Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5031549-15.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM

AGRAVANTE: CLAUDIA CARVALHEIRA FARHUD

Advogado do(a) AGRAVANTE: BASSIM CHAKUR FILHO - SP106309

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5031549-15.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM

AGRAVANTE: CLAUDIA CARVALHEIRA FARHUD

Advogado do(a) AGRAVANTE: BASSIM CHAKUR FILHO - SP106309

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CONSOLIM: 

Trata-se de agravo interno interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face da decisão monocrática Id 286153452, prolatada em 21.3.2024, que deu provimento ao agravo de instrumento interposto pela executada para declarar a inexigibilidade dos valores.

 

Em suas razões (Id 287385482), alega o INSS que, uma vez reformada a decisão que deferiu a tutela provisória, fica a parte autora obrigada a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, independentemente da demonstração de boa-fé. Sustenta que o Superior Tribunal de Justiça reafirmou a tese jurídica fixada no Tema 692 e, apenas, fez acréscimo redacional para adequar o tema à nova legislação de regência para possibilitar, alternativamente, a restituição por meio de desconto em eventual benefício ativo.

 

Com contraminuta (Id 288664037), subiram os autos a esta Corte.

 

Frise-se que este agravo de instrumento foi interposto pela executada CLAUDIA CARVALHEIRA FARHUD em face da decisão Id 290920006 (autos de origem), proferida nos autos do cumprimento de sentença n. 0011206-18.2010.4.03.6183, em 31.10.2023, pelo Juízo da 9.ª Vara Federal Previdenciária da Subseção Judiciária de São Paulo, SP, que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença sob o fundamento de que a devolução de quantia recebida por força de tutela antecipada posteriormente revogada está prevista no artigo 115, inciso II, da Lei n. 8.213/1991 e no artigo 302, inciso I, e seu parágrafo único, do CPC, bem como no entendimento firmado pelo STJ no Tema Repetitivo n. 692. Na ação de conhecimento, a parte autora teve reconhecido o direito à desaposentação, com o cômputo das contribuições posteriores à aquisição do primeiro benefício, e concedido novo benefício, com determinação de implantação em tutela deferida por esta Corte. Após interposição de Recurso Especial, esta Corte, em juízo de retratação, em 19.12.2016, deu provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido da parte autora, sem condenação em honorários advocatícios, por ser beneficiária da gratuidade da justiça.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5031549-15.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM

AGRAVANTE: CLAUDIA CARVALHEIRA FARHUD

Advogado do(a) AGRAVANTE: BASSIM CHAKUR FILHO - SP106309

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

 

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CONSOLIM

O INSS, com fundamento no decidido pelo colendo Superior Tribunal de Justiça no Tema 692, almeja a devolução de valores recebidos por força de tutela provisória, concedida em ação de desaposentação, que, em juízo de retratação, em 19.12.2016, foi dado provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido da parte autora.

 

Na decisão Id 282739200 foi concedido o efeito suspensivo.

 

Na decisão Id 286153452, ora agravada pelo INSS, ficou decidido monocraticamente o mérito do agravo de instrumento pela desnecessidade da devolução do benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência da tutela que foi posteriormente reformada, não estando sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar.

 

Da devolução de valores recebidos em decorrência de revogação de tutela ou liminar (Tema 692 do STJ)

 

Por meio de decisão por maioria, em apertada votação (4X3), o colendo Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp n. 1.401.560/MT, em sistemática de recurso repetitivo (Tema 692), firmou a seguinte tese:

 

“A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.”

 

O voto condutor, de autoria do Ministro Ari Pargendler, teve como fundamento o teor do artigo 115, inciso II, da Lei n. 8.213/1991. O Ministro Herman Benjamin, acompanhando o relator, em seu voto acrescentou que não se aplicaria ao presente caso a irrepetibilidade dos alimentos, usada para justificar a não devolução nas ações rescisórias, uma vez que enquanto nestas últimas a decisão cassada é definitiva, no caso da tutela a decisão é provisória. Ainda, fundamentou no fato de que, embora o segurado tenha boa-fé subjetiva no recebimento da tutela, ele tinha conhecimento da sua precariedade, faltando-lhe, portanto, a boa-fé objetiva. E, finalmente, justificando que “o caráter alimentar dos benefícios previdenciários está indissociavelmente ligado ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana” e que “O princípio da dignidade da pessoa humana, na sua dimensão objetiva, visa garantir um contexto adequado à subsistência do indivíduo”, propôs a limitação de desconto mensal a 10% da renda do benefício.

