APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5002633-85.2020.4.03.6107
RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE: ANDERSON AUGUSTO VIEIRA
Advogados do(a) APELANTE: CLAUDIA MARIA POLIZEL - SP336721-A, EDUARDO DE SOUZA STEFANONE - SP127390-A
APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5002633-85.2020.4.03.6107 RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI APELANTE: ANDERSON AUGUSTO VIEIRA Advogados do(a) APELANTE: CLAUDIA MARIA POLIZEL - SP336721-A, EDUARDO DE SOUZA STEFANONE - SP127390-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: Trata-se de apelação criminal interposta pela defesa de ANDERSON AUGUSTO VIEIRA, em face de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Araçatuba/SP, que julgou procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia, para condenar o réu como incurso nas disposições do artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, c.c. artigos 1º e 2º do Decreto-Lei nº 399/1968. Narra a denúncia (ID 282069177): "No dia 7 de dezembro de 2020, o denunciado foi preso em flagrante porque adquiriu, recebeu e transportou, dentro do território nacional, mercadoria proibida de procedência estrangeira para fins comerciais, que sabia ser produto de introdução clandestina, bem como praticou fato assimilado, em lei especial, a contrabando, consubstanciado no transporte de cigarros de procedência estrangeira desprovidos de documentação comprobatória de sua regular importação. Segundo consta, na data acima mencionada, por volta das 23h30, os policiais militares rodoviários Silazak, Andreazzi e Valdenor estavam com a viatura parada em fiscalização do tráfego local na altura do km 44,5 da Rodovia SP-461, Deputado Rollemberg, município de Brejo Alegre-SP, quando avistaram o veículo GM, modelo Classic, placas CWQ 1120, trafegando pelo sentido sul apagando imediatamente os faróis. Em razão dessa atitude foram atrás do veículo por aproximadamente 3 km, quando o mesmo perdeu o controle saindo da pista. Os dois ocupantes do veículo, o denunciado Anderson e sua mulher Jéssica Delfino Vieira tentaram fugir, sendo capturados logo em seguida. Durante a abordagem, constataram que o veículo continha aproximadamente 8 (oito) caixas com 50 (cinquenta) pacotes de cigarros de diversas marcas. Segundo os policiais, Anderson assumiu a posse dos cigarros, afirmando tê-los adquirido na cidade de Buritama-SP para levá-los para Birigui-SP. Conforme o auto de infração e termo de apreensão e guarda-fiscal de mercadorias elaborado pela Delegacia da Receita Federal do Brasil em Araçatuba/SP foram apreendidos com o denunciado 7.120 (sete mil, cento e vinte) maços de cigarros de origem estrangeira das marcas EIGHT, TE, CLASSIC e R7. Ressalta-se, ainda, que de acordo com o apurado pela Receita Federal no mesmo Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal supracitado, os cigarros apreendidos foram avaliados em R$ 35.600,00 (trinta e cinco mil e seiscentos reais), o que corresponde ao não recolhimento de tributos na ordem de R$ 30.250,74 (trinta mil, duzentos e cinquenta reais e setenta e quatro centavos) aos cofres públicos, no caso de importação regular (fls. 13/21 do ID 52336841). A importação de cigarros por pessoas físicas é proibida, qualquer que seja sua origem, nos termos dos arts. 45 a 51, da Lei nº 9.532/97. Na Delegacia de Polícia, Anderson preferiu fazer uso de seu direito constitucional ao silêncio (fls. 5 e 6 do ID 43046489). [...]." Ao final, o Ministério Público Federal denunciou o réu como incurso nas penas do artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, combinado com o art. 3º, do Decreto-Lei nº 399/1968. A denúncia foi recebida em 22/06/2021 (ID 282069179). Após regular instrução, sobreveio a sentença (ID 282069264), pela qual o magistrado de primeiro grau julgou procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia, para condenar o réu pela prática do crime previsto no artigo 334-A, §1º, I e V do Código Penal, c.c. arts. 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/1968, à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos, 3 (três) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial aberto. