Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0000402-05.2014.4.03.6133

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: INST. NAC. COLON. REFORMA AGRARIA - INCRA

APELADO: IRMANDADE DA SANTA CASA DE MISERICORDIA DE SAO PAULO, ITAQUAREIA INDUSTRIA EXTRATIVA DE MINERIOS LTDA, ESPÓLIO DE LOURENÇO DE SOUZA FRANCO, ESPÓLIO DE BENEDICTO DE SOUZA FRANCO, ESPÓLIO DE MANOEL ALVES DOS ANJOS

Advogados do(a) APELADO: ADILSON BERGAMO JUNIOR - SP182988-A, JAIME LUGO BELATO ORTS - SP248509-A
Advogado do(a) APELADO: EDUARDO DIAMANTINO BONFIM E SILVA - SP119083-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0000402-05.2014.4.03.6133

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: INST. NAC. COLON. REFORMA AGRARIA - INCRA

 

APELADO: IRMANDADE DA SANTA CASA DE MISERICORDIA DE SAO PAULO, ITAQUAREIA INDUSTRIA EXTRATIVA DE MINERIOS LTDA, ESPÓLIO DE LOURENÇO DE SOUZA FRANCO, ESPÓLIO DE BENEDICTO DE SOUZA FRANCO, ESPÓLIO DE MANOEL ALVES DOS ANJOS

Advogados do(a) APELADO: ADILSON BERGAMO JUNIOR - SP182988-A, JAIME LUGO BELATO ORTS - SP248509-A
Advogado do(a) APELADO: EDUARDO DIAMANTINO BONFIM E SILVA - SP119083-A

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R E L A T Ó R I O

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e de remessa necessária em face de sentença proferida pela  1ª Vara Federal de Mogi das Cruzes/SP que, em sede de ação de desapropriação para fins de reforma agrária, assim decidiu:

Posto isso, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido autoral, para declarar incorporado ao patrimônio do expropriante o imóvel rural denominado Chácara Santo Ângelo, situado no Município de Mogi das Cruzes/SP, registrado na transcrição nº 4.859 – 1º ORI (atual matrícula nº 96.067 do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Mogi das Cruzes) e 4.425-1º ORI (atual Matrícula nº 91.793 do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Mogi das Cruzes).

Com relação a corré SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE SÃO PAULO, JULGO EXTINTO O PROCESSO, sem resolução do mérito, na forma do artigo 485, VI, do Código de Processo Civil, diante da sua ilegitimidade. Cada parte arcará com os honorários de seus advogados. Oportunamente anote-se a exclusão do polo do processo eletrônico.

Diante da sentença proferida nos autos de Usucapião nº 0004250-63.2015.4.03.6133 (acostada no ID 48500821), igualmente, com relação aos corréus ESPÓLIO DE LOURENÇO DE SOUZA FRANCO, BENEDICTO DE SOUZA FRANCO E MANOEL ALVES DOS ANJOS, JULGO EXTINTO O PROCESSO, sem resolução do mérito, na forma do artigo 485, VI, do Código de Processo Civil, diante da ilegitimidade. Cada parte arcará com os honorários de seus advogados.

Condeno o INCRA a pagar ao expropriado a importância de R$ 41.380.973,38 (quarenta e um milhões, trezentos e oitenta mil, novecentos e setenta e três reais e trinta e oito centavos), apurada na data da imissão na posse.

Sobre a diferença apurada entre 80% (oitenta por cento) do preço ofertado e o valor do bem fixado na presente sentença incidirão juros compensatórios, no percentual de 6% (seis por cento) ao ano, a partir da data da imissão do expropriante na posse, em atendimento à decisão do E. Pretório Excelso na ADI 2332/DF, bem como juros moratórios, também no percentual de 6% (seis por cento) ao ano, a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da Constituição, à luz do art. 15-B do Decreto-lei nº 3.365/41, com a redação conferida pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001.

Saliento que, considerando tratar-se de imóvel produtivo, não há se falar em afastamento dos juros compensatórios. Ademais, eventual improdutividade do imóvel não afasta o direito aos juros compensatórios, pois esses restituem não só o que o expropriado deixou de ganhar com a perda antecipada, mas também a expectativa de renda, considerando a possibilidade do imóvel "ser aproveitado a qualquer momento de forma racional e adequada, ou até ser vendido com o recebimento do seu valor à vista" (EREsp 453.823/MA,  Rel.  Min.  Teori Albino Zavascki, Rel. p/ acórdão Min. Castro  Meira,  DJU de 17.05.04). Precedentes: REsp 675.401/RO, Rel. Min.  Mauro Campbell Marques, DJe de 10.09.09; REsp 984.965/CE, Rel. Min.  Eliana  Calmon,  DJe de 04.08.09; REsp 1.099.264/PA, Rel. Min. Francisco  Falcão, DJe de 19.08.09; REsp 1.034.014/CE, Rel. Ministro Teori  Albino  Zavascki,  Primeira  Turma,  DJU  de  26.06.08;  REsp 1.090.221/PE,  Rel.  Min. Hamilton Carvalhido, DJe de 29.09.09; REsp 1.066.839/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 31.08.09.

A Correção monetária incidirá sobre o valor da condenação, desde a data do laudo até o efetivo pagamento, devendo obedecer ao Manual de Cálculos da Justiça Federal.

Os títulos agrários (TDAs) complementares deverão ser emitidos com dedução do tempo decorrido a partir da data da imissão da posse, a fim de que o resgate não ultrapasse o prazo constitucional de 20 anos.

Condeno o expropriante ao pagamento das despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 5% (cinco por cento) sobre a diferença entre a oferta e condenação, nos termos do art. 27, §1º do Decreto Lei 3365/41, devidamente corrigidos (Súmula 141 STJ).

