APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000247-27.2012.4.03.6115
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
APELANTE: GPB INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS QUIMICOS LTDA
Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ROGERIO LYRIO PIMENTA - SP281421-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000247-27.2012.4.03.6115 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: GPB INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS QUIMICOS LTDA Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ROGERIO LYRIO PIMENTA - SP281421-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta por GPB GAXETAS E PERFIS DO BRASIL LTDA. em face da r. sentença que julgou improcedentes os embargos à execução fiscal. Alega a apelante, em síntese, que o artigo 11 da Lei n° 9.779/1999 autorizou a utilização do saldo credor apurado a partir da Medida Provisória n° 1.788/98, para ressarcimento em espécie ou compensação de tributos, na forma dos artigos 73 e 74, da Lei 9.430/96. Aduz que a Instrução Normativa SRF n 33/99 foi ilegal ao estabelecer que o direito à compensação se restringiria a créditos escriturados a partir de 01/01/1999. Assim, defende a extinção do crédito tributário exigido, por compensação regularmente procedida. Requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso. A apelação foi recebida apenas no efeito devolutivo. Contra essa decisão, não se insurgiu a apelante. Apresentadas contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000247-27.2012.4.03.6115 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: GPB INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS QUIMICOS LTDA Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ROGERIO LYRIO PIMENTA - SP281421-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Trata-se de embargos opostos à execução fiscal ajuizada para a cobrança de créditos tributários de PIS e COFINS, decorrentes de compensações não homologadas na esfera administrativa, consoante CDAS n°80 608011778-36 e n° 80708002527-50. Alega a embargante, ora apelante, a regularidade da compensação de créditos de IPI acumulados em 31/12/1998, com os débitos em cobro na presente execução fiscal (PIS e COFINS – período de apuração entre 12/1998 e 06/1999), realizada com base na MP 1788/98, convertida na Lei nº 9.779/99. Vejamos. Antes da entrada em vigor da mencionada MP 1.788/98, convertida na Lei nº 9.779/99, somente era possível a utilização de saldo credor de IPI acumulado no trimestre com o IPI devido na saída de produtos (Decreto nº 2.637/98, art. 146). Com o advento do art. 11 da Lei 9.779/99, o saldo credor do IPI acumulado no trimestre que o contribuinte não pudesse compensar com o IPI devido na saída de outros produtos, poderia ser utilizado de conformidade com o disposto nos artigos 73 e 74 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, in verbis: “Art. 11. O saldo credor do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, acumulado em cada trimestre-calendário, decorrente de aquisição de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem, aplicados na industrialização, inclusive de produto isento ou tributado à alíquota zero, que o contribuinte não puder compensar com o IPI devido na saída de outros produtos, poderá ser utilizado de conformidade com o disposto nos arts. 73 e 74 da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996, observadas normas expedidas pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.”. O artigo 74 da Lei 9.430/96, por sua vez, disciplina a utilização de créditos tributários para a quitação de quaisquer tributos e contribuições sob a administração da Secretaria da Receita Federal. Portanto, em outras palavras, o artigo 11 da Lei 9779/99 autorizou a utilização do mencionado saldo de IPI para a compensação com quaisquer tributos e contribuições sob a administração da Secretaria da Receita Federal. Nesse ponto, importante salientar que o aludido dispositivo legal foi expresso ao autorizar a Secretaria da Receita Federal a expedir normas para o fim de viabilizar a execução da lei (“observadas normas expedidas pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.”). Diante disso, a Secretaria da Receita Federal expediu a Instrução Normativa SRF n. 33/1999 que dispôs que a nova sistemática de compensação de saldo credor de IPI com tributos de outras naturezas somente se aplicaria aos créditos de IPI relativos a insumos recebidos no estabelecimento a partir de 01/01/1999 (art. 4°). Assim, os créditos acumulados até 31/12/1998 somente poderiam ser deduzidos do próprio IPI devido (art. 5º). Pois bem. Acerca do poder regulamentar da Administração Pública, leciona MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO: “Os atos pelos quais a Administração exerce o seu poder normativo têm em comum com a lei o fato de emanarem normas, ou seja, atos com efeitos gerais e abstratos. Segundo a lição de Miguel Reale (1980:12-14), podem-se dividir os atos normativos em originários e derivados. “Originários se dizem os emanados de um órgão estatal em virtude de competência própria, outorgada imediata e diretamente pela Constituição, para edição de regras instituidoras de direito novo”; compreende os atos emanados do Legislativo. Já os atos normativos derivados têm por objetivo a “explicitação ou especificação de um conteúdo normativo preexistente, visando à sua execução no plano da praxis”; o ato normativo derivado, por excelência, é o regulamento. (…) Doutrinariamente, admitem-se dois tipos de regulamentos: o regulamento executivo e o regulamento independente ou autônomo. O primeiro complementa a lei ou, nos termos do art. 84, IV, da Constituição, contém normas “para fiel execução da lei”; ele não pode estabelecer normas contra legem ou ultra legem. Ele não pode inovar na ordem jurídica, criando direitos, obrigações, proibições, medidas punitivas, até porque ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, conforme art. 5º, II, da Constituição; ele tem que se limitar a estabelecer normas sobre a forma como a lei vai ser cumprida pela Administração.” (Pietro, Maria Sylvia Zanella D. Direito Administrativo. 