Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5070477-74.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: FRANCISCO BENEDITO DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: MARCELO BEIRIGO MACHADO - SP417270-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5070477-74.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: FRANCISCO BENEDITO DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: MARCELO BEIRIGO MACHADO - SP417270-N

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face da sentença de fls.  47/64  que julgou  parcialmente  procedente o pedido, verbis:

“DIANTE DO EXPOSTO, com fundamento no art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por FRANCISCO BENEDITO DE OLIVEIRA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL INSS para: a) RECONHECER o exercício de atividade rural no período de 02/10/1972 e 08/05/1983, e determinar que seja averbado pela autarquia o tempo reconhecido, devendo passar a constar no CNIS do autor; b) RECONHECER o período constante em CTPS de 09/05/1983 a 03/02/1986, devendo passar a constar no CNIS do autor; c) RECONHECER o caráter especial das atividades exercidas no período de 01/03/1986 a 08/03/1995, determinando sua conversão em comum pelo réu ao tempo da implementação do benefício; d) DETERMINAR que o réu conceda ao autor aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do primeiro requerimento administrativo, em 01/08/2018 [fl. 34], observada a prescrição quinquenal; e) CONDENAR o réu a pagar as prestações atrasadas com juros e correção monetária calculados de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente com as alterações promovidas pela Resolução n° 658/2020 CJF, de 10 de agosto de 2020, observando-se que desde a promulgação da Emenda Constitucional n° 113, de 08 de dezembro de 2021, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária. Em razão da sucumbência mínima do autor, CONDENO o requerido ao pagamento dos honorários advocatícios do procurador do autor, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observando-se a súmula 111 do STJ, levando em consideração a natureza da causa, bem como o tempo e o trabalho despendidos, em conformidade com o art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Deixo de condenar o réu ao pagamento das custas processuais em face da isenção legal previsto no art. 6º da Lei Estadual nº 11.608/03. Dispensada a remessa necessária (art. 496, §3º, I, do CPC, com a interpretação conferida no REsp 1735097/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/10/2019, DJe 11/10/2019)   Comandos Finais 1- Decorrido o prazo recursal ou havendo renúncia das partes a este, certifique-se o trânsito em julgado e intimem-se as partes, cabendo ao interessado, sendo o caso, instaurar o respectivo cumprimento de sentença, no prazo de 30 dias, sob pena de arquivamento (art. 1.286, §6º, das NSCGJ). 2- Após, proceda-se à conferência do recolhimento integral de todas as custas processuais devidas; à consulta da validade e da veracidade das guias DARE-SP, oportunidade em que deve ser realizada a vinculação do documento ao número do processo para impossibilitar a reutilização; bem como à queima das guias no Portal de Custas, certificando-se nos autos, de acordo com o Comunicado CG nº 136/2020 da egrégia Corregedoria Geral da Justiça (arts. 1.093, §6º e 1.098, caput, das NSCGJ). 3- Caso haja custas processuais pendentes, intime-se o responsável para efetuar o pagamento no prazo de 60 dias, sob pena de extração de certidão para fins de inscrição na dívida ativa, nos termos do art. 1.098, §§1º e 2º, das NSCGJ. 4- Ainda, proceda-se à baixa nos alertas de pendências, à exclusão das tarjas insubsistentes e à remoção de cópias no subfluxo de processos e de documentos pendentes no subfluxo de documentos, se necessário com abertura de chamado ao setor de informática. 5- Por fim, arquive-se com extinção e baixa definitiva, fazendo-se as anotações necessárias no sistema informatizado, observados os códigos de movimentação descritos no Comunicado CG 1789/17 (art. 184, parágrafo único, das NSCGJ). 6- Interposta apelação, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões no prazo de 15 dias, assegurada a contagem em dobro para o Ministério Público, a Defensoria Pública e a Advocacia Pública, na forma dos arts. 180, 183 e 186 do CPC (art. 1.010, §1º do CPC). 7- Interposta apelação adesiva, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões na forma do item 6 (art. 1.010, §2º, do CPC). 8- Cumpridas as formalidades descritas acima, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com as nossas homenagens, independentemente de juízo de admissibilidade (art. 1.010, §3º, do CPC). 9- Com o retorno dos autos à origem, intimem-se as partes para cumprirem o v. acórdão, cabendo ao interessado, sendo o caso, instaurar o respectivo cumprimento de sentença no prazo de 30 dias (art. 1.286, §6º, das NSCGJ). Após, arquive-se, observadas as diretrizes descritas nos itens 2 a 5. Certifique-se o decurso de prazo quando não houver manifestação da pessoa intimada. Cumpra-se por simples ato ordinatório sempre que possível. P.I.C.”