Torno definitivos os honorários do perito judicial em R$ 107.100,00 (cento e sete mil e cem reais), já levantados em sua integralidade. 

Proceda-se ao registro da área em questão em nome do expropriante, junto ao 2º Cartório de Registro de Imóveis de Mogi das Cruzes. Oportunamente, expeça-se o respectivo mandado.

Custas na forma da lei.

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição (art. 28, § 1º, do Decreto-lei nº 3.365/41).

Em suas razões recursais, alega o INCRA, em síntese, que a ocupação do imóvel por posseiros é fato incontroverso, devendo ser aplicado fator de depreciação sobre o valor da indenização. Insurge-se, ainda, contra a condenação em juros compensatórios, tendo em vista a necessidade de comprovação da perda de renda pelo expropriado, a ausência de perda antecipada da posse e o quanto decidido pelo C. STF na ADI nº 2332. Discute, ainda, o método de avaliação do imóvel, pugnando pela prevalência do método comparativo.

Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

Parecer do Ministério Público Federal pelo provimento tanto da remessa oficial como do recurso de apelação.

É o breve relatório. Passo a decidir.

 

 

 

 


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APELADO: IRMANDADE DA SANTA CASA DE MISERICORDIA DE SAO PAULO, ITAQUAREIA INDUSTRIA EXTRATIVA DE MINERIOS LTDA, ESPÓLIO DE LOURENÇO DE SOUZA FRANCO, ESPÓLIO DE BENEDICTO DE SOUZA FRANCO, ESPÓLIO DE MANOEL ALVES DOS ANJOS

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V O T O

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de Ação de Desapropriação por Interesse Social para fins de Reforma Agrária, promovida pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA em face de ITAQUAREIA INDÚSTRIA EXTRATIVA DE MINÉRIOS LTDA, SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE SÃO PAULO, ESPÓLIO DE LOURENÇO DE SOUZA FRANCO, ESPÓLIO DE BENEDICTO DE SOUZA BRANCO e ESPÓLIO DE MANOEL ALVES DOS ANJOS, objetivando provimento jurisdicional que lhe assegure a adjudicação do imóvel rural denominado Chácara Santo Ângelo, situado no Município de Mogi das Cruzes/SP, registrado nas matrículas nº 4.859, Livro 3-E, e 4.425, Livro 3-D, ambos do Cartório de Registro de Imóveis de Mogi das Cruzes.

Aduz que o imóvel é grande propriedade improdutiva, sujeita à desapropriação-sanção para fins de reforma agrária, e por este motivo foi declarada, apenas uma parte do imóvel, como de interesse social, por meio do Decreto Presidencial de 26 de dezembro de 2013, publicado no Diário Oficial da União de 27/12/2013. Ofereceu como indenização da área visada de 532.27ha (quinhentos e trinta e dois hectares, vinte e sete ares), o valor total de R$ 12.600.000,00 (doze milhões e seiscentos mil reais). Requereu, liminarmente, a imissão provisória na posse e, ao final, a adjudicação do bem desapropriado ao seu patrimônio.

Tendo havido discordância dos expropriados quanto ao preço ofertado, tornando controvertido o valor da justa indenização, foi determinada a realização de perícia judicial.

Laudo pericial juntado na ordem correta a partir do ID 40813262 até o ID 40815068. Foi identificada uma área total desapropriada de 579,91229 hectares (5.799.122,90 m²) e estimado o valor unitário de R$ 20,28/m² para as áreas úteis da desapropriação (área loteável de 2.174.504,26 m²), totalizando a quantia bruta de R$ 44.096.213,79. Desse montante foi deduzida a quantia de R$ 2.715.240,41 a título de passivo ambiental, resultando no valor final de R$ 41.380.973,38 (quarenta e um milhões, trezentos e oitenta mil, novecentos e setenta e três reais e trinta e oito centavos) para indenização aos expropriados.

As partes foram instadas a se manifestar sobre o laudo pericial, sendo que o INCRA formulou impugnação no ID 43739982, discordando dos valores alcançados pelo Sr. Perito, na medida em que não foi considerado o fator “ancianidade” das posses; a pesquisa de mercado foi feita de maneira equivocada, pois abordou lotes de terrenos na área urbana de loteamentos já consolidados ofertados no mercado; e, por fim, o método de avaliação também se encontra errado, pois foi utilizado o método “involutivo”, quando o correto seria o método “comparativo direto”, tendo em vista que se trata de área de exploração agrícola com o cultivo de olerícolas muito comum no município de Mogi das Cruzes e municípios circunvizinhos. Por fim, asseverou que aplicando o fator obrigatório da “ancianidade”, o valor da avaliação decai de R$ 41.380.973,38 para R$ 16.552.389,35. Apresentou parecer divergente no ID 43739988.

Tecidas essas considerações, tenho que a sentença merece ser parcialmente reformada. De fato, assim dispõe o art. 12 da Lei nº 8.629/1993, que tem a finalidade, exatamente, de regulamentar o dispositivo constitucional que trata da desapropriação por interesse social (art. 184), definindo, de forma objetiva, o que se deve entender por justa indenização:

Art. 12.  Considera-se justa a indenização que reflita o preço atual de mercado do imóvel em sua totalidade, aí incluídas as terras e acessões naturais, matas e florestas e as benfeitorias indenizáveis, observados os seguintes aspectos:                     (Redação dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

I - localização do imóvel;                    (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

II - aptidão agrícola;                     (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

III - dimensão do imóvel;                  (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

IV - área ocupada e ancianidade das posses;                    (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

V - funcionalidade, tempo de uso e estado de conservação das benfeitorias.                     (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

