APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004104-55.2005.4.03.6106
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
APELANTE: EVANDRO CESAR CASALI
Advogado do(a) APELANTE: CELSO SPITZCOVSKY - SP87104-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004104-55.2005.4.03.6106 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: EVANDRO CESAR CASALI Advogado do(a) APELANTE: CELSO SPITZCOVSKY - SP87104-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: jcc R E L A T Ó R I O Apelação interposta por EVANDRO CESAR CASALI (Id. 101953431 - fls. 76/94) contra sentença que, em sede de ação de rito ordinário, julgou improcedente o pedido e o condenou ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (Id. 101953431 - fls. 52/56). Alega, em síntese, que: a) a Resolução nº 01/2002 do Conselho Federal de Psicologia, em seu artigo 3°, estabelece a necessidade de os editais discriminarem de forma objetiva os critérios que serão utilizados para a avaliação psicológica; b) é descabida a realização de exame psicotécnico de forma subjetiva (STF, Súm. nº 686, DL nº 2.320/87, art. 6º, c e f); c) o edital não esclareceu quais os testes a serem aplicados e nem qual o perfil profissiográfico para o cargo; d) o edital deve mencionar as técnicas psicológicas que serão aplicadas; e) a realização do teste psicotécnico não se presta a averiguar a adequação do candidato ao perfil profissiográfico; f) o perfil profissiográfico deve ser previsto em lei; g) não foram respeitados o contraditório e a ampla defesa; h) não foram identificados os julgados do recurso administrativo apresentado, sendo necessária a participação de um profissional de psicologia (Res. CPF nº 02/2003, art. 18); i) a decisão que analisou o recurso administrativo é nula, pois proferida em data anterior à sua apresentação. Contrarrazões apresentadas no Id. 101953431 (fls. 124/131), nas quais a União requer seja desprovido o recurso. Parecer ministerial juntado aos autos no Id. 101953431 (fls. 150/155), no qual opina seja desprovido o apelo. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004104-55.2005.4.03.6106 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: EVANDRO CESAR CASALI Advogado do(a) APELANTE: CELSO SPITZCOVSKY - SP87104-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: jcc V O T O Apelação interposta por EVANDRO CESAR CASALI (Id. 101953431 - fls. 76/94) contra sentença que, em sede de ação de rito ordinário, julgou improcedente o pedido e o condenou ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (Id. 101953431 - fls. 52/56). De acordo com o ordenamento jurídico pátrio, é cabível o controle judicial em sede de concurso público, o qual deve ser restrito à verificação da legalidade do ato, uma vez que não lhe é dado substituir-se à banca examinadora, seja na formulação de questões, seja no estabelecimento dos critérios de correção. Inicialmente, ressalta-se que a exigência do exame psicotécnico em concurso público, inclusive com caráter eliminatório, é autorizada pela Constituição Federal, que, em seu artigo 37, incisos I e II, preceitua que: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) Já o artigo 39, § 3º, da Carta política prevê a possibilidade de a lei estabelecer requisitos diferenciados no exame de admissão dos servidores públicos, quando a natureza do cargo o exigir, verbis: Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas. (Vide ADI nº 2.135) Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Vide ADI nº 2.135) § 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) O Supremo Tribunal Federal ao julgar, em sede de repercussão geral, a Questão de Ordem no AI 758.533, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, reafirmou a jurisprudência para fixar a tese de que “a exigência do exame psicotécnico em concurso depende de previsão em lei e no edital, e deve seguir critérios objetivos”, verbis: “Questão de ordem. Agravo de Instrumento. Conversão em recurso extraordinário (CPC, art. 544, §§ 3° e 4°). 2. Exame psicotécnico. Previsão em lei em sentido material. Indispensabilidade. Critérios objetivos. Obrigatoriedade. 3. Jurisprudência pacificada na Corte. Repercussão Geral. Aplicabilidade. 4. Questão de ordem acolhida para reconhecer a repercussão geral, reafirmar a jurisprudência do Tribunal, negar provimento ao recurso e autorizar a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão geral.” Verifica- se que foram estabelecidos dois requisitos: previsão em lei e no edital e objetividade dos critérios de avaliação. Referido entendimento constou do enunciado da Súmula Vinculante nº 44, resultado da conversão da Súmula nº 686, de seguinte teor: STF. Súmula vinculante 44: Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público. No caso de ingresso em concurso público para provimento de cargos na Academia de Polícia Federal, o Decreto-Lei nº 2.320/87 estabelece: Art. 6°. As instruções reguladoras dos processos seletivos serão publicadas por meio de Edital, que deverá conter: c) as condições de sanidade física e psíquica; ... f) as técnicas psicológicas aplicáveis; Art. 8º São requisitos para a matrícula em curso de formação profissional, apurados em processo seletivo, promovido pela Academia Nacional de Polícia: I - ter procedimento irrepreensível e idoneidade moral inatacável, avaliados segundo normas baixadas pela Direção-Geral do Departamento de Polícia Federal; II - gozar de boa saúde física e psíquica, comprovada em