Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5016703-32.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

AGRAVANTE: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS

AGRAVADO: SERVICOS AUTOMOTIVOS RIO PEQUENO LTDA

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5016703-32.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

AGRAVANTE: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS

AGRAVADO: SERVICOS AUTOMOTIVOS RIO PEQUENO LTDA

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator):

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA contra decisão que indeferiu o pedido de redirecionamento da execução fiscal ao sócio Ortêncio João de Oliveira, sob o fundamento de que não teria sido comprovada sua responsabilidade tributária.

Sustenta o agravante, em síntese, que o redirecionamento da execução pode ser realizado em relação ao sócio-gerente ou ao administrador da empresa na época da dissolução irregular, pois tal figura é que detém a responsabilidade de cumprir todas as obrigações da sociedade.

Alega que, no caso concreto, foi comprovada a dissolução irregular da pessoa jurídica executada, uma vez que há nos autos certidão do Oficial de Justiça informando que a empresa não se encontra em funcionamento no endereço de sua sede e/ou domicílio fiscal, o que configura fato suficiente para autorizar o redirecionamento da execução fiscal ao sócio com poderes de administração na época da constatação da dissolução irregular.

Requer o recebimento do recurso com efeito suspensivo e, ao final, o seu provimento, para reformar a decisão agravada, a fim de determinar a inclusão do sócio no polo passivo da execução fiscal (ID 75008577).

Foi proferida decisão determinando o sobrestamento do feito, até a definição pelo C. Superior Tribunal de Justiça dos Temas Repetitivos n. 962 e 981 (ID 77366983).

Ante o julgamento dos mencionados Temas Repetitivos, foi procedido ao levantamento do sobrestamento do feito e deferida parcialmente a atribuição de efeito suspensivo ao recurso (ID 275085696).

Sem apresentação de contraminuta, uma vez que a agravada não constituiu advogado nos autos de origem.

Em 11/09/2023, os autos foram redistribuídos para minha relatoria em razão da criação desta unidade judiciária.

É o relatório.

 

 


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3ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5016703-32.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

AGRAVANTE: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS

AGRAVADO: SERVICOS AUTOMOTIVOS RIO PEQUENO LTDA

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): 

Cinge-se a controvérsia em quanto ao redirecionamento da execução fiscal para cobrança de débito tributário de pessoa jurídica que deixou de exercer suas atividades em seu endereço sem informar as autoridades competentes.  

Inicialmente cumpre salientar que o redirecionamento da execução fiscal ao sócio da pessoa jurídica decorre da sua responsabilidade subsidiária, prevista no art. 135, III, do CTN, que assim dispõe:

“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

(...)

III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”

 

O redirecionamento, assim, consiste na possibilidade de se responsabilizar o administrador da sociedade pelos atos praticados com infringência à lei ou ao seu contrato / estatuto social. Cuida-se de exceção à regra da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, prevista, dentre outros, no art. 49-A do Código Civil:

“Art. 49-A.  A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

Parágrafo único. A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos.” 

 

Isso porque a autonomia patrimonial da pessoa jurídica não é um fim em si mesmo, um direito absoluto, sendo possível sua relativização quando ocorrer fraude ou abuso de direito por parte de seus sócios e/ou administradores.

É o caso, por exemplo, da regra prevista na legislação civil (CC/02, art. 50), consumerista (CDC, art. 28), ambiental (Lei 9.605/98, art. 4º), de anticorrupção empresarial (Lei 12.846/13, art. 14) e de defesa da concorrência (Lei 12.529/11, art. 34), dentre outros.

Na seara tributária não é diferente. O art. 135 do CTN, como visto, prevê, dentre outros, a possibilidade de responsabilização pessoal dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado pelos créditos correspondentes às obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos (inciso III). E a dissolução irregular da pessoa jurídica devedora de tributos, nesse diapasão, configura inegável hipótese de infração à lei.

Nesse sentido, a jurisprudência do STJ se consolidou no sentido de que “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente” (Súmula 435).

