Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005250-74.2023.4.03.6119

RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: BENEDITO APARECIDO RODRIGUES

Advogado do(a) APELADO: ANA ANGELICA DOS SANTOS CARNEIRO - SP116424-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005250-74.2023.4.03.6119

RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: BENEDITO APARECIDO RODRIGUES

Advogado do(a) APELADO: ANA ANGELICA DOS SANTOS CARNEIRO - SP116424-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por BENEDITO APARECIDO RODRIGUES, representado por sua curadora, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o benefício de pensão por morte, em decorrência do falecimento de seu genitor, ocorrido em 07 de novembro de 1981.

A r. sentença recorrida julgou procedente o pedido e condenou a Autarquia Previdenciária à concessão do benefício pleiteado, a contar do requerimento administrativo (21/03/2019), com parcelas acrescidas dos consectários legais. Por fim, concedeu a tutela de urgência e determinou sua imediata implantação (id 290439549 – p. 1/7).

Em suas razões recursais, pugna o INSS pela reforma da sentença e improcedência do pedido, ao argumento de não ter logrado a parte autora comprovar os requisitos autorizadores à concessão do benefício. Aduz que o laudo pericial fixou o início da incapacidade em data posterior ao falecimento do segurado, o que ilide a suposta dependência econômica do autor em relação ao falecido genitor (id 290439553 – p. 1/4).

Contrarrazões (id. 290439560 – p. 1/4).

Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.

Parecer do Ministério Público Federal, em que se manifesta pelo desprovimento da apelação do INSS (id. 293593176 – p. 1/5).

É o relatório.

 

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 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005250-74.2023.4.03.6119

RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: BENEDITO APARECIDO RODRIGUES

Advogado do(a) APELADO: ANA ANGELICA DOS SANTOS CARNEIRO - SP116424-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.

DA PENSÃO POR MORTE

O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi a Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais, cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).

A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.

A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:

 

"A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:

V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º."

 

DO CASO DOS AUTOS

A controvérsia cinge-se à comprovação da dependência econômica do autor, na condição de filho inválido de Sebastião Demétrio Rodrigues, falecido em 07 de novembro de 1981.

Na seara administrativa, a pensão por morte, requerida em 21 de março de 2019, restou indeferida, ao fundamento de ser a incapacidade superveniente ao falecimento do genitor (id. 290439272 – p. 49/51).

Mediante o brocardo tempus regit actum, o benefício rege-se pela legislação vigente à época do falecimento.

Por ocasião do óbito do genitor (07/11/1981) estava em vigor o Decreto nº 83.080/79, cujo art. 12 trazia a relação dos dependentes:

 

“Art. 12 - São dependentes do segurado:

I - A esposa, o marido inválido, a companheira mantida há mais de 5 (cinco) anos, os filhos de qualquer condição menores de 18 (dezoito) anos ou inválidos e as filhas solteiras de qualquer condição menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidas;

II - a pessoa designada que seja do sexo masculino, só pode ser menor de 18 (dezoito) anos ou maior de 60 (sessenta) anos ou inválida;

III - o pai inválido e a mãe;

(...)”.

 

Depreende-se da norma em comento que para a concessão da pensão por morte far-se-ia o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 12 da norma citada.

A qualidade de segurado do de cujus é incontroversa. Consoante se infere dos extratos do Sistema Único de Benefícios – DATAPREV, em decorrência do falecimento, o INSS instituiu administrativamente em prol da genitora do postulante o benefício de pensão por morte (NB 21/079.579.039-2), o qual esteve em vigor entre 07 de novembro de 1981 e 04 de março de 2019, tendo sido cessado em razão do óbito da beneficiária (id. 290439272 – p. 23).

Na presente demanda, o postulante foi submetido à perícia médica. O respectivo laudo, com data de 24 de julho de 2023, foi conclusivo quanto à sua incapacidade total e permanente. Transcrevo, na sequência, o item discussão e conclusão:

 

“(...)

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

Diante do exposto, destituído de qualquer parcialidade ou interesse, a não ser contribuir com a verdade, com base na história clínica, no exame físico, nos laudos médicos apresentados, exames de imagem e demais documentos constantes nos autos posso concluir afirmando: Segundo manual de procedimentos de perícias em saúde da UNESP, Baremo europeu e Guides to evaluation of permanente impairment (6ª edição da American Medical Association) apresenta critérios de incapacidade total permanente para atividade habitual.

