Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5011791-16.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: SKY TECHNOLOGY INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS ELETRONICOS EIRELI - EPP

Advogados do(a) AGRAVANTE: BRUNO SCHOUERI DE CORDEIRO - SP238953-A, MAYARA NOVAES MENDES DA SILVA - SP332277-A, VIVIANE SIQUEIRA LEITE - SP218191-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5011791-16.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: SKY TECHNOLOGY INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS ELETRONICOS EIRELI - EPP

Advogados do(a) AGRAVANTE: BRUNO SCHOUERI DE CORDEIRO - SP238953-A, MAYARA NOVAES MENDES DA SILVA - SP332277-A, VIVIANE SIQUEIRA LEITE - SP218191-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por SKY TECHNOLOGY INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE PRODUTOS ELETRONICOS EIRELI contra decisão proferida nos autos de execução fiscal movida pela União Federal.

Sustenta a parte agravante, em síntese, a impenhorabilidade da quantia inferior a quarenta salários mínimos, inclusive no que diz respeito às pessoas jurídicas. Ressalta a probabilidade do direito e o risco de dano. Este último consiste no prejuízo  à atividade empresarial e ao pagamento de empregados e fornecedores, bem como no risco de novas constrições. 

Foi proferida decisão que indeferiu pedido de antecipação de tutela recursal.

Foram apresentadas contrarrazões.

É o relatório.

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5011791-16.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: SKY TECHNOLOGY INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS ELETRONICOS EIRELI - EPP

Advogados do(a) AGRAVANTE: BRUNO SCHOUERI DE CORDEIRO - SP238953-A, MAYARA NOVAES MENDES DA SILVA - SP332277-A, VIVIANE SIQUEIRA LEITE - SP218191-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO:   

No presente caso, nenhuma das partes trouxe qualquer argumento apto a infirmar o entendimento já manifestado na decisão que apreciou o pedido de atribuição de antecipação de tutela recursal.

Passo a transcrever os fundamentos da decisão por mim lavrada:

Dispondo sobre a cobrança judicial da dívida ativa da administração pública direta e indireta, a Lei nº 6.830/1980 se assenta em vários objetivos legítimos que forçam o cumprimento de obrigações pecuniárias pelo devedor, dentre eles as finalidades fiscais e extrafiscais de tributos, a observância de regramentos de administrativos e a imperatividade da legislação vigente em áreas de interesse socioeconômico.

O objeto da ação de execução fiscal é o montante em dinheiro não pago pelo devedor a tempo e modo (art. 2º da Lei nº 6.830/1980), compreendendo tanto dívidas ativas tributárias (e respectivas multas) e quanto a dívidas ativas não tributárias (demais créditos da Fazenda Pública, tais como multa de qualquer origem ou natureza, foros, laudêmios, aluguéis ou taxas de ocupação, FGTS, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, etc.). 

Essas dívidas fiscais estão devidamente anotadas em registros públicos, e são dotadas de liquidez e certeza nos moldes constantes do título executivo extrajudicial manuseado, motivo pelo qual o executado não é surpreendido pela execução fiscal. Há sempre medidas antecedentes à propositura da ação executiva, à disposição do conhecimento do devedor, começando pelo surgimento da própria obrigação e de suas inerentes responsabilidades (do credor e do devedor), passando por medidas de formalização de quantitativos (p. ex., DCTFs, GFIPs, e obrigações tributárias acessórias atribuídas pela lei a contribuintes, e autos de infração lavrados pela administração pública), chegando à inscrição nos registros de dívida ativa.

Mesmo tendo como finalidade a satisfação do direito do credor-exequente, as medidas forçadas não podem ser adotadas a qualquer custo, devendo respeitar o modo menos gravoso para o devedor-executado. Porém, a menor onerosidade quanto ao devedor-executado deve ser também contextualizada com a efetividade da medida alternativa àquela mais gravosa, sob pena de serem relegados os válidos interesses do credor-exequente. 

Assim, a compreensão jurídica da menor onerosidade deve ser construída na área de convergência entre os interesses legítimos do credor e a excessiva privação do patrimônio e das atividades do devedor, daí significando que, havendo diversos meios executivos igualmente eficientes, deve-se trilhar aquele que implique em menor sacrifício para o devedor.