 

No voto-vencido, o Ministro Sérgio Kukina ressaltou a finalidade de proteção social da norma previdenciária e que o referido artigo 115, inciso II, da Lei n. 8.213/1991 (em sua redação originária), não previa a hipótese de desconto de valores recebidos por força de tutela revogada e reforçou a aplicabilidade do princípio da irrepetibilidade diante do caráter alimentar e da boa-fé objetiva que o segurado tem ao supor que o magistrado, ao deferir a antecipação, em observância dos fins sociais da Previdência, não lhe sujeitaria à devolução de valores. O Ministro Arnaldo Esteves Lima salientou que o entendimento da devolução esvaziaria a missão do instituto da tutela. O Ministro Napoleão Nunes acrescentou que a tutela difere de uma medida cautelar, porquanto ela é uma decisão com eficácia plena, total e absoluta enquanto ela vigorar, razão pela qual não seria possível alegar a sua precariedade, bem como a “injustiça” discriminatória quando a Fazenda desobriga o pagamento de imposto nos crimes de descaminho e contrabando em valores de até R$ 10.000,00, considerando-se como bagatela, enquanto exige-se do segurado, que recebe valores menores, a devolução.

 

Como bem salientado pelo Ministro Herman Benjamin, “o caráter alimentar dos benefícios previdenciários está indissociavelmente ligado ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana” e “O princípio da dignidade da pessoa humana, na sua dimensão objetiva, visa garantir um contexto adequado à subsistência do indivíduo”.

 

Nesse contexto, o referido princípio da dignidade da pessoa, mormente a necessidade de os Estados garantirem meios de subsistência do indivíduo, pode ser extraído dos artigos 7º, 9º e 11 do “Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais”, do qual o Brasil é signatário e foi promulgado por meio do Decreto n. 591, de 6 de julho de 1992, “in verbis”:

 

“ACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

PREÂMBULO

Os Estados Partes do presente Pacto,

Considerando que, em conformidade com os princípios proclamados na Carta das Nações Unidas, o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,

Reconhecendo que esses direitos decorrem da dignidade inerente à pessoa humana,

Reconhecendo que, em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, o ideal do ser humano livre, liberto do temor e da miséria, não pode ser realizado a menos que se criem condições que permitam a cada um gozar de seus direitos econômicos, sociais e culturais, assim como de seus direitos civis e políticos,

Considerando que a Carta das Nações Unidas impõe aos Estados a obrigação de promover o respeito universal e efetivo dos direitos e das liberdades do homem,

Compreendendo que o indivíduo, por ter deveres para com seus semelhantes e para com a coletividade a que pertence, tem a obrigação de lutar pela promoção e observância dos direitos reconhecidos no presente Pacto,

Acordam o seguinte:

(Omissis)

ARTIGO 7º

Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa de gozar de condições de trabalho justas e favoráveis, que assegurem especialmente:

a) Uma remuneração que proporcione, no mínimo, a todos os trabalhadores:

i) Um salário eqüitativo e uma remuneração igual por um trabalho de igual valor, sem qualquer distinção; em particular, as mulheres deverão ter a garantia de condições de trabalho não inferiores às dos homens e perceber a mesma remuneração que eles por trabalho igual;

ii) Uma existência decente para eles e suas famílias, em conformidade com as disposições do presente Pacto;

b) À segurança e a higiene no trabalho;

c) Igual oportunidade para todos de serem promovidos, em seu trabalho, à categoria superior que lhes corresponda, sem outras considerações que as de tempo de trabalho e capacidade;

d) O descanso, o lazer, a limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas remuneradas, assim como a remuneração dos feridos.

(Omissis)

ARTIGO 9º

Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa à previdência social, inclusive ao seguro social.”

