APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007008-15.2018.4.03.6103
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY
APELANTE: UNIÃO FEDERAL
PARTE RE: JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SAO PAULO
APELADO: JEFFERSON MARQUES
Advogado do(a) APELADO: NIVAIR APARECIDO DE OLIVEIRA - SP348512-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007008-15.2018.4.03.6103 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: UNIÃO FEDERAL PARTE RE: JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SAO PAULO Advogado do(a) APELADO: NIVAIR APARECIDO DE OLIVEIRA - SP348512-A R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto por UNIÃO FEDERAL em face de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por JEFFERSON MARQUES, contra a apelante e contra a JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO, para determinar o cancelamento do CPF 048.291.348-79 e a concessão de um novo número, após o trânsito em julgado da decisão (ID 286008903). Alega, em suma, que a alegação de fraude com o número de CPF não se enquadra nos casos previstos de cancelamento administrativo do cadastro pela Instrução Normativa n. 1548/2015 da RFB, nem a pedido, nem de ofício. Afirma que os atos administrativos do agente público são vinculados e que a lista dos casos elencados na norma em questão é exaustivo, bem como que a autorização para modificação do número em caso de utilização indevida sacrifica a segurança jurídica que o Estado deve possuir na identificação dos cidadãos. Por fim, sustenta que a fraude alegada não restou comprovada, sobretudo considerando que desde 2001 o autor sabe que seu nome estaria envolvido em abertura de empresas e somente passados quase 20 anos veio a se insurgir contra tal fato. Portanto, postula a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido (ID 286008907). O apelado interpôs recurso adesivo postulando tão somente a reforma da sentença quanto ao reconhecimento da ocorrência dos danos morais. Sustenta ser “a inegável conduta antijurídica da Apelada grande constrangimento de ordem social do Autor, ora Apelante, visto que evidenciado o transtorno provocado, tendo a mesmo tentado resolver administrativamente, porém sem êxito e descaso, não lhe restando outra alternativa senão judicializar a demanda.” Afirma não conseguir abrir conta em bancos e nem ter crédito no comércio em razão da negativa da União em fornecê-lo um novo número de CPF, portanto, faz jus à indenização pleiteada (ID 286008911). Contrarrazões do apelado (ID 286008912). Sem contrarrazões da União. É o relatório.
APELADO: JEFFERSON MARQUES
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007008-15.2018.4.03.6103 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: UNIÃO FEDERAL PARTE RE: JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SAO PAULO Advogado do(a) APELADO: NIVAIR APARECIDO DE OLIVEIRA - SP348512-A V O T O Cinge-se a controvérsia acerca do direito do autor ao cancelamento de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) da Receita Federal do Brasil em razão do uso indevido por terceiros, bem como da ocorrência e extensão dos danos morais decorrentes de conduta estatal. E, sem delongas, tenho que o recurso de apelação não merece provimento. Acerca das hipóteses de cancelamento do CPF, dispõe a Instrução Normativa RFB n. 2172/2024, que revogou a IN RFB n. 1548/2015: Art. 15. O cancelamento da inscrição no CPF poderá ocorrer: I - a pedido; ou II - de ofício. Art. 16. O cancelamento da inscrição no CPF a pedido ocorrerá exclusivamente quando constatada a multiplicidade de inscrições pela própria pessoa física. Parágrafo único. O cancelamento da inscrição no CPF será realizado em conformidade com o disposto no Anexo IV, ficando a critério da administração tributária eleger o número de inscrição no CPF a ser mantido válido. Art. 17. Será cancelada de ofício a inscrição no CPF nas seguintes hipóteses: I - atribuição de mais de um número de inscrição para uma mesma pessoa física; II - por decisão administrativa; ou III - por determinação judicial. Parágrafo único. O cancelamento de ofício da inscrição no CPF será comunicado por meio do: I - Comprovante de Situação Cadastral no CPF, conforme modelo constante do Anexo VI, disponível no site da RFB na Internet; II - Comprovante de Situação Cadastral no CPF, acessado por meio do aplicativo da RFB para dispositivos móveis. Como visto, a norma de regência prevê expressamente três possibilidades de cancelamento de ofício, pela autoridade fazendária, da inscrição do contribuinte no CPF: a) a atribuição de mais de um número de inscrição para uma mesma pessoa física; b) por decisão administrativa; ou c) por decisão judicial. Veja-se que o conectivo adotado (“ou”) denota alternativa ou opcionalidade