APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5032274-37.2023.4.03.6100
RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: TACITO PEREIRA NOBRE
Advogados do(a) APELADO: MARIA MADALENA SANTANA PEREIRA - SP416849-A, RENATO SODERO UNGARETTI - SP154016-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5032274-37.2023.4.03.6100 RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MARISA SANTOS APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: TACITO PEREIRA NOBRE Advogados do(a) APELADO: MARIA MADALENA SANTANA PEREIRA - SP416849-A, RENATO SODERO UNGARETTI - SP154016-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Remessa necessária e apelação interposta pela UNIÃO em face a decisão que julgou procedente o pedido formulado na ação de procedimento comum cível ajuizada por TACITO PEREIRA NOBRE, em que pretende o autor o reconhecimento do direito de não sofrer o desconto do imposto de renda sobre os planos de VGBL, bem como a restituição do indébito tributário pago a tal título, corrigido monetariamente pela taxa Selic. Pedido julgado procedente pelo juízo de origem nos seguintes termos (ID 290751207): “JULGO PROCEDENTE O PEDIDO e extingo o feito com resolução do mérito nos termos do art. 487, I, do CPC para, confirmando os efeitos da tutela antecipada, declarar o direito da parte autora à isenção do Imposto de Renda sobre os planos Vida Gerador de Benefício Livre – VGBL junto ao Bradesco Vida e Previdência S.A e ao Itaú Vida e Previdência S.A. Condeno a Ré a proceder à restituição do valor indevidamente retido a título de Imposto de Renda, observado o prazo prescricional quinquenal, a contar da propositura da ação, acrescido, exclusivamente, da taxa SELIC, desde o desembolso. Custas e honorários advocatícios devidos pela União, aplicando-se sobre o valor da condenação, os percentuais mínimos previstos nas tabelas regressivas constantes dos incisos do parágrafo 3º c/c o parágrafo 5º, ambos do art. 85 do CPC”. No recurso, em síntese, sustenta a União que a isenção do art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88, não alcançaria os planos VGBL, uma vez que não se enquadrariam no conceito legal de “aposentadoria privada complementar”, caracterizando, a rigor, espécie de seguro de pessoa (ID 290751209). Com contrarrazões, os autos foram encaminhados a esta Corte (ID 290751214). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5032274-37.2023.4.03.6100 RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MARISA SANTOS APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: TACITO PEREIRA NOBRE Advogados do(a) APELADO: MARIA MADALENA SANTANA PEREIRA - SP416849-A, RENATO SODERO UNGARETTI - SP154016-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA): Remessa necessária e apelação interposta pela UNIÃO em face a decisão que julgou procedente o pedido formulado na ação de procedimento comum cível ajuizada por TACITO PEREIRA NOBRE, em que pretende o autor o reconhecimento do direito de não sofrer o desconto do Imposto de Renda sobre os planos de VGBL, bem como a restituição do indébito tributário pago a tal título, corrigido monetariamente pela Taxa Selic. De início, anoto que, a despeito de não ter a sentença sido submetida ao duplo grau obrigatório, porquanto diante de condenação ilíquida proferida em desfavor da União, de rigor o exame dos autos sob esse prisma. A remessa necessária e a apelação devem ser conhecidas e, no mérito, improvidas. Narra o apelado na inicial ter sido diagnosticado com Leucemia Mieloide Aguda (C92.0) ainda em fevereiro de 2013. Acostou aos autos atestado médico (ID 290751185). Pois bem. Decorre do art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88: "Art. 6º. Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (....) XIV - Os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma." Assim, considerando que a leucemia mieloide aguda corresponde a neoplasia maligna, deve-se reconhecer o direito ao benefício legal. Quanto à extensão da isenção, prevalece não restar limitada aos benefícios previdenciários do regime público, alcançando igualmente os valores recebidos a título de previdência complementar: TRIBUTÁRIO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ARTIGO 1.022, INCISO II, DO CPC/2015. NÃO CARACTERIZAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA. PROCESSUAL CIVIL. IMPOSTO DE RENDA DE PESSOA FÍSICA. ISENÇÃO. ALCANCE. PROVENTOS DE APOSENTADORIA COMPLEMENTAR. PORTADOR DE MOLÉSTIA GRAVE. PRECEDENTES. AGRAVO CONHECIDO PARA SE NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. (...) 