(Omissis)

ARTIGO 11

1. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim como a uma melhoria contínua de suas condições de vida. Os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para assegurar a consecução desse direito, reconhecendo, nesse sentido, a importância essencial da cooperação internacional fundada no livre consentimento.”

(Grifei)

 

Sendo assim, como a tutela foi concedida especialmente para garantir a subsistência do segurado, trata-se de garantia também decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, como bem salientado pelo eminente Ministro Herman Benjamin.

 

A referida garantia decorre de norma prevista no “Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais”, do qual o Brasil é signatário, aprovado pelo Congresso Nacional com votação da maioria simples e promulgado por meio do Decreto n. 591, de 6 de julho de 1992.

 

Dessa forma, conforme entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC 95.967 e RE 466.343, trata-se de norma supralegal, como segue:

 

“A esses diplomas internacionais sobre direitos humanos é reservado o lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da CF/1988, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação.” (Grifei)

 

“Tendo em vista o caráter supralegal desses diplomas normativos internacionais, a legislação infraconstitucional posterior que com eles seja conflitante também tem sua eficácia paralisada.” (Grifei)

 

De outro lado, como defendido no voto condutor, que definiu o Tema 692, e pelo INSS, a necessidade de devolução estaria amparada no artigo 520, inciso I, do CPC (correspondente ao artigo 475-O, inciso I, do CPC de 1973) e no artigo 115, inciso II, da Lei n. 8.213/1991.

 

Destarte, o caso revela um aparente conflito de normas, que pode ser resolvido por meio de controle de convencionalidade, pelo excelso Supremo Tribunal Federal.

 

Dessa forma, deixar momentaneamente de aplicar o Tema 692 do STJ não configura desrespeito ao artigo 927, inciso III, do CPC, e nem desrespeito ao Tema 799 do STF, uma vez que em nenhum dos casos houve a análise pelo prisma da hierarquia da norma supralegal sobre a norma ordinária.

 

Assim, até novo pronunciamento da Suprema Corte, deve prevalecer o posicionamento de não devolução dos valores recebidos pelo segurado em decorrência da revogação da tutela, de acordo com o seguinte julgado:

 

“DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO.

1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes.

2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº 8.213/1991. Precedentes.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.”

(ARE 734242 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, Julgado: 04-08-2015, DJe: 04-09-2015)

 

Da improcedência da desaposentação e modulação dos efeitos com irrepetibilidade dos valores pagos até fevereiro de 2020

 

O excelso Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário n. 661.256 (Tema n. 503), considerou indevida a desaposentação, modificando o anterior posicionamento do Superior Tribunal de Justiça. 

 

Ao examinar os segundos ED no RE n. 661.256/SC, a Corte Suprema modulou os efeitos da decisão que julgou a questão da repercussão geral mencionada, pronunciando a desnecessidade de repetição dos valores recebidos a título de desaposentação até a data da proclamação do resultado do julgamento do recurso analisado (6.2.2020). A propósito:

 

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. TEMA 503 DA REPERCUSSÃO GERAL. DESAPOSENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. EXTENSÃO AO INSTITUTO DA REAPOSENTAÇÃO. AMPLIAÇÃO DA TESE, UNICAMENTE PARA FINS DE ESCLARECIMENTOS. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES ALIMENTARES RECEBIDOS DE BOA-FÉ, POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL, ATÉ A PROCLAMAÇÃO DO RESULTADO DESTE JULGAMENTO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DO JULGADO, PARA PRESERVAR AS HIPÓTESES RELATIVAS ÀS DECISÕES TRANSITADAS EM JULGADO ATÉ A DATA DESTE JULGADO.

(...)

5. Diante da boa-fé dos beneficiários, bem como da natureza alimentar da aposentadoria, reputa-se desnecessária a devolução dos valores recebidos, até a proclamação do resultado do julgamento destes embargos de declaração.

6. Em relação aos segurados que usufruem da desaposentação em razão de decisão judicial transitada em julgado até a data do julgamento destes embargos declaratórios, considera-se legítima a modulação dos efeitos, em conformidade com os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança. Vencido, em parte, o Ministro Redator para o Acórdão, unicamente quanto ao marco temporal.

