Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5018526-35.2023.4.03.6100

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: AMBEV S.A.

Advogados do(a) APELANTE: DANIEL MONTEIRO PEIXOTO - SP238434-A, MARCELO PAULO FORTES DE CERQUEIRA - SP144994-A

APELADO: DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5018526-35.2023.4.03.6100

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: AMBEV S.A.

Advogados do(a) APELANTE: DANIEL MONTEIRO PEIXOTO - SP238434-A, MARCELO PAULO FORTES DE CERQUEIRA - SP144994-A

APELADO: DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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R E L A T Ó R I O

 

 

 

Cuida-se de embargos de declaração opostos por AMBEV S.A. contra o v. acórdão assim ementado:

 

CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CIDE. REMESSA DE ROYALTIES AO EXTERIOR. LEI 10.168/2000. CONSTITUCIONALIDADE. ACORDOS MULTILATERAIS. AUSÊNCIA DE OFENSA AO ART. 98 DO CTN. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. A Lei nº 10.168/2000, cumprindo o escopo constitucional inserto no artigo 149 da CF/88, instituiu a CIDE destinada a estimular o desenvolvimento tecnológico brasileiro, mediante o financiamento do Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação, sendo que a Lei nº 10.332/2001, de 19/12/2001, alterou aquela para ampliar o âmbito de incidência da CIDE foi ampliado, de modo a abranger as pessoas jurídicas que remeterem royalties, a qualquer título, para o exterior.

2. Segundo o STJ, a CIDE produz intervenção no domínio econômico ao onerar a importação da tecnologia estrangeira, com a finalidade de "fazer com que a tecnologia (nas várias vertentes: licença, conhecimento/comercialização, transferência) seja adquirida no mercado nacional e não no exterior, evitando-se as remessas de remuneração ou royalties" (REsp 1642249/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, j. 15/08/2017).

3. Há muito fixou o STF compreensão no sentido de que é “dispensável a edição de lei complementar para a instituição das Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (Cide).

4. Quanto à alegada necessidade de referibilidade da CIDE em questão, o STF já decidiu que a ausência de correlação direta entre as atividades do sujeito passivo e a atividade estatal específica a qual se destina a respectiva contribuição não impede sua cobrança.

5. Em que pese a redação original da Lei 10.168/2000 ter instituído como fato gerador a remessa de valores ao exterior em contraprestação pela licença de uso ou aquisição de conhecimentos tecnológicos e em virtude de contratos de transferência de tecnologia (art. 2º, caput, e § 3º), é sabido que a Lei 10.332/2001 incluiu as remessas ao exterior realizadas em decorrência de contratos que tenham por objeto a prestação de serviços técnicos e de assistência administrativa a serem prestados por residentes ou domiciliados no estrangeiro, bem assim os royalties remetidos ao exterior (art. 2º, §§ 2º e 3º).

6.Acerca da alegada violação a acordos multilaterais, tais como GATT, GATS e TRIPS, dos quais é signatário o Brasil, sobreleva destacar que estes não preponderam sobre o disposto no art. 149, § 3º, II da CF. Ademais, tal exação não tem como objetivo discriminar produtos e serviços de origem estrangeira, mas sim estimular o desenvolvimento tecnológico brasileiro.  Outrossim, não há que falar em inconstitucionalidade em razão do tratamento tributário diferenciado entre as operações nacionais e internacionais. Afinal, decorre do próprio texto constitucional a regra que impõe a incidência de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico na importação de produtos estrangeiros ou serviços.

7. Recurso de apelação desprovido.

 

Em suas razões de recorrer (ID 290335333), a parte embargante afirma que o acórdão é omisso em relação aos seguintes argumentos:

 

 

Pretende, por fim, o prequestionamento expresso dos seguintes dispositivos: “artigos 4º, IV, 5º, caput e § 2º, 145, §1º 146, III, 149, 150, incisos I, II e III, 153, III, 154, I, 165, §9º, 167, IV, 170, 173, 174, 212, 213, 218 e 219 da CF/88 e artigo 36 do ADCT. Também se vê necessidade de integração quanto ao artigos 1º, 2º e 4º da Lei nº 10.168/2000, art. 2º, §1º, da Lei nº 10.332/2001, art. 10 do Decreto nº 4.195/2002, artigo 74 da Lei nº 9.430/96, bem como aos artigos 96, 97, 98, 165 e 168 do CTN e disposições do Decreto n° 1.355/94”.

