Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5008879-80.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., GOOGLE INC, GOOGLE IRELAND LIMITED

Advogados do(a) IMPETRANTE: ARTUR ROVERE SOARES - SP468539, CARINA QUITO - SP183646-A, HELENA COSTA ROSSI - SP429900, MIRIAM SINGER ROZENBLUM BEN MEIR - SP485557

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 7ª VARA FEDERAL CRIMINAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5008879-80.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., GOOGLE INC, GOOGLE IRELAND LIMITED

Advogados do(a) IMPETRANTE: ARTUR ROVERE SOARES - SP468539, CARINA QUITO - SP183646-A, HELENA COSTA ROSSI - SP429900, MIRIAM SINGER ROZENBLUM BEN MEIR - SP485557

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 7ª VARA FEDERAL CRIMINAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

Trata-se de Embargos de Declaração opostos pela defesa de GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., GOOGLE INC e GOOGLE IRELAND LIMITED em face do v. acórdão abaixo ementado, proferido por esta 11ª Turma, que, por unanimidade, decidiu DENEGAR a Segurança.

 

PROCESSO PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL. CABIMENTO. QUEBRA DE SIGILO TELEMÁTICO. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. EMPRESA SITUADA NO PAÍS, SUBMISSÃO À LEGISLAÇÃO NACIONAL. MARCO CIVIL DA INTERNET. INCIDÊNCIA. DENEGADA A SEGURANÇA. PREJUDICADO AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO CONTRA INDEFERIMENTO DE LIMINAR.

- Em se tratando de empresa multinacional com subsidiária estabelecida no Brasil, não se há de falar em utilização de mecanismos de cooperação jurídica internacional para a obtenção das referidas informações, uma vez que, embora se trate de empresa sediada no exterior, sua filial brasileira é pessoa jurídica de direito interno e, portanto, deve se submeter à legislação vigente no Brasil, notadamente a partir do novo Marco Civil da Internet (Lei n.° 12.965/2014).

- Em tendo a autoridade judicial requisitado informações relacionadas à apuração de crime(s) praticado(s) em território nacional, deve a filial brasileira da empresa GOOGLE prestá-las, ainda que com a colaboração de sua controladora sediada no exterior, sem que, para tanto, seja necessário acionar os meios diplomáticos. Em outras palavras, independentemente de os dados estarem ou não armazenados em outro país, em se tratando de empresa instituída e em atuação no Brasil, o fornecimento de dados requisitados pela autoridade judicial criminal prescinde de acordo de cooperação internacional.

- A interpretação dos artigos 10 e 11 supramencionados é tema controverso na doutrina e na jurisprudência. Há quem reconheça como legítima a alegação da parte impetrante no sentido de que, em estando os dados armazenados em servidores no exterior, estes devem ser requisitados por meio de acordo de cooperação internacional, cujo trâmite, diga-se de passagem, se mostra, por vezes, demasiadamente custoso e demorado. Para os adeptos desse posicionamento, a vinculação do provedor estrangeiro a processos judiciais em trâmite no Brasil continua sujeita aos tratados internacionais aplicáveis (inteligência do parágrafo único do art. 3° da Lei n.° 12.955/2014), uma vez que o Marco Civil da Internet não teria instituído responsabilidade solidária ou subsidiária entre o provedor estrangeiro (empresa controladora) e sua subsidiária (empresa controlada) sediada no Brasil.

- Entendimento adotado no sentido de que a interpretação mais adequada dos referidos artigos do Marco Civil da Internet é no sentido de que, em hipóteses como a dos autos, em que uma pessoa jurídica (GOOGLE), além de ofertar serviço ao público brasileiro (embora sediada no exterior), possui ao menos “um braço” de seu grupo econômico sediado no Brasil, torna-se de rigor sua submissão às leis brasileiras, as quais estabelecem obediência à ordem judicial de quebra de sigilo e fornecimento de comunicações privadas. Assim, apenas se haveria de falar em uso de tratados de cooperação internacional subsidiariamente, nas hipóteses em que, eventualmente, as disposições dos artigos 10 e 11 da Lei n.° 12.955/2014 não se apliquem.

- Em suma, em se tratando de empresa multinacional com representação no Brasil, esta tem a obrigação legal de promover os mecanismos necessários ao atendimento da ordem de quebra de sigilo telemático determinada judicialmente, sob pena, inclusive, de incidir, isolada ou cumulativamente, nas sanções previstas no art. 12 da Lei n.° 12.955/2014.