O autor apresenta incapacidade omniprofissional permanente que é desfavorável a reabilitação levando em consideração a tabela do próprio INSS totalmente dependente de terceiros para atividades da vida diária”.

 

A conclusão quanto à incapacidade total e permanente foi corroborada nas respostas aos quesitos do juízo.

 Em resposta ao quesito nº 1, o qual indagava acerca das enfermidades constatadas, o expert deixou consignado: “Retardo Mental Grave (CID F 72) + Hipertensão Arterial Sistêmica (CID I10) + Diabetes Mellitus Insulino Dependente (CID E 10) + Depressão (CID F 32)”.

Em resposta ao quesito nº 4.1., que indagava acerca da deficiência ou doença incapacitante do qual o autor é portador, o perito afirmou se tratar de “Retardo Mental Grave (CID F72)”.

No quesito nº 4.2., o perito fixou a data de início da doença no nascimento do autor, em 12 de dezembro de 1952.

Em resposta ao quesito nº 4.5., o perito afirmou que a enfermidade o incapacita de forma total e permanente.

No entanto, ao responder o quesito nº 4.6., o qual indagava acerca da data do início da incapacidade, o médico perito fixou-a naquela em que foi formulado o requerimento do benefício de pensão por morte, em 18 de novembro de 2020.

Em razão disso, o julgamento foi convertido em diligência, a fim de que o expert esclarecesse a divergência entre a data de início da enfermidade e aquela do advento da incapacidade.

No laudo complementar, com data de 17 de outubro de 2023, o perito retificou o laudo anterior, para esclarecer que a incapacidade teve início na data em que foi formulado o pedido de pensão na seara administrativa, em 21 de março de 2019 (id. 290439541 – p. 1/2).

Ocorre que o próprio INSS, na seara administrativa, já havia concluído ser o autor portador de retardo mental desde a infância, evoluindo com AVC em 2019, conforme transcrevo:

 

“Desempregado. Em 18/11/2020 exame de Perícia Médica de Maior sem laudos médicos e sem exames complementares para análise pericial. Irmã do requerente relata que o mesmo possui Retardo Mental desde a infância, evoluindo com AVC em 2019 (sic), estando acamado desde então. Solicito SIMA neuropsiquiátrico detalhado para determinação de DID e DII. Em 03/12/2020 retorno de SIMA com solicitação de relatório psiquiátrico detalhado. Apresenta relatório com data de primeiro atendimento em 21/06/2011, assinado por Assistente Social Roberto Carlos Beserra Barreto CRESS 33936. Apresenta relatório médico assinado pelo Dr. Flavio Henrique Teixeira Goes CRM 146513 de 27/11/2020, onde relata acompanhamento psiquiátrico devido à Deficiência Intelectual Grave - CID F71, porém novamente não informa a data de início de sintomas e início de tratamento”.

 

O início da incapacidade fixado na seara administrativa se pautou, exclusivamente, na data dos documentos apresentados acerca do primeiro atendimento hospitalar, sem se ater aos demais documentos que instruem a demanda.

O autor já houvera sido submetido a processo de interdição e curatela, conforme sentença proferida em 31 de agosto de 1984, nos autos de processo nº 385/1983, os quais tramitaram pela 2ª Vara da Comarca de Santa Isabel – SP.

Transcrevo na sequência a fundamentação do decisum, que julgou procedente o pedido:

 

“(...) Com efeito, o interditando já houvera sido examinado pela Dra. Lenita Maekawa Narusawa, médica psiquiátrica, que atestou que o requerido “se encontra incapacitado para os atos da vida civil, por apresentar  ao exame séria deficiência mental de ordem irrecuperável”.

A essa mesma conclusão chegaram os senhores peritos que o examinaram, concluindo que ele é portador de oligofrenia de nível de debilidade mental moderada, que essa doença não é susceptível de cura e que o interditando não está em condições de reger sua pessoa e administrar seus bens.