§ 1o  Verificado o preço atual de mercado da totalidade do imóvel, proceder-se-á à dedução do valor das benfeitorias indenizáveis a serem pagas em dinheiro, obtendo-se o preço da terra a ser indenizado em TDA.                       (Redação dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

§ 2o  Integram o preço da terra as florestas naturais, matas nativas e qualquer outro tipo de vegetação natural, não podendo o preço apurado superar, em qualquer hipótese, o preço de mercado do imóvel.                 (Redação dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

§ 3o  O Laudo de Avaliação será subscrito por Engenheiro Agrônomo com registro de Anotação de Responsabilidade Técnica - ART, respondendo o subscritor, civil, penal e administrativamente, pela superavaliação comprovada ou fraude na identificação das informações.                      (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

A razão de ser do dispositivo é que a existência de posseiros na área e a ancianidade dessas posses (vale dizer, o tempo decorrido desde a invasão) podem até mesmo levar à configuração da usucapião e, mesmo que isso não ocorra, haverá custos, perda de tempo e de esforços do ente desapropriante para a retirada dos invasores, repercutindo negativamente no preço de mercado do imóvel em comparação com outra gleba que não sofreu nenhum tipo de turbação. Parece evidente, nessa linha de raciocínio, que poucas serão as pessoas interessadas em adquirir um imóvel invadido por posseiros, circunstância que, necessariamente, faz cair o preço de mercado da propriedade rural, especialmente (como no caso dos autos) quando as posses contam com mais de ano e dia, situação em que eventuais ações possessórias, de "força velha", sequer contarão com a possibilidade de concessão da medida liminar de reintegração de posse prevista nos arts. 558 e 562 do CPC.

É certo, outrossim, que o C. STJ tem entendimento formado pela aplicação desse fator de depreciação do valor da indenização, como se nota dos seguintes precedentes:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO PARA REFORMA AGRÁRIA. IMÓVEL INVADIDO POR POSSEIROS. ART. 12, VI, DA LEI N. 8.629/1993. CÁLCULO DA JUSTA INDENIZAÇÃO QUE DEVE LEVAR EM CONTA A ANCIANIDADE DAS POSSES.

1. Nos termos do que decidido pelo Plenário do STJ, "[a]os recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2).

2. "O art. 12, IV, da Lei 8.629/1993 é peremptório ao indicar a posse e sua ancianidade como fatores de depreciação a serem observados pelo julgador" (EDcl no AgRg no Ag 1.228.051/MA, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 4/3/2011).

Outros Precedentes: Relatora Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 17/8/2010; e AgRg no REsp 974.150/RO, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 10/2/2010.

3. Agravo regimental não provido.

(AgRg no REsp n. 1.304.619/PA, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 13/9/2016, DJe de 22/9/2016.)

PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. NULIDADE. OMISSÃO. ALEGAÇÃO GENÉRICA. SÚMULA 284/STF. VALOR INDENIZATÓRIO. ESBULHO. ANCIANIDADE DA POSSE. DEPRECIAÇÃO. IMPOSIÇÃO LEGAL.

1. É deficiente a fundamentação do recurso especial em que a alegada ofensa ao art. 535 do CPC/1973 se faz sem a demonstração objetiva dos pontos omitidos pelo acórdão combatido, individualizando o erro, a obscuridade, a contradição ou a omissão supostamente ocorridos, bem como sua relevância para a solução da controvérsia apresentada nos autos. Incidência analógica da Súmula 284/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."

2. A ancianidade das invasões deve ser considerada para depreciação do valor indenizatório, por força de imposição legal.

3. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido.

(REsp n. 1.297.461/PA, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 3/5/2018, DJe de 9/5/2018.)

A questão deve ser examinada, ainda, sob a ótica do conceito de "justa indenização", consagrado nos arts. 5º, XXIV e 184, da Constituição Federal de 1988, e nos arts. 5º e 12, da Lei nº 8.629/1993. Deve-se considerar como justa a indenização que corresponda ao preço atual de mercado do imóvel, valor este que se revele suficiente para que o expropriado possa adquirir outra propriedade nas mesmas condições daquela que lhe foi desapropriada. Dessa forma, a lei considera que o proprietário expropriado terá sido justamente indenizado se vier a receber pelo imóvel valor equivalente àquele que seria obtido no mercado imobiliário da região, observada a lei da oferta e da procura. Cuida-se de receber, dos Cofres Públicos, aquele mesmo montante que o proprietário receberia, caso estivesse negociando com particulares por meio de um contrato de compra e venda. Garante-se, com isso, a justa indenização.

Ora, no caso dos autos, o valor atual de mercado do imóvel deve, necessariamente, levar em conta o fato de que o mesmo se encontra há bastante tempo invadido por posseiros, sendo este um robusto fator de desvalorização da área. Observada a lei da oferta e da procura é fácil perceber que, caso o proprietário estivesse negociando com particulares, receberia um preço bastante inferior aos R$ 41.380.973,38 (quarenta e um milhões, trezentos e oitenta mil, novecentos e setenta e três reais e trinta e oito centavos) a que chegou o perito judicial sem levar em conta o fator ancianidade. 

O fundamento supra, ademais, torna insubsistente o argumento de que a Administração Pública, quando editou o Decreto expropriatório, já estava ciente das invasões, tendo sido, na verdade, motivada justamente pela intenção de regularizá-las. Isso é assim pois, como se viu, tais considerações não interferem no conceito de justa indenização, o qual deve ser buscado em razão do valor atual de mercado do imóvel, observada a lei da oferta e da procura.

