APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000505-69.2014.4.03.6114
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: MAURICIO AZEVEDO FRACON
Advogado do(a) APELANTE: PEDRO PASCHOAL DE SA E SARTI JUNIOR - SP271819-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000505-69.2014.4.03.6114 RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO APELANTE: MAURICIO AZEVEDO FRACON Advogado do(a) APELANTE: PEDRO PASCHOAL DE SA E SARTI JUNIOR - SP271819-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de apelação interposta por MAURICIO AZEVEDO FRAÇON em face da sentença, integrada pela decisão dos embargos de declaração, que determinou a extinção da execução de sentença, nos moldes do artigo 924, inciso II do Código de Processo Civil. A parte apelante sustenta, em síntese, que a execução deve prosseguir para a complementação de pagamento referente à incidência da taxa SELIC entre a data da inscrição do ofício requisitório até a data do pagamento, nos termos do artigo 3º da EC 113/2021. Requer o provimento do recurso, a fim de determinar o prosseguimento da execução para a complementação de pagamento nos moldes acima pleiteados. Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000505-69.2014.4.03.6114 RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO APELANTE: MAURICIO AZEVEDO FRACON Advogado do(a) APELANTE: PEDRO PASCHOAL DE SA E SARTI JUNIOR - SP271819-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora o prosseguimento da execução para a complementação de pagamento referente à incidência da taxa SELIC entre a data da inscrição do ofício requisitório e a data do pagamento, ao argumento de que seu pedido está amparado pelo art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021, o qual dispõe: "Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente." Os ofícios requisitórios expedidos na vigência da Resolução nº 458, do Conselho da Justiça Federal, submetem-se ao disposto em seu artigo 7º, caput, a respeito de atualização monetária: "Art. 7º Para a atualização monetária dos precatórios e RPVs tributários e não tributários, serão utilizados, da data-base informada pelo juízo da execução até o efetivo depósito, os índices estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvado o disposto nos arts. 50 e 55 desta resolução." Por sua vez, o artigo 38, §§1º e 3º, da Lei nº 14.436/22 (Lei de Diretrizes Orçamentárias), aplicável ao caso, estabelece: “Art. 38. (…). § 1º. A atualização dos precatórios não tributários, no período a que se refere o§ 5º do art. 100 da Constituição, será efetuada exclusivamente pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (…) § 3º Após o prazo a que se refere o §5º do art. 100 da Constituição, não havendo o adimplemento do requisitório, a atualização dos precatórios tributários e não tributários será efetuada pelo índice da taxa Selic, acumulado mensalmente, vedada a sua aplicação sobre a parcela referente à correção realizada durante o período de que trata o §5º do art. 100 da Constituição.” (grifos meus). Quanto ao cálculo do pagamento do precatório em discussão, convém anotar o que foi dito pelo contador judicial em ID 290712946: “(...) O Tribunal corrigiu o valor principal da conta homologada (R$ 235.167,60) em 06/2021 até 12/2021 através do índice IPCA-e (1,06098395960), e aplicou juros em continuação (conforme MP 567/12) sobre o valor principal também no período de 06/2021 a 11/2021 (percentual de 1,7911%), apurando o valor de R$ 253.288,70. E atualizou esse valor em 12/2021 até a data da inscrição (04/2022) pela Selic 3,19%, obtendo o valor inscrito de R$ 261.368,61. A primeira parcela referente ao teto de 180 salários-mínimos paga em 05/2023, no valor de R$ 237.600,00, foi corrigida através do índice IPCA-E (período constitucional). Valor da primeira parcela paga R$ 251.754,07. Durante o período constitucional (04/2022 a 12/2023) o Tribunal corrigiu este saldo pelo indexador IPCA-e. O saldo remanescente formou o valor da segunda parcela, que foi corrigida pelo IPCA-e de 04/2022 a 12/2023 (data do pagamento da segunda parcela). Valor da segunda parcela paga R$ 25.602,73. A parte exequente entende que o valor deve ser corrigido pela Taxa SELIC desde o início da incidência em 12/2021 até a data do efetivo pagamento, nos termos do art. 3º da EC 113/21. (...)”