Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5015152-45.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: RESTAURANTE LA CASSEROLE LTDA - EPP

Advogados do(a) APELADO: EMELY ALVES PEREZ - SP315560-A, LUIZ COELHO PAMPLONA - SP147549-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5015152-45.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

APELADO: RESTAURANTE LA CASSEROLE LTDA - EPP

Advogado do(a) APELADO: LUIZ COELHO PAMPLONA - SP147549-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de remessa necessária e de apelação interposta pela UNIÃO (Fazenda Nacional) contra sentença que concedeu em parte a segurança, na forma do art. 487, I do CPC, “para reconhecer à parte impetrante o direito de aplicar o benefício de alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre todas as receitas da pessoa jurídica na forma prevista pelo art. 4º da Lei nº 14.148/21, durante todo o prazo estipulado na referida norma (60 meses), desde que a parte impetrante, em 18 de março de 2022, estivesse com inscrição em situação regular no Cadastur, para fins de aplicação do benefício a receitas ou resultados decorrentes de atividades econômicas constantes do Anexo II da Portaria ME nº 7.163, de 2021, bem como  autorizo a compensação do quanto recolhido indevidamente desde 18/03/2022, após o trânsito em julgado, observado o prazo prescricional de 05 (cinco) anos, contado de cada recolhimento indevido, nos termos das disposições legais e infralegais pertinentes ao exercício da compensação tributária”.

 

O writ foi impetrado por RESTAURANTE LA CASSEROLE LTDA, em 24.06.2022, contra ato do Delegado da Delegacia de Administração Tributária da Receita Federal do Brasil em São Paulo (DERAT), objetivando ter “reconhecido o direito da Impetrante de usufruir do benefício de redução a zero das alíquotas de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL previsto no art. 4º da Lei nº 14.148/2021 independentemente da data de inscrição no CADASTUR, determinando-se à D. Autoridade Coatora que se abstenha de efetuar a cobrança destes tributos sobre as receitas auferidas pela Impetrante no desempenho das suas atividades consideradas, para fins do PERSE, como do setor de eventos, isso pelo prazo de sessenta meses previsto no mencionado dispositivo”, bem como a repetição dos valores indevidamente recolhidos a este título.

 

Pedido liminar deferido em parte, conforme decisão ID 291043487.

 

Informações prestadas pela autoridade apontada como coatora (ID 290356526).

 

Pela sentença ID 290356527, o Magistrado sentenciante entendeu pela legitimidade passiva da autoridade coatora, haja vista que “considerando as informações prestadas no ID 270859083, no sentido de que a única interpretação possível neste caso e para este fim é a de que o benefício começou a viger a partir da republicação da Lei, isto é, em 18/03/2022, e que a inscrição do CADASTUR da empresa impetrante se deu em 04/06/2021 (ID 254873586), impõe-se reconhecer a concessão da segurança”.

 

Fundamentou, ainda, que “considerando-se que a natureza do mandado de segurança exige a presença de direito líquido e certo de plano, entendendo-se este como aquele que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercido no momento da impetração, sem a necessidade de dilação probatória, de rigor a concessão parcial da segurança, para reconhecer à parte impetrante o direito de aplicar o benefício de alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre todas as receitas da pessoa jurídica na forma prevista pelo art. 4º da Lei nº 14.148/21, durante todo o prazo estipulado na referida norma (60 meses), desde que a parte impetrante, em 18 de março de 2022, estivesse com inscrição em situação regular no Cadastur, para fins de aplicação do benefício a receitas ou resultados decorrentes de atividades econômicas constantes do Anexo II da Portaria ME nº 7.163, de 2021”. 

 

 

Embargos de declaração da União (ID 290356530) e da parte impetrante (ID 290356682) foram rejeitados, conforme sentença ID 290356683.

 

Em suas razões de recorrer (ID 290356685), alega a União (Fazenda Nacional) que: a) “a Portaria ME nº 11.266/2022 foi editada em decorrência de previsão contida no art. 2º, §2º, da Lei nº 14.148/2021, em que houve a delegação ao Poder Executivo a prerrogativa de determinar as atividades (leia-se, no caso, CNAE) que teriam acesso aos benefícios nela previstos”; b) “a supressão do CNAE da impetrante da lista de atividades enquadradas no programa não configura ilegalidade, tampouco se molda à majoração indireta de alíquotas ou de base de cálculo de tributo a se submeterem ao princípio previsto no art. 151, inciso IV, do CTN”; c) “É de se destacar ainda que as alterações que foram promovidas pela Portaria ME nº 11.266/2022, especialmente a revogação de norma que diminuiu alíquota das contribuições não é considerada pela jurisprudência do STF como majoração, mas sim alteração de um benefício fiscal, de modo que não se submete à anterioridade nonagesimal ou anual, uma vez que se referem a tributos já existentes. Mais uma vez, afigura-se mero restabelecimento, dentro da faixa legal prevista, em atenção ao princípio da legalidade”.

 

Sustenta, ainda, que “além de as atividades econômicas estarem previstas na portaria, há a obrigação de que a pessoa jurídica exercesse a atividade e/ou estivesse cadastrada no Cadastur, em 18/03/2022, O QUE NÃO RESTOU COMPROVADO EM NENHUM MOMENTO”.

 

Pretende, por fim, o prequestionamento dos seguintes dispositivos: “arts. 2º; 5º, caput, I; 60, §4º, III e 150, II, §6º da CF; os arts. 97, inciso VI e 155-A do CTN; os arts. 2º, §2º e 3º, §2º, I da Lei 14.148/2021; os arts. 21, 22, 33, I, 34 e 36 da Lei 11.771/2008; art. 1º, caput e §4º da LINDB e o art. 1º, §2º da Portaria ME 7.163/2021”.

 

Contrarrazões apresentadas (ID 290356688).

 

Manifestação do Parquet Federal (ID 29104712) no sentido da desnecessidade de sua intervenção no feito.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


EXMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA:     

Com a devida vênia, divirjo do E. Relator para negar provimento à apelação e dar parcial provimento à remessa necessária.  

Primeiramente, a remessa necessária comporta parcial provimento para reduzir a sentença aos limites do pedido, uma vez ser ultra petita.  

Conforme se extrai da inicial, requer a parte impetrante a concessão da segurança para que: 

a) seja reconhecido o direito da Impetrante de usufruir do benefício de redução a zero das alíquotas de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL previsto no art. 4º da Lei nº 14.148/2021 independentemente da data de inscrição no CADASTUR, determinando-se à D. Autoridade Coatora que se abstenha de efetuar a cobrança destes tributos sobre as receitas auferidas pela Impetrante no desempenho das suas atividades consideradas, para fins do PERSE, como do setor de eventos, isso pelo prazo de sessenta meses previsto no mencionado dispositivo;  

b) seja declarado o seu direito de ser restituído os valores indevidamente recolhidos a título de tais tributos desde 18/03/2022 e/ou que eventualmente venham a ser recolhidos no curso do presente mandamus - respeitando-se o prazo de 60 meses, seja via compensação com débitos de tributos federais vencidos ou vincendos ou restituição em espécie (via cumprimento de sentença ou restituição administrativa), nos termos dos artigos 74 da Lei nº 9.430/1996, 156, II, 165, I, 168, I, 170 e 170-A do CTN e 26-A, da Lei nº 11.457, de 2007, bem como das Súmulas STJ nºs. 213 e 461, acrescendo-se ao crédito restituível juros de mora calculados pela taxa SELIC. 

 

Por sua vez, assim decidiu o Juízo a quo

Diante do exposto, CONCEDO PARCIALMENTE A SEGURANÇA e JULGO EXTINTO o processo, com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para reconhecer à parte impetrante o direito de aplicar o benefício de alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre todas as receitas da pessoa jurídica na forma prevista pelo art. 4º da Lei nº 14.148/21, durante todo o prazo estipulado na referida norma (60 meses), desde que a parte impetrante, em 18 de março de 2022, estivesse com inscrição em situação regular no Cadastur, para fins de aplicação do benefício a receitas ou resultados decorrentes de atividades econômicas constantes do Anexo II da Portaria ME nº 7.163, de 2021, bem como  autorizo a compensação do quanto recolhido indevidamente desde 18/03/2022, após o trânsito em julgado, observado o prazo prescricional de 05 (cinco) anos, contado de cada recolhimento indevido, nos termos das disposições legais e infralegais pertinentes ao exercício da compensação tributária.   