inspeção médica; III - possuir temperamento adequado ao exercício das atividades inerentes à categoria funcional a que concorrer, apurado em exame psicotécnico; De outro lado, o edital nº 24/2004, para ingresso nos cargos de delegado de polícia federal, perito criminal federal, agente de polícia federal e de escrivão de polícia federal previu (Id. 101953481- fls. 31/65): 1.3.1 A primeira etapa do concurso público destina-se à admissão à matrícula no Curso de Formação Profissional e será executada pelo Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (CESPE) da Universidade de Brasília (UnB), em todas as capitais das unidades da Federação e nas seguintes cidades: Santarém/PA, Imperatriz/MA, Juazeiro do Norte/CE, Ilhéus/BA, Uberlândia/MG, Bauru/SP, Campinas/SP, Londrina/PR e Santa Maria/RS, e abrangerá as seguintes fases: a) exame de habilidades e conhecimentos aferidos por meio de aplicação de provas objetivas e de prova discursiva, de caráter eliminatório e classificatório; b) avaliação psicológica, de caráter unicamente eliminatório; c) prova de capacidade fisica, de caráter unicamente eliminatório; d) exames médicos, de caráter unicamente eliminatório; e) prova prática de digitação, de caráter eliminatório, somente para o cargo de Escrivão de Policia Federal. 1.3.2 A segunda etapa do concurso público consistirá de Curso de Formação Profissional, de caráter eliminatório e classificatório, e de responsabilidade da Academia Nacional de Polícia, a ser realizado na Academia Nacional de Polícia, em Brasilia/DF. Relativamente à avaliação psicológica, previu: 6 DA AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA 6.1 A avaliação psicológica terá caráter eliminatório e será realizada na data provável de 5 de dezembro de 2004. 6.2 Na avaliação psicológica, o candidato será considerado recomendado ou não -recomendado. 6.3 A avaliação psicológica consistirá na aplicação e na avaliação de técnicas psicológicas, visando analisar a adequação do candidato ao perfil profissiográfico do cargo, identificando a capacidade de concentração e atenção, raciocínio, controle emocional, capacidade de memória e características de personalidade prejudiciais e restritivas ao cargo. 6.4 O candidato considerado não-recomendado na avaliação psicológica será eliminado do concurso. 6.5 Demais informações a respeito da avaliação psicológica constarão de edital especifico de convocação. para essa fase. Já o artigo 3º da Resolução nº 01/2002, do Conselho Federal de Psicologia, dispõe: Art. 3º - O Edital deverá conter informações, em linguagem compreensível ao leigo, sobre a avaliação psicológica a ser realizada e os critérios de avaliação, relacionando-os aos aspectos psicológicos considerados compatíveis com o desempenho esperado para o cargo. Vê-se que a exigência de exame psicotécnico para ingresso nos cargos da Academia de Polícia Federal tem previsão legal e editalícia. De outro lado, o edital estabeleceu que, na avaliação psicológica, deverão ser aplicadas técnicas psicológicas para analisar a adequação do candidato ao perfil profissiográfico do cargo, identificando a capacidade de concentração e atenção, raciocínio, controle emocional, capacidade de memória e características de personalidade prejudiciais e restritivas ao cargo . In casu, foi juntada cópia do exame psicológico (Id. 101950179 fls. 142/146), na qual não é possível aferir quais os critérios utilizados para verificação do preenchimento ou não dos requisitos exigidos, quais sejam: estabilidade emocional, conscienciosidade, dominação, altruísmo, introversão, relacionamento interpessoal, liderança criativa, independência, autenticidade, agressividade, inibição, raciocínio analítico dedutivo, abstrato, espacial e verbal, memória virtual e atenção difusa. Após a aplicação do teste, o apelante foi considerado não recomendado por não ter sido aprovado nos exames de raciocínio e rapidez de movimento (Id. 101950180 - fls. 103/110). Em conclusão, ausentes critérios objetivos de avaliação psicológica, deve ser anulado o teste aplicado com a consequente realização de novo exame psicológico. Reconhecida a ilegalidade da prova psicológica, resta prejudicada a análise das alegações de nulidade da decisão que indeferiu o recurso administrativo e de ilegalidade do perfil profissiográfico. Quanto aos honorários advocatícios, verifico que se trata de ação em que foi vencida a União, razão pela qual sua fixação poderá ser feita conforme apreciação equitativa, sem a obrigatoriedade de adoção, como base para o cômputo, do valor da causa ou da condenação, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n.º 1.155.125/MG, representativo da controvérsia (REsp 1155125/MG - Primeira Seção - rel. Min. CASTRO MEIRA, j. 10.03.2010, v.u., DJe 06.04.2010). Dessa forma, considerados o valor atribuído à demanda (R$ 1.000,00), o trabalho realizado, a natureza da causa, bem como a regra do tempus regit actum, aplicável ao caso concreto, e o disposto no artigo 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil de 1973, condeno a União ao pagamento da verba honorária fixada em R$ 200,00 (duzentos reais), devidamente atualizada. Ante o exposto, voto para dar provimento à apelação para reformar a sentença e julgar procedente o pedido para decretar a nulidade da avaliação psicológica do autor e determinar a realização de novo teste, bem como condenar a União ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos anteriormente explicitados.