entre as situações apresentadas, de modo que não se pode concluir, como alega a apelante, que o cancelamento da inscrição, mesmo que determinado judicialmente, somente poderia se basear na multiplicidade de inscrições (inciso I). Do contrário, o fato de a decisão judicial constar de forma autônoma, sem qualquer condição ou fundamento vinculado pela norma, indica que esta admite o cancelamento por razões outras que não as expressamente ali constantes, desde que devidamente comprovadas em juízo. Se assim não fosse, bastava tão somente a previsão do inciso I pra basear quaisquer decisões judiciais ou administrativas acerca da matéria. Esse, aliás, é o entendimento que vem sendo amplamente adotado na jurisprudência pátria, que admite o cancelamento da inscrição no CPF do contribuinte, com atribuição de novo número, caso demonstrado seu uso indevido por terceiros (fraude). Veja-se os precedentes desta Quarta Turma: ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. CPF. FRAUDE. CANCELAMENTO. DETERMINAÇÃO JUDICIAL. NOVA INSCRIÇÃO. POSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. - O propósito do cadastro de pessoas físicas é a identificação do contribuinte perante a Receita Federal e as instituições financeiras, de maneira que, uma vez utilizado indevidamente e de forma fraudulenta por terceiro, ocorre o completo esvaziamento lógico do sistema por ser rompida a relação entre os meios de que se utiliza a administração pública e os fins que ela almeja alcançar. - A Instrução Normativa RFB nº 1.548/2015 prevê o cancelamento da inscrição por determinação judicial em casos especiais, dado que não se pode esperar que a Receita Federal cancele e emita novos registros por simples capricho do contribuinte, razão pela qual foram editadas instruções normativas para regular o processo de expedição. - À vista do princípio da razoabilidade e da normatização pertinente, e evidenciado o uso fraudulento dos dados pessoais da apelada, afigura-se correto o provimento ao determinar o cancelamento do CPF, bem como a emissão novo número à autora. - Apelação desprovida. (TRF3, 4ª Turma, ApCiv n. 5001946-93.2021.4.03.6133, Rel. Des. Federal SIDMAR DIAS MARTINS, j. 21/02/2024, DJEN 28/02/2024) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CPF. IN RFB 1.548/15. CANCELAMENTO DO NÚMERO DE INSCRIÇÃO. POSSIBILIDADE. FRAUDE. 1. A IN RFB 1.548/15 prevê a atribuição de um número de CPF apenas uma única vez para cada pessoa física. 2. A própria Instrução Normativa não é taxativa, possibilitando o cancelamento de ofício da inscrição “por decisão administrativa, nos demais casos”. Por sua vez, o cancelamento por determinação judicial tão somente reitera o direito de ação, previsto pelo art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. 3. A possibilidade do cancelamento do número de inscrição de CPF em razão da utilização indevida por terceiros encontrou amparo na jurisprudência. Precedentes. 4. Apelo provido. (TRF3, 4ª Turma, ApCiv n. 5000794-92.2020.4.03.6117, Rel. Des. Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, j. 04/04/2023, DJEN 12/04/2023) PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. CADASTRO DE PESSOAS FÍSICAS - CPF. FRAUDE. CANCELAMENTO. POSSIBILIDADE. 1. A questão vertida nos autos diz respeito à possibilidade de cancelamento da inscrição da demandante no Cadastro de Pessoas Físicas, em razão de fraudes perpetradas em seu nome, e a emissão de nova inscrição. 2. O Cadastro de Pessoa Física - CPF é o documento que identifica o contribuinte perante a Receita Federal e tem a finalidade de tornar possível à Administração Pública a fiscalização do efetivo e correto recolhimento dos tributos federais. Tal controle se justifica em razão da supremacia do interesse público que se sobrepõe ao interesse particular do contribuinte, sendo a matéria regulamentada pela Instrução Normativa RFB nº 1548, de 13/02/2015, a qual dispõe no art. 5º que o número de inscrição no CPF é atribuído à pessoa física uma única vez, sendo vedada a concessão de mais de um número de CPF. Dispõe, ainda, sobre as hipóteses de cancelamento do CPF. 4. E, da leitura da norma de regência depreende-se que o caso dos autos - uso indevido por terceiros - não se enquadra em nenhuma das hipóteses de cancelamento de inscrição no CPF, a pedido do contribuinte, tampouco nas de cancelamento de ofício. Ocorre, contudo, que pela norma de regência, a inscrição no CPF pode ser declarada nula pela Receita Federal do Brasil nos casos em que constatada fraude e, ainda, por decisão judicial, de modo que há a possibilidade de se cancelar o número de inscrição no CPF, desde que cabalmente comprovada fraude. 