 

Com contrarrazões da União (ID 290570615), os autos vieram-me conclusos.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


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OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Os embargos declaratórios somente são cabíveis para a modificação do julgado que se apresenta omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar eventual erro material no acórdão.

 

Sem razão à embargante.

 

Com efeito, inconformada com o resultado do julgado busca a recorrente, com a oposição destes embargos declaratórios, ver reexaminada e decidida a controvérsia de acordo com sua tese.

 

Todavia, impossível converter os embargos declaratórios em recurso com efeitos infringentes sem a demonstração das hipóteses descritas na lei processual.

 

Analisando o v. acórdão embargado inexiste qualquer vício a ser sanado, o tema levantado foi integralmente abordado em seu inteiro teor, com as fundamentações ali esposadas.

 

A propósito, o acórdão atacado foi claro e suficientemente fundamentado ao afastar as alegações relacionadas à ausência de ação interventiva e referibilidade; à necessidade de lei complementar para instituição da exação, à ilegalidade das alterações legislativas posteriores, alargaram indevidamente a base de cálculo e acresceram hipóteses de incidência de forma ilegal e inconstitucional e ofensa ao GATS. Confira-se (destaquei):

 

“(...) Com efeito, as contribuições sociais de intervenção no domínio econômico têm previsão no artigo 149, da Constituição Federal, que atribui competência exclusiva à União para sua instituição.

A Lei nº 10.168/2000, cumprindo o escopo constitucional inserto no artigo 149 da CF/88, instituiu a CIDE destinada a estimular o desenvolvimento tecnológico brasileiro, mediante o financiamento do Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação, sendo que a Lei nº 10.332/2001, de 19/12/2001, alterou aquela para ampliar o âmbito de incidência da CIDE foi ampliado, de modo a abranger as pessoas jurídicas que remeterem royalties, a qualquer título, para o exterior, senão vejamos (destaquei): (...)

Segundo o STJ, a CIDE produz intervenção no domínio econômico ao onerar a importação da tecnologia estrangeira, com a finalidade de "fazer com que a tecnologia (nas várias vertentes: licença, conhecimento/comercialização, transferência) seja adquirida no mercado nacional e não no exterior, evitando-se as remessas de remuneração ou royalties" (REsp 1642249/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, j. 15/08/2017).

A teor do art. 4º da Lei 10.168/2000, a contribuição em debate será recolhida ao Tesouro Nacional e destinada ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT. Trata-se de fundo criado pelo Decreto-Lei 719/1969 que, muito embora não tenha sido ratificado pelo Congresso Nacional na forma do art. 36 do ADCT, foi restabelecido pela Lei 8.172/1991. Não se identifica inconstitucionalidade em seu restabelecimento, pois o art. 165, § 9º, II, da Constituição Federal exige a edição de lei complementar para estabelecer as condições para a instituição e funcionamento de fundos (e não, portanto, especificamente para sua criação).

Desta forma, a ausência de ratificação pelo Congresso Nacional não resultou na inconstitucionalidade suscitada.

Registre que há muito fixou o STF compreensão no sentido de que é “dispensável a edição de lei complementar para a instituição das Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). Precedentes” (RE 1100485 AgR, Relator(a): NUNES MARQUES, Segunda Turma, julgado em 10/11/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-237  DIVULG 22-11-2022  PUBLIC 23-11-2022). Neste mesmo sentido: (...)

Quanto à alegada necessidade de referibilidade aventada pela apelante, o STF já decidiu que a ausência de correlação direta entre as atividades do sujeito passivo e a atividade estatal específica a qual se destina a respectiva contribuição não impede sua cobrança. Confira-se: (...)

Em que pese a redação original da Lei 10.168/2000 ter instituído como fato gerador a remessa de valores ao exterior em contraprestação pela licença de uso ou aquisição de conhecimentos tecnológicos e em virtude de contratos de transferência de tecnologia (art. 2º, caput, e § 3º), é sabido que a Lei 10.332/2001 incluiu as remessas ao exterior realizadas em decorrência de contratos que tenham por objeto a prestação de serviços técnicos e de assistência administrativa a serem prestados por residentes ou domiciliados no estrangeiro, bem assim os royalties remetidos ao exterior (art. 2º, §§ 2º e 3º).