 

Verifica-se que a r. sentença é ultra petita no que se refere às receitas auferidas em atividades estranhas ao setor de eventos, impondo-se sua redução para que a concessão da segurança somente se dê quanto às receitas auferidas no desempenho da atividade objeto do CNAE 5611-2/01 (Restaurantes e Similares). 

Passo à apreciação do mérito.

Instituído pela Lei 14.148/2021, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - PERSE estabelece ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da COVID/19. Dentre os benefícios fiscais, está a redução para zero, pelo prazo de 60 meses, das alíquotas de PIS, COFINS, CSLL e IRPJ devidos pelas pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas elencadas.  

Confira-se:    

   
Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.  
§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente:  
I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;  
II - hotelaria em geral;  
III - administração de salas de exibição cinematográfica; e  
IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.  
§ 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo.   

   

No tocante à Política Nacional de Turismo, assim disciplina a Lei nº 11.771/2008:    

 

Art. 21.  Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo:  
I - meios de hospedagem;  
II - agências de turismo;  
III - transportadoras turísticas;  
IV - organizadoras de eventos;  
V - parques temáticos; e  
VI - acampamentos turísticos.  
Parágrafo único.  Poderão ser cadastradas no Ministério do Turismo, atendidas as condições próprias, as sociedades empresárias que prestem os seguintes serviços:  
I - restaurantes, cafeterias, bares e similares;  
II - centros ou locais destinados a convenções e/ou a feiras e a exposições e similares;  
III - parques temáticos aquáticos e empreendimentos dotados de equipamentos de entretenimento e lazer;  
IV - marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou à pesca desportiva;  
V - casas de espetáculos e equipamentos de animação turística;  
VI - organizadores, promotores e prestadores de serviços de infra-estrutura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposições e eventos;  
VII - locadoras de veículos para turistas; e  
VIII - prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades.  
 
Art. 22.  Os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação.  
§ 1º  As filiais são igualmente sujeitas ao cadastro no Ministério do Turismo, exceto no caso de estande de serviço de agências de turismo instalado em local destinado a abrigar evento de caráter temporário e cujo funcionamento se restrinja ao período de sua realização.  
§ 2º  O Ministério do Turismo expedirá certificado para cada cadastro deferido, inclusive de filiais, correspondente ao objeto das atividades turísticas a serem exercidas.  
§ 3º  Somente poderão prestar serviços de turismo a terceiros, ou intermediá-los, os prestadores de serviços turísticos referidos neste artigo quando devidamente cadastrados no Ministério do Turismo.  
§ 4o  O cadastro terá validade de 2 (dois) anos, contados da data de emissão do certificado.  
§ 5o  O disposto neste artigo não se aplica aos serviços de transporte aéreo.  

(...)  

Art. 33.  São direitos dos prestadores de serviços turísticos cadastrados no Ministério do Turismo, resguardadas as diretrizes da Política Nacional de Turismo, na forma desta Lei:  
I - o acesso a programas de apoio, financiamentos ou outros benefícios constantes da legislação de fomento ao turismo;      

 

O legislador expressamente definiu quais são atividades típicas da "cadeia produtiva do turismo" (caput do art. 21), cujo cadastro no Ministério do Turismo é obrigatório, e quais são as atividades equiparadas (parágrafo único do art. 21), que podem se registrar no CADASTUR, cujo cadastro é obrigatório para fins de acesso a programas de apoio e outros benefícios legais (art. 33, I).  

Por exigência do § 2º, do art. 2º da Lei 14.148/2021, o Ministério da Economia editou a   Portaria ME nº 7.163/2021, trazendo os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE considerados do setor de eventos, definindo no Anexo I as atividades econômicas que estão enquadradas no PERSE, e no Anexo II as atividades cujo enquadramento é permitido, desde que na data da publicação da Lei nº 14.148/2021, estivessem registradas no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos - CADASTUR.  

Portanto, verifica-se que a exigência de inscrição prévia no CADASTUR para usufruir dos benefícios do PERSE não se mostra desarrazoada, na medida em que as atividades descritas nos incisos do parágrafo único do art. 21 da Lei 11.771/2008 (como restaurantes e bares, por exemplo) não são, necessariamente, qualificadas como pertencentes ao setor turístico. Tanto é que a parte autora não estava registrada no CADASTUR, embora o cadastro já fosse obrigatório aos prestadores de serviços tipicamente turísticos e efetivamente atuantes (art. 22).    

Assim, a Portaria ME 7.163/2021 não extrapola as disposições das Leis 14.148/2021 e 11.771/2008, apenas possibilita a adesão ao PERSE de pessoas jurídicas que exercem atividades que não são típicas do setor de eventos, mas podem nele atuar, para o que se exige o registro no CADASTUR.  

Não se identifica, portanto, que a norma regulamentar apresente ilegalidade ou abuso a atrair a interferência do Poder Judiciário. 

É como tem julgado esta Corte em casos semelhantes:

                                       
                                            
 
AGRAVO INTERNO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADESÃO AO PERSE. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS. PORTARIA ME Nº 7.163/2021. INSCRIÇÃO PRÉVIA NO CADASTUR. REQUISITO NÃO ATENDIDO. LIMINAR SATISFATIVA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.  
1. Na via estreita do mandado de segurança é exigida a demonstração, de plano, do direito líquido e certo tido como violado, não se comportando fase instrutória. No caso em tela, não se pode imputar à autoridade impetrada qualquer ilegalidade, porquanto observada a normatização própria do caso.  
2. É incontroverso que não foi observado o cumprimento de todos os requisitos para adesão ao Programa em comento. O contribuinte não observou os requisitos da Portaria ME nº 7.163/2021 ao formalizar o pedido de benefício do PERSE. Alega, contudo, que a regulamentação contida na referida Portaria é ilegal, porquanto na lei regulamentadora – Lei nº 14.148/21 não há previsão de inscrição no CADASTUR até a respectiva data de entrada em vigor.  
3. Se o contribuinte adere a um programa emergencial de apoio, deve submeter-se a suas regras. E ao Judiciário não cabe incursionar nos meandros do programa para alterar as regras que vigem, desequilibrando a relação em favor do constituinte, a uma porque o Juiz não é legislador positivo (STF: ARE 1307729 AgR, Relator(a): Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 03/05/2021, DJe-087, publicado em 07-05-2021), a duas porque não pode de qualquer modo invadir o espaço de competência dos órgãos do Poder Executivo.  
4. O referido programa – PERSE, sujeita-se em primeiro lugar ao princípio da estrita legalidade e se caracteriza por sua natureza de adesão; ao contribuinte só resta anuir com os termos instituídos, descabendo qualquer ingerência dele – ou do Judiciário, sob pena de afronta à separação de poderes – nas cláusulas do favor concedido. Trata-se, portanto, de uma opção do contribuinte, que, ao aderir ao benefício, fica sujeito às suas determinações.  
5. Como confessado pela própria agravante, a inscrição no CADASATUR somente foi efetivada no dia 01.04.2022, fora do período aceito pela portaria regulamentadora. Embora não haja expressa previsão do período na Lei 14.148/2021, em seu art. 3º, §2º, I, a lei deixa claro que a transação “poderá ser realizada por adesão, na forma e nas condições constantes da regulamentação específica...”.  
6. A lei não regulamentou todos os requisitos e pormenores necessários à adesão, ao programa, deixando isso a cargo de regulamentação específica, o que foi feito na Portaria ME nº 7.163/2021. Assim, diante da existência de norma infralegal que expressamente disciplina em pormenores os critérios de adesão ao PERSE, sem qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade aparente, descabe a invocação de princípios para se safar do cumprimento de determinações da Portaria.  
7. Agravo interno desprovido.  
(TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5015579-09.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 29/08/2022, Intimação via sistema DATA: 01/09/2022)  
 
   

Nesse contexto, impende observar que o marco temporal a ser considerado para a verificação da inscrição do contribuinte no CADASTUR é 18/03/2022, data em que já estava vigente o cadastro da parte impetrante, conforme certificado ID 290356507 juntado com a inicial.  