5. A utilização de um mesmo número por duas ou mais pessoas, alguma dessas agindo mediante comprovada fraude, traz consequências danosas não apenas para o contribuinte legitimamente inscrito sob aquele número, mas também para toda a sociedade, vale dizer instituições financeiras, estabelecimentos comerciais e outros, em prejuízo da sociedade e do próprio fisco. Nessa situação, portanto, não se mostra razoável exigir que, em nome da unicidade do número cadastral, a parte autora e a coletividade suportem os diversos prejuízos decorrentes da utilização indevida de CPF por terceiro. 6. No caso concreto, restou cabalmente comprovado nos autos os inúmeros transtornos causados em razão do uso fraudulento do número de CPF atribuído à demandante. 7. Apelação improvida. (TRF3, 4ª Turma, ApCiv n. 0003336-37.2016.4.03.6109, Rel. Des. Federal MARLI MARQUES FERREIRA, j. 18/06/2021, DJEN 07/07/2021) Na espécie, tenho que a fraude restou demonstrada por meio do boletim de ocorrência de ID 286008631, no qual o autor relata ter sido vítima de um roubo em 08/04/1999, conforme BO n. 3322/1999, no qual foram subtraídos sua carteira com documentos (CNH, RG, CPF, cartões de crédito e talonário de cheques), seu celular e outros pertences. Na ocasião, vê-se que ele exibiu RG emitido em 28/04/1999, logo após a data do roubo relatado, o que indica a necessidade de obtenção de novos documentos em razão da subtração dos antigos. O documento de ID 286008737, por sua vez, se trata de RG com os mesmos dados do autor, inclusive CPF, mas com fotografia de terceiro e assinatura distinta da constante do RG trazido a juízo (ID 286008628), do instrumento de procuração (ID 286008627) e da declaração de hipossuficiência (ID 286008630), evidenciando que, de fato, suas informações foram utilizadas indevidamente por terceiros. Soma-se a isso o fato de que todas as empresas cuja participação social o autor contesta foram abertas ou tiveram a sua inclusão no quadro societário após o roubo (entre os anos de 2000 e 2008), como indicam os documentos trazidos pela Junta Comercial de São Paulo (ID 286008860). O endereço neles declinado como sendo do autor, ainda, são todos diferentes daqueles em que ele declarou residir no boletim de ocorrência juntado aos autos (Rua Humaitá, 177, Centro, São José dos Campos-SP) e na petição inicial (Rua Enseada, 91, Jardim Satélite, na mesma cidade). As assinaturas de ID 286008868, f. 1, 4, 13, 16 e 18-19, ID 286008869, f. 1-2, 8, 11 e 16-17, ID 286008870, f. 14, ID 286008871, f. 1 e 6, ID 286008872, f. 1-2, 6 e 14, ID 286008873, f. 4, e ID 286008874, f. 1 e 4, que lhe são atribuídas também diferem das constantes dos documentos originais juntados ao feito e muitas vezes se assemelham à do RG com fotografia de terceiro (ID 286008737). Portanto, o uso indevido do número de CPF do autor, mediante fraude, está suficientemente comprovado, sendo devido o cancelamento da inscrição com atribuição de novo número como determinado na sentença recorrida. Quanto aos danos morais alegados, objeto do recurso adesivo interposto, também se afiguram presentes. Acerca da responsabilidade civil do Estado, dispõe o art. 37, § 6º, da Constituição Federal: § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Na modalidade objetiva, a responsabilidade estatal prescinde da apuração de dolo ou culpa – por negligência, imprudência ou imperícia –, bastando que exista nexo de causalidade entre o ato praticado pelo agente do Estado e o dano sofrido pelo administrado. Na hipótese de responsabilidade por ato omissivo, por sua vez, deixa de incidir a regra do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, fazendo-se necessário apurar a existência de omissão danosa e ilícita dos agentes do Estado a caracterizar a culpa do serviço público. Nesse sentido, a lição da professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro[1]: (...) A responsabilidade, no caso de omissão, é subjetiva, aplicando-se a teoria da culpa do serviço público ou da culpa anônima do serviço público (porque é indiferente saber quem é o agente público responsável). Segundo essa teoria, o Estado responde desde que o serviço público (a) não funcione, quando deveria funcionar; (b) funcione atrasado; ou (c) funcione mal. Nas duas primeiras hipóteses, tem-se a omissão danosa. (...) A esse respeito, Juan Carlos Cassagne (citado por Flávio de Araújo Willeman, 2005:122) ensina que “a chave para determinar a falta de serviço e, consequentemente, a procedência da responsabilidade estatal por um ato omissivo se encontra na configuração ou não de uma omissão antijurídica. Esta última se perfila só quando seja razoável esperar que o Estado atue em determinado sentido para evitar os danos às pessoas ou aos bens dos particulares. Pois bem, a configuração de dita omissão antijurídica requer que o Estado ou suas entidades descumpram uma obrigação legal expressa ou implícita (...). Por