No âmbito da menor onerosidade é também imprescindível considerar as determinações legais, sobre o que emerge a ordem de preferência de bens penhoráveis e os instrumentos para as correspondentes efetivações. 

Sobre a ordem de bens penhoráveis, tratando-se de execuções fiscais, o critério da especialidade induz à aplicação preferencial da lista fixada pelo art. 11 da Lei nº 6.830/1980, mas porque é necessário que fontes normativas dialoguem entre si, excepcionalmente, e possível impor a ordem descrita no art. 835 do Código de Processo Civil (não obstante se trate de diploma normativo geral, ainda que posterior à lei de execuções fiscais).

De todo modo, para o que importa a este feito, tanto o art. 11 da Lei nº 6.830/1980 quanto o art. 835 do Código de Processo Civil partem do dinheiro como o primeiro item a ser penhorado, dada sua intrínseca liquidez. O termo “dinheiro” deve ser compreendido como moeda escritural (saldos em instituições financeiras) ou manual (na espécie em papel ou metálica), alcançando aplicações múltiplas (fundos de investimentos, p ex.). 

Sobre os instrumentos para a efetivação da penhora, meios eletrônicos para localizar recursos financeiros (em conta corrente, aplicações em bancos etc.) são legítimos para a constrição dos mesmos objetos indicados pelo art. 11 da Lei nº 6.830/1980 e pelo art. 835 da lei processual civil. A correta compreensão do contido no art. 837 do Código de Processo Civil e no art. 185-A do Código Tributário Nacional permite a imediata utilização de meios eletrônicos para a penhora de bens nas ordens indicadas no art. 11 da Lei nº 6.830/1980 e no art. 835 da lei processual civil notadamente o dinheiro (primeiro item das listas legais de preferência), inexistindo mácula à menor onerosidade justamente porque essa é a determinação legal para equilibrar os interesses legítimos do credor com os ônus possíveis do devedor.

Por tudo isso, a compreensão jurídica da menor onerosidade não pode comprometer o resultado útil do processo executivo, sendo viáveis meios eletrônicos para a efetivação de penhoras (notadamente o SISBAJUD), em favor da prestação jurisdicional célere e eficaz. Sobre o assunto, confira-se:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. RECUSA DE NOMEAÇÃO À PENHORA DE SEGURO GARANTIA. INOBSERVÂNCIA DA GRADAÇÃO LEGAL PREVISTA NO ARTIGO 11 DA LEI DE EXECUÇÕES FISCAIS. PLEITO DE PENHORA POR MEIO DO SISTEMA BACENJUD.  RECURSO PROVIDO. 1. Não obstante as alterações trazidas pela Lei nº 13.043/14, é uma realidade da vida que o dinheiro e seguro garantia ou fiança não são a mesma coisa e por isso a aceitação destes no lugar daquele só é cabível em situações excepcionais, o que não se verifica "in casu".  2. Do STJ colhe-se que "Esta  Corte  firmou  posicionamento,  em  recurso repetitivo, segundo  o  qual é legítima a recusa ou a substituição, pela Fazenda Pública,  de bem nomeado à penhora em desacordo com a gradação legal prevista  nos  arts.  11 da Lei n. 6.830/80, e 655 do CPC, devendo a parte  executada  apresentar  elementos  concretos que justifiquem a incidência  do  princípio  da menor onerosidade para afastar a ordem legal, não demonstrados na espécie" (AgInt no REsp 1605001/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/10/2016, DJe 25/10/2016). 3. Na gradação do artigo 835 do CPC de 2015 o "dinheiro" figura em primeiro lugar, de modo que o uso do meio eletrônico para localizá-lo é medida "preferencial", como soa o artigo 837 do CPC/2015 inexistindo na lei qualquer condicionamento no sentido de que "outros bens" devem ser perscrutados para fins de constrição "antes" do dinheiro. Precedente: (REsp 1184765/PA, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 03/12/2010). 4. É certo que a execução deve ser feita de modo menos gravoso para o executado; mas isso não quer dizer - ao contrário de "interpretação" que os executados em geral dão ao artigo 805 do CPC/2015 (artigo 620 do CPC/73) - que a execução deve ser "comandada" pelos interesses particulares do devedor. O princípio da menor onerosidade não legitima que o executado "dite as regras" do trâmite da execução. 5. Agravo de instrumento provido.” (TRF3. AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP 5000311-17.2019.4.03.0000. Órgão Julgador: Sexta Turma. Relator: Desembargador Federal Johonson di Salvo. Data do Julgamento: 20/09/2019. Data da Publicação/Fonte: e - DJF3 Judicial 1, 25/09/2019).