- O STF, na Ação Declaratória de Constitucionalidade n.° 51/DF (ADC 51), ajuizada pela Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação – ASSESPRO NACIONAL, decidiu, em 23.02.2023, que as empresas de tecnologia que operam aplicações de internet no Brasil devem cumprir determinações judiciais de fornecimento de dados para elucidação de investigações criminais, ainda que parte desses dados esteja armazenado em servidores localizados no exterior.

- Não se invalidou os acordos diplomáticos (cooperação judicial), porém, para a apuração de crimes os juízes pátrios podem determinar a requisição de dados diretamente às empresas de tecnologia, nos termos do artigo 11 do Marco Civil da Internet.

- Portanto, as empresas de internet que oferecem serviços no Brasil devem estar submetidas à jurisdição nacional, independentemente do local de seus data centers.

- Denegada a ordem. Prejudicado o Agravo Regimental.

 

Os embargantes alegam a ocorrência dos vícios de omissão e de obscuridade do v. acórdão. Apontam omissão quanto à aplicação dos artigos 13 do Decreto-Lei nº 4.657/1942 e 11, § 1º, da Lei Federal nº 12.965/14, à luz da premissa de que as atividades na conta do usuário haxxxon.km.xxa@gmail.com ocorrem integral ou preponderantemente fora do território nacional, bem como sustentam a existência de obscuridade ao julgar questão distinta daquela trazida no mandamus, pois não se questiona que a Google esteja sob jurisdição brasileira ou que deva obedecer à legislação nacional.

Sustentam, ainda, que a situação discutida nestes autos, em relação à lei aplicável à execução da quebra de sigilo da conta haxxxon.km.xxa@gmail.com, é substancialmente diferente daquela relativa aos demais alvos da ordem.

Prequestionam toda matéria para fins de interposição de recursos às instâncias superiores.

Requerem, assim, o provimento dos Embargos para reformar o v. acórdão para que seja concedida a Segurança (ID 285740709).

As contrarrazões foram apresentadas, pugnando pelo não conhecimento dos embargos de declaração opostos e, caso conhecidos, pelo seu total desprovimento (ID 288082155).

É o relatório.

Em mesa.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5008879-80.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., GOOGLE INC, GOOGLE IRELAND LIMITED

Advogados do(a) IMPETRANTE: ARTUR ROVERE SOARES - SP468539, CARINA QUITO - SP183646-A, HELENA COSTA ROSSI - SP429900, MIRIAM SINGER ROZENBLUM BEN MEIR - SP485557

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 7ª VARA FEDERAL CRIMINAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

 

 

As hipóteses de cabimento do recurso de Embargos de Declaração estão elencadas no artigo 619 do Código de Processo Penal, quais sejam, a existência de ambiguidade, de obscuridade, de contradição ou de omissão. De regra, não se admite a oposição de embargos declaratórios com o objetivo de modificar o julgado, exceto para sanar algum dos vícios anteriormente mencionados. Não serve o expediente, portanto, para alterar o que foi decidido pelo órgão judicial em razão de simples inconformismo acerca de como o tema foi apreciado (o que doutrina e jurisprudência nominam como efeito infringente dos aclaratórios). Nesse sentido é o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça e deste E. Tribunal:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE NO ACÓRDÃO. INOCORRÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. MERA IRRESIGNAÇÃO DO EMBARGANTE. ANÁLISE DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. PREQUESTIONAMENTO. INVIABILIDADE. EMBARGOS REJEITADOS. 1. Os embargos de declaração são cabíveis quando houver ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão, nos termos do art. 619 do Código de Processo Penal. 2. Não se prestam, portanto, para revisão do julgado no caso de mero inconformismo da parte. (...) 4. Impende registrar que o julgador não é obrigado a manifestar-se sobre todas as teses expostas no recurso, ainda que para fins de prequestionamento, desde que demonstre os fundamentos e os motivos que justificaram suas razões de decidir. Assim, tendo a matéria recebido o devido e suficiente tratamento jurídico, não cabe a esta Corte construir teses com base em dispositivos da Carta Magna a pedido da parte, mesmo que a finalidade seja prequestionar a matéria. 5. Não há, assim, que se falar em omissão, contradição e obscuridade no acórdão embargado. 6. Embargos de declaração rejeitados.

(EDcl no AgRg no HC 401.360/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 14.11.2017, DJe 24.11.2017).