essa razão, acolhemos a lição daqueles que aceitam a tese da responsabilidade subjetiva nos casos de omissão do Poder Público. Com Celso Antônio Bandeira de Mello (2008:996), entendemos que, nessa hipótese, existe uma presunção de culpa do Poder Público. O lesado não precisa fazer a prova de que existiu a culpa ou dolo. Ao Estado é que cabe demonstrar que agiu com diligência, que utilizou os meios adequados e disponíveis e que, se não agiu, é porque sua atuação estaria acima do que seria razoável exigir; se fizer essa demonstração, não incidirá em responsabilidade. Assim, presente a omissão ilícita estatal, e comprovadas a existência do dano e do nexo causal entre ambos, impõe-se o dever de indenizar, nos moldes do art. 186 do Código Civil. No caso, verifico presente a responsabilidade, na modalidade subjetiva, por parte da JUCESP, e na modalidade objetiva, por parte da União. Isso porque, nos termos da Lei n. 8.934/1994, que dispõe sobre o registro público de empresas mercantis, compete à Junta Comercial exigir, para o arquivamento dos documentos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção de firmas individuais, sociedades e cooperativas, “a prova de identidade dos titulares e dos administradores da empresa” (art. 37, inciso V), bem como autenticar “as cópias dos documentos assentados” (art. 39, II). O art. 40, por sua vez, prevê que “todo ato, documento ou instrumento apresentado a arquivamento será objeto de exame do cumprimento das formalidades legais pela junta comercial.” Por fim, o art. 63, parágrafo único, na redação então vigente, previa que “a cópia de documento, autenticada na forma da lei, dispensa nova conferência com o original; poderá, também, a autenticação ser feita pelo cotejo da cópia com o original por servidor a quem o documento seja apresentado.” Dos os dispositivos citados, depreende-se o dever do servidor da Junta Comercial de verificar a autenticidade dos documentos apresentados para registro na autarquia. Tal dever, na espécie, evidentemente não foi observado, considerando o registro de ao menos sete empresas com o uso de documento falso contendo os dados do demandante. Determinada pelo juízo a juntada de “quaisquer documentos pessoais arquivados em sua posse, ou de cópias, exigidos na abertura ou alteração do registro de empresas em que conste o autor JEFFERSON MARQUES – CPF n.º 048.291.348-79 como titular/sócio/administrador/diretor” (ID 286008856), a JUCESP não trouxe cópias de RG, CNH ou outros documentos apresentados na ocasião, apenas dos atos constitutivos das empresas, cujas assinaturas, como já assinalado, não condizem com a assinatura do autor. Portanto, a ré não se desincumbiu do ônus de comprovar que observou todas as cautelas necessárias ao atendimento de seu dever legal, a fim de evitar a conclusão do ato fraudulento, configurando-se a omissão ilícita para fins de responsabilização civil. Nesse sentido: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ARQUIVAMENTO DE REGISTROS DE ATOS EMPRESARIAIS. RECONHECIMENTO DE FIRMAS. EXIGIBILIDADE. RESOLUÇÃO 010/2007, DA JUNTA COMERCIAL DO MATRO GROSSO. OFENSA A LEI 8.934/1994 E 9.784/1999. OCORRÊNCIA. VERIFICAÇÃO DE AUTENTICIDADE. ATRIBUIÇÃO DA JUNTA COMERCIAL. ART. 40 DA LEI 8.934/1994. SENTENÇA REFORMADA. 1. É desnecessário o reconhecimento de firma nos documentos para o registro de atos comerciais na junta comercial, nos termos do art. 63 da Lei 8.934/94, exceto na hipótese de fundada dúvida, caso em que a exigência de reconhecimento de firma deverá ser motivada. 2. É dever da Junta Comercial diligenciar no sentido de examinar e conferir os documentos que lhe são apresentados para aferir o cumprimento das formalidades legais necessárias ao registro público, principalmente quanto a legitimidade e autenticidade dos documentos e assinaturas, a fim de que sejam evitadas fraudes, nos termos do art. 40 da Lei nº 8.934/1994. 3. Hipótese em que a Junta Comercial de Mato Grosso se negou a aceitar a documentação da impetrante por ausência de firma previamente reconhecida com base em resolução própria, em flagrante afronta à legislação federal, mormente quando inexistiu qualquer dúvida quanto à autenticidade do documento. 4. Apelação da impetrante a que se dá provimento. (TRF1, AC 1000053-78.2019.4.01.3606, Rel. Desa. Federal DANIELE MARANHÃO COSTA, 5ª Turma, j. 17/06/2020) ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FRAUDE NO REGISTRO COMERCIAL DE ABERTURA DE EMPRESA. FALHA NA VERIFICAÇÃO DA DOCUMENTAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. CONFIGURADOS. QUANTIFICAÇÃO. HONORÁRIOS. 