Deve, portanto, ser negado provimento à apelação da UNIÃO. 

Por fim, descabe emitir provimento jurisdicional específico acerca de inovações legais e/ou normativas supervenientes ao ajuizamento da presente ação, a exemplo da MPV 1.202/2023 e das Leis 14.592/2023 e 14.859/2024. 

Em face do exposto, pedindo vênia ao E. Relator, nego provimento à apelação por fundamentação diversa e dou parcial provimento à remessa necessária, nos termos acima fundamentados. 

É o voto.  

 

 


DECLARAÇÃO DE VOTO

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO:

 

Do princípio da congruência

 

Segundo o princípio da congruência, fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante artigo 492 do CPC/2015.

 

É firme o entendimento pretoriano no sentido de que, em casos de sentença ultra petita, não se deve pronunciar a nulidade da decisão recorrida, mas, tão somente, reduzi-la aos limites do pedido.

 

A propósito, cito o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:

 

PROCESSUAL CIVIL. JULGAMENTO "ULTRA PETITA". REDUÇÃO.

O juiz não poderá conceder mais do que o pedido pelo autor, sob pena de o julgamento ser "ultra petita".

A sentença que decide "ultra petita" - atribuindo ao promovente mais do que o formulado na inicial - não é nula, devendo apenas ser reduzida.

Assim, sendo deferida - como foi no caso - uma indenização acima do pedido inicial, que foi certo e determinado, consubstanciado no valor que indica, deve-se reduzi-la aos limites do pedido.

Recursos parcialmente conhecidos e, nessa parte, providos.

(STJ - REsp 113355/RS - 4ª turma - Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, julgado em 18/12/1997, DJ 27/04/1998, p. 170)

 

Na especificidade no caso concreto, verifica-se que apenas a atividade principal da parte impetrante se encontra inclusa no PERSE, qual seja, CNAE 56.11-2-01 - Restaurantes e similares.

 

As demais atividades exercidas (47.29-6-99 - Comércio varejista de produtos alimentícios em geral ou especializado em produtos alimentícios não especificados anteriormente; 64.62-0-00 - Holdings de instituições não-financeiras) jamais se encontraram previstas dentre as atividades inclusas no Programa.

 

Ressalte-se que a parte impetrante sequer trata destas atividades na sua inicial, limitando seu pedido às “receitas auferidas pela Impetrante no desempenho das suas atividades consideradas, para fins do PERSE, como do setor de eventos”.

 

Contudo a sentença dispôs sobre o “direito de aplicar o benefício de alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre todas as receitas da pessoa jurídica na forma prevista pelo art. 4º da Lei nº 14.148/21” (g.n.) e, neste sentido, implicou em julgamento ultra petita.

 

Assim, reduzo a sentença aos limites do pedido restringindo a condenação às receitas auferidas em decorrência da atividade CNAE 56.11-2-01 - Restaurantes e similares.

 

 

Do mérito

 

Discute-se a legalidade da exigência prevista no § 2º, do artigo 1º, da Portaria ME n.º 7.163/2021, do Ministério da Economia, que, em relação às pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como restaurantes, bares e similares, condicionou-as à situação regular no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos – Cadastur na data publicação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021, em 18.03.2022, para fins de enquadramento no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE.

 

A Lei n.º 14.148/2021 estabeleceu ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de isolamento ou de quarentena realizadas para enfrentamento da pandemia da Covid-19.

 

Instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE, com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos pudesse mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública.

 

Dentre os benefícios do Programa foi prevista, inicialmente, a redução a zero 0% (zero por cento), pelo prazo de 60 (sessenta) meses, das alíquotas da tributação de PIS, COFINS, CSLL e IRPJ, incidentes sobre as receitas e o resultado auferido pelas pessoas jurídicas do setor de eventos, verbis:

 

Redação decorrente de promulgação da parte originariamente vetada: “Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei

I - Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep);

II - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);

III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e

IV - Imposto sobre a Renda das Pessoas Juridicas (IRPJ).”

 

Ressalta-se que, posteriormente, com a vigência da Medida Provisória n.º 1.147/2022, convertida na Lei n.º 14.592/2023, referida redução a zero 0% (zero por cento) das alíquotas tributárias passou a incidir, restritivamente, sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos nas atividades relacionadas no ato do Ministério da Economia:

 

Redação alterada pela MP 1.147/22: “Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos nas atividades relacionadas em ato do Ministério da Economia: [...]”

 

A fim de delimitar as pessoas jurídicas do denominado setor de eventos, a Lei n.º 14.148/2021 estabeleceu:

 

“Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.

§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente:

I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;

II - hotelaria em geral;

III - administração de salas de exibição cinematográfica; e

IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.

§ 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo.” (g.n.)

 

Em relação à atividade econômica de “prestação de serviços turísticos”, remeteu-se à Lei n.º 11.771/2008, que, dentre as disposições sobre a Política Nacional de Turismo, disciplinou a prestação de serviços turísticos, seu cadastro, classificação e fiscalização. Em seus artigos 21 e 22 estabeleceu o que segue quanto aos prestadores de serviços turísticos:

 

“Art. 21.  Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo:

I - meios de hospedagem;

II - agências de turismo;

III - transportadoras turísticas;

IV - organizadoras de eventos;

V - parques temáticos; e

VI - acampamentos turísticos.

Parágrafo único.  Poderão ser cadastradas no Ministério do Turismo, atendidas as condições próprias, as sociedades empresárias que prestem os seguintes serviços:

I - restaurantes, cafeterias, bares e similares;

II - centros ou locais destinados a convenções e/ou a feiras e a exposições e similares;

III - parques temáticos aquáticos e empreendimentos dotados de equipamentos de entretenimento e lazer;

IV - marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou à pesca desportiva;

V - casas de espetáculos e equipamentos de animação turística;

VI - organizadores, promotores e prestadores de serviços de infra-estrutura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposições e eventos;

VII - locadoras de veículos para turistas; e

VIII - prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades.

Art. 22.  Os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação.

§ 1o  As filiais são igualmente sujeitas ao cadastro no Ministério do Turismo, exceto no caso de estande de serviço de agências de turismo instalado em local destinado a abrigar evento de caráter temporário e cujo funcionamento se restrinja ao período de sua realização.

§ 2o  O Ministério do Turismo expedirá certificado para cada cadastro deferido, inclusive de filiais, correspondente ao objeto das atividades turísticas a serem exercidas.

§ 3o  Somente poderão prestar serviços de turismo a terceiros, ou intermediá-los, os prestadores de serviços turísticos referidos neste artigo quando devidamente cadastrados no Ministério do Turismo.

§ 4o  O cadastro terá validade de 2 (dois) anos, contados da data de emissão do certificado.

§ 5o  O disposto neste artigo não se aplica aos serviços de transporte aéreo.” (g.n.)

 

Editada para o fim de definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram inclusos no denominado setor de eventos, a Portaria ME n.º 7.163/2021, do Ministério da Economia, restou expresso no § 2º, de seu artigo 1º, a exigência de situação regular no Cadastur na data publicação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021 (em 18.03.2022), para que as pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como restaurantes, bares e similares, pudessem ser enquadradas no PERSE:

 

“Art. 1º Definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, na forma dos Anexos I e II.

§ 1º As pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, as atividades econômicas relacionadas no Anexo I a esta Portaria se enquadram no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - Perse.

§ 2º As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.” (g.n.)

