APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5237988-39.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ SERAFIM
Advogado do(a) APELADO: ROBILAN MANFIO DOS REIS - SP124377-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5237988-39.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LUIZ SERAFIM Advogado do(a) APELADO: ROBILAN MANFIO DOS REIS - SP124377-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Senhor Juiz Federal Convocado DENILSON BRANCO (Relator): Trata-se de recurso de apelação do INSS em face da r. sentença que julgou procedente o pedido (ID 130900998 - Págs. 1/4), nos seguintes termos: “Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, condenando o réu a restabelecer o benefício auxílio-doença NB 570.537.720-3 em favor do autor a partir da data da cessação indevida (19/03/2019), com a sua conversão em aposentadoria por invalidez a partir de 21/08/2019, data do laudo pericial judicial; condenando-se ainda o réu ao pagamento das prestações vencidas ou eventuais diferenças devidas, considerando os benefícios eventualmente já pagos a serem descontados/compensados/substituídos a fim de evitar duplicidade, atualizadas com correção monetária pelo IPCA-E e juros da caderneta de poupança (art. 1-F, Lei 9.494/97), contados desde a data de vencimento de cada prestação, ressalvando que os juros relativos às prestações anteriores à citação deverão incidir a partir da citação (Súmula 204, STJ). Condeno o INSS no pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre os valores vencidos até a presente data (Súmula 111, STJ). Deixo de condenar o INSS ao pagamento das custas processuais, em razão da isenção prevista no art. 8°, § 1°, da Lei n° 8.620/93. Transitada em julgado, intime-se o INSS para implantação do benefício e apresentar o cálculo dos atrasados. Vindos aos autos os cálculos de liquidação apresentados pela autarquia-ré, intime-se a autora para deles se manifestar em 10 dias para que, havendo concordância, seja desde logo expedida a devida requisição de pagamento. Em se tratando de sentença ilíquida, decorrido o prazo de recurso voluntário, silente o réu, remetam-se os autos ao E. Tribunal Regional Federal para reexame necessário (Súmula 490, STJ). P.I.C." Em suas razões recursais, requer o ente previdenciário a submissão da sentença ao reexame necessário, a revogação da tutela antecipada e a reforma da sentença, em razão da ausência do preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício. Subsidiariamente, requer o reconhecimento da prescrição de parcelas eventualmente vencidas antes do quinquênio que antecede o ajuizamento da presente demanda ou a eventual prescrição da pretensão contra indeferimento administrativo anterior ao aludido prazo quinquenal; 2) a aplicação da isenção de custas e emolumentos (art. 46 da Lei n.º 5.010/66 c/c art. 8º, § 1º, da Lei n.º 8.620/93 c/c art. 4º, inciso I, da Lei n.º 9.289/96 c/c art. 24-A da Lei 9.028/95); seja concedida expressa autorização para o desconto das competências em que há contribuições prescrição de parcelas eventualmente vencidas antes do quinquênio que antecede o ajuizamento da presente demanda ou a eventual prescrição da pretensão contra indeferimento administrativo anterior ao aludido prazo; a aplicação da isenção de custas e emolumentos (art. 46 da Lei n.º 5.010/66 c/c art. 8º, § 1º, da Lei n.º 8.620/93 c/c art. 4º, inciso I, da Lei n.º 9.289/96 c/c art. 24-A da Lei 9.028/95); seja concedida expressa autorização para o desconto das competências em que há contribuições previdenciárias no CNIS, em razão da incompatibilidade jurídica da percepção simultânea de rendimentos decorrentes de atividade laborativa e de benefício por incapacidade, permitindo-se, assim, a realização do ENCONTRO DE CONTAS/COMPENSAÇÃO DOS VALORES, nos termos dos artigos 43, § 1º, a, 46 e 59 da Lei 8213/91, do art. 48 do Decreto 3.048/99 e da jurisprudência dos Tribunais; sejam os honorários advocatícios fixados em percentual mínimo sobre o valor da condenação ou do proveito econômico, nos termos do artigo 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC e da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça; seja a DIB fixada de modo a não permitir cumulação indevida de benefícios; a aplicação da correção monetária com a incidência dos índices legalmente previstos (Súmula nº 148 do STJ) e juros de mora não cumulativos tão-somente a partir da data da citação válida (Súmula nº 204 do STJ), bem como sejam fixados nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação conferida pela Lei 11.960/09 (ID 130901001 - Págs. 1/19). Com contrarrazões (ID 130901005 - Págs. 1/5). É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5237988-39.