                                             

PENAL E PROCESSO PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 619 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. AUSÊNCIA DE VÍCIO A SER SANADO. NOTAS TAQUIGRÁFICAS. VOTAÇÃO UNÂNIME. AUSÊNCIA DE APONTAMENTO PELA EMBARGANTE DE DESCONFORMIDADE ENTRE O ACÓRDÃO E O PRONUNCIAMENTO ORAL DOS DESEMBARGADORES. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS REJEITADO.

- Sem que sejam adequadamente demonstrados quaisquer dos vícios elencados no artigo 619 do Código de Processo Penal, não devem ser acolhidos os Embargos de Declaração, que não se prestam a veicular simples inconformismo com o julgamento, nem têm, em regra, efeito infringente.

- Pretende a embargante a rediscussão da matéria, o que não se admite em sede de embargos declaratórios. Foram expostos todos os fundamentos que embasaram o v. acórdão, não sendo necessário que o julgador responda todas as questões e teses deduzidas em juízo.

- Ausência de apontamento pela embargante de desconformidade entre o v. acórdão e o pronunciamento oral dos componentes da Turma, que foi lavrado nos termos do voto do Relator, resultando na denegação da ordem por votação unânime sem qualquer divergência.

- Embargos de Declaração rejeitados.

(TRF 3ª Região, 11ª Turma, MSCrim - MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL - 5001740-77.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal FAUSTO MARTIN DE SANCTIS, julgado em 06/10/2023, Intimação via sistema DATA: 11/10/2023).

                                       

Ademais, cumpre salientar que o Código de Processo Penal não faz exigências quanto ao estilo de expressão nem impõe que o julgador se prolongue eternamente na discussão de cada uma das linhas de argumentação tecidas pelas partes, mas apenas que sejam fundamentadamente apreciadas todas as questões controversas passíveis de conhecimento pelo julgador naquela sede processual - em outras palavras, a concisão e a precisão são qualidades, e não defeitos, do provimento jurisdicional exarado. A propósito, o C. Superior Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de assentar:

 

Esta Egrégia Corte não responde a questionário e não é obrigada a examinar todas as normas legais citadas e todos os argumentos utilizados pelas partes e sim somente aqueles que julgar pertinentes para lastrear sua decisão (EDRESP nº 92.0027261, 1ª Turma, rel. Min. Garcia Vieira, DJ 22.03.93, p. 4515).

 

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AFRONTA AO ART. 619 DO CPP. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. INEXISTÊNCIA. REDISCUSSÃO DO MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. VIOLAÇÃO AO ART. 386, IV E V, DO CPP. ABSOLVIÇÃO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. VEDAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. De acordo com o entendimento jurisprudencial remansoso neste Superior Tribunal de Justiça, os julgadores não estão obrigados a responder todas as questões e teses deduzidas em juízo, sendo suficiente que exponham os fundamentos que embasam a decisão. Incidência do enunciado 83 da Súmula deste STJ. (...)

(AgRg no AREsp 462735/MG 2014/0013029-6, T6 - SEXTA TURMA, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Julgamento: 18.11.2014, DJe: 04.12.2014).

 

Ressalte-se, outrossim, que, mesmo tendo os aclaratórios finalidade de prequestionar a matéria decidida objetivando a apresentação de recursos excepcionais, imperioso que haja no julgado recorrido qualquer um dos vícios constantes do artigo 619 anteriormente mencionado - sobre o tema, vide os julgados que seguem:

 

PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. AUSÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE. PREQUETIONAMENTO PARA FINS DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INVIABILIDADE. (...) 3. Os embargos declaratórios opostos com o objetivo de prequestionamento, para fins de interposição de recurso extraordinário, não podem ser acolhidos se ausente omissão, contradição ou obscuridade no julgado embargado. (...)

(STJ, EDcl na APn .675/GO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 19.09.2012, DJe 01.02.2013).

 

EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OMISSÕES. AUSÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. INVIABILIDADE. (...) II - Esta c. Corte já tem entendimento pacífico de que os embargos declaratórios, mesmo para fins de prequestionamento, só serão admissíveis se a decisão embargada ostentar algum dos vícios que ensejariam o seu manejo (omissão, obscuridade ou contradição). Embargos declaratórios rejeitados.

(STJ, EDcl no AgRg no REsp 723962/DF, Relator Min. FELIX FISCHER, Quinta Turma, v. u., DJ 02.10.2006, p. 300).

 

In casu, os presentes Embargos de Declaração não merecem acolhida.