 

 

Posteriormente, a Lei n.º 14.592/2023, publicada em 30.05.2023, alterando em parte as disposições da Lei n.º 14.148/2021, passou a exigir, para o enquadramento no PERSE, a regularidade, em 18 de março de 2022, da situação no Cadastur quanto às pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como restaurantes, bares e similares:

 

Redação alterada pela Lei 14.592/23: “Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos abrangendo as seguintes atividades econômicas, com os respectivos códigos da CNAE: hotéis (5510-8/01); apart-hotéis (5510-8/02); albergues, exceto assistenciais (5590-6/01); campings (5590-6/02), pensões (alojamento) (5590-6/03); outros alojamentos não especificados anteriormente (5590-6/99); serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê (5620-1/02); produtora de filmes para publicidade (5911-1/02); atividades de exibição cinematográfica (5914-6/00); criação de estandes para feiras e exposições (7319-0/01); atividades de produção de fotografias, exceto aérea e submarina (7420-0/01); filmagem de festas e eventos (7420-0/04); agenciamento de profissionais para atividades esportivas, culturais e artísticas (7490-1/05); aluguel de equipamentos recreativos e esportivos (7721-7/00); aluguel de palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário, exceto andaimes (7739-0/03); serviços de reservas e outros serviços de turismo não especificados anteriormente (7990-2/00); serviços de organização de feiras, congressos, exposições e festas (8230-0/01); casas de festas e eventos (8230-0/02); produção teatral (9001-9/01); produção musical (9001-9/02); produção de espetáculos de dança (9001-9/03); produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares (9001-9/04); atividades de sonorização e de iluminação (9001-9/06); artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificadas anteriormente (9001-9/99); gestão de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas (9003-5/00); produção e promoção de eventos esportivos (9319-1/01); discotecas, danceterias, salões de dança e similares (9329-8/01); serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00): [...]

§ 4º Somente as pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, em 18 de março de 2022, as atividades econômicas de que trata este artigo poderão usufruir do benefício.

§ 5º Terão direito à fruição de que trata este artigo, condicionada à regularidade, em 18 de março de 2022, de sua situação perante o Cadastro dos Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), nos termos dos arts. 21 e 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008 (Política Nacional de Turismo), as pessoas jurídicas que exercem as seguintes atividades econômicas: serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00). [...]” (g.n.)

 

Após, foi editada a Medida Provisória n.ª 1.202/2023, publicada em 29.12.2023, que, submetida aos princípios da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e da anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social, revogou expressamente o benefício fiscal relativo à redução a zero das alíquotas dos tributos previstos no PERSE (artigo 6º, I).

 

Contudo, referido inciso I, do artigo 6º, da Medida Provisória n.º 1.202/2023 foi expressamente revogado pelo artigo 5º da Lei n.º 14.859/2024, publicada em 23.05.2024, a qual, em seu artigo 1º, modificou a redação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021, passando a dispor, para o enquadramento no PERSE de pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como restaurantes, bares e similares, a necessidade de regularidade da situação no Cadastur, seja na data de 18 de março de 2022, seja por meio de regularização naquele cadastro até 30 de maio de 2023:

 

Redação alterada pela Lei 14.859/24: “Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos abrangendo as seguintes atividades econômicas, com os respectivos códigos da CNAE: hotéis (5510-8/01); apart-hotéis (5510-8/02); serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê (5620-1/02); atividades de exibição cinematográfica (5914-6/00); criação de estandes para feiras e exposições (7319-0/01); atividades de produção de fotografias, exceto aérea e submarina (7420-0/01); filmagem de festas e eventos (7420-0/04); agenciamento de profissionais para atividades esportivas, culturais e artísticas (7490-1/05); aluguel de equipamentos recreativos e esportivos (7721-7/00); aluguel de palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário, exceto andaimes (7739-0/03); serviços de reservas e outros serviços de turismo não especificados anteriormente (7990-2/00); serviços de organização de feiras, congressos, exposições e festas (8230-0/01); casas de festas e eventos (8230-0/02); produção teatral (9001-9/01); produção musical (9001-9/02); produção de espetáculos de dança (9001-9/03); produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares (9001-9/04); atividades de sonorização e de iluminação (9001-9/06); artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificadas anteriormente (9001-9/99); gestão de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas (9003-5/00); produção e promoção de eventos esportivos (9319-1/01); discotecas, danceterias, salões de dança e similares (9329-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00): [...]

§ 5º Terão direito à fruição de que trata este artigo, condicionada à regularidade, em 18 de março de 2022, ou adquirida entre essa data e 30 de maio de 2023, de sua situação perante o Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), nos termos dos arts. 21 e 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008 (Política Nacional de Turismo), as pessoas jurídicas que exercem as seguintes atividades econômicas: restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00). [...]” (g.n.)

 

Dado este arcabouço normativo, passo à análise da exigência legislativa de regularidade da situação no Cadastur para fins de fruição do benefício fiscal.

 

É importante frisar que a Lei n.º 11.771/2008, indicada nos atos normativos para fins da exigência de regularidade no Cadastur, não estabelecia, e permanece não estabelecendo, qualquer obrigatoriedade para que se cadastrem no Ministério do Turismo as pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como restaurantes, bares e similares; tal medida, nos estritos termos do parágrafo único de seu artigo 21, consiste numa faculdade.

 

O artigo 22 da Lei n.º 11.771/2008 obriga ao cadastro no Ministério do Turismo, apenas e tão somente, os prestadores de serviços turísticos, os quais, por seu turno, encontram-se elencados nos incisos I a VI, do caput, do artigo 21 do referido ato legal.

 

Na medida em que a exploração da atividade própria aos restaurantes, bares e similares não se insere, obrigatoriamente, no setor de eventos, tampouco no setor de turismo, não foge à razoabilidade e proporcionalidade a exigência, prevista em ato emanado pelo Poder Legislativo, de regularidade no Cadastur para fins de fruição do benefício fiscal previsto no PERSE, haja vista que referido Programa visou à recuperação de determinados setores da economia, especialmente afetados pela pandemia da Covid-19, e que, justamente, visou ao princípio da isonomia. De sorte que, sob pena de ofensa à separação dos Poderes, não cabe ao Judiciário substituir os demais Poderes no âmbito da discricionariedade que lhes é própria.

 

Uma vez que, em sua redação original, a Lei n.º 14.148/2021 não previa a exigência da situação de regularidade no Cadastur, requisito que se passou a exigir em ato do Legislativo com a edição da Lei n.º 14.592/2023, a qual não poderia atingir os fatos geradores que lhe precederam, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade (artigo 150, III, a, da CF), cabe um aprofundamento sobre a possibilidade de revogação ou alteração de benefício fiscal, bem como sobre o tipo de benefício concedido no âmbito do Programa, inclusive para fixação dos termos inicial e final de fruição do benefício fiscal do PERSE.

 

O poder constituinte originário conferiu ao Estado o poder de tributar os contribuintes, para obter recursos para financiar suas atividades. A fim de que o exercício desse poder estatal seja legítimo, contudo, deve-se observar não só os limites da competência atribuída pela Constituição Federal a cada ente da federação, como também as imunidades e as garantias individuais do contribuinte previstas principalmente no artigo 150 da Constituição Federal.

 

Na seara tributária, isso se reflete na vedação do Estado de promover modificações legislativas repentinas, com efeitos concretos imediatos, que elevem a carga tributária. Assegura, ainda, ao contribuinte, um tempo mínimo para conhecer a modificação na legislação tributária e planejar a atividade econômica para suportar seus efeitos.

 

É justamente para impedir tais “surpresas”, que o artigo 150, III, da Constituição Federal confere ao contribuinte a proteção dos princípios da anterioridade genérica e da anterioridade.

 

Em sua modalidade genérica, o princípio da anterioridade veda que a lei que institua ou majore tributo produza efeitos no mesmo exercício financeiro em que ela foi publicada, nos termos do artigo 150, III, alínea ‘b’ da Constituição Federal. Já de acordo com o princípio da anterioridade nonagesimal, a lei que institui ou majora tributos só produz efeitos após 90 (noventa) dias da data de sua publicação.

 

A matéria em questão, inicialmente, foi apenas tratada como limitação ao poder de tributar, consoante decorre explicitamente do texto constitucional. No entanto, passou-se também a questionar a aplicação principiológica para os benefícios fiscais concedidos.