1. Imputada a responsabilidade objetiva ao Estado, torna-se dispensável a verificação da existência de culpa do réu, bastando apenas a demonstração do nexo de causalidade entre o ato e o dano sofrido. Essa responsabilidade baseia-se na teoria do risco administrativo, em relação a qual basta a prova da ação, do dano e de um nexo de causa e efeito entre ambos, sendo, porém, possível excluir a responsabilidade em caso de culpa exclusiva da vítima, de terceiro ou ainda em caso fortuito ou força maior. 2. A responsabilidade estatal por ato omissivo é subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). 3. Se houve irregularidade na abertura da empresa porque a Junta Comercial deixou de verificar a compatibilidade das assinaturas apostas no contrato com os documentos de identificação dos sócios apresentados por ocasião do registro comercial, deve ela ser responsabilizada pelos danos causados a terceiros que tiveram seus nomes indevidamente figurando em contrato social fraudulento. 4. Na quantificação do dano moral devem ser sopesadas as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições econômicas das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. A indenização deve ser arbitrada em valor que se revele suficiente a desestimular a prática reiterada da prestação de serviço defeituosa e ainda evitar o enriquecimento sem causa da parte que sofre o dano. 5. Conforme o entendimento manifestado por esta Turma, a verba honorária deve ser arbitrada em 10% sobre o valor da causa ou da condenação, somente afastando-se desse critério quando tal valor for excessivo ou constituir em valor ínfimo e muito aquém daquilo que efetivamente deveria receber o advogado. (TRF4, AC 5004980-10.2011.4.04.7100, Rel. Des. Federal LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, 4ª Turma, j. 06/10/2015) Quanto à União, verifica-se da resposta de ofício encaminhado à Receita Federal (ID 286008833) que o autor figura como corresponsável em 18 inscrições de dívida ativa já ajuizadas relativas à empresa Marinho & Ferreira Comércio e Serviços LTDA, em cujo quadro societário ele foi incluído de forma fraudulenta. Portanto, tratam-se de inscrições em dívida ativa indevidas, o que caracteriza dano moral in re ipsa, como é pacífico na jurisprudência desta Corte: APELAÇÃO CIVIL. DANO MORAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO. DANO IN RE IPSA. DEVER DE INDENIZAR, POR DANOS MORAIS. CARACTERIZADO. APELAÇÕES DO AUTOR E DA UNIÃO, NÃO PROVIDAS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Cinge-se a controvérsia em apurar se a responsabilidade pelo fato do autor ter seu nome inscrito, indevidamente, em dívida ativa, deve ser atribuída à ré, gerando o dever de indenizar por danos morais. 2. De plano há que se reconhecer que o fato danoso (inscrição indevida do nome do autor em Divida Ativa) efetivamente ocorreu, conforme reconhece a própria ré tanto em sede de contestação como de contrarrazões de apelação e de apelação. Portanto, incontroverso o evento danoso e o dano. Outro fato inconteste é que a inscrição indevida foi ato da União Federal. Portanto, o ato danoso está diretamente relacionado (nexo causal) com a conduta do agente (União Federal). 3. Na espécie, inscrição indevida do nome do cidadão, em Dívida Ativa da União, que é um dos cadastros de restrição ao crédito, é a típica hipótese de dano a ser considerado in re ipsa, sendo presumida a sua ocorrência. Portanto, devidamente comprovados o dano, o evento danoso e o nexo de causalidade entre eles e a conduta do agente, ensejando o dever de indenizar, por dano. 4. Nega-se provimento às apelações do autor e da União, para manter a r. sentença, por seus próprios fundamentos. (TRF3, ApCiv 0008289-30.2011.4.03.6138, Rel. Desa. Federal DIVA MALERBI, 6ª Turma, j. 08/08/2019) DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA E INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDEVIDA INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO E INSCRIÇÃO DO NOME DA AUTORA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. PROTESTO DE DÍVIDA INEXISTENTE. EXTINÇÃO DE CDA. RECONHECIMENTO PARCIAL DOS PEDIDOS AUTORAIS PELA UNIÃO. DANO MORAL IN RE IPSA. APELAÇÃO IMPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 01. A controvérsia trazida à baila, nesta via recursal, diz respeito, unicamente, à aferição da ocorrência, ou não, de dano moral, decorrente da inscrição, em Dívida Ativa da União, de crédito tributário, oriundo de suspeita de fraude, que culminou com a negativação do nome da parte autora, além da cobrança e protesto de título. 02. Antes de se adentrar na questão de fundo trazida à lume, cumpre mencionar que a União Federal reconheceu a suspeita de fraude na DIRPF da autora, no ano calendário 2007, motivo pelo qual procedeu ao cancelamento da respectiva Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física, bem como à extinção da CDA nº 80.1.11.031876-41, conforme decisão exarada pela autoridade fiscal, no bojo do processo administrativo nº 10875.720873/2014-20. 