O INSS, ora recorrente, pede, preliminarmente,   submissão da sentença ao reexame necessário. No mérito, pugna pela reforma parcial aduzindo, em apertada  síntese, o seguinte:não comprovação da especialidade do período reconhecido, empregador não era agroindústria,  mas sim pessoa física; não comprovação do labor rural no período de 02/10/72 a 08/05/73, nem do vínculo anotado na CTPS, cuja    presunção  é relativa. . Subsidiariamente, pede a intimação da  parte para  firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; observância da prescrição quinquenal;  fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ;  isenção de custas e outras taxas judiciárias; e a cobrança  o  desconto dos  valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período, bem como pelo deferimento da cobrança de eventuais valores pagos   em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada..

Regularmente processado o feito,  os autos subiram a este Eg. Tribunal.

É O RELATÓRIO.

Obs: Todas as folhas mencionadas referem-se ao processo extraído em PDF pela ordem decrescente de páginas.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5070477-74.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: FRANCISCO BENEDITO DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: MARCELO BEIRIGO MACHADO - SP417270-N

 

 

 

V O T O

 

 

A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.

Controverte-se  sobre  o reconhecimento do  exercício de atividade rural no período de 02/10/1972 e 08/05/1983,   sobre o  período constante em CTPS de 09/05/1983 a 03/02/1986 e o reconhecimento da  especialidade das  atividades exercidas no período de 01/03/1986 a 08/03/1995,  sua conversão em comum com a conseuqente concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.

REMESSA NECESSÁRIA 

A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, que afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/2015).

Desta forma, considerando o valor do benefício e o lapso temporal desde a sua concessão, não há que se falar em sentença iliquida e a hipótese dos autos não demanda reexame necessário.

Por fim, cumpre esclarecer que o sobrestamento determinado pelo Eg. STJ ao afetar os Recursos Especiais nºs 1.882.236/RS, 1.893.709/RS e 1.894.666/SC, que tratam do tema sobre a remessa  necessária de sentença ilíquida (Tema 1081/STJ), se restringe apenas aos recursos especiais e agravos em recurso especial.

Logo, a r. sentença não está sujeita ao reexame necessário.

REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO/PROGRAMADA

Como é sabido, após a EC 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço cedeu lugar à aposentadoria por tempo de contribuição.

Em resumo, antes de 16/12/1998 (data da vigência da Emenda 20), bastava o segurado comprovar 30 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 35 anos, se homem, para concessão da aposentadoria integral; ou 25 anos, se mulher, e 30 anos, se homem, para concessão da aposentadoria proporcional.

Após a EC 20/98, o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, passando a ser necessário comprovar 35 anos de tempo contributivo, se homem, e 30 anos, se mulher, além da carência correspondente a 180 contribuições mensais (art. 25, inciso II, c/c art. 142, ambos da Lei 8.213/1991), deixando de existir a aposentadoria proporcional. Esta última, no entanto, foi assegurada aos já filiados antes do advento da Emenda, mediante os seguintes requisitos: 53 anos de idade e 30 anos de tempo de serviço, se homem; ou 48 anos de idade e 25 anos de tempo de serviço, se mulher; bem como o adicional de 40% sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional.

A EC 103/2019, vigente a partir de 13/11/2019, por sua vez, extinguiu a aposentadoria por tempo de contribuição, estabelecendo a aposentadoria programada, com exigência de novos requisitos: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores rurais e segurados especiais (art. 201, § 7º, da Constituição Federal).