Da mesma forma, a circunstância de que as invasões mencionadas sempre foram combatidas pela proprietária do imóvel expropriado por meio de ações de reintegração de posse propostas perante a Justiça Estadual, o que lhe trouxe gastos, também não produz reflexo no conceito de justa indenização. Na realidade, essas despesas em que incorreu a empresa na tentativa de reintegrar-se na posse das áreas ocupadas podem, em tese, caracterizar eventuais perdas e danos, tal como definidos pelo art. 402 do CC. O ressarcimento desses possíveis danos emergentes e lucros cessantes, contudo, escapa ao objeto da presente ação desapropriatória, na qual a discussão só pode versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta, nos termos do art. 20 do Decreto-Lei nº 3.365/1941.

Assim, diante da comprovação da existência de ancianidade da posse, prevista no art. 12, IV, da Lei nº 8.629/1993, deve ser reformada a sentença neste ponto, de modo a que seja aplicado esse fator legal de depreciação do valor da indenização, em sendo necessário, com  complementação da perícia, a fim de quantificar esse fator de depreciação, o qual não foi levado em conta no laudo pericial original. 

Prosseguindo, tem-se que diante da discordância em relação à importância a ser paga a título de indenização, foi determinada a realização de perícia técnica, que resultou na elaboração do laudo apresentado sob IDs 252001082 e 252001094, atribuindo à área de terreno objeto desta ação o valor indenizatório de R$ 41.380.973,38 (quarenta e um milhões, trezentos e oitenta mil, novecentos e setenta e três reais e trinta e oito centavos), apurada na data da imissão na posse.

A parte apelante, insatisfeita com a prova técnica produzida, alega que a pesquisa de mercado foi feita de maneira equivocada, pois o método de avaliação se encontra errado, pois foi utilizado o método involutivo, quando o correto seria o método comparativo direto, tendo em vista que se trata de área de exploração agrícola com o cultivo de olerícolas muito comum no município de Mogi das Cruzes e municípios circunvizinhos.

É certo que o magistrado não está vinculado às conclusões do perito. Nesse sentido, dispõe o art. 479 do CPC/2015 que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com base em outros elementos ou fatos provados nos autos. Ocorre que, no caso concreto, o Juízo “a quo”, no exercício do seu livre convencimento motivado (art. 371 do CPC/2015), houve por bem adotar a conclusão a que chegou o laudo pericial produzido nestes autos, o qual, por sua vez, encontra-se embasado no denominado Método Involutivo, definido pelo IBAPE (Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias), da seguinte forma: “O método involutivo deve ser empregado quando não houver mínimas condições de utilização do método comparativo direto. Trata-se de um critério indireto de valoração de uma gleba ou terreno de grandes dimensões considerando seu aproveitamento por meio de subdivisão de área maior em lotes menores”.

É importante notar, ademais, que o perito judicial fundamentou adequadamente a utilização do método involutivo, manifestando-se no sentido de que: (...) “Para a aplicação do método comparativo direto de ofertas de mercado, se faz necessária a que os elementos utilizados tenham localização assemelhadas ao avaliando. Deve ser considerada dimensão, localização, circunvizinhança, distanciamento do perímetro urbano, tudo conforme já relatado anteriormente. Para a busca destes imóveis, foram contatadas, imobiliárias de renome e idôneas na região a exemplo: Imobiliária Kiyokawa – Sr. Edson –responsável pelo setor de vendas - tel. 4728.7700; Cidade Imóveis – Sr. Cury - proprietário – tel. 4726.2044, dentre outras, as quais em consulta a seus arquivos, não localizaram “áreas/ofertas” no intervalo de 06 (seis) meses antes e depois da efetiva imissão na posse - referência junho de 2014 e que se assemelhassem ao avaliando. (...) Foram consultados ainda profissionais Peritos/Avaliadores que atuam nas varas federais e estaduais desta comarca, em busca de trabalhos elaborados à época que contemplem a região do imóvel avaliando, os quais não efetuaram qualquer trabalho avaliativo naquela região ou em sua proximidade, no período informado. (...) A área expropriada atinge grandes proporções, situação que dificulta o atendimento a norma técnica, em se ter um número seguro de elementos úteis a avaliação, atenuante sobre o aspecto quantitativo. Só pelo exposto acima, o Método Comparativo Direto, já se apresentaria ineficaz a apresentar um resultado seguro, pela heterogeneidade dos elementos. (...) Portanto, por todo o exposto só nos resta afirmar que a aplicação do METODO COMPARATIVO DE DADOS DE MERCADO, no caso em tela, seria um grande equívoco, seu resultado não refletiria a realidade do mercado e a rigor comprometendo o princípio básico da justa indenização (...)”.

As partes, por sua vez, não informaram a existência de nenhum imóvel similar existente no Município de Mogi das Cruzes/SP que pudesse ser tomado como paradigma para a utilização do Método Comparativo. Também salientou o perito a impossibilidade de utilizar como parâmetro amostras de outros Municípios: “(...) A cidade de Mogi das cruzes é caracterizada por atividades diversas: hortaliças, plantações de caqui, reflorestamentos e granjas, boa parte destas em processos de desativação ou já desativada. A região do avaliando tem como características consolidadas antes mesmo da imissão na posse, de loteamentos, plantações de hortaliças (característica da área avalianda somente), extração de minérios, aspectos que não podem ser desconsiderados na escolha das amostras. O erro que se acumularia na utilização de amostras de outros municípios, distritos e bairros com características distintas, e nada semelhantes ao avaliando, quer seja em: Nordeste: Biritiba Mirim (distante 19 km), Guararema (distante 26 km), Salesópolis (distante 41 km), Sudeste: Biritiba Ussú (distante 14 km), Noroeste: Arujá (distante 19 km), à Oeste: Suzano (distante 6 Km), considerando que o marco zero da Capital está à 40 Km, distancias estas medidas em linha reta até a área. A utilização de amostras de outras regiões geoeconômicas, no município, melhor sorte não se administra, considerada sua localização, ainda nos confrontamos com as dimensões das áreas, sendo Mogi das Cruzes servida em grande parte do seu território de pequenas e médias propriedades, as poucas propriedades com grandes áreas produtivas, não estão disponíveis no mercado imobiliário, nem agora, nem em 2014. (...)”.