3. Igualmente, segundo os precedentes exarados por essa Corte, a isenção fiscal sobredita deverá englobar o pagamento do imposto de renda relativo aos valores percebidos de fundo de previdência privada a título de complementação da aposentadoria por pessoa acometida de uma das doenças listadas na Lei 7.713/1988, uma vez que o destino tributário dos benefícios recebidos de entidade de previdência privada não pode ser diverso do destino das importâncias correspondentes ao resgate das respectivas contribuições. Logo, se há isenção para os benefícios recebidos por portadores de moléstia grave, que nada mais são que o recebimento dos valores aplicados nos planos de previdência privada de forma parcelada no tempo, a norma também alberga a isenção para os resgates das mesmas importâncias, que nada mais são que o recebimento dos valores aplicados de uma só vez. Precedentes: AgInt no REsp. n. 1.481.695 /SC, Primeira Turma, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 23.08.2018; EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp. n. 948.403/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 07.06.2018; AgInt no REsp. n. 1.554.683/PR, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 22.05.2018; AgInt no REsp. n. 1.662.097/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 28.11.2017. (STJ, AREsp n. 2.373.615/GO, r. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 17/10/2023, DJe de 19/10/2023.). No ponto, sustenta a União haver de se limitar o benefício tributário aos valores decorrente de PGBL, porquanto somente essa modalidade apresentaria natureza jurídica de previdência complementar; afastando-se os valores oriundos de plano VGBL, que teria natureza de seguro de vida. Em contrário, à luz da jurisprudência do STJ, irrelevante tratar-se de plano de previdência privada modelo PGBL ou VGBL, isto porque são apenas duas espécies do mesmo gênero (planos de caráter previdenciário) que se diferenciam em razão do fato de se pagar parte do IR antes (sobre o rendimento do contribuinte) ou depois (sobre o resgate do plano). E porque ambos os planos cumprem função previdenciária, proporcionando uma renda mensal ao beneficiário, não se justifica o tratamento diferenciado. Vale conferir: “RECURSOS DA FAZENDA NACIONAL E DO CONTRIBUINTE INTERPOSTOS NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 2. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA DA PESSOA FÍSICA. ISENÇÃO PARA PROVENTOS DE APOSENTADORIA E RESGATES. PREVIDÊNCIA PRIVADA. MOLÉSTIA GRAVE. ART. 6º, XIV, DA LEI N. 7.713/88, C/C ART. 39, §6º, DO DECRETO N. 3.000/99. IRRELEVÂNCIA DE SE TRATAR DE PLANO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA MODELO PGBL (PLANO GERADOR DE BENEFÍCIO LIVRE) OU VGBL (VIDA GERADOR DE BENEFÍCIO LIVRE). 1. O recurso especial da FAZENDA NACIONAL não merece conhecimento quanto à alegada violação ao art. 535, do CPC/1973, tendo em vista que fundado em argumentação genérica que não discrimina a relevância das teses, não as correlaciona aos artigos de lei invocados e também não explicita qual a sua relevância para o deslinde da causa em julgamento. Incidência da Súmula n. 284/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia". 2. Conhecidos os recursos da FAZENDA NACIONAL e do CONTRIBUINTE por violação à lei e pelo dissídio em torno da interpretação da isenção prevista no art. 6º, XIV, da Lei n. 7.713/88 e do art. 39, §6º, do Decreto n. 3.000/99. 3. A extensão da aplicação do art. 6º, XIV, da Lei n. 7.713/88 (isenção para proventos de aposentadoria ou reforma recebidos por portadores de moléstia grave) também para os recolhimentos ou resgates envolvendo entidades de previdência privada ocorreu com o advento do art. 39, §6º, do Decreto n. 3.000/99, que assim consignou: "§ 6º As isenções de que tratam os incisos XXXI e XXXIII também se aplicam à complementação de aposentadoria, reforma ou pensão". Precedentes: REsp 1.204.516/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 04.11.2010; AgRg no REsp 1144661 / SC, Segunda Turma, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 25.04.2011. 