Restou assegurado, também, no artigo 3º da nova Emenda Constitucional, o direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que tivessem preenchido as condições em data anterior a sua vigência (13/11/2019), os quais podem pedir benefício a qualquer tempo (art. 3º da EC), garantindo-se cálculo e reajuste com base na legislação vigente à época em que foram cumpridos os requisitos (art. 3º, §§ 1º e 2º, da EC).

Além disso, restaram estabelecidas 04 (quatro) regras de transição para àqueles que já eram filiados ao RGPS e ainda não tinham implementado os requisitos até 13/11/2019, a saber (arts. 15, 16, 17 e 20 da EC 103/2019): a) sistema de pontos, idade e tempo de contribuição; b)tempo de contribuição e idade mínima; c) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator previdenciário, sem o requisito da idade; d) tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade mínima.

O   tempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado, independentemente do recolhimento de contribuição, exceto para fins de carência, até o dia 31/10/1991, conforme o disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99, in verbis

"Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros:

(...)

X - o tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior à competência novembro de 1991;"

DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL.

Nos termos do artigo 55, §§2º, da Lei 8.213/1991,o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início da vigência de mencionada lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência.

Logo é desnecessária a comprovação do recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios (24/07/1991), caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, sendo certo, no entanto, que tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região, 2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região, 2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região, 2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015, DJe 04/12/2015).

Com relação ao período posterior à vigência da Lei 8.213/91, caso o segurado especial pretenda o cômputo do tempo de serviço rural para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, deverá comprovar o recolhimento das contribuições previdenciárias, como contribuinte facultativo.

Portanto, é impossível o reconhecimento do tempo de labor no campo após 31/10/1991 sem o devido recolhimento da contribuição previdenciária.

PROVAS DO TEMPO DE ATIVIDADE RURAL.

A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

Entende-se por início de prova material documentos contemporâneos ao período que se busca comprovar, espontaneamente produzidos no passado.

Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).

Vale lembrar, que dentre os documentos admitidos pelo Eg. STJ estão aqueles que atestam a condição de rurícola do cônjuge, cuja qualificação pode estender-se a esposa, desde que a continuação da atividade rural seja comprovada por robusta prova testemunhal (AgRg no AREsp nº 272.248/MG, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 12/04/2013; AgRg no REsp nº 1342162/CE, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 27/09/2013).

Em reforço, a Súmula nº 6 da TNU: "A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola".

E atendendo as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea prova testemunhal.

Frisa-se, ademais, que a C. 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n.º 1.348.633/SP, também representativo de controvérsia, admite, inclusive, o tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que, claro, corroborado por prova testemunhal idônea. Nesse sentido, precedentes desta E. 7ª Turma (AC 2013.03.99.020629-8/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018).

Nesse passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.

No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do menor.

Sobre a questão, a Eg. Sétima Turma desta Corte Regional assentou o entendimento de que,  em virtude das peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da década de 70, impõe-se admitir,   para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade e, a partir da Constituição Federal de 1988,  prevalece a idade nela estabelecida.

Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário, especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE 906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).

Nesse sentido os precedentes desta E. 7ª Turma: AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, DJe 13/03/2017; AC 2003.61.25.001445-4, Rel. Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018.

 

DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.

Em linhas gerais, até o advento da EC 103/2019, a aposentadoria especial era devida após 180 contribuições, para os trabalhadores expostos a condições prejudiciais à saúde por 15, 20 ou 25 anos.

Até 28.04.1995, a especialidade poderia ser reconhecida sem comprovação da exposição, desde que a atividade estivesse enquadrada nos decretos n° 53.831/64 ou n° 83.080/1979, sendo possível e desejável o uso de analogia, para considerar a inserção de determinada categoria profissional, aproximando os diversos grupos de trabalhadores que se enquadrem em atividades assemelhadas, a fim de evitar situações injustas, acarretando sua não aplicação.

Após 28.04.1995, com o advento da Lei 9.032/1995, o segurado passou a ter que comprovar a exposição permanente a agentes prejudiciais à saúde, de forma permanente, não ocasional nem intermitente; entendendo-se como permanente, o trabalho em que a exposição ao agente nocivo é indissociável da produção ou serviço.