 

Indo adiante, a legislação e a jurisprudência procuram evitar imposições excessivas do credor em face do devedor, mas a regra geral é a possibilidade de penhora de bens para o cumprimento de obrigações válidas e legítimas, razão pela qual as hipóteses legais de impenhorabilidade representam exceção e, por isso, devem ser interpretadas restritivamente.

É nesse contexto que emerge a proteção do art. 833, X, e §2º do CPC/2015 (antes, do art. 649, X, e §2º do CPC/1973) é impenhorável a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos, embora esse saldo possa ser penhorado para pagamento de prestação alimentícia (independentemente de sua origem, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, §8º e no art. 529, §3º do mesmo código).

A impenhorabilidade do art. 833, X, do CPC/2015 é extensível a outras modalidades de contas e a moedas em espécie (inclusive estrangeiras, presumindo que terão a mesma função de segurança em infortúnios do devedor e de sua família), mas diz respeito ao saldo total de todas as aplicações financeiras do devedor (e não a cada uma delas), ressalvada ainda a comprovação de má-fé, de abuso de direito ou fraude.

Portanto, em vista da necessária isonomia, são impenhoráveis conta poupança, conta corrente, e outras aplicações financeiras (tais como em fundos de investimento), inclusive papel-moeda mantido pelo devedor, considerado o montante total de até 40 salários mínimos para o conjunto de todos os saldos. Nesse sentido, p.ex., no E.STJ: AgInt no REsp 1886463/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 30/11/2020, DJe 04/12/2020; e AgInt no AREsp 1706667/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/11/2020, DJe 17/11/2020.

Essa impenhorabilidade tem por finalidade proteger a poupança familiar mantida por pessoa física, e por isso não pode ser aplicada em favor de pessoa jurídica. Nesse sentido, trago à colação os seguintes julgados:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. BACENJUD.VALORES DE ATÉ 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. REGRA DA IMPENHORABILIDADE NÃO ALCANÇA, EM REGRA, A PESSOA JURÍDICA. CASO DOS AUTOS. VALOR IRRISÓRIO. DESBLOQUEIO. NÃO CABIMENTO.

(...)

 2. A impenhorabilidade inserida no art. 833, X, do CPC/2015, reprodução da norma contida no art. 649, X, do CPC/1973, não alcança, em regra, as pessoas jurídicas, visto que direcionada a garantir um mínimo existencial ao devedor (pessoa física). Nesse sentido: "[...] a intenção do legislador foi proteger a poupança familiar e não a pessoa jurídica, mesmo que mantenha poupança como única conta bancária" (AREsp 873.585/SC, Rel. Ministro Raul Araújo, DJe 8/3/2017).

 3. Conforme já assentado na decisão monocrática, o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que não se pode obstar a penhora on-line pelo sistema Bacenjud a pretexto de que os valores bloqueados seriam irrisórios.

 4. Agravo Interno não provido.

(AgInt no REsp 1878944/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/02/2021, DJe 01/03/2021)                         

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. BLOQUEIO DE VALORES CONTIDOS EM CONTA CORRENTE. ARTIGO 833, X, CPC. PESSOA JURÍDICA. INAPLICABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.

1. A impenhorabilidade prevista no artigo 833, inciso X, do Código de Processo Civil aplica-se às pessoas físicas, não havendo como ampliar previsão excepcional em favor de pessoa jurídica.

2. Conforme explicitado pelo Superior Tribunal de Justiça, “a intenção do legislador foi proteger a poupança familiar e não a pessoa jurídica, mesmo que mantenha poupança como única conta bancária” (AREsp 873.585/SC, Relator Ministro Raul Araújo, DJe 8/3/2017).

3. Agravo de instrumento desprovido.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5028017-09.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 04/04/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 10/04/2019)                                         

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. BLOQUEIO DE VALORES. HIPÓTESES DE IMPENHORABILIDADE NÃO DEMONSTRADAS. RECURSO IMPROVIDO.

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto por T4E Indústria, Comércio, Importação e Exportação LTDA em face da r. decisão que, em sede de execução fiscal, indeferiu pedido de desbloqueio de valores.