 

O debate faz sentido na medida em que a retirada de benesses fiscais - tal como a criação ou aumento dos tributos –, da mesma forma, é passível de gerar surpresa aos contribuintes, caracterizando, na realidade, espécie de majoração indireta de tributos.

 

Não se questiona a possibilidade de eventual alteração legislativa ou mesmo da reedição de atos infralegais que tenham por consequência a supressão de benefícios, seja pela alteração do entendimento do Parlamento ou mesmo por diversa compreensão da Administração.

 

A bem da verdade, compreende-se com naturalidade que se sucedam modificações normativas, inclusive, em curto espaço tempo, o que decorre de novos cenários e demandas. Todavia, preza-se, apenas, pela aplicação dos mesmos princípios constitucionais para situação equivalente, isto é, de exasperação da carga tributária.

 

Não é demais ressaltar que a Lei que estabelece restrição a benefício fiscal, que implique na sua redução ou revogação, está sujeita ao princípio da anterioridade, seja a anterioridade de exercício (artigo 150, III, b, da CF), seja a anterioridade nonagesimal (alínea c), de acordo com o respectivo tributo (§ 1º), conforme entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte. Confira-se:

 

“DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INCENTIVO FISCAL. REVOGAÇÃO. MAJORAÇÃO INDIRETA. ANTERIORIDADE.

1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal concebe que não apenas a majoração direta de tributos atrai a eficácia da anterioridade nonagesimal, mas também a majoração indireta decorrente de revogação de benefícios fiscais. Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento, com aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015”

(RE 1053254 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª Turma, DJe 13.11.2018).”

 

“REINTEGRA – DECRETO Nº 9.393/2018 – BENEFÍCIO – REDUÇÃO DO PERCENTUAL – ANTERIORIDADE – PRECEDENTES.

Alcançado aumento indireto de tributo mediante redução da alíquota de incentivo do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras – Reintegra, cumpre observar o princípio da anterioridade, geral e nonagesimal, versado nas alíneas “b” e “c” do inciso III do artigo 150 da Constituição Federal. Precedente: medida cautelar na ação direta de inconstitucionalidade nº 2.325/DF, Pleno, relator ministro Marco Aurélio, acórdão publicado no Diário da Justiça de 6 de outubro de 2006.”

(STF, 1ª Turma, Ag.Reg.RE 1,263,840/RS, Rel.: Min. Marco Aurélio, Data de Julg.: 05.08.2020)

 

MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DE IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – PRAZO MÍNIMO – MEDIDA PROVISÓRIA N.º 1.034/21 – ANTERIORIDADE NONAGESIMAL.

1. A Lei Federal n.º 8.989/95 estabelece a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados com relação aos automóveis de passageiros de fabricação nacional, adquiridos por pessoas com deficiência física, visual, auditiva e mental severa ou profunda e pessoas com transtorno do espectro autista, diretamente ou por intermédio de seu representante legal (artigo 1º, inciso IV).

2. A reutilização do benefício fiscal implica, em regra, a observância do interregno mínimo de dois anos (artigo 2º). Contudo, em 1º de março de 2021, foi editada a Medida Provisória n.º 1.034, que alterou o parágrafo único do artigo 2º da lei, ampliando para quatro anos o prazo mínimo de reutilização do benefício fiscal por pessoas com deficiência. A regra entrou em vigor na data de publicação (artigo 5º, inciso I). Posteriormente, por ocasião da conversão na Lei Federal n.º 14.183/21, o prazo foi reduzido para três anos.

3. É pertinente considerar que, em hipóteses de majoração indireta de tributo decorrente da revogação de benefícios fiscais, o C. Supremo Tribunal Federal tem se posicionado pela necessária observância do princípio da anterioridade nonagesimal, estabelecida no artigo 150, inciso III, alínea “c”, da Constituição Federal.

4. Em decorrência da alteração perpetrada pela Medida Provisória, a autoridade coatora proferiu despacho indeferindo o requerimento de isenção, sob o fundamento de inobservância do interregno mínimo de quatro anos. A negativa fundamentada na aplicação imediata da nova regra configura afronta à anterioridade nonagesimal, constitucionalmente assegurada.

5. Remessa necessária desprovida.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, RemNecCiv - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - 5000372-68.2021.4.03.6122, Rel. Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES, julgado em 25/03/2022, Intimação via sistema DATA: 29/03/2022)”

 

Por seu turno, dispõe o artigo 178 do Código Tributário Nacional que “a isenção, salvo se concedida por prazo certo ou em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei a qualquer tempo, observado o disposto no inc. III do CTN, art. 104”. Exsurgem, portanto, duas modalidades de isenção: as simples e as onerosas.

 

As isenções simples são passíveis de revogação a qualquer tempo, apenas sendo de rigor a observância dos princípios da anterioridade anual e nonagesimal, entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte.

 

Já as isenções onerosas, por sua vez, são concedidas por um lapso temporal definido e, necessariamente, para a sua caracterização, devem vir acompanhadas de determinadas ações do seu beneficiário para que possam dela usufruir (“em função de determinadas condições”).

 

Em razão de tais características, isto é, tempo determinado e contrapartida do contribuinte, não é possível se falar em revogação da isenção onerosa, devido à proteção conferida ao direito adquirido de seu beneficiário.

 

Como elemento chave na caracterização das isenções onerosas e com conceito jurídico bem definido no ordenamento pátrio, as condições não são diferentes na esfera tributária e também se caracterizam como eventos futuros e incertos.

 

Na mesma linha argumentativa, são precisas as lições de Leandro Paulsen, no Curso de Direito Tributário Completo, 13ª edição – 2022, editora Saraiva:

 

“Quanto aos requisitos e condições, vale distingui-los, porquanto se prestam para a classificação das isenções em simples ou onerosas. O estabelecimento de requisitos remete à caracterização do objeto ou do sujeito alcançado pela norma em face de uma situação preexistente ou atual, que lhe é inerente, exigida como mero critério de enquadramento na sua hipótese de incidência. Já a fixação de condições induz à conformação da situação ou da conduta futura do sujeito ao que é pretendido pelo legislador e que deve ser cumprido para que os efeitos jurídicos prometidos sejam aplicados” (p. 313).

 

 

Figura como requisito legal (e não condição) para a fruição das benesses fiscais a inscrição no Cadastur na data de publicação da Lei instituidora do PERSE (18.03.2022), ou até 30.05.2023.

 

A rigor, não foi estabelecido na legislação discutida qualquer ônus às empresas para a fruição dos benefícios previstos, o que implica reconhecer a ausência de violação do artigo 178 do CTN e de distinção da situação abrangida pela Súmula 544 do STF (“Isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas”).

 

Importante ressaltar que a fruição dos benefícios fiscais previstos para as pessoas jurídicas que preenchem os requisitos legais independe de qualquer ato formal de adesão ao Programa. Enquadrada na hipótese legal do PERSE, nasce para o contribuinte, de imediato, o direito à redução a zero da alíquota tributária e, para o Fisco, exsurge a impossibilidade de exigir qualquer tributo em descompasso com a Lei.

 

Ausente condição relativa à adesão ao PERSE, incabível a exigência de sua comprovação para fruição dos benefícios do Programa, bastando o cumprimento dos requisitos legais para que as pessoas jurídicas façam jus à redução a zero da alíquota tributária.

 

Porém, com a vigência da Lei n.º 14.859/2024, para fins de fruição dos benefícios do PERSE passou a se exigir a comprovação de situação regular no Cadastur, na data de 18.03.2022 ou até a data de 30.05.2023.

 

Para os contribuintes que não atendem ao referido requisito legal, tem-se que a alteração legislativa promovida já pela Lei n.º 14.592/2023 implicou a revogação do benefício fiscal, observado o critério da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e à anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social, contado da data de sua publicação, em 30.05.2023.

 

No caso concreto, conforme documento juntado com a inicial (ID 289950190), a parte impetrante contava com certificado de regularidade no Cadastur, emitido em 04.06.2021, com validade para o período de 04.06.2021 a 04.06.2023.