As condições especiais de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico.

Todavia, consoante entendimento já sufragado por esta Turma, por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.

O artigo 58 da Lei 8.213/91 dispõe que cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares consideradas exemplificativas (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC), de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97.

Assim, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial.

A partir de 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário aos segurados expostos a agentes nocivos, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.

Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência reconhece como especial o trabalho que assim era considerado pela legislação em vigor na época (Recurso Especial nº 1.398.260/PR – Tema 694/STJ).

A conversão do tempo de trabalho deve seguir a legislação vigente no momento do requerimento administrativo (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).

Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo- se observar a tabela dos multiplicadores prevista no artigo 70, do Decreto 3.048/99.

A EC 103/2019, por sua vez, proibiu a conversão do tempo especial em comum para atividades após 13/11/2019, não sendo o art. 57, § 5º, da lei 8.213/91, recepcionado pela reforma constitucional (art. 201, §14, da CF e art. 25, caput, e §2º da referida Emenda).

No tocante ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, o E. STF assentou a tese de que não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, situação que não se aplica ao agente nocivo ruído (ARE 664335).

CASO   CONCRETO

PERÍODO DE 02/10/1972 A 08/05/1983  TRABALHADOR RURAL

 Segundo a inicial, o autor, nascido em 02/10/1960, é  filho de lavradores e desde  tenra idade, a partir dos 10 anos de idade, dedicou-se ao duro e árduo trabalho rural na região de Paranapuã - SP, laborando em conjunto com seus pais no desempenho das mais variadas atividades ligadas ás lidas rurais, sobretudo plantio, cultivo e colheita de café cultura predominante a época. Com o evento da geada do ano de 1974, com a queima do cafezal, ajudou a cortar os pés de café junto ao tronco, para os gatos “Bento” e “Augusto Quinalha”, passando trabalhava assim na cultura de algodão, milho e arroz, ativando no plantio, carpindo, passando ferramenta com animais, colheita e, bem como tirando semente de braquiária. Em 08 de agosto de 1981, o autor se  casou,  ocasião  em que  trabalhava para Masashige Matsue, no sitio São João localizado no córrego da Arara no município de Mesópolis – SP, na condição de trabalhador diarista rural. Esclarece que, após o casamento, ele  foi residir nesta propriedade com sua esposa, tendo permanecido  na  condição de trabalhador rural sem registro em CTPS até 09 de maio de 1983, quando foi admitido como trabalhador rural por João Ademar Paro, permanecendo  até 03 de fevereiro de 1986.

Para comprovar o labor rural no período de  02/10/1972 a 08/05/1983, o autor  trouxe aos autos os seguintes documentos: certidão de seu casamento, em  08/08/1981, onde ele  está qualificado como lavrador (fl. 599/600) sua CTPS onde se vê  que o primeiro vínculo anotado é de natureza rural, de longa duração, de 1983 a 1986, o que denota a continuidade do trabalho rural (fl. 437/470); Matrícula de imóvel rural denominado Fazenda São João  onde trabalhou após o casamento (fl. 525/561) e os documentos concernentes ao imóvel onde trabalhou (ITR de 2014  em nome de Masashige Matsue,  referente  ao Sítio São João (fl. 561/564); CCIR   2006 a 2008   onde o imóvel está classificado como pequena propriedade - fl. 524);  declaração  firmada por de Masashige Matsue, de que o autor trabalhou em sua propriedade – Sítio São João, de 03/02/1980 a 27/12/1982 como diarista rural, em lavoura de milho, soja e algodão (fl. 523) e Entrevista rural  fl.391/ 392.

A  documentação trazida aos autos configura início de prova material.

Ademais, há que se registrar que tais elementos probatórios foram corroborados pela prova oral produzida em juízo e não impugnada pelas partes.