37th edição. Grupo GEN, 2024, pg. 101) - g.n. Na espécie, a Instrução Normativa SRF nº 33/1999 é exemplo claro de regulamento executivo expedido com a finalidade de dar aplicação à lei 9.779/99 no plano concreto, isto é, no âmbito administrativo. Referida instrução normativa não inovou ou extrapolou os limites da lei em questão, tampouco estabeleceu norma contra legem ou ultra legem, mas apenas fixou critérios para a utilização do crédito disciplinado naquela lei. Logo, não há que se falar em ilegalidade do ato normativo. Ademais, é razoável o entendimento de que somente os créditos tributários de IPI com fato gerador posterior à vigência da MP 1788/98 (publicada em 30/12/1998), convertida na Lei 9.779/99, sejam compensáveis com débitos de outros tributos administrados pela SRF, haja vista a impossibilidade da aplicação retroativa da norma legal. Com efeito, o E. STF já reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do art. 11 da Lei 9.779/99, senão, vejamos: “TRIBUTÁRIO. CRÉDITO DE IPI. AQUISIÇÃO DE MATÉRIAS-PRIMAS, PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS E MATERIAL DE EMBALAGEM. PRODUTOS FINAIS ISENTOS OU SUJEITOS À ALÍQUOTA ZERO. NORMA GARANTIDORA. IRRETROATIVIDADE. JUÍZO DE CONFORMAÇÃO. 1. Autos devolvidos pela Vice-Presidência do STJ para a análise de hipótese de retratação, nos termos do § 3º do art. 543-B do CPC/1973 e do art. 1.030, II, do CPC/2015. 2. O Supremo Tribunal Federal, reconhecendo a repercussão geral do tema, no RE 562.980/SC, firmou a tese: "o direito do contribuinte de utilizar-se de crédito relativo a valores pagos a título de Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, oriundo da aquisição de matéria-prima a ser empregada em produto final beneficiado pela isenção ou tributado à alíquota zero, somente surgiu com a Lei n. 9.779/1999, não se mostrando possível a aplicação retroativa da norma" (Tema 49). Entendimento compartilhado pela Primeira Seção: REsp 860.369/PE, repetitivo, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe 18/12/2009. 3. Hipótese em que se impõe o juízo de conformação, para compatibilizar as manifestações anteriores desta Corte e o acórdão do Tribunal a quo ao entendimento firmado em repercussão geral e pela sistemática dos recursos repetitivos. 4. Agravo regimental da Fazenda Nacional provido. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido.” (AgRg no REsp n. 1.007.695/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 7/5/2019, DJe de 24/5/2019.) “PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. CREDITAMENTO DO IPI. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. AQUISIÇÃO DE MATÉRIA-PRIMA, PRODUTO INTERMEDIÁRIO E MATERIAL DE EMBALAGEM DESTINADOS À INDUSTRIALIZAÇÃO DE PRODUTOS ISENTOS OU SUJEITOS AO REGIME DE ALÍQUOTA ZERO. LEI 9.779/99. NOVEL JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Seguindo essa linha de raciocínio, esta C. Corte Regional já se posicionou no sentido de ser vedada a compensação do saldo credor de IPI com outros tributos, relativamente a fatos geradores anteriores à vigência da Lei nº 9.779/99, in verbis: “TRIBUTÁRIO. IPI. INSUMOS TRIBUTADOS. PRODUTOS ISENTOS. COMPENSAÇÃO COM OUTROS TRIBUTOS ADMINISTRADOS PELA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. POSSIBILIDADE A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI N.º 9.779/99. INCIDÊNCIA DE JUROS, CORREÇÃO MONETÁRIA E TAXA SELIC. CRÉDITOS ESCRITURAIS. DESCABIMENTO. ENTENDIMENTO PACIFICADO NOS TRIBUNAIS SUPERIORES. PRAZO PRESCRICIONAL. CINCO ANOS. I. Os créditos de IPI relativos à aquisição de insumos tributados que não podem ser aproveitados na saída dos produtos isentos, ou tributados à alíquota zero, podem ser compensados com outros tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, a teor do artigo 11 da Lei n.º 9.779/99. II. É vedada a compensação do saldo credor de IPI, com outros tributos, relativamente aos fatos geradores anteriores à vigência da Lei nº 9.779/99. III. Tratando-se de créditos escriturais, descabe a incidência de correção monetária, de juros e da taxa SELIC, conforme entendimento pacificado no âmbito do C. STF e do C. STJ. IV. Aplica-se aos créditos escriturais o prazo prescricional de cinco anos.” (TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 176305 - 0017024-17.2003.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MAIRAN MAIA, julgado em 15/09/2004, DJU DATA:01/10/2004 PÁGINA: 624) – g.n. Desta feita, não houve regularidade na compensação do saldo credor de IPI apurado em 31/12/1998, com os débitos de PIS e de COFINS ora exequendos. A r. sentença não comporta reforma. Ante o exposto, nego provimento à apelação, consoante fundamentação. É o voto.