 

Desta sorte, por fundamento diverso, acompanho Sua Excelência quanto ao reconhecimento da ilegalidade do quanto disposto no § 2º, do artigo 1º, da Portaria ME n.º 7.163/2021 e, por consequência, o direito ao enquadramento no PERSE do contribuinte prestador de serviços qualificados como restaurantes, bares e similares, sem que se lhe exija a comprovação de situação regular no Cadastur na data publicação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021, ou da publicação originária da referida Lei.

 

Ante o exposto, quanto ao não provimento da apelação da União acompanho Sua Excelência por fundamento diverso e, pedindo-lhe vênias para divergir em parte, dou parcial provimento à remessa necessária para reduzir a sentença aos limites do pedido restringindo a condenação às receitas auferidas em decorrência da atividade CNAE 56.11-2-01 - Restaurantes e similares.

 

É como voto.

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5015152-45.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

APELADO: RESTAURANTE LA CASSEROLE LTDA - EPP

Advogado do(a) APELADO: LUIZ COELHO PAMPLONA - SP147549-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, devem ser conhecidas a remessa necessária e a apelação.

 

A sentença não comporta reparo.

 

Com efeito, dispõe a Lei n. 14.148/2021 ("Lei Perse" - Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos):

 

Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.

§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente:

I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;

II - hotelaria em geral;

III - administração de salas de exibição cinematográfica; e

IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.

§ 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo.

(...)

Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei:    

 I - Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep);

II - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);

III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e

IV - Imposto sobre a Renda das Pessoas Juridicas (IRPJ).”

 

Com efeito, a Lei n. 14.148, de 3.5.2021 trouxe importantes benefícios fiscais ao setor de eventos como forma de mitigar os danos causados pela pandemia da COVID19, trazendo ações emergenciais e temporárias destinadas a essa área empresarial.

 

O aludido diploma legal autorizou, por prazo limitado, a redução da alíquota dos tributos que elenca para zero. Registre-se que a hipótese não é de isenção ou não incidência, mas de incidência de alíquota zero, pelo prazo que fixa.

 

A lei, ainda, delegou ao Ministério da Economia a publicação dos códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos.

 

Em razão dessa delegação, foi editada a Portaria n. 7163/2021 que incluiu as atividades exercidas pela autora quando considerada prestadora de serviços turísticos, conforme art. 21 da Lei 11.771, de 17/09/2008.

 

A referida portaria previu: “As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.” (art. 1º, § 2º). (grifos)

 

A Lei n. 11.771/2008, que depôs sobre a Política Nacional de Turismo, definiu as atribuições do Governo Federal no planejamento, desenvolvimento e estímulo ao setor turístico:

 

Art. 21.  Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo:

I - meios de hospedagem;

II - agências de turismo;

III - transportadoras turísticas;

IV - organizadoras de eventos;

V - parques temáticos; e

VI - acampamentos turísticos.

Parágrafo único.  Poderão ser cadastradas no Ministério do Turismo, atendidas as condições próprias, as sociedades empresárias que prestem os seguintes serviços:

I - restaurantes, cafeterias, bares e similares;

II - centros ou locais destinados a convenções e/ou a feiras e a exposições e similares;

III - parques temáticos aquáticos e empreendimentos dotados de equipamentos de entretenimento e lazer;

IV - marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou à pesca desportiva;

V - casas de espetáculos e equipamentos de animação turística;

VI - organizadores, promotores e prestadores de serviços de infra-estrutura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposições e eventos;

VII - locadoras de veículos para turistas; e

VIII - prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades.

Art. 22.  Os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação.

§ 1o  As filiais são igualmente sujeitas ao cadastro no Ministério do Turismo, exceto no caso de estande de serviço de agências de turismo instalado em local destinado a abrigar evento de caráter temporário e cujo funcionamento se restrinja ao período de sua realização.

§ 2o  O Ministério do Turismo expedirá certificado para cada cadastro deferido, inclusive de filiais, correspondente ao objeto das atividades turísticas a serem exercidas.

§ 3o  Somente poderão prestar serviços de turismo a terceiros, ou intermediá-los, os prestadores de serviços turísticos referidos neste artigo quando devidamente cadastrados no Ministério do Turismo.

§ 4o  O cadastro terá validade de 2 (dois) anos, contados da data de emissão do certificado.

§ 5o  O disposto neste artigo não se aplica aos serviços de transporte aéreo.

 

Logo, em que pese não desconhecer a existência de julgados desta Corte em sentido contrário, tenho que a imposição do cadastro (na hipótese, no Cadastur), para gozo da incidência da alíquota zero, decorreu de ato infralegal e não da lei estipuladora do benefício fiscal.

 

Ademais, tornou faculdade em condição obrigatória para a concessão da benesse a partir da edição da portaria.

 

Vale lembrar que o Ministério da Economia não possuía capacidade normativa para instituir a obrigação cadastral, excedendo a delegação concedida pela lei. Se a lei instituidora do benefício não o restringiu às empresas inscritas no Cadastur, não cabe ao ato infralegal limitar seu alcance, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade.

 

Frise-se, admitir que uma portaria possa inovar, criando uma obrigação para o contribuinte que não foi prevista em lei, importa violação ao disposto no art. 100, do CTN, pois desborda dos estreitos limites do poder regulamentar conferidos à Administração Fiscal.

 

Convém ressaltar, noutro giro, que a Medida Provisória nº 1.147/2022, de 22.12.22, alterou o art. 4º da Lei nº 14.148/2021, restringindo o benefício da alíquota zero, de modo que apenas os resultados das atividades relacionadas no novo texto (a serem detalhadas em portaria editada pelo Ministério da Economia) poderiam ser alvo do benefício fiscal, não mais sendo atingido todo o resultado auferido pela pessoa jurídica.

 

Posteriormente, com a edição da Lei n. 14.592, de 30 de maio de 2023, lei de conversão da Medida Provisória nº 1.147/2022, passou-se a estabelecer a necessidade de prévio registro no CADASTUR como requisito prévio para inscrição no PERSE. Confira-se:

 

 “Art. 1º O art. 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos abrangendo as seguintes atividades econômicas, com os respectivos códigos da CNAE: hotéis (5510-8/01); apart-hotéis (5510-8/02); albergues, exceto assistenciais (5590-6/01); campings (5590-6/02), pensões (alojamento) (5590-6/03); outros alojamentos não especificados anteriormente (5590-6/99); serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê (5620-1/02); produtora de filmes para publicidade (5911-1/02); atividades de exibição cinematográfica (5914-6/00); criação de estandes para feiras e exposições (7319-0/01); atividades de produção de fotografias, exceto aérea e submarina (7420-0/01); filmagem de festas e eventos (7420-0/04); agenciamento de profissionais para atividades esportivas, culturais e artísticas (7490-1/05); aluguel de equipamentos recreativos e esportivos (7721-7/00); aluguel de palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário, exceto andaimes (7739-0/03); serviços de reservas e outros serviços de turismo não especificados anteriormente (7990-2/00); serviços de organização de feiras, congressos, exposições e festas (8230-0/01); casas de festas e eventos (8230-0/02); produção teatral (9001-9/01); produção musical (9001-9/02); produção de espetáculos de dança (9001-9/03); produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares (9001-9/04); atividades de sonorização e de iluminação (9001-9/06); artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificadas anteriormente (9001-9/99); gestão de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas (9003-5/00); produção e promoção de eventos esportivos (9319-1/01); discotecas, danceterias, salões de dança e similares (9329-8/01); serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00):

(...)

§ 4º Somente as pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, em 18 de março de 2022, as atividades econômicas de que trata este artigo poderão usufruir do benefício.

§ 5º Terão direito à fruição de que trata este artigo, condicionada à regularidade, em 18 de março de 2022, de sua situação perante o Cadastro dos Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), nos termos dos arts. 21 e 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008 (Política Nacional de Turismo), as pessoas jurídicas que exercem as seguintes atividades econômicas: serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00).”

 

Sendo assim, o requisito da inscrição prévia no CADASTUR somente pode ser exigido para os pedidos de inscrição no PERSE ocorridos após a edição da supracitada lei.