Em seu  depoimento pessoal, o autor aduziu ser natural do Município de Estrela D' Oeste. Informou ter residido em âmbito urbano e laborado no meio rurícola por meio de empreiteiros/gatos, indicando por exemplo as pessoas de “Bento” e “Augusto”. Afirmou que seu genitor também exercia atividade campesina da mesma forma. Especificou ter iniciado no labor rurícola com 10/12 anos de idade e que seguia para o exercício da atividade campesina utilizando transporte conhecido na época como “pau de arara”. Narrou que a princípio, o maior cultivo era de café, porém, após ter ocorrido uma geada em 1974, passaram a trabalhar com lavoura de milho, algodão e soja. Questionado, confirmou ter laborado na colheita de algodão e que a remuneração era por arroba, diferente do cultivo da lavoura de milho e arroz, em que recebiam por dia. Delimitou ter exercido atividade rural sem registro de 1972 a 1983. Mencionou que após ter se casado, permaneceu exercendo o labor rurícola em determinada propriedade até por volta de 1982. Disse que posteriormente ingressou registrado em uma propriedade na região de Colina, como tratorista, na qual permaneceu por 3/4 anos. Informou que em seguida passou a trabalhar com Luiz. C Junqueira, como tratorista, pelo período de 09 anos. Questionado, respondeu que posteriormente trabalhou em outros locais por períodos diferentes. Indagado, respondeu exercer atualmente a atividade de operador de máquina.

A testemunha Edson Oliveira Lima declarou que conhece  o autor desde criança do Município de Estrela D' Oeste. Afirmou que o requerente exercia atividade rural por meio de empreiteiros/gatos como “Bento” e “Augusto”, mencionando inclusive terem trabalhado juntos. Especificou que o autor exerceu atividade campesina em tal região na qual se conheceram, pelo período de aproximadamente 10 anos, transcorrido entre 1972 e 1982. Confirmou que o requerente exercia diariamente a atividade rural, era solteiro e entregava a renda auferida para a genitora. Disse que o autor laborou para um japonês, lidando com horta, trator e demais funções que fossem necessárias em âmbito rural. Questionado, respondeu nunca ter visto o requerente exercendo atividade urbana. Esclareceu que após o autor ter passado a residir no Município de Colina, acabaram se distanciando.

A testemunha Luiz Candido Junqueira Franco, disse conhecer o autor pporque ele foi seu funcionário na  propriedade rural denominada Fazenda Santa Helena, entre os anos de 1986 e 1995, na região de Barretos. Informou ter tomado conhecimento posteriormente, inclusive por ter sido empregador também de irmãos do requerente, que ele havia ingressado na Usina Moema. Questionado, respondeu acreditar que o autor tenha laborado somente no campo. Indagado, confirmou que requerente pulverizava laranja, sem utilizar EPI e com trator sem cabine.

A testemunha Antônio Martins Dantas disse que  conhece o autor desde criança. Afirmou que o requerente exercia atividade rural e inclusive estiveram trabalhando juntos por 12 anos em lavouras de café, soja e laranja. Confirmou que o autor também trabalhou exercendo atividade rural para um japonês. Descreveu que a propriedade em que colhiam café, contava em torno com dois mil pés do produto. Aduziu que posteriormente, o autor mudou-se para a região do Município de Colina.

Consoante anteriormente assentado, a prova testemunhal, desde que idônea, tal como verificado in casu, autoriza a ampliação da eficácia probatória dos documentos juntados ao feito, razão pela qual mostra-se possível reconhecer o trabalho rural no período pretendido pela parte autora.

Por tais razões, possível a averbação de referido período de labor campesino, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, não podendo tal período ser computado para efeito de carência, nos termos do art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.

 

PERÍODO  DE 09/05/1983 A 03/02/1986:  CTPS

Quanto ao período de 09/05/1983 a 03/02/1986 , devidamente  anotados em sua CTPS, afigura-se correto o seu reconhecimento pelo decisum, que não merece reparo sob esse aspecto.

As anotações de vínculos empregatícios constantes da CTPS do segurado tem presunção de veracidade relativa, cabendo ao INSS o ônus de provar seu desacerto, caso contrário, representam início de prova material, mesmo que não constem do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS.

Nesse sentido a Súmula 75 da TNU: "A Carteira de Trabalho e Previdência social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conste no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS)".