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LUIZ SERAFIM Advogado do(a) APELADO: ROBILAN MANFIO DOS REIS - SP124377-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Juiz Federal Convocado DENILSON BRANCO (Relator): Recebo o recurso de apelação do INSS, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do Código de Processo Civil. Não há que se falar em revogação da tutela antecipada, pois esta não foi concedida. No que se refere à remessa necessária, à qual fora submetida a sentença contrariada pelas partes, uma vez que o Juízo de origem indicou sua necessidade ao final daquela decisão de mérito, entendemos não ser necessário seu conhecimento. Tomando-se a norma contida no inciso I do § 3º do artigo 496 do atual Código de Processo Civil, já vigente à época da prolação da sentença, a remessa necessária não se aplica quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Não se pode negar que a sentença se apresentou ilíquida, uma vez que julgou procedente o pedido inicial, para condenar a Autarquia Previdenciária a conceder benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, além do pagamento das diferenças decorrentes, sem fixar o valor efetivamente devido. Mas tal condição daquela decisão de mérito não pode exigir que se conheça da remessa necessária, uma vez que o proveito econômico daquela condenação inegavelmente não atingirá o valor de mil salários mínimos ou mais. Registre-se, desde logo, que esta Corte vem firmando posicionamento no sentido de que, mesmo não sendo de valor certo, quando evidente que o proveito econômico da sentença não atingirá o limite de mil salários mínimos resta dispensada a remessa necessária, com recorrentes não conhecimento de tal recurso de ofício (Apelação/Reexame Necessário nº 0003371-69.2014.4.03.6140 - Relator Des. Fed. Paulo Domingues; Apelação/Remessa Necessária nº 0003377-59.2015.4.03.6102/SP – Relator Des. Fed. Luiz Stefanini; Apelação/Reexame Necessário nº 5882226-31.2019.4.03.9999 – Relator Des. Fed. Newton de Lucca). Razão pela qual, não conheço da remessa necessária indicada na sentença. Superadas tais questões, passo à análise do mérito. Os requisitos para a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente, de acordo com o artigo 42, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os que seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento daquelas. Enquanto que, de acordo com os artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, o benefício de auxílio por incapacidade temporária é devido ao segurado que fica incapacitado temporariamente para o exercício de suas atividades profissionais habituais, bem como àquele cuja incapacidade, embora permanente, não seja total, isto é, haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o seu sustento. A qualidade de segurada da parte autora e o cumprimento da carência prevista no inciso I do artigo 25 da Lei nº 8.213/91 restaram comprovadas, uma vez que ela esteve em gozo de auxílio por incapacidade temporária, benefício este que lhe foi concedido judicialmente e cessado administrativamente em 19/03/2019 (ID 130900962 – Pág. 1). Ajuizada a presente ação em 29/05/2019, não há que se falar em perda da qualidade de segurado, nos termos do inciso II do art. 15 da Lei nº 8.213/91. Para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica produzida. Neste passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência foi atestada pelo laudo pericial (ID 130900987 – Págs. 1/9). De acordo com referido laudo, a parte autora, nascida em 15/10/1962, tendo iniciado a “atividade laboral aos 09 anos de idade na lavoura, após engraxate, carreto na feira, aos 14 anos de idade como cobrador de ônibus, trabalho rural”, portadora de “síndrome de dependência ao álcool - CID 10 - F 10.2”, apresenta incapacidade total e temporária para o trabalho, desde o “primeiro dia da internação em hospital fechado”. Entretanto, considerando as condições pessoais da parte autora (idade, natureza da atividade laborativa desenvolvida e grau de instrução), tornam-se praticamente nulas as chances de ela se inserir novamente no mercado de trabalho, não havendo falar em possibilidade de reabilitação, razão pela qual a incapacidade revela-se total e definitiva. Assim já decidiu esta Corte Regional, conforme a seguinte ementa de acórdão: "AGRAVO LEGAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PARCIAL CONSIDERADA TOTAL. POSSIBILIDADE. INVALIDEZ. FENÔMENO QUE DEVE SER ANALISADO TAMBÉM À LUZ DAS CONDIÇÕES PESSOAIS E SÓCIO-CULTURAIS DO SEGURADO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO. I - Em sede de agravo, a controvérsia limita-se ao exame da ocorrência, ou não, de flagrante ilegalidade ou abuso de poder, a gerar dano irreparável ou de difícil reparação para a parte, vícios inexistentes na decisão que deu parcial provimento ao recurso adesivo do