Deste modo, tratando-se de caso em que não há elementos semelhantes ou assemelhados suficientes, mostra-se adequada a utilização do Método Involutivo, por estar suficientemente fundamentado e amparado pela Norma de Avaliações do IBAPE.

Registre-se, ainda, não haver razões para que o criterioso trabalho técnico apresentado não seja acolhido para fins de determinação do valor da indenização, notadamente quando a motivação adotada na sentença está de acordo com as diretrizes legais acerca do tema. A mera discordância do apelante, quanto ao valor da indenização acolhido pela sentença, não justifica seja desconsiderado o laudo pericial produzido por perito imparcial, tecnicamente qualificado e que conta com a confiança do juízo, em prol do parecer divergente oferecido por uma das partes interessadas na solução da lide.

No que concerne aos consectários legais, a controvérsia existente nos autos diz respeito às hipóteses em que terá lugar a incidência de juros compensatórios.

Sobre o tema, destaco que a incidência de juros compensatórios nas desapropriações encontra disciplina no art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941 (incluído pela mesma MP nº 2.183/2001), transcrito a seguir para melhor compreensão de sua finalidade:

Art. 15-A No caso de imissão prévia na posse, na desapropriação por necessidade ou utilidade pública e interesse social, inclusive para fins de reforma agrária, havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem, fixado na sentença, expressos em termos reais, incidirão juros compensatórios de até seis por cento ao ano sobre o valor da diferença eventualmente apurada, a contar da imissão na posse, vedado o cálculo de juros compostos.  

§ 1º Os juros compensatórios destinam-se, apenas, a compensar a perda de renda comprovadamente sofrida pelo proprietário.  

§ 2º Não serão devidos juros compensatórios quando o imóvel possuir graus de utilização da terra e de eficiência na exploração iguais a zero.                     

§ 3º O disposto no caput deste artigo aplica-se também às ações ordinárias de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bem assim às ações que visem a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público, em especial aqueles destinados à proteção ambiental, incidindo os juros sobre o valor fixado na sentença.

Conforme se extrai do dispositivo acima, para que sejam devidos juros compensatórios, deverão estar preenchidos os seguintes requisitos: 1) imissão prévia (provisória) do expropriante na posse do imóvel; 2) graus de utilização (potencial para ser explorado) e de eficiência na exploração (efetivo aproveitamento) do imóvel superiores a zero; 3) comprovação da perda de renda sofrida pelo proprietário; 4) o reconhecimento, pela sentença, de que o valor inicialmente ofertado pelo expropriante é insuficiente para a reparação, fazendo com que o expropriado ficasse privado, ainda que parcialmente, da justa e prévia indenização no período entre a perda da posse (termo inicial) e o efetivo recebimento.

Vale dizer que se a indenização ocorresse de forma prévia à perda da posse, e em quantia justa, suficiente para recompor integralmente o prejuízo decorrente da retirada do bem da esfera patrimonial do expropriado, não haveria que se falar em posterior compensação pela privação do bem. Do contrário, a impossibilidade do exercício dos atributos da propriedade pelo expropriado a partir da imissão do expropriante na posse do imóvel, sem a simultânea e integral indenização, faz nascer o direito à percepção, por meio dos juros compensatórios, da reparação pelo proveito econômico injustamente inviabilizado.

Criação pretoriana, materializada a partir da aprovação pelo E.STF, em 13/12/1963, da Súmula 164, (“no processo de desapropriação, são devidos juros compensatórios desde a antecipada imissão de posse, ordenada pelo juiz, por motivo de urgência”), os juros compensatórios sempre ensejaram discussões acerca de sua natureza e finalidade. Inicialmente destinado a recompor o valor da indenização, afeiçoando-se mais à correção monetária, em seu papel de preservação do poder de compra da moeda, teve sua incidência ampliada a tal ponto de suscitar ainda discussões sobre seu potencial para a reparação de lucros cessantes e danos emergentes.

Atualmente, entendo defensável a tese de que, se o valor correspondente à perda de renda a que se refere o §1º, do art. 15-A, fosse obtido mediante apuração na própria fase instrutória do processo de desapropriação, de modo que a indenização fixada na sentença já compreendesse a integralidade da reparação devida ao expropriado (incluídos lucros cessantes e danos emergentes), bastaria a incidência de juros moratórios sobre a diferença entre a oferta inicial e o montante reconhecido na sentença, desde a imissão prévia na posse, para que a reparação, pelo período em que o poder público permaneceu na posse do bem sem a justa e prévia indenização, se desse em conformidade com o princípio imposto pelo art. 5º, XXIV, da Constituição. Com isso estaria reparada, até com maior grau de precisão, a integralidade da indenização que se buscou por meio do percentual fixo estabelecido a título de juros compensatórios. Aliás, não sendo essa a sistemática adotada em nosso ordenamento, é possível vislumbrar situações em que a aplicação do art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, ensejaria dupla reparação para uma mesma causa, notadamente quando determinado prejuízo já integrou a avaliação realizada em juízo, e ainda assim comporá a base de cálculo dos juros compensatórios.

De toda sorte, o critério positivado a ser observado permite duas situações possíveis dentro das condições por ele estabelecidas. Na primeira, a imissão prévia da Administração na posse do imóvel vem acompanhada de oferta de valor aceito pelo expropriado ou reconhecido como correto pela sentença; nesse caso, não incidirão juros compensatórios. Na segunda, a imissão na posse ocorre mediante oferta considerada insuficiente pela sentença; nessa hipótese serão devidos juros compensatórios sobre a diferença do valor reconhecido pela sentença e o ofertado pela Administração, desde a imissão na posse.