Em outras palavras, nos casos em que o INSS não trouxer aos autos qualquer prova que infirme as anotações constantes na CTPS da parte autora, tais períodos devem ser considerados como tempo de contribuição/serviço, até porque eventual não recolhimento das contribuições previdenciárias devidas nesse período não pode ser atribuído ao segurado, nos termos do artigo 30, inciso I da Lei 8.212/1991. Precedentes desta C. Turma:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO COMUM COM REGISTRO EM CTPS. ATIVIDADES ESPECIAIS COMPROVADAS. REQUISITOS PREENCHIDOS.

1. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 ambos da Lei nº 8.213/91. A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91.

2. Portanto, as anotações constantes da CTPS da parte autora no período de 17/08/1979 a 15/04/1981, deve ser computada pelo INSS, como efetivo tempo de serviço/contribuição, inclusive para fins de concessão de benefício.

3. Logo, deve ser considerado como especial o período de 06/03/1997 a 31/12/2004.

4. Desse modo, computando-se os períodos especiais ora reconhecidos, acrescidos dos períodos incontroversos constantes da CTPS e do CNIS até a data do requerimento administrativo, perfazem-se mais de trinta e cinco anos de contribuição, conforme planilha anexa, o que autoriza a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral, na forma do artigo 53, inciso II, da Lei nº 8.213/91, correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, com valor a ser calculado nos termos do artigo 29 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 9.876/99.

5. Assim, reconhece-se o direito da parte autora à aposentadoria por tempo de contribuição, na forma integral, a partir do requerimento administrativo (04/09/2014), data em que o réu tomou conhecimento da pretensão.

6. Apelação do INSS parcialmente provida.

(TRF 3ª Região, 7ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0002589-93.2015.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 11/03/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 18/03/2020)

Nessa esteira, a Súmula nº 12 do TST estabelece que as anotações apostas pelo empregador na CTPS do empregado geram presunção juris tantum de veracidade do que foi anotado.

Logo, não comprovada nenhuma irregularidade, não há que falar em desconsideração dos vínculos empregatícios devidamente registrados.

Por conseguinte,  o fato de o período não constar do Cadastro de Informações Sociais CNIS não pode impedir o reconhecimento do trabalho prestado pelo segurado como tempo de serviço para fins previdenciários, especialmente quando o lapso vem regularmente registrado em sua CTPS e o INSS não demonstrou que o registro se deu mediante fraude.

Ademais, referido vínculo  não  está ilegível, não contém rasuras, está em ordem cronológica e possui anotações diversas.

PERÍODO  DE 01/03/1986 A 08/03/1995 : TRATORISTA - ENQUADRAMENTO

Relativamente ao período trabalhado para o  empregador LUIZ  CANDIDO JUNQUEIRA FRANCO – FAZENDA SANTA HELENA    é possível  reconhecer a atividade de tratorista como especial por enquadramento profissional, tendo em vista a equiparação com a função de motorista de caminhão, nos Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79.

Confira-se:                                            

"APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. NÃO CABIMENTO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. LAUDO EXTEMPORÂNEO IDÔNEO. ATIVIDADE DE TRATORISTA E SAPATEIRO. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISISONAL ATÉ 28/04/1995. HIDROCARBONETOS. RUÍDO. METODOLOGIA DE AFERIÇÃO. HABITUALIDADE. EPI INEFICAZ. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. DIREITO AO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS. TEMA 1124/STJ. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS. HONORÁRIOS RECURSAIS INDEVIDOS. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS. PREQUESTIONAMENTO. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA EM PARTE.
(...)
- É possível reconhecer a atividade de tratorista como especial por enquadramento profissional, tendo em vista a equiparação com a função de motorista de caminhão, nos Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79.
- (...)
- Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação provida em parte." (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001535-47.2020.4.03.6113, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 17/11/2023, DJEN DATA: 21/11/2023
)
                                        

Ademais, ao contrário do sustentado pelo INSS, colho da CTPS do autor que se trata de estabelecimento agropecuário, sendo perfeitamente possível o enquadramento profissional.