03. O presente caso apresenta nítidos contornos de responsabilidade civil objetiva do Estado, nos termos do art. 37, § 6º da CF/88, encampada pela teoria do risco administrativo, ora adotada pelo ordenamento jurídico pátrio. 04. Depreende-se do conjunto de provas amealhadas aos autos que a inscrição indevida de débitos tributários em Dívida Ativa, em prejuízo do requerente, perdurou por, aproximadamente, 05 (cinco) anos, e a negativação do nome da apelada permaneceu por cerca de um ano e quatro meses, de forma indevida. 05. Tal situação enseja a configuração do dano moral in re ipsa, ante a inscrição em Dívida Ativa da União, o protesto e negativação indevida do nome da autora, os quais a privaram, injustificadamente, de seus recursos financeiros por vários anos, não havendo que se falar em falta de demonstração do dano moral. Precedentes: STJ/ REsp 1820537/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/09/2019, DJe 11/10/2019; TRF3 AC 00059135520164039999, JUIZ CONVOCADO LEONEL FERREIRA, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/04/2016. 06. Considerando as circunstâncias fáticas em análise, em especial o protesto de dívida inexistente, no valor de R$ 6.000,00, a condição social da vítima e do ofensor, o tempo de inscrição em Dívida Ativa da União (aproximadamente cinco anos) e o período no qual restou negativado, indevidamente, o nome da autora (aproximadamente um ano e quatro meses), deve ser mantido o valor indenizatório fixado na origem, condizente com a situação narrada nos autos. 07. Sentença mantida na sua integralidade. Honorários advocatícios majorados em um ponto percentual a incidir sobre o percentual fixado na origem, consoante o disposto no art. 85, § 11 do CPC/15. 08. Apelação improvida. (TRF3, ApCiv 0001137-12.2016.4.03.6119, Rel. Des. Federal NERY DA COSTA JUNIOR, 3ª Turma, j. 06/09/2022) Demonstrada a conduta da União e o nexo causal entre esta e o dano sofrido pelo autor, resta configurada, também, a sua responsabilidade civil objetiva. Registro que o fato de o ente federal não ser responsável pela constituição indevida da empresa em nome do autor ou pelo uso indevido de seu CPF não afasta tal responsabilidade, uma vez que, como se sabe, o ato estatal apto a ensejar a ocorrência de dano indenizável nem sempre será um ato ilícito. Além de o art. 37, § 6º, da CRFB não fazer tal distinção, a experiência demonstra que atos legitimamente praticados por agente público podem, também, ocasionar danos passíveis de indenização. Nesse sentido, a lição da Profa. Maria Sylvia Zanella Di Pietro[2]: Segundo alguns doutrinadores, o Estado só responde objetivamente se o dano decorrer de ato antijurídico, o que deve ser entendido em seus devidos termos. Ato antijurídico não pode ser entendido, para esse fim, como ato ilícito, pois é evidente que a licitude ou ilicitude do ato é irrelevante para fins de responsabilidade objetiva; caso contrário, danos decorrentes de obra pública, por exemplo, ainda que licitamente realizada, não seriam indenizados pelo Estado. Somente se pode aceitar como pressuposto da responsabilidade objetiva a prática de ato antijurídico se este, mesmo sendo lícito, for entendido como ato causador de dano anormal e específico a determinadas pessoas, rompendo o princípio da igualdade de todos perante os encargos sociais. Por outras palavras, ato antijurídico, para fins de responsabilidade objetiva do Estado, é o ato ilícito e o ato lícito que cause dano anormal e específico. [grifei] Portanto, advindo da conduta do agente público, ainda que estritamente legal, dano anormal – que supera os inconvenientes normais da vida em sociedade decorrentes da atuação estatal – e específico – que atinge apenas um ou alguns administrados –, aquele(s) que o sofreu(sofreram) faz(em) jus à indenização. É esse o caso dos autos, em que a atuação da RFB baseada em ato eivado de fraude levou à responsabilização do autor por ao menos dezoito débitos inscritos em dívida ativa, a figurar no polo passivo de execuções fiscais e ter seu CPF irregular (ID 286008738). No que se refere ao arbitramento do valor a título de indenização por danos morais, é firme a orientação jurisprudencial no sentido de que, nesses casos, deve ser determinada segundo o critério da razoabilidade e do não enriquecimento despropositado, nos seguintes moldes, in verbis: "A indenização por dano moral deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido, devendo o arbitramento operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte empresarial das partes, às suas atividades comerciais e, ainda, ao valor do negócio. Há de orientar-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida, notadamente à situação econômica