Lembro que em razão da limitação do levantamento, pelo expropriado, de até 80% da oferta inicial, imposta pelo art. 33, §2º, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, incidirão juros compensatórios sobre os 20% que permaneceram inacessíveis, mesmo se a sentença considerar correta a indenização oferecida pelo expropriante (salvo no caso de levantamento integral autorizado pelo art. 34-A, do mesmo ato normativo). O motivo, conforme visto anteriormente, é justamente a privação do acesso à indenização integral, pelo expropriante, antes da perda da posse.

Sobre a taxa a ser aplicada a título de juros compensatórios, destaco que antes mesmo da atual conformação normativa, sua incidência já ocorria na proporção de 6% ao ano, em referência aos juros previstos no art. 1.062, do Código Civil/1916. Em razão dos índices inflacionários dos anos 1980, o E.STF entendeu por aumentar os juros compensatórios para 12% ao ano, conforme a Súmula 618, de 1984 (“Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano”). Em 11/06/1997, com o art. 3º da Medida Provisória nº 1.577, os juros compensatórios voltaram a ser de 6% ao ano sobre o valor da diferença eventualmente apurada entre o depósito ofertado e o valor total da indenização, a contar da imissão na posse, o que foi mantido pelo art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941 (observadas as disposições da MP nº 1.774-22/1999, depois alteradas pela MP 1.901-30/1999, com sucessivas reedições, até a MP nº 2.183/2001), com a seguinte redação atual:

Art. 15-A No caso de imissão prévia na posse, na desapropriação por necessidade ou utilidade pública e interesse social, inclusive para fins de reforma agrária, havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem, fixado na sentença, expressos em termos reais, incidirão juros compensatórios de até seis por cento ao ano sobre o valor da diferença eventualmente apurada, a contar da imissão na posse, vedado o cálculo de juros compostos.

§ 1º Os juros compensatórios destinam-se, apenas, a compensar a perda de renda comprovadamente sofrida pelo proprietário.

§ 2º Não serão devidos juros compensatórios quando o imóvel possuir graus de utilização da terra e de eficiência na exploração iguais a zero.

§ 3º O disposto no caput deste artigo aplica-se também às ações ordinárias de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bem assim às ações que visem a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público, em especial aqueles destinados à proteção ambiental, incidindo os juros sobre o valor fixado na sentença.

Note-se que na ADI 2.332/DF, o E.STF deferiu liminar (em 13/09/2001) para suspender a eficácia da expressão “de até seis por cento ao ano”, contida no caput do art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, dando ainda interpretação conforme a Constituição ao dispositivo para estipular, como base de cálculo da incidência dos juros compensatórios, a diferença entre os 80% do preço ofertado (valor cujo levantamento, pelo expropriado, está autorizado pelo art. 33, §2º, do Decreto-Lei nº 3.365/1941) e o montante fixado na sentença. Na mesma oportunidade, o E.STF suspendeu a eficácia dos referidos §§ 1º e 2º do art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, já na redação conferida pela MP nº 2.207-43/2000, reeditada até a MP nº 2.183-56/2001. Tratando-se de decisão com efeitos ex nunc, foram preservados os juros de 6% no período compreendido entre 11/06/1997 (MP 1.577/1997) e 13/09/2001 (publicação da liminar na ADI 2.332/DF), voltando a incidir, a partir de então, à taxa de 12% ao ano.

Ocorre que o E.STF mudou seu entendimento no julgamento definitivo da ADI 2.332/DF, como se nota nesta transcrição:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REGIME JURÍDICO DOS JUROS COMPENSATÓRIOS E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NA DESAPROPRIAÇÃO. PROCEDÊNCIA PARCIAL.

(...)

2. É constitucional o percentual de juros compensatórios de 6% (seis por cento) ao ano para a remuneração do proprietário pela imissão provisória do ente público na posse do seu bem, na medida em que consiste em ponderação legislativa proporcional entre o direito constitucional do proprietário à justa indenização (art. 5º, XXIV, CF/88) e os princípios constitucionais da eficiência e da economicidade (art. 37, caput, CF/88).

3. Declaração da inconstitucionalidade do termo “até” e interpretação conforme a Constituição do caput do art. 15-A, de maneira a incidir juros compensatórios sobre a diferença entre 80% do preço ofertado pelo ente público e o valor fixado na sentença.

4. Constitucionalidade dos §§ 1º, 2º e 4º, do art. 15-A, do Decreto-lei nº 3.365/1941, ao determinarem a não incidência dos juros compensatórios nas hipóteses em que (i) não haja comprovação de efetiva perda de renda pelo proprietário com a imissão provisória na posse (§ 1º), (ii)   o imóvel tenha “graus de utilização da terra e de eficiência na exploração iguais a zero” (§ 2º), e (iii) sobre o período anterior “à aquisição da propriedade ou posse titulada pelo autor da ação”. Voto reajustado para expressar o entendimento da maioria.

5. É constitucional a estipulação de parâmetros mínimo e máximo para a concessão de honorários advocatícios, previstos no § 1º, do art. 27, do Decreto-lei nº 3.365/1941.

6. Declaração da inconstitucionalidade da expressão “não podendo os honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais)” por inobservância ao princípio da proporcionalidade e por possibilitar violação reflexa ao justo preço na indenização do expropriado (art. 5º, XXIV, CF/88).