Por ocasião da DER,  em 01/08/2018, o INSS apurou um total de  33 anos, 03 meses e 23 dias de tempo de contribuição  e carência de 334 contribuições  (fl. 490 e 603)

Considerando  o período reconhecido administrativamente  somado ao   período especial  devidamente convertido ([12 anos, 07 meses e 15 dias)  e aos demais  períodos reconhecidos na sentença,    por ocasião da  DER , o autor fazia jus ao benefício concedido.

AUTODECLARAÇÃO

O requerimento para que a parte firme autodeclaração para os pedidos de aposentadorias deve ser rejeitado, seja porque tal exigência, prevista apenas em norma administrativa (Portaria INSS n° 450/2020), não se aplica na esfera judicial, mas apenas no âmbito administrativo; seja porque os requisitos para a concessão do benefício sub judice foram preenchidos antes do advento da EC, de sorte que as disposições desta não se lhes aplica.

PRESCRIÇÃO

Sobre a prescrição,correto o decisum que  assim se dispôs:

"Na presente situação, imperioso reconhecer que incide a prescrição quinquenal das parcelas vencidas há mais de 05 (cinco) anos entre o primeiro requerimento administrativo (01/08/2018 - fl. 34) e o ajuizamento da lide (01/09/2023).

Incide, na espécie, o disposto no verbete nº 85 da súmula do STJ:

“Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação.”

Posto isto, necessário reconhecer a prescrição de eventuais parcelas vencidas anteriormente a 01/09/2018, sendo este o quinquênio antecedente ao ajuizamento da lide (01/09/2023)" 

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Os honorários advocatícios foram fixados moderadamente e devem ser mantidos.

CUSTAS

O INSS não foi condenado ao pagamento  de custas.

JUROS DE MORA  E  CORREÇÃO  MONETÁRIA

Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios adotados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução, o qual   foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.

Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser discutido ou acrescentado aos autos.

Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados para 12%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do CPC/2015.

Ante o exposto, nego  provimento ao recurso, condenando o INSS ao pagamento dos honorários recursais nos termos do expendido,   de ofício, altero os critérios de juros de mora e correção monetária, ficando mantida, no mais, a r. sentença. 

 

É COMO VOTO.

 

/gabiv/.soliveir..



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO: TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/CONTRIBUIÇÃO/PROGRAMADA. . TRATORISTA. ENQUADRAMENTO,   TRABALHO RURAL. COMPROVAÇÃO.CTPS. VÍNCULO RECONHECIDO.RECURSO DESPROVIDO.

1. A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, que afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/2015). Desta forma, considerando o valor do benefício e o lapso temporal desde a sua concessão, não há que se falar em sentença iliquida e a hipótese dos autos não demanda reexame necessário.

2.A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).

3- A EC 103/2019, vigente a partir de 13/11/2019, por sua vez, extinguiu a aposentadoria por tempo de contribuição, estabelecendo a aposentadoria programada, com exigência de novos requisitos: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores rurais e segurados especiais (art.  201, § 7º, da Constituição Federal).

4- O artigo 3º da  Emenda Constitucional 103/2019 assegura   o direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que preencheram os requisitos legais  em data anterior a sua vigência (13/11/2019),  os quais podem pedir benefício a qualquer tempo (art. 3º da EC), garantindo-se cálculo e reajuste com base na legislação vigente à época em que foram cumpridos os requisitos (art. 3º, §§ 1º e 2º, da EC).

5- Restaram estabelecidas 04 (quatro) regras de transição para àqueles que já eram filiados ao RGPS e ainda não tinham implementado os requisitos até 13/11/2019, a saber (arts. 15, 16, 17 e 20 da EC 103/2019): a) sistema de pontos, idade e tempo de contribuição;  b)tempo de contribuição e idade mínima; c) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator previdenciário, sem o requisito da idade; d)  tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade mínima.