Verifica-se que os embargantes pretendem, por meio deste recurso, adentrar ao mérito do julgado e rediscuti-lo por insatisfação com o deslinde jurisdicional, ao que não se presta esta via aclaratória, uma vez que a matéria foi devidamente analisada no v. acordão recorrido:

 

DO CASO CONCRETO

(...)

DESNECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DO PROCEDIMENTO ESTABELECIDO EM COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL

A parte impetrante alegou, em síntese, que in casu o fornecimento de conteúdo de comunicações de usuários depende da observância de cooperação jurídica internacional.

Não se ignora a existência de entendimento jurisprudencial e doutrinário no sentido de que a solicitação de acesso a conteúdo de comunicações travadas com empresas tais como a GOOGLE dever se dar, necessariamente, por meio do procedimento previsto em cooperação jurídica internacional, independentemente de tais comunicações terem sido travadas por brasileiros (e/ou no Brasil), dado que a responsabilidade pela armazenagem e administração de tais registros seria da sede da empresa no exterior. Todavia, compartilho do entendimento de que, em se tratando de empresa multinacional com subsidiária estabelecida no Brasil, não se há de falar em utilização de mecanismos de cooperação jurídica internacional para a obtenção das referidas informações, uma vez que, embora se trate de empresa sediada no exterior, sua filial brasileira é pessoa jurídica de direito interno e, portanto, deve se submeter à legislação vigente no Brasil, notadamente a partir do novo Marco Civil da Internet (Lei n.° 12.965/2014).

Desse modo, em tendo a autoridade judicial requisitado informações relacionadas à apuração de crime(s) praticado(s) em território nacional, deve a filial brasileira da empresa GOOGLE prestá-las, ainda que com a colaboração de sua controladora sediada no exterior, sem que, para tanto, seja necessário acionar os meios diplomáticos. Em outras palavras, independentemente de os dados estarem ou não armazenados em outro país, em se tratando de empresa instituída e em atuação no Brasil, o fornecimento de dados requisitados pela autoridade judicial criminal prescinde de acordo de cooperação internacional.

A Lei n.° 12.955/2014, denominada Marco Civil da Internet (MCI) trata do tema nos artigos 10 ao 12:

Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet de que trata esta Lei, bem como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes direta ou indiretamente envolvidas.

§ 1º O provedor responsável pela guarda somente será obrigado a disponibilizar os registros mencionados no caput, de forma autônoma ou associados a dados pessoais ou a outras informações que possam contribuir para a identificação do usuário ou do terminal, mediante ordem judicial, na forma do disposto na Seção IV deste Capítulo, respeitado o disposto no art. 7º.

§ 2º O conteúdo das comunicações privadas somente poderá ser disponibilizado mediante ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer, respeitado o disposto nos incisos II e III do art. 7º.

§ 3º O disposto no caput não impede o acesso aos dados cadastrais que informem qualificação pessoal, filiação e endereço, na forma da lei, pelas autoridades administrativas que detenham competência legal para a sua requisição.

§ 4º As medidas e os procedimentos de segurança e de sigilo devem ser informados pelo responsável pela provisão de serviços de forma clara e atender a padrões definidos em regulamento, respeitado seu direito de confidencialidade quanto a segredos empresariais.

 

Art. 11. Em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet em que pelo menos um desses atos ocorra em território nacional, deverão ser obrigatoriamente respeitados a legislação brasileira e os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros.

§ 1º O disposto no caput aplica-se aos dados coletados em território nacional e ao conteúdo das comunicações, desde que pelo menos um dos terminais esteja localizado no Brasil.

§ 2º O disposto no caput aplica-se mesmo que as atividades sejam realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior, desde que oferte serviço ao público brasileiro ou pelo menos uma integrante do mesmo grupo econômico possua estabelecimento no Brasil.

§ 3º Os provedores de conexão e de aplicações de internet deverão prestar, na forma da regulamentação, informações que permitam a verificação quanto ao cumprimento da legislação brasileira referente à coleta, à guarda, ao armazenamento ou ao tratamento de dados, bem como quanto ao respeito à privacidade e ao sigilo de comunicações.

§ 4º Decreto regulamentará o procedimento para apuração de infrações ao disposto neste artigo.