7. Ação direta julgada parcialmente procedente. Fixação das seguintes teses:

“(i) É constitucional o percentual de juros compensatórios de 6% (seis por cento) ao ano para a remuneração pela imissão provisória na posse de bem objeto de desapropriação;

(ii) A base de cálculo dos juros compensatórios em desapropriações corresponde à diferença entre 80% do preço ofertado pelo ente público e o valor fixado na sentença;

(iii) São constitucionais as normas que condicionam a incidência de juros compensatórios à produtividade da propriedade;

(iv) É constitucional a estipulação de parâmetros mínimo e máximo para a concessão de honorários advocatícios em desapropriações, sendo, contudo, vedada a fixação de um valor nominal máximo de honorários.”

ADI 2332, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 17/05/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-080 DIVULG 15-04-2019 PUBLIC 16-04-2019)

Importante registrar, nesse mesmo diapasão, que o E. STF, ao apreciar embargos declaratórios interpostos em face do acórdão supra, rejeitou expressamente a tese da modulação dos efeitos da declaração de constitucionalidade do percentual de 6% ao ano a título de juros compensatórios em caso de imissão provisória na posse do bem objeto da desapropriação. Confira-se a ementa do julgado:

Ementa: Direito Administrativo. Embargos de Declaração em Ação Direta. Juros Compensatórios e o Honorários Advocatícios na Desapropriação. Procedência parcial. 1. Embargos de declaração em que se postula (i) a correção de erro material constante da ementa da ADI 2332; (ii) a modulação dos efeitos da declaração de constitucionalidade do art. 15-A do Decreto-Lei nº 3.365/1941; e (iii) a atribuição de efeitos infringentes para que se declare a inconstitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 15-A e do § 1º do art. 27 do Decreto-Lei 3.365/41. 2. O item 4 da ementa do acórdão embargado possui erro material passível de correção em sede de embargos. De fato, esta Corte declarou a inconstitucionalidade do § 4º do art. 15-A do Decreto-Lei nº 3.365/1941. Ocorre que consta da ementa do julgado a declaração de sua constitucionalidade, em desconformidade com a decisão do plenário e da ata de julgamento. 3. A modulação de efeitos em declaração de constitucionalidade é medida excepcional e restrita a hipóteses específicas, o que não ocorre no presente caso. Ademais, a atribuição de efeitos ex tunc possui três finalidades: (i) reparar injustiças históricas; (ii) evitar enriquecimento sem causa dos expropriados; e (iii) aliviar o ônus imposto aos entes expropriantes. 4. Em relação aos pedidos de efeitos infringentes, ainda que a embargante discorde das conclusões alcançadas pelo Tribunal, não pode pretender revê-las por meio de embargos de declaração. A via recursal adotada não se mostra adequada para, a pretexto de correção de inexistentes vícios internos do acórdão proferido, postular a renovação de julgamento que transcorreu de maneira hígida e regular. Precedentes. 5. Embargos de declaração parcialmente providos, sem efeitos modificativos, a fim de incluir o seguinte dispositivo na ementa: “Declaração da inconstitucionalidade do § 4º, do art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, de modo a incidir juros compensatórios sobre o período anterior à aquisição da propriedade ou posse titulada pelo autor da ação”.
(ADI 2332 ED, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 18-10-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 09-01-2023  PUBLIC 10-01-2023) 

Portanto, em vista das teses vinculantes fixadas nessa ADI 2332, o C.STF reafirmou o conteúdo da Súmula 164, mas reviu a Súmulas 618 (acima transcritas), sobrepondo-se à Súmula 408 do E.STJ (“Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória 1.577 de 11.06.1997 devem ser fixados em 6% ao ano até 13/09/2001 e a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula 618 do Supremo Tribunal Federal”). A propósito, a Tese fixada no Tema 126 do E.STJ, que refletia o enunciado da Súmula 408 da mesma corte extrema, foi readequada, por ocasião do julgamento da Pet. 12.344/DF, em 28/10/2020, passando a figurar com a seguinte redação: “O índice de juros compensatórios na desapropriação direta ou indireta é de 12% até 11.6.97, data anterior à publicação da MP 1577/97”.

No caso dos autos, partindo-se da premissa assentada pelo C. STF, de que “são constitucionais as normas que condicionam a incidência de juros compensatórios à produtividade da propriedade”, tenho que deve ser confirmada a sentença, também quanto à aplicação dos juros compensatórios.

De fato, encontra-se comprovado nos autos que o imóvel expropriado tem certo grau de produtividade, como se nota do laudo pericial que serviu de base para a sentença (ID 252001102, fls. 6 e ID 252001109, fls. 6/7).

Acrescente-se que, em sede de desapropriação para fins de reforma agrária, a exclusão dos juros compensatórios somente se justifica caso se trate de imóvel improdutivo, circunstância não verificada na espécie dos autos, em que o imóvel desapropriado é comprovadamente produtivo. Nessa linha, julgado do C. STJ:

PROCESSUAL CIVIL. DEVOLUÇÃO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM PARA REALIZAÇÃO DE NOVO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE EM CONFORMIDADE COM O DECIDIDO EM RECURSO ESPECIAL REPETITIVO OU EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO SUBMETIDO À REPERCUSSÃO GERAL.

I - Verifica-se que o recurso especial aborda também a questão da incidência de juros compensatórios nas desapropriações para fins de reforma agrária, tema esse que, entre outros, foi objeto de julgamento de mérito pelo Supremo Tribunal Federal na apreciação da ADI n. 2.332/DF, em 17/5/2018, no qual se firmou o entendimento da constitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 15-A do Decreto Lei n. 3.365/1941, ao argumento de que os juros compensatórios só são devidos para compensar a perda de renda comprovada, não incidindo, portanto, sobre imóvel improdutivo.

(...)

(AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.286.162/MT, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 28/9/2020, DJe de 30/9/2020.)