Isso porque: "(...) é obrigação dos gestores das empresas manter atualizados os respectivos cadastros, incluindo os atos relativos à mudança de endereço dos estabelecimentos e, especialmente, referentes à dissolução da sociedade. A regularidade desses registros é exigida para que se demonstre que a sociedade dissolveu-se de forma regular, em obediência aos ritos e formalidades previstas nos arts. 1.033 a 1.038 e arts. 1.102 a 1.112, todos do Código Civil de 2002 – onde é prevista a liquidação da sociedade com o pagamento dos credores em sua ordem de preferência – ou na forma da Lei 11.101/2005, no caso de falência. A desobediência a tais ritos caracteriza infração à lei" (cf. REsp 1.371.128/RS, tema repetitivo 630, Rel. Min. Mauro Campbell, DJe de 17/09/2014).

Pois bem. A responsabilidade tributária de terceiros, tal qual prevista no art. 135, III, do CTN para os diretores, gerentes ou representantes da pessoa jurídica, pode decorrer, assim: (i)  de ato de infração à lei do qual resulte diretamente a obrigação tributária; ou (ii)  de ato infracional praticado em momento posterior ao surgimento do crédito tributário que inviabilize, porém, a cobrança do devedor original. (conforme Recurso Especial repetitivo 1.201.993/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe de 12/12/2019).

A dissolução irregular da pessoa jurídica é justamente a caracterização dessa segunda hipótese, em que o ato de infração à lei ocorre em momento posterior ao fato gerador, de forma a inviabilizar a cobrança do crédito tributário do contribuinte.

Assentadas tais premissas, passo à análise dos autos.

No caso vertente, o Sr. Oficial de Justiça constatou a dissolução irregular da empresa em 23/03/2018, quando, na tentativa de cumprimento da mandado de citação, certificou que a executada não foi localizada no endereço indicado para realização da diligência, que coincide com aqueles constantes da ficha cadastral da JUCESP e do Sistema INFOSEG (ID 75008578 – Pág. 16/19 e 24), ensejando a conclusão de que as atividades da empresa foram encerradas sem as devidas providências legais.

Por outro lado, conforme se extrai da ficha cadastral da JUCESP, o Sr. Ortêncio João de Oliveira foi admitido na sociedade empresária em 11/01/2007, na condição de sócio e administrador, assinando pela empresa, não havendo registro de sua retirada do quadro social e da administração (ID 75008578 – Pág. 17/19).

Assim, considerando que o Sr. Ortêncio João de Oliveira figurava como sócio e administrador da sociedade na época da constatação da dissolução irregular, é plenamente cabível o redirecionamento da execução fiscal requerido no presente recurso, por força da regra da responsabilidade em sentido estrito  (art. 135, III, CTN c/c art. 10, Decreto 3.078/19 c/c art. 4º, V, da LEF), em harmonia com a jurisprudência recente. 

A decisão combatida, assim, merece reforma, deferindo-se o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-administrador Ortêncio João de Oliveira.

Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento. 

É o voto. 



E M E N T A

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA PESSOA JURÍDICA. REDIRECIONAMENTO AO SÓCIO-ADMINISTRADOR. POSSIBILIDADE. SÚMULA 435/STJ E TEMAS REPETITIVOS 630 e 981/ STJ. RECURSO PROVIDO. 

- A empresa que deixa de funcionar no seu domicílio fiscal sem comunicar os órgãos competentes presume-se dissolvida irregularmente, de modo a permitir o redirecionamento da execução fiscal (Súmula 435/STJ).

- Em execução fiscal de dívida ativa tributária ou não-tributária, dissolvida irregularmente a empresa, está legitimado o redirecionamento ao sócio-gerente (tema repetitivo 630/STJ). Inteligência do art. 135, III, do CTN c/c arts. 10 do Decreto 3.078/19 e 158 da Lei nº 6.404/76.

- No presente caso, o requerimento de redirecionamento da execução fiscal se deu em relação ao sócio da executada com poderes de administração no momento de sua dissolução irregular (tema repetitivo 981/STJ), razão pela qual a decisão de primeiro grau deve ser reformada para permitir tal redirecionamento.   

- Tese recursal que encontra amparo na jurisprudência, impondo a reforma da decisão de primeira instância. 

- Agravo de instrumento provido.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RUBENS CALIXTO
DESEMBARGADOR FEDERAL