Diante desse quadro probatório, impõe-se a interdição do requerido, conforme, aliás, opinou o ilustre representante do Ministério Público” (id. 290439275 – p. 1/2).

 

O laudo pericial em que esteve pautado referida sentença, realizado pelo Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo – IMESC, com data de 10 de janeiro de 1984, já havia sedimentado ser o autor portador de oligofrenia, em nível de debilidade mental moderada.

Do item “histórico” do referido laudo, infere-se que a enfermidade remonta ao próprio nascimento.

Ambos os laudos que instruem a demanda são consonantes no sentido de que a enfermidade mental (oligofrenia) o acomete desde a tenra idade, de tal forma que o autor nunca teve vida independente, sem vínculos empregatícios, e sempre foi dependente de terceiros.

A doença mental que o aflige desde o nascimento (oligofrenia) é suficiente a caracterizar sua condição de filho inválido. Esta interpretação encontra supedâneo na legislação previdenciária, a qual também considera como inválido o filho “que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, na dicção da atual redação do art. 16, III da Lei nº 8.213/91.

Restou demonstrado, desta forma, que já se encontrava inválido ao tempo do falecimento do genitor, fazendo jus ao benefício de pensão por morte, a contar da data do requerimento administrativo (21/03/2019).

Por ocasião da liquidação da sentença, deverá ser compensado o valor das parcelas auferidas por força da antecipação da tutela.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.

Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência.

 

DISPOSITIVO

 

Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, mantendo a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte, a contar da data do requerimento administrativo (21/03/2019), na forma da fundamentação. Os honorários advocatícios deverão ser fixados por ocasião da liquidação do julgado. Mantenho a tutela concedida.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 1981. QUALIDADE DE SEGURADO. PENSÃO DEFERIDA ANTERIORMENTE À GENITORA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. FILHO INVÁLIDO. PERÍCIA MÉDICA. OLIGOFRENIA. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE. ECLOSÃO ADVINDA ANTERIORMENTE AO ÓBITO DO SEGURADO.

- Mediante o brocardo tempus regit actum, o benefício rege-se pela legislação vigente à época do falecimento, incidindo à espécie judicial em apreço o Decreto nº 83.080/79.

- O INSS instituiu administrativamente em prol da genitora do postulante o benefício de pensão por morte, o qual esteve em vigor desde a data do falecimento do segurado (07/11/1981), tendo sido cessado em razão do óbito da beneficiária, em 04 de março de 2019.

- O início da incapacidade do autor, fixado na seara administrativa, em 21 de junho de 2011, se pautou, exclusivamente, na data dos documentos apresentados acerca do primeiro atendimento hospitalar, sem se ater aos demais documentos que instruem a demanda.

- O autor já houvera sido submetido a processo de interdição e curatela, conforme sentença proferida em 31 de agosto de 1984. O laudo pericial em que esteve pautado referida sentença, realizado pelo Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo – IMESC, com data de 10 de janeiro de 1984, já havia sedimentado ser o autor portador de oligofrenia, em nível de debilidade mental moderada.

- Na presente demanda, o postulante foi submetido à perícia médica. O respectivo laudo, com data de 24 de julho de 2023, foi conclusivo quanto à sua incapacidade total e permanente.

- Conquanto o perito tenha consignado ser portador de oligofrenia e enfermidade mental grave, desde o nascimento, fixou a data do início da incapacidade naquela em que foi pleiteada a pensão por morte, a mingua de outros documentos.

- Ambos os laudos que instruem os autos são consonantes no sentido de que a enfermidade mental (oligofrenia) o acomete desde a tenra idade, de tal forma que o autor nunca exerceu atividade laborativa remunerada e sempre foi dependente de terceiros.

- A doença mental que o aflige desde o nascimento (oligofrenia) é suficiente para caracterizar sua condição de filho inválido. Esta interpretação encontra supedâneo na legislação previdenciária, a qual considera como inválido o filho “que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave”, na dicção da atual redação do art. 16, III da Lei nº 8.213/91.

- Comprovada que a invalidez é anterior ao falecimento do genitor, o autor faz jus ao benefício de pensão por morte.

- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.

- Apelação do INSS desprovida.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, mantendo o decreto de procedência do pleito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
GILBERTO JORDAN
DESEMBARGADOR FEDERAL