 

Sobre o tema, válido trazer à baila os seguintes precedentes jurisprudenciais:

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 1.022 DO CPC. PRESSUPOSTOS. INEXISTÊNCIA. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. NÃO CABIMENTO. ADVENTO DE NORMA LEGAL A PREVER A EXIGÊNCIA.

1. Embargos de declaração opostos pela União (Fazenda Nacional) contra acórdão desta Quinta Turma que deu provimento ao agravo de instrumento.

2. O acórdão embargado tratou da questão ora reiterada no recurso, qual seja, o disposto na Portaria ME 7.163/2021 e a obrigatoriedade do registro no CADASTUR. Esta Quinta Turma se manifestou expressamente sobre o cerne da questão trazida à baila por ocasião da apreciação do recurso de agravo de instrumento, fundamentando que, a referida portaria estabelece uma limitação que afronta o princípio da legalidade estrita, já que restringe a concessão do benefício da desoneração fiscal prevista no art. 4º, da Lei nº 14.148, de 2021. Além disso, a Quinta Turma evidenciou a prevalência do entendimento segundo o qual o prévio registro no Cadastur não deve ser exigido para que a pessoa jurídica possa participar do PERSE.

3. Esta eg. 5ª Turma do TRF5 compreende que a Portaria ME nº 7.163/2021 violou o princípio da legalidade ao exigir a prévia inscrição no CADASTUR das empresas interessadas nas benesses do programa, pois, no momento da edição do referido normativo, não constava tal requisito na Lei nº 14.148/21.

4. Ocorre, todavia, que, com o advento da Medida Provisória nº 1.147, de 20/12/2022, e, mais especificamente, com o advento da respectiva lei de conversão (Lei nº 14.592, de 30/5/2023), o artigo 4º da Lei nº 14.148/2021 passou a estabelecer a necessidade de prévio registro no CADASTUR como requisito para a fruição da benesse (a necessidade de prévio registro no aludido cadastro não constava na redação da MP, mas passou a constar na redação da referida lei de conversão; o que já constava, na aludida medida provisória, era a previsão de que a benesse não poderia se aplicar a todas as atividades da pessoa jurídica, mas apenas àquelas expressamente previstas como relacionadas ao setor de eventos e turismo, devendo ser realizada a devida distinção e separação na contabilidade fiscal respectiva).

5. A respeito do novo panorama normativo, depreende-se que as referidas Medida Provisória nº 1.147, de 20/12/2022, e Lei nº 14.592, de 30/5/2023, não poderiam se aplicar de forma retroativa, alcançando períodos e fatos anteriores à sua vigência.

6. Em atenção ao princípio da anterioridade (seja o seja a anterioridade nonagesimal, para as contribuições sociais; seja a anual, para os demais tributos, 'ex vi' dos artigos 195, § 6º, e 150, III, b, todos da CF/88), não podem as novas normas ser aplicadas de imediato, mas mediante observância dos marcos temporais alusivos ao referido princípio (intervalo de 90 dias para as contribuições sociais e a data de 1º de janeiro do ano subsequente para os demais tributos).

7. Do exposto se infere que a impetrante somente poderia usufruir do benefício de redução a 0% (zero por cento) das alíquotas do Imposto de Renda sobre a Pessoa Jurídica - IRPJ, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, Contribuição para os Programas de Integração Social - PIS e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS, nos termos do art. 4º da Lei nº 14.148/2021, sobre todo seu resultado (englobando todas as atividades), até a finalização do princípio constitucional da anterioridade nonagesimal (para as contribuições sociais) e até o advento da data de 1º de janeiro de 2023 (para o IRPJ), tomando sempre por parâmetro a publicação da Medida Provisória nº 1.147, de 20 de dezembro de 2022, a partir de quando incidirão as regras desta, já transformada na Lei 14.592, de 30.05.2023. Tal se deve, como já dito, ao fato de a Medida Provisória haver limitado a fruição do PERSE apenas às atividades da pessoa jurídica relacionadas ao setor turístico e de eventos. Assim, se ela desenvolver atividades outras, serão estas excluídas a partir dos marcos temporais mencionados.

8. De seu turno, a despeito da inclusão da exigência de prévio registro no CADASTUR a partir da Lei nº 14.592, de 30 de maio de 2023, depreende-se sua inaplicabilidade às pessoas jurídicas que (como a demandante) haviam buscado sua inscrição no PERSE anteriormente ao seu advento. Suficiente que se observe que formulou exigência (de inscrição no CADASTUR em 18 de março de 2022) que não poderia ser validamente exigida. A exigência, para ser considerada legítima, somente poderia impor que a inscrição no referido Cadastro fosse anterior ao advento da própria lei (que ocorreu em 30 de maio de 2023), não podendo indicar uma data muito anterior à sua promulgação.

9. Embargos de declaração desprovidos. Diante do direito superveniente (Medida Provisória nº 1.147, de 20.12.2022, já convertida na Lei 14.592, de 30.05.2023), haverão de ser obrigatoriamente atendidos, pela pessoa jurídica contribuinte, os parâmetros mencionados no item 7.

(PROCESSO: 08017900420234050000, AGRAVO DE INSTRUMENTO, DESEMBARGADORA FEDERAL JOANA CAROLINA LINS PEREIRA, 5ª TURMA, JULGAMENTO: 18/09/2023)

 

TRIBUTÁRIO. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RECUPERAÇÃO DO SETOR DE EVENTOS - PERSE. LEI Nº 14.148/2021. EXIGÊNCIA DE INSCRIÇÃO PRÉVIA NO CADASTUR. PORTARIA ME Nº 7.163/2021. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. ILEGALIDADE. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.147/2022. ALTERAÇÃO DO ART. 4°, CAPUT DA LEI Nº 14.148/2021. RESTRIÇÃO A ATIVIDADES ESPECIFICADAS. ELEVAÇÃO DA CARGA TRIBUTÁRIA. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE. LEI Nº 14.592/2023. ALTERAÇÃO DO ART. 4°, § 5º, DA LEI Nº 14.148/2021. INTRODUÇÃO DA EXIGÊNCIA DE PRÉVIO CADASTRO NO CADASTUR. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO RESTRITA ÀS EMPRESAS QUE PLEITEAREM O INGRESSO APÓS A LEI. PROVIMENTO PARCIAL DA APELAÇÃO E DA REMESSA NECESSÁRIA.

1. Apelação interposta pela Fazenda Nacional e remessa necessária contra sentença do Juízo da 2ª Vara Federal de Pernambuco (Magistrado Rafael Tavares da Silva), que concedeu a segurança pleiteada no sentido de garantir o ingresso do particular no Programa de Retomada do Setor de Eventos - PERSE.

2. O PERSE foi criado pelo Governo Federal para combater os efeitos na economia da adoção das medidas de isolamento ou de quarentena realizadas para enfrentamento da pandemia da Covid-19.

3. Os requisitos para ingressar no PERSE encontram-se disciplinados na Lei n° 14.148/2021.

4. A Portaria ME n° 7.163/2021 incluiu exigência indevida de que a pessoa jurídica interessada já possuísse inscrição regular no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos - CADASTUR quando da data de publicação da Lei n. 14.148/2021, para que pudesse ter acesso ao PERSE.

5. Em razão disso, a Portaria ME nº 7.163/2021 violou o princípio da legalidade, devendo tal exigência ser afastada in concreto.

6. Posteriormente, a redação do art. 4º, da Lei nº 14.148/2021, foi alterada pela Medida Provisória nº 1.147/2022, instituindo-se restrição ao benefício de alíquota zero trazido pelo PERSE.

7. Nos termos da nova redação do art. 4º, apenas aos resultados das atividades ali relacionadas (a serem detalhadas em portaria editada pelo Ministério da Economia) podem ser alvo do benefício fiscal e não mais todo o resultado auferido pela pessoa jurídica.

8. A Solução de Consulta n° 52 - COSIT, de 2023, definiu que, para apuração dos tributos sujeitos ao benefício fiscal do PERSE, é necessário segregar as receitas e resultados auferidos pela pessoa jurídica em duas categorias distintas, conforme tais valores sejam abrangidos ou não pelo referido benefício.