1. O direito ao crédito de IPI, fundado no princípio da não-cumulatividade, decorrente da aquisição de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem utilizados na fabricação de produtos isentos ou sujeitos ao regime de alíquota zero, exsurgiu apenas com a vigência da Lei 9.779/99, cujo artigo 11 estabeleceu que: "Art. 11. O saldo credor do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, acumulado em cada trimestre-calendário, decorrente de aquisição de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem, aplicados na industrialização, inclusive de produto isento ou tributado à alíquota zero, que o contribuinte não puder compensar com o IPI devido na saída de outros produtos, poderá ser utilizado de conformidade com o disposto nos arts. 73 e 74 da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996, observadas normas expedidas pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda."
2. "A ficção jurídica prevista no artigo 11, da Lei nº 9.779/99, não alcança situação reveladora de isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI que a antecedeu" (Precedentes do Supremo Tribunal Federal: RE 562.980/SC, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, Rel. p/ Acórdão Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 06.05.2009, DJe-167 DIVULG 03.09.2009 PUBLIC 04.09.2009; e RE 460.785/RS, Rel. Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 06.05.2009, DJe-171 DIVULG 10.09.2009 PUBLIC 11.09.2009).
3. In casu, cuida-se de estabelecimento industrial que pretende o reconhecimento de direito de aproveitamento de créditos de IPI decorrentes da aquisição de matéria-prima, material de embalagem e insumos destinados à industrialização de produto sujeito à alíquota zero, apurados no período de janeiro de 1995 a dezembro de 1998, razão pela qual merece reforma o acórdão regional que deferiu o creditamento.
4. Recurso especial da Fazenda Nacional parcialmente provido, restando prejudicadas as pretensões recursais encartadas nas aduzidas violações dos artigos 166 e 170-A, do CTN. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.”
E M E N T A
ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PIS E COFINS. SALDO DE IPI. COMPENSAÇÃO COM OUTROS TRIBUTOS ADMINISTRADOS PELA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. POSSIBILIDADE A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI N.º 9.779/99. INSTRUÇÃO NORMATIVA 33/99 DA SRF. LEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
- Antes da entrada em vigor da mencionada MP 1788/98, convertida na Lei nº 9.779/99, somente era possível a utilização de saldo credor de IPI acumulado no trimestre com o IPI devido na saída de produtos (Decreto nº 2.637/98, art. 146).
- Com o advento do art. 11 da Lei 9.779/99, o saldo credor do IPI acumulado no trimestre que o contribuinte não pudesse compensar com o IPI devido na saída de outros produtos, poderia ser utilizado de conformidade com o disposto nos artigos 73 e 74 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996.
- O artigo 74 da Lei 9.430/96, por sua vez, disciplina a utilização de créditos tributários para a quitação de quaisquer tributos e contribuições sob a administração da Secretaria da Receita Federal. Portanto, em outras palavras, o artigo 11 da Lei 9779/99 autorizou a utilização do mencionado saldo de IPI para a compensação com quaisquer tributos e contribuições sob a administração da Secretaria da Receita Federal.
- A Secretaria da Receita Federal expediu a Instrução Normativa SRF n. 33/1999 que dispôs que a nova sistemática de compensação de saldo credor de IPI com tributos de outras naturezas somente se aplicaria aos créditos de IPI relativos a insumos recebidos no estabelecimento a partir de 01/01/1999 (art. 4°). Assim, os créditos acumulados até 31/12/1998 somente poderiam ser deduzidos do próprio IPI devido (art. 5º).
- A instrução normativa não inovou ou extrapolou os limites da lei em questão, tampouco estabeleceu norma contra legem ou ultra legem, mas apenas fixou critérios para a utilização do crédito disciplinado naquela lei. Logo, não há que se falar em ilegalidade do aludido ato normativo.
- Ademais, é razoável o entendimento de que somente os créditos tributários de IPI com fato gerador posterior à vigência da MP 1788/98 (publicada em 30/12/1998), convertida na Lei 9.779/99, sejam compensáveis com débitos de outros tributos administrados pela SRF, haja vista a impossibilidade da aplicação retroativa da norma legal. Precedentes STF e TRF3.
- Recurso desprovido.