6.  O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.

7. Até 28/04/1995, é possível a subsunção da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.

8. .  Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar. Precedentes

9. Para comprovar o labor rural no período de  02/10/1972 a 08/05/1983, o autor  trouxe aos autos os seguintes documentos: certidão de seu casamento, em  08/08/1981, onde ele  está qualificado como lavrador (fl. 599/600) sua CTPS onde se vê  que o primeiro vínculo anotado é de natureza rural, de longa duração, de 1983 a 1986, o que denota a continuidade do trabalho rural (fl. 437/470); Matrícula de imóvel rural denominado Fazenda São João  onde trabalhou após o casamento (fl. 525/561) e os documentos concernentes ao imóvel onde trabalhou (ITR de 2014  em nome de Masashige Matsue,  referente  ao Sítio São João (fl. 561/564); CCIR   2006 a 2008   onde o imóvel está classificado como pequena propriedade - fl. 524);  declaração  firmada por de Masashige Matsue, de que o autor trabalhou em sua propriedade – Sítio São João, de 03/02/1980 a 27/12/1982 como diarista rural, em lavoura de milho, soja e algodão (fl. 523) e Entrevista rural  fl.391/ 392..

10. O labor rural foi comprovado através de início suficiente de prova material, corroborado por robusta prova oral.

11. Consoante anteriormente assentado, a prova testemunhal, desde que idônea, tal como verificado in casu, autoriza a ampliação da eficácia probatória dos documentos juntados ao feito, razão pela qual mostra-se possível reconhecer o trabalho rural no período pretendido pela parte autora.

12. Possível a averbação de referido período de labor campesino, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, não podendo tal período ser computado para efeito de carência, nos termos do art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.

13. Quanto ao período de 09/05/1983 a 03/02/1986 , devidamente  anotados em sua CTPS, afigura-se correto o seu reconhecimento pelo decisum, que não merece reparo sob esse aspecto.

14. As anotações de vínculos empregatícios constantes da CTPS do segurado tem presunção de veracidade relativa, cabendo ao INSS o ônus de provar seu desacerto, caso contrário, representam início de prova material, mesmo que não constem do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS. Ademais, referido vínculo  não  está ilegível, não contém rasuras, está em ordem cronológica e possui anotações diversas.

15. Relativamente ao período trabalhado para o  empregador LUIZ  CANDIDO JUNQUEIRA FRANCO – FAZENDA SANTA HELENA    é possível  reconhecer a atividade de tratorista como especial por enquadramento profissional, tendo em vista a equiparação com a função de motorista de caminhão, nos Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79.

16. Ao contrário do sustentado pelo INSS, colho da CTPS do autor que se trata de estabelecimento agropecuário, sendo perfeitamente possível o enquadramento profissional.

17. Por ocasião da DER,  em 01/08/2018, o INSS apurou um total de  33 anos, 03 meses e 23 dias de tempo de contribuição  e carência de 334 contribuições  (fl. 490 e 603)

18. Considerando  o período reconhecido administrativamente  somado ao   período especial  devidamente convertido ([12 anos, 07 meses e 15 dias)  e aos demais  períodos reconhecidos na sentença,    por ocasião da  DER , o autor fazia jus ao benefício concedido.

19. O requerimento para que a parte firme autodeclaração para os pedidos de aposentadorias deve ser rejeitado, seja porque tal exigência, prevista apenas em norma administrativa (Portaria INSS n° 450/2020), não se aplica na esfera judicial, mas apenas no âmbito administrativo; seja porque os requisitos para a concessão do benefício sub judice foram preenchidos antes do advento da EC, de sorte que as disposições desta não se lhes aplica.

20. Os honorários advocatícios foram fixados moderadamente e devem ser mantidos.

21. O INSS não foi condenado ao pagamento  de custas.

22. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios adotados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução, o qual   foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual.
23. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.

24. Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser discutido ou acrescentado aos autos.

25.  Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei, ficando sua exigibilidade condicionada à futura deliberação sobre o Tema nº 1.059/STJ, o que será examinado oportunamente pelo Juízo a quo.

26. Recurso desprovido. De ofício, alterados os critérios de juros de mora e correção monetária, nos termos do expendido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso, condenando o INSS ao pagamento dos honorários recursais e, de ofício, alterar os critérios de juros de mora e correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
INES VIRGINIA
DESEMBARGADORA FEDERAL