autor para determinar o pagamento do benefício (auxílio-doença NB 514.624.575-0) a contar da data imediatamente posterior à indevida cessação, com a conversão em aposentadoria por invalidez a contar da data do laudo pericial (24/10/2006). II - A invalidez é fenômeno que deve ser analisado também à luz das condições pessoais e sócio-culturais do segurado. III - Pelo nível social e cultural da parte autora não seria possível acreditar-se na sua recuperação para outra atividade que fosse compatível com as limitações estampadas no laudo pericial. IV - Restou demonstrado que o segurado está total e definitivamente incapacitado para toda e qualquer atividade laborativa. V - O réu, ora agravante, não apresentou nenhum argumento questionando a higidez da decisão agravada, nada mencionou sobre uma eventual omissão no julgado, ou a ocorrência de ilegalidade ou abuso de poder, restringiu-se somente em reproduzir os mesmos argumentos já enfrentados na decisão proferida por este relator. VI - Agravo improvido." (APELREE nº 1410235, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, j. 28/09/2009, DJF3 CJ1 DATA:28/10/2009, p. 1725). Ressalte-se que o julgador não está adstrito às conclusões do laudo pericial, podendo formar sua convicção pela análise do conjunto probatório trazido aos autos. Assim, uma vez preenchidos os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão da aposentadoria por incapacidade permanente, nos termos da r. sentença. Quanto à pretensão de exclusão das prestações devidas do benefício no período em que a parte autora exerceu atividade laborativa ou recolheu contribuições previdenciárias, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 24/06/2020, em sede de recurso representativo da controvérsia (Tema 1.013 - Recurso Especial repetitivo 1786590/SP e 1788700/SP, Ministro HERMAN BENJAMIN), firmou posicionamento no sentido de que “No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente”, conforme ementa a seguir transcrita: “PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA REPETITIVO 1.013/STJ. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DEMORA NA IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO SEGURADO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO SEGURADO. FUNÇÃO SUBSTITUTIVA DA RENDA NÃO CONSUBSTANCIADA. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO DA RENDA DO TRABALHO E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A EFETIVA IMPLANTAÇÃO. TESE REPETITIVA FIXADA. IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA 1. O tema repetitivo ora controvertido consiste em definir a "possibilidade de recebimento de benefício, por incapacidade, do Regime Geral de Previdência Social, de caráter substitutivo da renda (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), concedido judicialmente em período de abrangência concomitante àquele em que o segurado estava trabalhando e aguardava o deferimento do benefício." 2. Os fatos constatados no presente Recurso Especial consistem cronologicamente em: a) o segurado teve indeferido benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) na via administrativa; b) para prover seu sustento, trabalhou após o indeferimento e entrou com ação judicial para a concessão de benefício por incapacidade; c) a ação foi julgada procedente para conceder o benefício desde o requerimento administrativo, o que acabou por abranger o período de tempo em que o segurado trabalhou; e d) o debate, travado ainda na fase ordinária, consiste no entendimento do INSS de que o benefício por incapacidade concedido judicialmente não pode ser pago no período em que o segurado estava trabalhando, ante seu caráter substitutivo da renda e à luz dos arts. 42, 46 e 59 da Lei 8.213/1991. 3. A presente controvérsia e, consequentemente, a tese repetitiva que for fixada não abrangem as seguintes hipóteses: 3.1. O segurado está recebendo regularmente benefício por incapacidade e passa a exercer atividade remunerada incompatível com sua incapacidade, em que não há o caráter da necessidade de sobrevivência como elemento que justifique a cumulação, e a função substitutiva da renda do segurado é implementada de forma eficaz. Outro aspecto que pode ser analisado sob perspectiva diferente é o relativo à boa-fé do segurado. Há jurisprudência das duas Turmas da Primeira Seção que analisa essa hipótese, tendo prevalecido a compreensão de que há incompatibilidade no recebimento conjunto das verbas. A exemplo: AgInt no REsp 1.597.369/SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 13.4.2018; REsp 1.454.163/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015; e REsp 1.554.318/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 2.9.2016. 