7. Embargos de Declaração conhecidos para dar-lhes provimento parcial, para: a) acompanhar a proposta de alteração da tese de repercussão geral apresentada pelo Ilustre Ministro Relator, nos seguintes termos: ‘No âmbito do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à 'desaposentação' ou à reaposentação, sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91’; b) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar a desaposentação aos segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento; c) declarar a desnecessidade de repetição dos valores recebidos a título de desaposentação até a data deste julgamento.”

(STF, Segundos ED no RE n. 661.256/SC, Plenário, Relator para acórdão Ministro ALEXANDRE DE MORAES, DJe 13.11.2020, grifei)

 

Cabe destacar parte do voto do Relator para o acórdão, Ministro Alexandre de Moraes, que asseverou:

 

“Sr. Presidente, diante da boa-fé dos beneficiários, bem como da natureza alimentar da aposentadoria, entendo desnecessária a devolução dos valores recebidos. Ora, a decisão paradigmática do STJ que reconheceu o direito à desaposentação data de 8/5/2013; logo, seria absolutamente inviável compelir o segurado a devolver os valores que recebeu de boa-fé durante tantos anos.”

 

A irrepetibilidade dos valores pagos em decorrência de desaposentação até 6.2.2020, conforme decidido pelo excelso Supremo Tribunal Federal.

 

Do caso concreto
 

Trata-se o presente caso de discussão sobre a necessidade de devolução de valores recebidos por força de tutela provisória, concedida em ação de desaposentação, que, em juízo de retratação, em 19.12.2016, foi dado provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido da parte autora, sem condenação em honorários advocatícios, por ser beneficiária da gratuidade da justiça. Por conseguinte, a tutela foi revogada.

 

Na decisão Id 286153452, ora agravada pelo INSS, ficou decidido monocraticamente o mérito do agravo de instrumento pela desnecessidade da devolução do benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência da tutela que foi posteriormente reformada, não estando sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar.

 

Primeiramente, é importante salientar que a tutela revogada foi deferida em ação de desaposentação, sob a qual incide a modulação dos efeitos fixada pelo excelso Supremo Tribunal Federal, a qual se sobrepõe ao decidido no Tema 692 do STJ. 

 

Ademais, em razão do aparente conflito de normas, que pode ser resolvido por meio de controle de convencionalidade, pelo excelso Supremo Tribunal Federal, deixar momentaneamente de aplicar o Tema 692 do STJ não configura desrespeito ao artigo 927, inciso III, do CPC, e nem desrespeito ao Tema 799 do STF, uma vez que em nenhum dos casos houve a análise pelo prisma da hierarquia da norma supralegal sobre a norma ordinária.

 

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno interposto pelo INSS, nos termos da fundamentação.

 

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO AGRAVADA EM CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESAPOSENTAÇÃO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ 6.2.2020. TEMA STJ N. 692 AFASTADO. APARENTE CONFLITO DE NORMAS. SUBSISTÊNCIA DO INDIVÍDUO PREVISTA NO PACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS. NORMA SUPRALEGAL.

1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário n. 661.256 (Tema n. 503), considerou indevida a desaposentação, modificando o anterior posicionamento do Superior Tribunal de Justiça e, ao examinar os segundos ED no RE n. 661.256/SC, modulou os efeitos da sua decisão, reconhecendo a desnecessidade de repetição dos valores recebidos a título de desaposentação até a data da proclamação do resultado do julgamento do recurso analisado (6.2.2020).

2. Os Estados devem garantir meios de subsistência ao indivíduo, em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana, nos termos dos artigos 7º, 9º e 11 do “Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais", do qual o Brasil é signatário, promulgado por meio do Decreto n. 591, de 6 de julho de 1992. Conforme entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 95.967 e RE 466.343, trata-se de norma supralegal.

3. No caso, a não aplicação do Tema 692 do STJ não configura desrespeito ao artigo 927, inciso III, do CPC, e nem desrespeito ao Tema 799 do STF, à vista da coisa julgada e uma vez que em nenhum dos casos houve a análise pelo prisma da hierarquia da norma supralegal sobre a norma ordinária.

4. Agravo interno do INSS não provido.

 

  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao agravo interno interposto pelo INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
JOÃO CONSOLIM
DESEMBARGADOR FEDERAL