Dessa forma, tratando-se de imóvel produtivo, não há se falar em afastamento dos juros compensatórios.

Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INCRA e ao reexame necessário, para que seja aplicado a ancianidade da posse (art. 12, IV, da Lei nº 8.629/1993) como fator de depreciação do valor da indenização, na forma da fundamentação supra. 

Mantenho a verba honorária tal como fixada na sentença, haja vista a previsão contida no art. 27, §3º, I, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, incluída pela MP nº 2.138/2001, cujos efeitos se prolongam por força do art. 2º da EC nº 32/2001, sobrepondo-se, portanto ao limite estabelecido pelo art. 19, da LC nº 76/1993.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL PARA REFORMA  AGRÁRIA. AVALIAÇÃO. ART. 12, IV, DA LEI Nº 8.629/1993. INVASÃO. POSSEIROS. ANCIANIDADE. LAUDO PERICIAL. CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO. MÉTODO INVOLUTIVO. POSSIBILIDADE. JUROS COMPENSATÓRIOS. PROPRIEDADE PRODUTIVA. APLICAÇÃO

- A razão de ser do art. 12, IV, da Lei nº 8.629/1993 é que a existência de posseiros na área e a ancianidade dessas posses (vale dizer, o tempo decorrido desde a invasão) podem configurar a usucapião, custos, duração e esforços para a retirada dos invasores, repercutindo negativamente no preço de mercado do imóvel e em comparações com outra outra gleba que não sofreu nenhum tipo de turbação. É presumível que poucas serão as pessoas interessadas em adquirir um imóvel invadido por posseiros, circunstância que, necessariamente, faz cair o preço de mercado da propriedade rural, especialmente (como no caso dos autos) quando as posses contam com mais de ano e dia, situação em que eventuais ações possessórias, de "força velha", sequer contarão com a possibilidade de concessão da medida liminar de reintegração de posse prevista nos arts. 558 e 562 do CPC. 

- A questão deve ser examinada, ainda, sob a ótica do conceito de "justa indenização", consagrado nos arts. 5º, XXIV e 184, da Constituição de 1988, e nos arts. 5º e 12, da Lei nº 8.629/1993. Deve-se considerar como justa a indenização que corresponda ao preço atual de mercado do imóvel, valor este que se revele suficiente para que o expropriado possa adquirir outra propriedade nas mesmas condições daquela que lhe foi desapropriada. Dessa forma, a lei considera que o proprietário expropriado terá sido justamente indenizado se vier a receber pelo imóvel valor equivalente àquele que seria obtido no mercado imobiliário da região, observada a lei da oferta e da procura. Cuida-se de receber, dos Cofres Públicos, aquele mesmo montante que o proprietário receberia, caso estivesse negociando com particulares por meio de um contrato de compra e venda.

- No caso dos autos, o valor atual de mercado do imóvel deve, necessariamente, levar em conta o fato de que o mesmo se encontra há bastante tempo invadido por posseiros, sendo este um robusto fator de desvalorização da área. Observada a lei da oferta e da procura é fácil perceber que, caso o proprietário estivesse negociando com particulares, receberia um preço bastante inferior aos R$ 41.380.973,38 (quarenta e um milhões, trezentos e oitenta mil, novecentos e setenta e três reais e trinta e oito centavos) a que chegou o perito judicial sem levar em conta o fator ancianidade. 

- Assim, diante da comprovação da existência de ancianidade da posse, prevista no art. 12, IV, da Lei nº 8.629/1993, deve ser reformada a sentença neste ponto, de modo a que seja aplicado esse fator legal de depreciação do valor da indenização. Caso o MM Juízo de 1º Grau entenda necessário, poderá ser determinada a complementação da perícia, a fim de quantificar esse fator de depreciação, o qual não foi levado em conta no laudo pericial original. 

- O laudo pericial encontra-se embasado no Método Involutivo, empregado quando não houver mínimas condições de utilização do método comparativo direto, de modo que se revela como critério indireto de valoração de uma gleba ou terreno de grandes dimensões considerando seu aproveitamento por meio de subdivisão de área maior em lotes menores. O perito judicial fundamentou adequadamente a utilização do método involutivo.

- Em vista das teses vinculantes fixadas na ADI 2332, o C.STF reafirmou o conteúdo da Súmula 164, mas reviu a Súmulas 618, sobrepondo-se à Súmula 408 do E.STJ (“Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória 1.577 de 11.06.1997 devem ser fixados em 6% ao ano até 13/09/2001 e a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula 618 do Supremo Tribunal Federal”). A propósito, a Tese fixada no Tema 126 do E.STJ, que refletia o enunciado da Súmula 408 da mesma corte extrema, foi readequada, por ocasião do julgamento da Pet. 12.344/DF, em 28/10/2020, passando a figurar com a seguinte redação: “O índice de juros compensatórios na desapropriação direta ou indireta é de 12% até 11.6.97, data anterior à publicação da MP 1577/97”.

- No caso dos autos, partindo-se da premissa assentada pelo C. STF, de que “são constitucionais as normas que condicionam a incidência de juros compensatórios à produtividade da propriedade”, deve ser confirmada a sentença, também quanto à aplicação dos juros compensatórios porque encontra-se comprovado nos autos que o imóvel expropriado tem certo grau de produtividade, como se nota do laudo pericial que serviu de base para a sentença.

- Acrescente-se que, em sede de desapropriação para fins de reforma agrária, a exclusão dos juros compensatórios somente se justifica caso se trate de imóvel improdutivo, circunstância não verificada na espécie dos autos, em que o imóvel desapropriado é comprovadamente produtivo.

- Apelação e remessa necessária providas em parte.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e ao reexame necessário, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
CARLOS FRANCISCO
DESEMBARGADOR FEDERAL