Tal ampliação é legítima, pois coaduna-se com a finalidade da contribuição que, como referido acima, visa a desestimular a contratação com o exterior de tecnologia nas suas mais variadas formas e independentemente de haver ou não, de fato, a transferência. Por certo, cabe abarcar também os serviços técnicos e de assistência administrativa e o uso, fruição e exploração de direitos que dão ensejo à remessa de royalties a fim de incentivar o mercado interno e a produção científica e tecnológica brasileira.

Nessa esteira, é a sólida orientação jurisprudencial desta Turma Julgadora, senão vejamos: (...)

Outrossim, não há que falar em inconstitucionalidade em razão do tratamento tributário diferenciado entre as operações nacionais e internacionais. Afinal, decorre do próprio texto constitucional a regra que impõe a incidência de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico na importação de produtos estrangeiros ou serviços (art. 149, §2º, inc. II, da Constituição Federal).

Ademais, descabida a alegação de quebra de isonomia vez que, ao impor a exação apenas para os contratos de compra de tecnologia do exterior, a Lei revela seu caráter extrafiscal, buscando estimular que as indústrias brasileiras busquem tecnologias nacionais. Nesse sentido, pretende-se incentivar a atividade empresarial tecnológica brasileira.

E mais, todos os contribuintes em situação análoga, que realizam a importação de serviços, estão submetidos à mesma regra de incidência tributária.

Noutro giro, dispõe o art. 98 do CTN que “os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha”.

Acerca da alegada violação a acordos multilaterais, tais como GATT, GATS e TRIPS, dos quais é signatário o Brasil, sobreleva destacar que estes não preponderam sobre o disposto no art. 149, § 3º, II da CF. Ademais, tal exação não tem como objetivo discriminar produtos e serviços de origem estrangeira, mas sim estimular o desenvolvimento tecnológico brasileiro.

Outrossim, decorre do próprio texto constitucional a regra que impõe a incidência de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico na importação de produtos estrangeiros ou serviços (art. 149, §2º, inc. II, da Constituição Federal).

É sabido que o Princípio do Tratamento Nacional, previsto no art XVII do GATS, consiste em oferecer tratamento igual tanto para os prestadores de serviços nacionais como para os estrangeiros.

Dispõe o art. 17.2 do aludido acordo que “um Membro poderá satisfazer o disposto no parágrafo 1 outorgando aos serviços e prestadores de serviços dos demais Membros um tratamento formalmente idêntico ou formalmente diferente do que dispense a seus próprios serviços similares e prestadores de serviços similares”.

Logo, como bem destacado na sentença, “há permissivo para a elaboração de tratamento formalmente diferente, sem que isso importe descumprimento do disposto no art. 17.1 da norma em comento”.

Sendo assim, descabida a alegação de quebra de isonomia ou de ofensa às normas do GATS. Com efeito, ao impor a exação apenas para os contratos de compra de tecnologia do exterior, a Lei revela seu caráter extrafiscal, buscando estimular que as indústrias brasileiras busquem tecnologias nacionais. Nesse sentido, pretende-se incentivar a atividade empresarial tecnológica brasileira, o que, além de tudo, é uma das características da intervenção no domínio brasileiro”.

 

 

Conquanto tenha sido aplicado entendimento diverso ao pretendido pela parte embargante na solução do litígio, não é o magistrado obrigado a refutar, um a um, todos os argumentos por ele trazidos, bastando que enfrente a demanda observando as questões relevantes e imprescindíveis à sua resolução, o que de fato ocorreu.

 

Ademais, a Lei nº 13.105/2015 admite o prequestionamento ficto, nos termos do seu artigo 1.025, considerando-se incluídos no acórdão os dispositivos suscitados pelo embargante.

 

Ante o exposto, rejeito os presentes embargos de declaração.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CIDE. LEI 10.168/2000. AUSÊNCIA DE VÍCIOS. INCONFORMISMO. PREQUESTIONAMENTO. VIA INADEQUADA. EMBARGOS REJEITADOS.

1. O cabimento dos embargos de declaração restringe-se às hipóteses em que o acórdão apresente obscuridade, contradição ou omissão.

2. Imprópria a via dos embargos declaratórios para o fim de rediscutir o mérito.

3. O acórdão atacado foi claro acerca da legalidade da cobrança da CIDE-remessas, tendo rebatido, de modo fundamentado, todas as alegações da parte impetrante.

4. O Código de Processo Civil vigente admite o prequestionamento ficto, nos termos do seu artigo 1.025.

5. Embargos de declaração rejeitados.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
NERY JÚNIOR
DESEMBARGADOR FEDERAL