E M E N T A
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. CONCURSO PÚBLICO PARA DELEGADO DA POLÍCIA FEDERAL. AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA. AUSÊNCIA DE CRITÉRIOS OBJETIVOS. RECURSO PROVIDO.
- De acordo com o ordenamento jurídico pátrio, é cabível o controle judicial em sede de concurso público, o qual deve ser restrito à verificação da legalidade do ato, uma vez que não lhe é dado substituir-se à banca examinadora, seja na formulação de questões, seja no estabelecimento dos critérios de correção.
- O Supremo Tribunal Federal ao julgar, em sede de repercussão geral, a Questão de Ordem no AI 758.533, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, reafirmou a jurisprudência para fixar a tese de que “a exigência do exame psicotécnico em concurso depende de previsão em lei e no edital, e deve seguir critérios objetivos”.
- A exigência do exame psicotécnico em concurso público, inclusive com caráter eliminatório, é autorizada pela Constituição Federal, em seus artigos 37, incisos I e II, e 39 e nos artigos 6º e 8º do Decreto-Lei nº 2.320/87. De outro lado, o edital nº 24/2004, para ingresso nos cargos de delegado de polícia federal, perito criminal federal, agente de polícia federal e de escrivão de polícia federal previu em seu item 6 a exigência de exame psicotécnico para ingresso nos cargos da Academia de Polícia Federal tem previsão legal e editalícia. Estabeleceu também que, na avaliação psicológica, deverão ser aplicadas técnicas psicológicas para analisar a adequação do candidato ao perfil profissiográfico do cargo, identificando a capacidade de concentração e atenção, raciocínio, controle emocional, capacidade de memória e características de personalidade prejudiciais e restritivas ao cargo. In casu, foi juntada cópia do exame psicológico, na qual não é possível aferir quais os critérios utilizados para verificação do preenchimento ou não dos requisitos exigidos, quais sejam: estabilidade emocional, conscienciosidade, dominação, altruísmo, introversão, relacionamento interpessoal, liderança criativa, independência, autenticidade, agressividade, inibição, raciocínio analítico dedutivo, abstrato, espacial e verbal, memória virtual e atenção difusa. Após a aplicação do teste, o apelante foi considerado não recomendado por não ter sido aprovado nos exames de raciocínio e rapidez de movimento. Em conclusão, ausentes critérios objetivos de avaliação psicológica, deve ser anulado o teste aplicado com a consequente realização de novo exame psicológico.
- Quanto aos honorários advocatícios, verifico que se trata de ação em que foi vencida a União, razão pela qual sua fixação poderá ser feita conforme apreciação equitativa, sem a obrigatoriedade de adoção, como base para o cômputo, do valor da causa ou da condenação, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n.º 1.155.125/MG, representativo da controvérsia (REsp 1155125/MG - Primeira Seção - rel. Min. CASTRO MEIRA, j. 10.03.2010, v.u., DJe 06.04.2010). Dessa forma, considerados o valor atribuído à demanda (R$ 1.000,00), o trabalho realizado, a natureza da causa, bem como a regra do tempus regit actum, aplicável ao caso concreto, e o disposto no artigo 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil de 1973, condeno a União ao pagamento da verba honorária fixada em R$ 200,00 (duzentos reais), devidamente atualizada.
- Apelação provida.