. Pois bem. O princípio hermenêutico da unidade da Constituição Federal - segundo o qual os dispositivos constitucionais devem ser analisados como parte de um sistema unitário de regras e princípios, e não de forma isolada -, não alberga a interpretação atribuída pela parte exequente ao art. 3º da EC nº 113/2021, porquanto violadora do art. 100, §5º, da CF, senão vejamos. A taxa SELIC é um índice composto, que serve não apenas como indexador de correção monetária, mas também de juros de mora. E, segundo entendimento consolidado do C. STF, não incidem juros de mora sobre precatórios durante o prazo de graça constitucional previsto no art. 100, §5°, da CF, razão pela qual a LDO, em estrita consonância ao exposto, não prevê a aplicação da SELIC nesse interregno. (Cf: Súmula Vinculante 17; STF. Plenário. RE 594892 AgR-ED-EDv/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 1/7/2020). Nesse mesmo sentido, tendo em vista a promulgação da EC n° 113/2021 e o supracitado entendimento do Pretório Excelso, o CNJ incluiu, dentre outros, o art. 21-A, à Resolução n° 303/2019, esclarecendo em seu §5º que a atualização dos precatórios não tributários deve observar o período a que alude o §5º do artigo 100 da Constituição Federal, em cujo lapso temporal o valor se sujeitará exclusivamente à correção monetária pelo índice previsto em seu inciso XII, qual seja o IPCA-E/IBGE. Somente não havendo adimplemento do requisitório no aludido prazo constitucional é que a atualização será pela taxa SELIC (§6º). Anote-se que o entendimento aqui adotado não afronta a decisão proferida pelo C. STF no bojo da ADI 7064/DF, cuja discussão diz respeito à possibilidade de utilização da taxa SELIC como unificador para a atualização de débitos judiciais, afastando-se, naquela oportunidade, os argumentos autorais de que o índice não representaria índice inflacionário e a fixação de seu percentual estaria sob a potestade da própria Administração Pública. Com efeito, decisões recentes exaradas pelo próprio C. STF, posteriores à mencionada ADI, confirmam a inaplicabilidade da taxa SELIC no período de graça constitucional. Nesse sentido: "RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRECATÓRIOS. PERÍODO DE GRAÇA CONSTITUCIONAL. INADMISSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS. PRECEDENTES. TAXA SELIC ENGLOBA JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TAXA SELIC NO INTERVALO PREVISTO NO ART. 100, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APARENTE COLISÃO DE NORMAS CONSTITUCIONAIS. UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO E CONCORDÂNCIA PRÁTICA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO. 1. Durante o período de que trata o § 5º do art. 100 da Constituição Federal, não incidem juros de mora, somente com o inadimplemento do ente público devedor, ou seja, após o período de graça, é possível a fluência dos juros moratórios (Súmula Vinculante 17/STF e RE 1.169.289/SC, tema 1.037 da repercussão geral). 2. O art. 3º da EC 113/2021, cuja constitucionalidade já foi reconhecida por esta Suprema Corte (ADI’s 7.047/DF e 7.064/DF), estabelece que, a partir de sua entrada em vigor, em todas as condenações que envolvam a Fazenda Pública, para fins de atualização monetária, juros moratórios e juros compensatórios, inclusive do precatório, deve ser aplicada, uma única vez, até o efetivo pagamento, a taxa SELIC. 3. A taxa SELIC engloba juros e correção monetária, de modo que não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem (ADC’s 58/DF e 59/DF e ADI’s 5.867/DF e 6.021/DF). 