2. Por sua vez, insurge-se a agravante sustentando resumidamente que: (i)- os valores constritos estavam destinado ao adimplemento de folha de salários de funcionários; (ii)- a quantia é impenhorável, tendo em vista que inferior a 40 (quarenta) salários mínimos, nos termos do art. 833, X do CPC. Com tais fundamentos, pede provimento ao recurso para desbloqueio dos valores.

3. Primeiramente, no tocante à alegação de que os valores seriam destinados à folha de pagamento de empregados, não se verifica hipótese de impenhorabilidade nos termos do art. 833, IV do CPC. Precedentes.

4. Ademais, no que concerne à impenhorabilidade do art. 833, X do CPC, entende-se que não se dirige à pessoa jurídica. Precedente.

5. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5032778-49.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 13/08/2020, Intimação via sistema DATA: 20/08/2020)

Quando muito, a impenhorabilidade do art. 833, X, do CPC/2015 seria extensível às pessoas jurídicas em casos excepcionais, em vista de forma societária simplificada e destinada a pequenos empreendimentos (como é o caso do microempreendedor individual-MEI de que trata do art. 18-A da Lei Complementar nº 123/2006).

A respeito da matéria, embora reconheça a excepcional possibilidade de declarar impenhoráveis bem de empresas de porte diminuto, o STJ tem ressaltado, no caso de numerário, a necessidade de demonstração de que os valores constituem a única reserva monetária em nome do devedor ou a comprovação de que os valores são necessários às atividades do empresário.

Confira-se:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATOS BANCÁRIOS. EMBARGOS À PENHORA. IMPENHORABILIDADE DE VALOR DE ATÉ 40 (QUARENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS MANTIDO EM CONTA BANCÁRIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO CARÁTER ESSENCIAL PARA MANUTENÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. FUNDAMENTO INATACADO. SÚMULA 283/STF. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, "reveste-se de impenhorabilidade a quantia de até quarenta salários mínimos poupada, seja ela mantida em papel moeda, conta-corrente ou aplicada em caderneta de poupança propriamente dita, CDB, RDB ou em fundo de investimentos, desde que a única reserva monetária em nome do recorrente, e ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude, a ser verificado caso a caso, de acordo com as circunstâncias do caso concreto (inciso X)" (REsp 1.230.060/PR, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/8/2014, DJe de 29/8/2014).

2. A Corte de origem, analisando o acervo fático-probatório dos autos, concluiu que a recorrente não comprovou que a quantia bloqueada consistia em única fonte de ativos, o que não foi impugnado nas razões do recurso especial.

3. A ausência de impugnação, nas razões do recurso especial, de fundamento autônomo e suficiente à manutenção do acórdão recorrido atrai o óbice da Súmula 283 do STF.

4. Ademais, a alteração do que concluiu o Tribunal de origem, no que se refere à ausência de demonstração de que os valores depositados seriam a única reserva financeira do recorrente, demandaria o revolvimento de suporte fático-probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do que dispõe a Súmula 7 deste Pretório.

5. Agravo interno a que se nega provimento.

(STJ. AgInt no REsp 1833911 / RS. Quarta Turma. Relator:: Ministro RAUL ARAÚJO. Data do Julgamento: 06/02/2020. Data da Publicação/Fonte: DJe 17/02/2020)

 

A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos:

“Pleiteia a executada SKY TECHNOLOGY INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS ELETRONICOS EIRELI - EPP, em ID 321356970, o desbloqueio do valor de R$ 8.353,69, tornado indisponível pelo SISBAJUD, uma vez que se trata de montante impenhorável, nos termos do art. 833, X, do Código de Processo Civil, haja vista que inferior a 40 (quarenta) salários mínimos.

Alega que há posicionamento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no sentido de que é impenhorável até o limite de 40 salários mínimos os valores depositados em qualquer tipo de conta bancária.

FUNDAMENTO E DECIDO.

O pleito formulado pela executada não merece prosperar, senão vejamos.