atual e às peculiaridades de cada caso". (STJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, in RT 776/195). Considerando as circunstâncias específicas do caso concreto, tais como o número de empresas registradas indevidamente em nome do autor (sete) e de débitos inscritos e executados em seu desfavor (dezoito), bem como o lapso temporal entre o seu conhecimento acerca da primeira empresa constituída de forma fraudulenta (2001 – ID 286008631) e o ajuizamento da ação (em 2018), o que evidencia a inobservância do dever de mitigar o próprio prejuízo pela vítima[3], tenho que o valor indenizatório de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada ré (totalizando R$ 20.000,00) se afigura razoável e suficiente à compensação do dano moral sofrido, sem importar em punição excessiva às rés ou no indevido enriquecimento do autor. Quanto ao termo inicial dos encargos financeiros, é cediço que, nas hipóteses de indenização por dano moral, a correção monetária deve incidir a partir da data do arbitramento do valor indenizatório, nos termos da Súmula 362 do STJ. Os juros de mora, por sua vez, fluem a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ) que, no caso, para a JUCESP, deve ser a data de inclusão do autor no quadro societário da empresa Marinho & Ferreira Comércio e Serviços LTDA, em 15/05/2008 (ID 286008734). Não considero, para tal fim, as empresas anteriormente registradas em fraude por não terem sido demonstrados nos autos danos efetivamente oriundos daqueles registros – as inscrições na RFB se referem apenas à pessoa jurídica supra citada. As certidões de registro de distribuição de feitos estaduais de ID 286008882 e ID 286008883, embora indiquem que o autor consta como réu em diversas ações de execução fiscal, não permitem verificar quais dessas ações de fato se relacionam com as empresas abertas indevidamente em seu nome. Com relação à União, deve ser considerada a data da primeira inclusão do autor como corresponsável pelos débitos inscritos em dívida ativa, o que deverá ser verificado em sede de cumprimento de sentença. Os índices aplicáveis a título de juros de mora e correção monetária deverão observar o Manual de Orientação dos Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, nos termos da Resolução CJF 784/2022 ou outra que a substituir ou alterar. Ante o exposto: Com o provimento do recurso, ficam apenas as rés responsáveis pelas custas processuais, na forma da lei, e pelo pagamento de honorários advocatícios que fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 3º, I, do CPC. O percentual devido pela União fica acrescido de 1% (um por cento), em razão do não provimento da apelação, à luz do § 11 do art. 85 da lei processual. É como voto. [1] Direito administrativo / Maria Sylvia Zanella Di Pietro. – 32. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 834-835. [2] Direito administrativo / Maria Sylvia Zanella Di Pietro. – 32. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 824-828. [3] “(...) Assim, aplica-se magistério de doutrina de vanguarda e a jurisprudência que têm reconhecido como decorrência da boa-fé objetiva o princípio do Duty to mitigate the loss, um dever de mitigar o próprio dano, segundo o qual a parte que invoca violações a um dever legal ou contratual deve proceder a medidas possíveis e razoáveis para limitar seu prejuízo. É consectário direto dos deveres conexos à boa-fé o encargo de que a parte a quem a perda aproveita não se mantenha inerte diante da possibilidade de agravamento desnecessário do próprio dano, na esperança de se ressarcir posteriormente com uma ação indenizatória, comportamento esse que afronta, a toda evidência, os deveres de cooperação e de eticidade. 5. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp n. 1.325.862/PR, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, 4ª Turma, j. 05/09/2013 DJe 10/12/2013)
APELADO: JEFFERSON MARQUES
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. CANCELAMENTO DE CPF COM ATRIBUIÇÃO DE NOVO NÚMERO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA POR TERCEIROS. FRAUDE DEMONSTRADA. CONSTITUIÇÃO DE EMPRESAS NÃO RECONHECIDAS PELO CONTRIBUINTE. POSSIBILIDADE DE CANCELAMENTO, DE OFÍCIO, POR DECISÃO JUDICIAL. IN RFB N. 2172/2024. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. OMISSÃO ILÍCITA DA JUCESP NA ANÁLISE DE DOCUMENTOS APRESENTADOS A REGISTRO. INSCRIÇÃO INDEVIDA DE DÉBITOS EM DÍVIDA ATIVA E AJUIZAMENTO DE EXECUÇÕES FISCAIS PELA UNIÃO. DANO MORAL CONFIGURADO. ARBITRAMENTO. CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DO NÃO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. ENCARGOS FINANCEIROS. TERMO INICIAL. SÚMULAS 362 E 54 DO STJ. MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. RECURSO ADESIVO CONHECIDO E PROVIDO.