 

Art. 12. Sem prejuízo das demais sanções cíveis, criminais ou administrativas, as infrações às normas previstas nos arts. 10 e 11 ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções, aplicadas de forma isolada ou cumulativa:

I - advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas;

II - multa de até 10% (dez por cento) do faturamento do grupo econômico no Brasil no seu último exercício, excluídos os tributos, considerados a condição econômica do infrator e o princípio da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção;

III - suspensão temporária das atividades que envolvam os atos previstos no art. 11; ou

IV - proibição de exercício das atividades que envolvam os atos previstos no art. 11.

Parágrafo único. Tratando-se de empresa estrangeira, responde solidariamente pelo pagamento da multa de que trata o caput sua filial, sucursal, escritório ou estabelecimento situado no País.

 

É certo que a interpretação dos artigos 10 e 11 supramencionados é tema controverso na doutrina e na jurisprudência. Há quem reconheça como legítima a alegação da parte impetrante no sentido de que, em estando os dados armazenados em servidores no exterior, estes devem ser requisitados por meio de acordo de cooperação internacional, cujo trâmite, diga-se de passagem, se mostra, por vezes, demasiadamente custoso e demorado. Para os adeptos desse posicionamento, a vinculação do provedor estrangeiro a processos judiciais em trâmite no Brasil continua sujeita aos tratados internacionais aplicáveis (inteligência do parágrafo único do art. 3° da Lei n.° 12.955/2014), uma vez que o Marco Civil da Internet não teria instituído responsabilidade solidária ou subsidiária entre o provedor estrangeiro (empresa controladora) e sua subsidiária (empresa controlada) sediada no Brasil.

Todavia, filio-me ao entendimento de que a interpretação mais adequada dos referidos artigos do Marco Civil da Internet é no sentido de que, em hipóteses como a dos autos, em que uma pessoa jurídica (GOOGLE), além de ofertar serviço ao público brasileiro (embora sediada no exterior), possui ao menos “um braço” de seu grupo econômico sediado no Brasil, torna-se de rigor sua submissão às leis brasileiras, as quais estabelecem obediência à ordem judicial de quebra de sigilo e fornecimento de comunicações privadas. Assim, apenas se haveria de falar em uso de tratados de cooperação internacional subsidiariamente, nas hipóteses em que, eventualmente, as disposições dos artigos 10 e 11 da Lei n.° 12.955/2014 não se apliquem.

Em suma, em se tratando de empresa multinacional com representação no Brasil, esta tem a obrigação legal de promover os mecanismos necessários ao atendimento da ordem de quebra de sigilo telemático determinada judicialmente, sob pena, inclusive, de incidir, isolada ou cumulativamente, nas sanções previstas no art. 12 da Lei n.° 12.955/2014.

Válida, nesse passo, a menção aos seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça:

 

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. INQUÉRITO POLICIAL. QUEBRA DE SIGILO TELEMÁTICO. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. ALEGAÇÕES DE AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA DELITIVA E DE VIOLAÇÃO A DIREITO DE TERCEIRO. NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO DE MULTA DIÁRIA. EMPRESA SITUADA NO PAÍS. SUBMISSÃO À LEGISLAÇÃO NACIONAL. MARCO CIVIL DA INTERNET. INCIDÊNCIA.

1. Consta dos autos ter sido instaurado o Inquérito Policial nº 58728-34.2012.4.01.3400 com o objetivo de investigar a prática dos crimes tipificados no art. 10 da Lei nº 9.296/1996 (Lei de interceptação) e art. 153, § 1º-A, do Código Penal - CP. Situação em A YAHOO! DO BRASIL INTERNET LTDA alega que o acórdão impugnado efetuou interpretação equivocada do art. 10, § 1º, do Marco Civil da Internet e que ela tem o direito líquido e certo de não ser obrigada a fornecer dados pelos quais não é responsável pela guarda.

2. É incabível, em sede de mandado de segurança - que na sua essência visa preservar direito líquido e certo - discutir indícios de autoria delitiva, matéria afeta ao Juízo criminal, que, ademais, demanda a análise dos elementos de prova colhidos na investigação. Precedentes. Para a impetração do mandamus é imprescindível que a prova do direito seja pré-constituída, sendo inviável imiscuir-se em matéria fática, mormente no caso concreto, em que a investigação não recai sobre a impetrante, mas sobre terceiros. A propósito, esta Corte Superior já se manifestou no sentido de que a destinatária da interceptação de dados não pode invocar direitos fundamentais de terceiros para eximir-se se cumprir a decisão judicial. Precedente.

3. Conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça "por estar instituída e em atuação no País, a pessoa jurídica multinacional submete-se, necessariamente, às leis brasileiras, motivo pelo qual se afigura desnecessária a cooperação internacional para a obtenção dos dados requisitados pelo juízo" (RMS 55.109/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 17/11/2017).

 4. Observe-se, ainda, que não há qualquer ilegalidade no fato de o delito investigado ser anterior à vigência do Marco Civil da Internet. Isto porque a Lei n.º 12.965/2014 diz respeito tão somente à imposição de astreintes aos descumpridores de decisão judicial, sendo inequívoco nos autos que a decisão judicial que determinou a quebra de sigilo telemático permanece hígida. Com efeito, a data dos fatos delituosos é relevante para se aferir apenas a incidência da norma penal incriminadora, haja vista o princípio da anterioridade penal, sendo certo que o inquérito policial investiga condutas que se encontram tipificadas no art. 10 da Lei nº 9.296/1996 (Lei de interceptação) e art. 153, § 1º-A, do Código Penal - CP e não na Lei n. 12.965/2014.

5. Recurso ordinário em mandado de segurança ao qual se nega provimento.

(STJ, QUINTA TURMA, ROMS - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA - 55019 2017.02.01343-2, REL. JOEL ILAN PACIORNIK, DJE DE 01.02.2018)

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO CAVALO DE FOGO. TRÁFICO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO, TRANSNACIONALIDADE. 1. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. MATÉRIA NÃO EXAMINADA PELA CORTE DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. 2. NEGATIVA DE AUTORIA. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. EXAME APROFUNDADO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. NECESSIDADE. MATÉRIA INCABÍVEL NA VIA ELEITA. 3. ATOS PROCESSUAIS. DILIGÊNCIAS NO EXTERIOR. CARTA ROGATÓRIA. FACULTADO MEIOS MAIS CÉLERES. CONVENÇÕES E TRATADOS. 4. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA E TELEMÁTICA. PIN-TO-PIN E BBM. DADOS FORNECIDOS POR EMPRESA PRIVADA DO CANADÁ. SUBMISSÃO À CARTA ROGATÓRIA OU AO MLAT. DESNECESSIDADE. 5. COOPERAÇÃO DIRETA INTERNACIONAL. POSSIBILIDADE. EFETIVO CUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL. 6. SERVIÇOS TELEFÔNICOS E TELEMÁTICOS ATIVOS NO PAÍS. COMUNICAÇÕES PERPETRADAS NO TERRITÓRIO NACIONAL. OPERADORAS DE TELEFONIA LOCAIS. ATUAÇÃO DA EMPRESA CANADENSE NO BRASIL. OCORRÊNCIA. LOCAL DE ARMAZENAMENTO. IRRELEVÂNCIA. 7. MEDIDA CONSTRITIVA. DECISÃO JUDICIAL. TERCEIROS NÃO ELENCADOS. INVIABILIDADE. SERENDIPIDADE. POSSIBILIDADE. NULIDADE DA INTERCEPTAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. 8. RECURSO DESPROVIDO.

(...)

4. A implementação da medida constritiva judicial de interceptação dos dados vinculados aos serviços PIN-TO-PIN e BBM (BlackBerryMessage) não se submete, necessariamente, aos institutos da carta rogatória e do MLAT (Mutual Legal Assistance Treaty).

 5. No franco exercício da cooperação direta internacional e em prol de uma maior celeridade ao trâmite processual, inexiste pecha no fornecimento do material constrito por empresa canadense (RIM - Research In Motion), mediante ofício expedido pelo juízo e encaminhado diretamente ao ente empresarial, para o devido cumprimento da decisão constritiva.

 6. Os serviços telefônicos e telemáticos encontravam-se ativos no Brasil, no qual foram perpetradas as comunicações, por intermédio das operadoras de telefonia estabelecidas no território nacional, evidenciando-se a efetiva atuação da empresa canadense em solo brasileiro, independentemente do local de armazenamento do conteúdo das mensagens realizadas por usuários brasileiros.

7. É certo que a decisão judicial de quebra de sigilo telefônico e telemático não comporta todos os nomes das possíveis pessoas que possam contactar o indivíduo constrito em seu aparelho de telefonia, sendo que, acaso obtido algum indício de novos fatos delitivos ou mesmo da participação de terceiros na prática de ilícitos, em encontro fortuito (serendipidade), não há falar em nulidade da interceptação, pois ainda que não guardem relação com os fatos criminosos e/ou constritos primevos, o material logrado deve ser considerado, possibilitando inclusive a abertura de uma nova investigação.