É certo que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça encontra-se consolidada no sentido de que a impenhorabilidade prevista no inciso X do artigo 833 do Código de Processo Civil deve ser extensiva a todo tipo de conta bancária, seja ela conta corrente, conta poupança, fundo de investimento ou até mesmo dinheiro em espécie, ressalvada apenas quando comprovada má-fé, fraude ou abuso de direito por parte do executado. Não obstante, a hipótese de impenhorabilidade tem como destinatário a pessoa física, visando seu sustento digno e de sua família, revelando o seu caráter alimentar. Vejamos:

AGRAVO  INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VALORES BLOQUEADOS EM CADERNETA  DE  POUPANÇA. IMPENHORABILIDADE.  ART. 649, INCISO X, DO CPC.  ALCANCE. LIMITE DE IMPENHORABILIDADE DO VALOR CORRESPONDENTE A40  (QUARENTA)  SALÁRIOS  MÍNIMOS. MÁ-FÉ NÃO ANALISADA PELO TRIBUNALLOCAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. RECURSO NÃO PROVIDO.1.  "É  possível ao devedor, para viabilizar seu sustento digno e de sua  família,  poupar  valores  sob  a regra da impenhorabilidade no patamar  de  até  quarenta  salários  mínimos,  não  apenas  aqueles depositados  em cadernetas de poupança, mas também em conta-corrente ou em fundos de investimento, ou guardados em papel-moeda."(REsp  1340120/SP,  Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/11/2014, DJe 19/12/2014)

EMENTA: ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. QUANTIA DEPOSITADA DE ATÉ 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. IMPENHORABILIDADE. OBJETIVIDADE. PESSOA JURÍDICA. POSSIBILIDADE. ART. 833, INCISOS IV E X, DO CPC. I. Consoante orientação firmada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça - que estabeleceu novos parâmetros para a interpretação da referida normal legal (art. 649 do CPC/1973) - reveste-se de impenhorabilidade a quantia de até quarenta salários mínimos poupada, seja ela mantida em papel-moeda; em conta-corrente; aplicada em caderneta de poupança propriamente dita ou em fundo de investimentos. II. Considerando a interpretação que foi dada ao art. 833, X, impõe-se a conclusão de que também não mais se faz necessária a investigação e comprovação da origem dos valores mantidos em contas correntes, papel moeda, CDBs, RDBs e fundos de investimento, desde que, somados, não ultrapassem o limite contido no dispositivo legal. Trata-se, pois, de hipótese objetiva de impenhorabilidade, cuja constatação depende exclusivamente da verificação do montante total mantido em depósito. III. Essa orientação, contudo, não se aplica a valores depositados em conta corrente de pessoa jurídica, que, de rigor, não "poupam" recursos para garantir o mínimo necessário à subsistência própria e da família. A regra de impenhorabilidade, prevista no inciso IV do art. 833 do Código de Processo Civil, não lhe aproveita, pois alcança "salários", e não valores depositados em instituição financeira por pessoa jurídica, ainda que ostente a condição de empregadoraIsso porque o ativo financeiro pertence ao titular da conta bancária - e, de rigor, pode ser destinado ao pagamento de despesas de diferentes naturezas (insumos, salários, tributos etc.), entre outros fins -, e não ao seu futuro destinatário, o que afasta o seu caráter alimentar e a possibilidade de equiparação a remuneração de pessoa física. IV. A possibilidade de a constrição judicial acarretar dificuldades financeiras à empresa não implica necessariamente o reconhecimento da impenhorabilidade dos seus ativos financeiros e demais bens, e o requisito do periculum in mora pressupõe o efetivo risco de dano irreparável ou de difícil reparação para autorizar a antecipação dos efeitos da tutela, devendo o temor de lesão ao direito postulado ser evidente, concreto. (TRF4, AG 5025716-91.2020.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 03/11/2020)

 

No caso dos autos, portanto, em se tratando de pessoa jurídica, inaplicável, ainda que por analogia, a hipótese de impenhorabilidade prevista no art. 833, X, do Código de Processo Civil.

Ante o exposto, INDEFIRO o pedido.

Proceda-se à transferência dos valores tornados indisponíveis (ID 319907600), para conta à disposição do Juízo, prosseguindo-se no cumprimento da decisão ID 294443860.

Int.”

No caso dos autos, trata-se de execução fiscal que, na época do ajuizamento (11/2021), tinha valor de R$ 843.108,22

A executada é pessoa jurídica constituída sob a forma de empresa individual de responsabilidade limitada, de pequeno porte.