1. Controvérsia acerca do direito do autor ao cancelamento de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) da Receita Federal do Brasil em razão do uso indevido por terceiros, bem como da ocorrência e extensão dos danos morais decorrentes de conduta estatal.
2. A Instrução Normativa RFB n. 2172/2024 prevê expressamente três possibilidades de cancelamento de ofício, pela autoridade fazendária, da inscrição do contribuinte no CPF: a) a atribuição de mais de um número de inscrição para uma mesma pessoa física; b) por decisão administrativa; ou c) por decisão judicial. O fato de a decisão judicial constar de forma autônoma, sem qualquer condição ou fundamento vinculado pela norma, indica que esta admite o cancelamento por razões outras que não as expressamente ali constantes, desde que devidamente comprovadas em juízo. Precedentes da Quarta Turma.
3. Estando suficientemente comprovado o uso indevido do número de CPF do autor mediante fraude, é devido o cancelamento da inscrição com atribuição de novo número.
4. Nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal de 1988, “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
5. Na hipótese de responsabilidade por ato omissivo, por sua vez, deixa de incidir a regra do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, fazendo-se necessário apurar a existência de omissão danosa e ilícita dos agentes do Estado a caracterizar a culpa do serviço público.
6. No caso, presente a responsabilidade, na modalidade subjetiva, por parte da JUCESP, que não demonstrou ter observado o dever de verificar a autenticidade dos documentos apresentados para arquivamento na autarquia, nos termos da Lei n. 8.934/1994, arts. 37, V, 39, II, 40 e 63, parágrafo único, resultando no registro de ao menos sete empresas com o uso de documento falso contendo os dados do demandante.
7. Quanto à União, verifica-se da resposta de ofício encaminhado à Receita Federal que o autor figura como corresponsável em 18 inscrições de dívida ativa já ajuizadas relativas à empresa em cujo quadro societário ele foi incluído de forma fraudulenta. Portanto, tratam-se de inscrições em dívida ativa indevidas, o que caracteriza dano moral in re ipsa. Precedentes desta Corte.
8. No que se refere ao arbitramento do valor a título de indenização por danos morais, é firme a orientação jurisprudencial no sentido de que, nesses casos, deve ser determinada segundo o critério da razoabilidade e do não enriquecimento despropositado.
9. Considerando as circunstâncias específicas do caso concreto, como o número de empresas registradas indevidamente em nome do autor e de débitos inscritos e executados em seu desfavor, bem como o lapso temporal entre o seu conhecimento acerca da primeira empresa constituída de forma fraudulenta (2001) e o ajuizamento da ação (2018), o que evidencia a inobservância do dever de mitigar o próprio prejuízo pela vítima, tenho que o valor indenizatório de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada ré se afigura razoável e suficiente à compensação do dano moral sofrido, sem importar em punição excessiva às rés ou no indevido enriquecimento do autor.
10. Quanto ao temo inicial dos encargos financeiros, nas hipóteses de indenização por dano moral, a correção monetária deve incidir a partir da data do arbitramento do valor indenizatório, nos termos da Súmula 362 do STJ. Os juros de mora, por sua vez, fluem a partir do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ.
11. Os índices aplicáveis a título de juros de mora e correção monetária deverão observar o Manual de Orientação dos Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, nos termos da Resolução CJF 784/2022 ou outra que a substituir ou alterar.
12. Apelação conhecida e não provida. Recurso adesivo conhecido e provido.