4. A adequada compatibilização entre as normas constitucionais deve manter a efetividade dessas normas, sendo certo que admitir a incidência da taxa SELIC no período de graça de expedição de precatório acarretaria o esvaziamento completo da parte final do § 5º do art. 100 do texto constitucional, em nítida transgressão ao princípio da unidade da Constituição. 5. Necessidade de promover, portanto, com base na concordância prática, ajuste hermenêutico em relação ao art. 3º da EC 113/2021, de modo a, mantendo sua eficácia, reduzir, minimamente, seu âmbito de incidência. Assim, a partir da entrada em vigor da EC 113/2021, apenas no período a que se refere o art. 100, § 5º, da Constituição Federal, a taxa SELIC não deve incidir (art. 3º da EC 113/2021), preservando-se, em tal período, a imunidade aos juros e mantendo-se exclusivamente a correção monetária. 6. O IPCA-E deve continuar sendo utilizado para correção monetária dos precatórios, exclusivamente, no período de graça constitucional, nos termos do decidido por esta Corte nas ADI’s 4.357-QO/DF e 4.425-QO/DF. 7. Recurso extraordinário não provido." (STF, RE 1.475.938/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 07.05.2024, DJe 15.05.2024) Assim, resta afastada a alegação de irregularidade quanto à atualização monetária entre a data da expedição e o depósito das requisições de pagamento, ante a inaplicabilidade da taxa SELIC aos créditos não tributários durante o período de graça constitucional (art. 100, § 5º, da CF), independentemente do índice previsto no título executivo, conforme a regulamentação dos procedimentos relativos à expedição de ofícios requisitórios e precatórios estabelecida pelo Conselho da Justiça Federal e pelo Conselho Nacional de Justiça. Nesse contexto, a r. sentença recorrida deve ser mantida nos moldes em que proferida. Diante do exposto, nego provimento à apelação. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EXTINÇÃO. INCIDÊNCIA DA SELIC ENTRE A DATA DA EXPEDIÇÃO DO REQUISITÓRIO E O EFETIVO PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. ADIMPLEMENTO NO PRAZO DO ART. 100, §5°, DA CF. PERÍODO CORRIGIDO PELO IPCA-E. RESOLUÇÃO 458/2017 CJF. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Os procedimentos concernentes à expedição de ofícios requisitórios, pagamentos e levantamentos são regulados, no caso concreto, pela Resolução nº 458/2017, do Conselho da Justiça Federal, a qual determina que na atualização monetária dos precatórios e RPVs tributários e não tributários, serão utilizados, da data-base informada pelo juízo da execução até o efetivo depósito, os índices estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias.
2. Por sua vez, o artigo 38, §§1º e 3º, da Lei nº 14.436/22 (Lei de Diretrizes Orçamentárias), aplicável ao caso, estabelece que a atualização dos precatórios não tributários, no período a que se refere o§ 5º do art. 100 da Constituição, será efetuada exclusivamente pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E
3. A taxa SELIC é um índice composto, que serve não apenas como indexador de correção monetária, mas também de juros de mora. E, segundo entendimento consolidado do C. STF, não incidem juros de mora sobre precatórios durante o prazo de graça constitucional previsto no art. 100, §5°, da CF, razão pela qual a LDO, em estrita consonância ao exposto, não prevê a aplicação da SELIC nesse interregno. No mesmo sentido dispõe o art. 21-A, §5º, da Resolução n° 303/2019 do CNJ.
4. Resta afastada a alegação de irregularidade quanto à atualização monetária entre a data da expedição e o depósito das requisições de pagamento, ante a determinação legal de aplicação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) aos créditos não tributários durante o período de graça constitucional (art. 100, § 5º, da CF), independentemente do índice previsto no título executivo, conforme a regulamentação dos procedimentos relativos à expedição de ofícios requisitórios e precatórios estabelecida pelo Conselho da Justiça Federal e pelo Conselho Nacional de Justiça.
5. Apelação desprovida.