Em 01/02/2024, foi bloqueado o valor total de R$ 8,353.69  em contas de titularidade da agravante. Com o fim de obter o desbloqueio, a agravada apenas sustentou tratar-se de hipótese de impenhorabilidade, por tratar-se de valor inferior a quarenta salários mínimos.

Há de se considerar, no caso dos autos, que a proteção do art. 833, X, e §2º do CPC/2015 (antes, do art. 649, X, e §2º do CPC/1973) não deve ser aplicada à agravante, pessoa jurídica que não demonstrou a necessidade dos valores para a atividade da empresa, nem que se trata do único ativo da pessoa jurídica. Assim, inviável acolher o argumento de impenhorabilidade, mesmo porque o julgador não pode presumir que toda e qualquer verba é imprescindível para empreendimentos (mesmo porque, saldar dívidas também compõem o horizonte de empresas). 

De rigor, portanto, a manutenção da penhora online efetuada nestes autos.

É verdade que o e.STJ restringiu, recentemente, o alcance da impenhorabilidade do art. 833, X, e §2º do CPC/2015, de modo que é impenhorável o montante equivalente até 40 salários mínimos, mantido pelo devedor em conta poupança, conta corrente, em outras aplicações financeiras (tais como em fundos de investimento), ou em papel-moeda, em vista da necessária isonomia na compreensão do regramento positivado. Segundo a Corte Especial do e.STF (Resp. 1.677.144/RS, j. 21/02/2024), a garantia da impenhorabilidade até 40 salários mínimos: a) é aplicável automaticamente ao valor depositado exclusivamente em caderneta de poupança; b) se atingir dinheiro mantido em conta corrente (tais como sobras de salários, de um mês para outro) ou quaisquer outras aplicações financeiras (inclusive moeda estrangeira em espécie), a impenhorabilidade pode ser estendida desde que comprovado (pela parte atingida pela constrição) que o valor constitui reserva de patrimônio destinado a assegurar o mínimo existencial e a segurança em infortúnios (do devedor e de sua família). A impenhorabilidade diz respeito ao saldo total de todas as aplicações financeiras do devedor (e não para cada uma delas), que devem ter finalidades equivalentes às da caderneta de poupança, ressalvada ainda a comprovação de má-fé, abuso de direito ou fraude (nesse caso, ônus do credor).

De todo modo, essa nova interpretação foi conferida apenas para pessoas físicas, e não para pessoas jurídicas (como é o caso dos autos).

Ausente qualquer motivo para alteração, entendo que a decisão deve ser mantida.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. CONSTRIÇÃO DE VALORES POR MEIO DO SISTEMA SISBAJUD. ART. 833, X, DO CPC.  EXTENSÃO. PESSOAS JURÍDICAS. CASOS EXCEPCIONAIS. RECURSO NÃO PROVIDO.

- A legislação e a jurisprudência procuram evitar imposições excessivas do credor em face do devedor, mas a regra geral é a possibilidade de penhora de bens para o cumprimento de obrigações válidas e legítimas, daí porque as hipóteses legais de impenhorabilidade representam exceção e, por isso, devem ser interpretadas restritivamente.

- A impenhorabilidade do art. 833, X, do CPC/2015 tem por finalidade proteger a poupança familiar mantida por pessoa física, e por isso não pode ser aplicada em favor de pessoa jurídica.

- Quando muito, a impenhorabilidade do art. 833, X, do CPC/2015 seria extensível às pessoas jurídicas em casos excepcionais, em vista de forma societária simplificada e destinada a pequenos empreendimentos (como é o caso do microempreendedor individual-MEI de que trata do art. 18-A da Lei Complementar nº 123/2006).

- No caso dos autos, a proteção do art. 833, X, e §2º do CPC/2015 (antes, do art. 649, X, e §2º do CPC/1973) não deve ser aplicada à agravante, pessoa jurídica constituída sob a forma de empresa individual de responsabilidade limitada, de pequeno porte que não demonstrou a necessidade dos valores para a atividade da empresa, nem que se trata do único ativo da pessoa jurídica. Assim, inviável acolher o argumento de impenhorabilidade, mesmo porque o julgador não pode presumir que toda e qualquer verba é imprescindível para empreendimentos (mesmo porque saldar dívidas também compõem o horizonte de empresas).

- Agravo de instrumento desprovido.  


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
CARLOS FRANCISCO
DESEMBARGADOR FEDERAL