3.2. O INSS alega o fato impeditivo do direito (o exercício de trabalho pelo segurado) somente na fase de cumprimento da sentença, pois há elementos de natureza processual prejudiciais à presente tese a serem considerados, notadamente a aplicabilidade da tese repetitiva fixada no REsp 1.253.513/AL (Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe de 20.8.2012). RESOLUÇÃO DA TESE CONTROVERTIDA 4. Alguns benefícios previdenciários possuem a função substitutiva da renda auferida pelo segurado em decorrência do seu trabalho, como mencionado nos arts. 2º, VI, e 33 da Lei 8.213/1991. Em algumas hipóteses, a substitutividade é abrandada, como no caso de ser possível a volta ao trabalho após a aposentadoria por tempo de contribuição (art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991). Em outras, a substitutividade resulta na incompatibilidade entre as duas situações (benefício e atividade remunerada), como ocorre com os benefícios auxílio-doença por incapacidade e aposentadoria por invalidez. 5. Desses casos de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, é pressuposto que a incapacidade total para o trabalho seja temporária ou definitiva, respectivamente. 6. Como consequência, o Regime Geral de Previdência Social arca com os citados benefícios por incapacidade para consubstanciar a função substitutiva da renda, de forma que o segurado que não pode trabalhar proveja seu sustento. 7. A cobertura previdenciária, suportada pelo regime contributivo solidário, é o provimento do sustento do segurado enquanto estiver incapaz para o trabalho. 8. É decorrência lógica da natureza dos benefícios por incapacidade, substitutivos da renda, que a volta ao trabalho seja, em regra, causa automática de cessação desses benefícios, como se infere do requisito da incapacidade total previsto nos arts. 42 e 59 da Lei 8.213/1991, com ressalva ao auxílio-doença. 9. No caso de aposentadoria por invalidez, o art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS) estabelece como requisito a incapacidade "para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência", e, assim, a volta a qualquer atividade resulta no automático cancelamento do benefício (art. 46). 10. Já o auxílio-doença estabelece como requisito (art. 59) que o segurado esteja "incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual". Desse modo, a função substitutiva do auxílio-doença é restrita às duas hipóteses, fora das quais o segurado poderá trabalhar em atividade não limitada por sua incapacidade. 11. Alinhada a essa compreensão, já implícita desde a redação original da Lei 8.213/1991, a Lei 13.135/2015 incluiu os §§ 6º e 7º no art. 60 daquela, com a seguinte redação (grifos acrescentados): "§ 6º O segurado que durante o gozo do auxílio-doença vier a exercer atividade que lhe garanta subsistência poderá ter o benefício cancelado a partir do retorno à atividade. § 7º Na hipótese do § 6º, caso o segurado, durante o gozo do auxílio-doença, venha a exercer atividade diversa daquela que gerou o benefício, deverá ser verificada a incapacidade para cada uma das atividades exercidas." 12. Apresentado esse panorama legal sobre o tema, importa estabelecer o ponto diferencial entre a hipótese fática dos autos e aquela tratada na lei: aqui o segurado requereu o benefício, que lhe foi indeferido, e acabou trabalhando enquanto não obteve seu direito na via judicial; já a lei trata da situação em que o benefício é concedido, e o segurado volta a trabalhar. 13. A presente controvérsia cuida de caso, portanto, em que falhou a função substitutiva da renda, base da cobertura previdenciária dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. 14. O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo trabalho, o suprimento da sua subsistência. 15. Por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado teve de trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária e jurisprudencialmente convencionou-se chamar de sobre-esforço. Assim, a remuneração por esse trabalho tem resultado inafastável da justa contraprestação pecuniária. 16. Na hipótese, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia previdenciária, pois, por culpa sua - indeferimento equivocado do benefício por incapacidade -, o segurado foi privado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura previdenciária, inerente aos mencionados benefícios. 17. Como tempero do elemento volitivo do segurado, constata-se objetivamente que, ao trabalhar enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está ele atuando de boa-fé, cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito. 18. Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo efetivo pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o segurado exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame da compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral. 19. No mesmo sentido do entendimento aqui defendido: AgInt no AREsp 1.415.347/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, Je de 28.10.2019; REsp 1.745.633/PR, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18.3.2019; AgInt no REsp 1.669.033/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 30.8.2018; REsp 1.573.146/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 13.11.2017; AgInt no AgInt no AREsp 1.170.040/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 10.10.2018; AgInt no REsp 1.620.697/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 2.8.2018; AgInt no AREsp 1.393.909/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 6.6.2019; e REsp 1.724.369/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 25.5.2018. FIXAÇÃO DA TESE REPETITIVA 20. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente." RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 21. Ao Recurso Especial deve-se negar provimento, pois o Tribunal de origem julgou o presente caso no mesmo sentido do entendimento aqui proposto (fl. 142-143/e-STJ): "A permanência do segurado no exercício das atividades laborativas decorre da necessidade de prover sua subsistência enquanto a administração ou o Judiciário não reconheça sua incapacidade, não obstando a concessão do benefício vindicado durante a incapacidade." 22. Consubstanciado o que previsto no Enunciado Administrativo 7/STJ, o recorrente é condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor total da verba sucumbencial fixada nas instâncias ordinárias, com base no § 11 do art. 85 do CPC/2015. CONCLUSÃO 23. Recurso Especial não provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.” Além disso, não há que se falar em desconto dos períodos em que a parte autora exerceu atividade laborativa ou recolheu contribuições previdenciárias após a cessação do auxílio por incapacidade temporária, pois isso não ocorreu (ID 130900959 - Pág. 1). Também não há que se falar em prescrição quinquenal, considerando a data do início do benefício (19/03/2019) e a data do ajuizamento da presente demanda (29/05/2019). A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente com as alterações promovidas pela Resolução nº 658/2020 - CJF, de 10/08/2020, observando-se que desde a promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 08/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária. A autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita. Em razão da sucumbência recursal, mantenho a condenação da parte ré nos termos fixados na r. sentença e majoro os honorários advocatícios em 2% (dois por cento), observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 4º, III, 5º, 11, do CPC/2015. Diante do exposto, NÃO CONHEÇO DO REEXAME NECESSÁRIO, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS e arbitro honorários advocatícios, em razão da sucumbência recursal, nos termos da fundamentação. Independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS, a fim de que se adotem as providências cabíveis à imediata implantação do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, em nome de LUIZ SERAFIM, com data de início - DIB em 21/08/2019 e renda mensal inicial – RMI a ser calculada pelo INSS, nos termos do art. 497 do CPC. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO INCABÍVEL. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. ART. 42, CAPUT E § 2º DA LEI 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. Tomando-se a norma contida no inciso I do § 3º do artigo 496 do atual Código de Processo Civil, já vigente à época da prolação da sentença, a remessa necessária não se aplica quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos.
2. Não se pode negar que a sentença se apresentou ilíquida, uma vez que julgou procedente o pedido inicial, para condenar a Autarquia Previdenciária a conceder a aposentadoria por incapacidade permanente, além do pagamento das diferenças decorrentes, sem fixar o valor efetivamente devido.
3. Mas tal condição daquela decisão de mérito não pode exigir que se conheça da remessa necessária, uma vez que o proveito econômico daquela condenação inegavelmente não atingirá o valor de mil salários mínimos ou mais. Precedentes desta Corte e do E. STJ.
4. Comprovada a incapacidade total e permanente para o trabalho diante do conjunto probatório, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 42, caput e §2º da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente.
5. Em razão da sucumbência recursal, mantenho a condenação da parte ré nos termos fixados na r. sentença e majoro os honorários advocatícios em 2% (dois por cento), observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 4º, III, 5º, 11, do CPC/2015.
6. Reexame necessário não conhecido. Apelação do INSS desprovida.