8. Recurso a que se nega provimento.

(STJ, SEXTA TURMA, RHC - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS - 57763 2015.00.58354-0, Rel. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE DE 15.10.2015)

 

Por fim, o STF, na Ação Declaratória de Constitucionalidade n.° 51/DF (ADC 51), ajuizada pela Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação – ASSESPRO NACIONAL, decidiu, em 23.02.2023, que as empresas de tecnologia que operam aplicações de internet no Brasil devem cumprir determinações judiciais de fornecimento de dados para elucidação de investigações criminais, ainda que parte desses dados esteja armazenado em servidores localizados no exterior.

Não se invalidou os acordos diplomáticos (cooperação judicial), porém, para a apuração de crimes os juízes pátrios podem determinar a requisição de dados diretamente às empresas de tecnologia, nos termos do artigo 11 do Marco Civil da Internet.

Colaciono a ementa do julgado:

 

“AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. NORMAS DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL. OBTENÇÃO DE DADOS. EMPRESAS LOCALIZADAS NO EXTERIOR. DECRETO Nº 3.810/2001; ART. 237, II DO CPC; ARTS. 780 E 783 DO CPP; ART. 11 DO MARCO CIVIL DA INTERNET; ART. 18 DA CONVENÇÃO DE BUDAPESTE. CONSTITUCIONALIDADE. ADC CONHECIDA. PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE.

1. A controvérsia constitucional veiculada na ADC é, a rigor, mais ampla do que a simples declaração de validade do uso das cartas rogatórias e dos acordos MLAT para fins de investigação criminal. O escopo da ação declaratória compreende não apenas o exame de constitucionalidade dos dispositivos invocados pelos requerentes, como também da norma prevista no art. 11 do Marco Civil da Internet e art. 18 da Convenção de Budapeste.

2. O art. 11 do Marco Civil da Internet, que encontra respaldo no art. 18 da Convenção de Budapeste, é norma específica em relação às regras gerais do MLAT. O referido dispositivo assegura a aplicação da legislação brasileira em relação a atividades de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, dados e comunicações eletrônicas ocorridas em território nacional, desde que pelo menos um dos atos ou terminais se encontrem em território nacional, mesmo que a pessoa jurídica portadora dessas informações esteja localizada ou armazene tais informações no exterior.

3. As hipóteses de requisição direta previstas no art. 11 do Marco Civil da Internet e no art. 18 da Convenção de Budapeste reafirmam os princípios da soberania e da independência nacional, concretizando o dever do Estado de proteger os direitos fundamentais e a segurança pública dos cidadãos brasileiros ou residentes no país.

4. Constitucionalidade dos dispositivos do MLAT, do CPC e do CPP que tratam da cooperação jurídica internacional e da emissão de cartas rogatórias, nos casos em que a atividade de comunicação ou a prestação de tais serviços não tenham ocorrido em território nacional.

5. Dispositivos que convivem com a possibilidade de solicitação direta de dados, registros e comunicações eletrônicas nas hipóteses do art. 11 do Marco Civil da Internet e do art. 18 da Convenção de Budapeste.

6. Pedido julgado parcialmente procedente para declarar a constitucionalidade dos dispositivos indicados e da possibilidade de solicitação direta de dados e comunicações eletrônicas das autoridades nacionais a empresas de tecnologia nos casos de atividades de coleta e tratamento de dados no país, de posse ou controle dos dados por empresa com representação no Brasil e de crimes cometidos por indivíduos localizados em território nacional.”

(STF ADC 51, Relator Ministro Gilmar Mendes, Plenário, DJE 28.04.2023)

 

Portanto, as empresas de internet que oferecem serviços no Brasil devem estar submetidas à jurisdição nacional, independentemente do local de seus data centers.

Como se vê, como bem pontuado pela decisão liminar, embora sediada no exterior a empresa GOOGLE oferta serviços ao público brasileiro, ostentando “um braço” do seu grupo econômico aqui no Brasil, razão pela qual deve se submeter à legislação brasileira, independentemente do local de seus data centers.

Ademais, como bem constou das informações prestadas, o decisum subjacente pontuou que a conta de email sob questão foi criada por cidadão brasileiro e era utilizada a partir do território nacional para tratar de assuntos relativos a eventuais delitos cuja persecução compete à Justiça brasileira (ID274703734).