9. A alteração em tela deverá observar o princípio da anterioridade, seja o nonagesimal, seja o anual, delineados no art. 150, § 1º, da Constituição, uma vez que se trata de uma alteração legislativa que envolve matéria tributária e implica em majoração da carga tributária final do contribuinte.

10. Mais recentemente, a Medida Provisória nº 1.147/2022 foi convertida na Lei nº 14.592/2023, que acrescentou mais uma modificação na Lei nº 14.148/2021.

11. De acordo com a nova redação do § 5º, do art. 4º, da Lei nº 14.148/2021, passou-se a exigir do contribuinte o prévio registro no CADASTUR para fruição dos benefícios do PERSE.

12. A alteração legislativa incorporou o requisito antes veiculado somente pela Portaria ME n° 7.163/2021, corrigindo o vício de legalidade anteriormente existente.

13. Entretanto, tal exigência só poderá ser imposta às empresas que requereram administrativamente o gozo do benefício ou que ingressaram em juízo após a aludida alteração (20/05/2023), uma vez que ela não poderá ser aplicada retroativamente, de modo a atingir períodos e fatos anteriores à sua vigência, em razão do postulado da irretroatividade da lei.

14. Na hipótese dos autos, se está diante de empresa que desempenha atividade contemplada pela lei como as que podem ter acesso ao PERSE (56.11-2-01 - Restaurante e Similares).

15. Tendo a demanda sido ajuizada em 03/06/2022, a empresa faz jus ao ingresso no PERSE sem observância da exigência de prévia inscrição no CADASTUR, mas com as restrições relativas às atividades contempladas no programa, respeitadas as regras da anterioridade pertinentes especificamente aos impostos e contribuições contemplados no programa.

16. A possibilidade da declaração do direito à compensação encontra fundamento no artigo 170 do Código Tributário Nacional (CTN), assim como nas Leis n° 8.383/91 (art. 66) e 9.430/96 (art. 74).

17. Segundo o art. 170-A do CTN, acrescido pela Lei Complementar nº. 104/2001, deve ser condicionada a compensação à verificação do trânsito em julgado da sentença.

18. Os valores a serem compensados devem ser corrigidos exclusivamente pela taxa SELIC, que já engloba juros e correção monetária, na forma prevista no artigo 39, § 4º, da Lei 9.250/95 e deverá ser observada a norma do art. 166, do CTN, com relação ao PIS e à COFINS, por se tratarem de tributos indiretos.

19. No que tange à repetição de indébito dos valores recolhidos durante a tramitação do mandado de segurança, o valor deverá ser restituído ao contribuinte por meio de requisitório de pagamento, por força do art. 100, da Constituição.

20. Apelação e remessa oficial parcialmente providas.

 (PROCESSO: 08089314020224058300, APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA, DESEMBARGADORA FEDERAL CIBELE BENEVIDES GUEDES DA FONSECA, 5ª TURMA, JULGAMENTO: 18/09/2023)

 

No caso concreto, observa-se que a impetrante atua no ramo de “Restaurante, Cafeteria, Bar e Similares” (ID 290356507), estabelecimentos estes abrangidos pelo PERSE, sendo que este writ foi impetrado em 24.06.2022, de modo que faz jus ao ingresso no PERSE sem observância da exigência de prévia inscrição no CADASTUR, desde que observadas as restrições relativas às atividades contempladas no programa, respeitadas as regras da anterioridade pertinentes especificamente aos impostos e contribuições contemplados no programa.

 

 Logo, escorreita a sentença que reconheceu “à parte impetrante o direito de aplicar o benefício de alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre todas as receitas da pessoa jurídica na forma prevista pelo art. 4º da Lei nº 14.148/21, durante todo o prazo estipulado na referida norma (60 meses), desde que a parte impetrante, em 18 de março de 2022, estivesse com inscrição em situação regular no Cadastur, para fins de aplicação do benefício a receitas ou resultados decorrentes de atividades econômicas constantes do Anexo II da Portaria ME nº 7.163, de 2021”.

 

Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária e à apelação.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS – PERSE. LEI 14.148/2021. ATIVIDADES TIPICAMENTE ALHEIAS AO SETOR DE TURISMO.  OBRIGATORIEDADE DE PRÉVIA INSCRIÇÃO NO CADASTUR. PORTARIA ME Nº 7.163/2021. LEI nº 11.771/2008. AUSÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA ISONOMIA. SENTENÇA ULTRA PETITA. REDUÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO. REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 

1. A r. sentença é ultra petita no que se refere às receitas auferidas em atividades estranhas ao setor de eventos, impondo-se sua redução para que a concessão da segurança somente se dê quanto às receitas auferidas no desempenho da atividade objeto do CNAE 5611-2/01 (Restaurantes e Similares).   

2. Adentrando o mérito, instituído pela Lei 14.148/2021, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - PERSE estabelece ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da COVID/19. Dentre os benefícios fiscais, está a redução para zero, pelo prazo de 60 meses, das alíquotas de PIS, COFINS, CSLL e IRPJ devidos pelas pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas elencadas. 

3. A Lei 11.771/2008, que dispõe sobre a Política Nacional de Turismo, definiu quais são atividades típicas da "cadeia produtiva do turismo" (caputdo art. 21), cujo cadastro no Ministério do Turismo é obrigatório, e quais são as atividades equiparadas (parágrafo único do art. 21), que podem se registrar no CADASTUR, cujo cadastro é obrigatório para fins de acesso a programas de apoio e outros benefícios legais (art. 33, I). 

4. Por exigência do § 2º, do art. 2º da Lei 14.148/2021, o Ministério da Economia editou a Portaria ME nº 7.163/2021, trazendo os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE considerados do setor de eventos, definindo no Anexo I as atividades econômicas que estão enquadradas no PERSE,e no Anexo II as atividades cujo enquadramento é permitido, desde que na data da publicação da Lei nº 14.148/2021, estivessem registradas no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos - CADASTUR. 

5. A exigência de inscrição prévia no CADASTUR para usufruir dos benefícios do PERSE não se mostra desarrazoada, na medida em que as atividades descritas nos incisos do parágrafo único do art. 21 da Lei 11.771/2008 (como restaurantes e bares, por exemplo) não são, necessariamente, qualificadas como pertencentes ao setor turístico. Tanto é que a apelante não está registrada no CADASTUR, embora o cadastro já fosse obrigatório aos prestadores de serviços tipicamente turísticos e efetivamente atuantes (art. 22). 

6. Assim, a Portaria ME 7.163/2021 não extrapola as disposições das Leis 14.148/2021 e 11.771/2008, apenas possibilita a adesão ao PERSE de pessoas jurídicas que exercem atividades que não são típicas do setor de eventos, mas podem nele atuar, para o que se exige o registro no CADASTUR. 

7. Não se identifica, portanto, que a norma regulamentar apresente ilegalidade ou abuso a atrair a interferência do Poder Judiciário. Precedente (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5015579-09.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 29/08/2022, Intimação via sistema DATA: 01/09/2022). 

8. Nesse contexto, porém, impende observar que o marco temporal a ser considerado para a verificação da inscrição do contribuinte no CADASTUR é 18/03/2022, data em que já estava vigente o cadastro da parte impetrante, conforme certificado ID 290356507 juntado com a inicial.  

9. Por fim, descabe emitir provimento jurisdicional específico acerca de inovações legais e/ou normativas supervenientes ao ajuizamento da presente ação, a exemplo da MPV 1.202/2023 e das Leis 14.592/2023 e 14.859/2024. 

10. Remessa necessária parcialmente provida. Apelação desprovida. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do voto do Relator, sendo que os Des. Fed. CONSUELO YOSHIDA e CARLOS DELGADO acompanharam por fundamento diverso, e, por maioria, deu parcial provimento à remessa oficial, nos termos do voto da Des. Fed. CONSUELO YOSHIDA, vencido o Relator, que lhe negava provimento. Lavrará o acórdão a Des. Fed. CONSUELO YOSHIDA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

CONSUELO YOSHIDA
DESEMBARGADORA FEDERAL