4. O destino tributário dos benefícios recebidos de entidade de previdência privada não pode ser diverso do destino das importâncias correspondentes ao resgate das respectivas contribuições. Desse modo, se há isenção para os benefícios recebidos por portadores de moléstia grave, que nada mais são que o recebimento dos valores aplicados nos planos de previdência privada de forma parcelada no tempo, a norma também alberga a isenção para os resgates das mesmas importâncias, que nada mais são que o recebimento dos valores aplicados de uma só vez. Precedentes: AgInt no REsp. n. 1.481.695 / SC, Primeira Turma, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 23.08.2018; EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp. n. 948.403 / SP, Segunda Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 07.06.2018; AgInt no REsp. n. 1.554.683 / PR, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 22.05.2018; AgInt no REsp. n. 1.662.097 / RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 28.11.2017. 5. Para a aplicação da jurisprudência é irrelevante tratar-se de plano de previdência privada modelo PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) ou VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre), isto porque são apenas duas espécies do mesmo gênero (planos de caráter previdenciário) que se diferenciam em razão do fato de se pagar parte do IR antes (sobre o rendimento do contribuinte) ou depois (sobre o resgate do plano). 6. O fato de se pagar parte ou totalidade do IR antes ou depois e o fato de um plano ser tecnicamente chamado de "previdência" (PGBL) e o outro de "seguro" (VGBL) são irrelevantes para a aplicação da leitura que este Superior Tribunal de Justiça faz da isenção prevista no art. 6º, XIV, da Lei n. 7.713/88 c/c art. 39, §6º, do Decreto n. 3.000/99. Isto porque ambos os planos irão gerar efeitos previdenciários, quais sejam: uma renda mensal - que poderá ser vitalícia ou por período determinado - ou um pagamento único correspondentes à sobrevida do participante/beneficiário. 7. Recurso especial da FAZENDA NACIONAL parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido e recurso especial do CONTRIBUINTE provido”. (STJ, REsp n. 1.583.638/SC, r. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, j. 3/8/2021, DJe de 10/8/2021, grifos não originais). E, porque a isenção do imposto é concedida pela própria Lei, buscando o beneficiado tão somente a declaração da inexistência da relação jurídico tributária, deve-se reconhecer o indébito desde o momento em que caracterizada a moléstia: PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. PORTADORES DE MOLÉSTIA GRAVE. ART. 6º, XIV, DA LEI 7.713/1988. TERMO INICIAL. DATA DO DIAGNÓSTICO DA DOENÇA (...) 2. Esta Corte tem o entendimento segundo o qual o termo inicial da isenção da imposto de renda sobre proventos de aposentadoria prevista no art. 6º, XIV, da Lei n. 7.713/1988 é a data de comprovação da doença mediante diagnóstico médico (AgInt no REsp 1.882.157/MG, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16.11.2020, DJe 19.11.2020). 3. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no PUIL n. 2.774/RS, r. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 30/8/2022, DJe de 1/9/2022.) Cabível, portanto, a restituição do indébito tributário, observado o quinquênio prescricional, nos exatos termos da sentença. Honorários advocatícios majorados em 1%, nos termos do art. 85, §11º, do CPC. NEGO PROVIMENTO à apelação e a remessa necessária. Honorários advocatícios majorados em 1%. É o voto.
E M E N T A
TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA. ISENÇÃO IMPOSTO DE RENDA. MOLÉSTIA GRAVE. PLANO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA MODELO PGBL (PLANO GERADOR DE BENEFÍCIO LIVRE) OU VGBL (VIDA GERADOR DE BENEFÍCIO LIVRE). IRRELEVÂNCIA. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA IMPROVIDAS.
1. Comprovado ser o autor portador de moléstia grave nos termos do artigo 6º, inciso XIV, da Lei nº 7.713/88, é de se reconhecer o direito ao benefício legal;
2. À luz da jurisprudência do STJ, irrelevante tratar-se de plano de previdência privada modelo PGBL ou VGBL, isto porque são apenas duas espécies do mesmo gênero (planos de caráter previdenciário) que se diferenciam em razão do fato de se pagar parte do IR antes (sobre o rendimento do contribuinte) ou depois (sobre o resgate do plano). E porque ambos os planos cumprem função previdenciária, proporcionando uma renda mensal ao beneficiário, não se justifica o tratamento diferenciado. Precedentes (STJ, REsp n. 1.583.638/SC, r. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, j. 3/8/2021, DJe de 10/8/2021);
3. Honorários advocatícios majorados em 1%, nos termos do art. 85, § 11º, do CPC.
4. Apelação e remessa necessária improvidas.