Ressalte-se, mais uma vez, que o STF, na ADC n.º 51, decidiu, em 23.02.2023, que as empresas de tecnologia que operam aplicações de internet no Brasil devem cumprir determinações judiciais de fornecimento de dados para elucidação de investigações criminais, ainda que parte desses dados estejam armazenados em servidores localizados no exterior.

Portanto, não restaram invalidados os acordos diplomáticos, no entanto, para a apuração de crimes os juízes pátrios podem determinar a requisição de dados diretamente às empresas de tecnologia, nos termos do artigo 11 do Marco Civil da Internet.

(...)

 

Os embargantes alegam a ocorrência dos vícios de omissão e de obscuridade do v. acórdão. Apontam omissão quanto à aplicação dos artigos 13 do Decreto-Lei nº 4.657/1942 e 11, § 1º, da Lei Federal nº 12.965/14, à luz da premissa de que as atividades na conta do usuário haxxxon.km.xxa@gmail.com ocorrem integral ou preponderantemente fora do território nacional, bem como sustentam a existência de obscuridade ao julgar questão distinta daquela trazida no mandamus, pois não se questiona que a Google esteja sob jurisdição brasileira ou que deva obedecer à legislação nacional.

 

Entretanto, restou patente a apreciação das referidas questões no acórdão recorrido. Inclusive, como bem ressaltou o Parquet Federal, a conta supracitada “foi criada por um brasileiro e acessada também a partir do território nacional, de modo que as embargantes estariam sujeitas à legislação brasileira com relação a esta conta” (ID 288025155).

 

Salienta-se, ainda, que as embargantes não se desincumbiram do ônus de comprovar, de plano, a alegação de que o acesso à conta teria ocorrido somente no continente europeu, uma vez que a presente via não admite dilação probatória. 

 

De tal modo, não se verifica a ocorrência dos vícios apontados, na medida em que a decisão embargada se mostrou clara na sua conclusão quanto à legalidade na ordem emanada para que a Google quebre o sigilo do conteúdo de comunicações eletrônicas privadas e de outros conteúdos eletrônicos armazenados na conta haxxxon.km.xxa@gmail.com2.

 

Portanto, não se verifica a existência de ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão a ensejar pronunciamento, mas sim intenção de alteração do julgado, devendo para tanto, valer-se do recurso próprio.

 

Dessa forma, os Embargos de Declaração devem ser rejeitados.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO E OBSCURIDADE. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E REJEITADOS.

- As hipóteses de cabimento do recurso de Embargos de Declaração estão elencadas no artigo 619 do Código de Processo Penal, quais sejam, a existência de ambiguidade, de obscuridade, de contradição ou de omissão. De regra, não se admite a oposição de embargos declaratórios com o objetivo de modificar o julgado, exceto em decorrência da sanação de algum dos vícios anteriormente mencionados, não servindo, portanto, o expediente para alterar o que foi decidido pelo órgão judicial em razão de simples inconformismo acerca de como o tema foi apreciado (o que doutrina e jurisprudência nominam como efeito infringente dos aclaratórios). Entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça.

- O Código de Processo Penal não faz exigências quanto ao estilo de expressão nem impõe que o julgador se prolongue eternamente na discussão de cada uma das linhas de argumentação tecidas pelas partes, mas apenas que sejam fundamentadamente apreciadas todas as questões controversas passíveis de conhecimento pelo julgador naquela sede processual. A concisão e a precisão são qualidades, e não defeitos, do provimento jurisdicional exarado. Entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça.

- Tendo os aclaratórios finalidade de prequestionar a matéria decidida objetivando a apresentação de recursos excepcionais, imperioso que haja no julgado recorrido qualquer um dos vícios constantes do artigo 619 do CPP.

- O acórdão recorrido não padece de qualquer vício, pois todas as questões arguidas no remédio Constitucional utilizado pelo impetrante, em favor de seu paciente foram devidamente enfrentadas.

- Restou patente a apreciação de todas as questões suscitadas. Inclusive, como bem ressaltou o Parquet Federal, a conta em questão “foi criada por um brasileiro e acessada também a partir do território nacional, de modo que as embargantes estariam sujeitas à legislação brasileira com relação a esta conta”.

- As embargantes não se desincumbiram do ônus de comprovar, de plano, a alegação de que o acesso à conta teria ocorrido somente no continente europeu, uma vez que a presente via não admite dilação probatória.

- Embargos de Declaração conhecidos e rejeitados.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu REJEITAR os Embargos de Declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
FAUSTO DE SANCTIS
DESEMBARGADOR FEDERAL