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e em prestação pecuniária, no importe de 39 (trinta e nove) cestas básicas, cada qual no valor de R$ 200,00 reais, atualizados até a data do efetivo pagamento, cuja forma de pagamento e entidade beneficente serão estabelecidos pelo Juízo da Execução. Foi aplicada a inabilitação para dirigir veículo, pelo mesmo tempo da pena privativa de liberdade estabelecida. Por fim, o magistrado a quo condenou o réu ao recolhimento das custas judiciais, e concedeu ao réu o direito de apelar em liberdade. A sentença foi publicada em 05 de julho de 2023. Irresignada, a defesa de ANDERSON interpôs recurso de apelação (ID 282069271). Em suas razões recursais (ID 282069274), a defesa requer, preliminarmente, a declaração de incompetência da Justiça Federal para julgar o feito, por não ter sido comprovada a transnacionalidade da conduta praticada, com a consequente declaração de nulidade dos atos decisórios e remessa dos autos à Justiça Estadual. Também preliminarmente, aduz a falta de justa causa para a ação penal, uma vez que não houve a constituição definitiva do crédito tributário. No mérito, pugna pelo decreto absolutório, em razão da não comprovação da materialidade delitiva, considerando que não foi elaborado laudo merceológico tendo por objeto os cigarros apreendidos. Subsidiariamente, requer a isenção de pagamento das custas processuais, aduzindo a inconstitucionalidade da reprimenda, e o afastamento da inabilitação para dirigir veículo. A acusação apresentou contrarrazões (ID 282069278). Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República ofereceu parecer pelo não provimento do recurso (ID 290866030). É o relatório. Sujeito à revisão, na forma regimental.
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5002633-85.2020.4.03.6107 RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI APELANTE: ANDERSON AUGUSTO VIEIRA Advogados do(a) APELANTE: CLAUDIA MARIA POLIZEL - SP336721-A, EDUARDO DE SOUZA STEFANONE - SP127390-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: 1. Da capitulação jurídica A narrativa dos fatos declinada na exordial acusatória demonstra que a conduta criminosa engendrada, em tese, pelo réu, consiste no transporte de cigarros de origem estrangeira, sem documentação de sua regular importação, e no recebimento de mercadoria proibida, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial. Portanto, a conduta que lhe foi imputada deve ser analisada sob a ótica do artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, na redação dada pela Lei 13.008/14, combinado com os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/1968, que versam: "Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida: Pena - reclusão, de um a quatro anos. §1º - Incorre na mesma pena quem: I - pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando; V - adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira". "Art. 2º O Ministro da Fazenda estabelecerá medidas especiais de contrôle fiscal para o desembaraço aduaneiro, a circulação, a posse e o consumo de fumo, charuto, cigarrilha e cigarro de procedência estrangeira. Art. 3º Ficam incursos nas penas previstas no artigo 334 do Código Penal os que, em infração às medidas a serem baixadas na forma do artigo anterior adquirirem, transportarem, venderem, expuserem à venda, tiverem em depósito, possuírem ou consumirem qualquer dos produtos nêle mencionados.” Extrai-se da leitura dos dispositivos que o artigo 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal estabelece que incorre na pena prescrita para o delito de contrabando aquele que pratica fato assimilado em lei especial. O art. 3º do Decreto nº 399/68, por sua vez, complementa a referida norma penal em branco, e equipara ao delito de contrabando a conduta de transportar cigarro de procedência estrangeira. Assim, adequada a capitulação jurídica da conduta imputada ao réu, subsumida ao artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, na redação dada pela Lei 13.008/14, combinado com os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/1968. 2. Das preliminares 2.1. Da competência da Justiça Federal A preliminar apresentada pela defesa para que se decline da competência em favor da Justiça Estadual não merece prosperar. A princípio, trago à colação o entendimento exarado pelo E. Superior Tribunal de Justiça na Súmula nº 151: "A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando ou descaminho define-se pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens". Observa-se, assim, a competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento das infrações penais de contrabando e descaminho, não se mostrando plausível acolher posição diversa, em especial porque desacompanhada de motivo jurídico relevante. Saliento que não foi imputada ao recorrido a prática da conduta descrita no caput do artigo 334-A do Código Penal, que envolveria a importação dos cigarros. O comportamento do réu foi subsumido, adequadamente, àquele previsto no parágrafo 1º, incisos I e V, do referido dispositivo legal, consoante descrito na denúncia. O conjunto probatório demonstra que os cigarros apreendidos em poder do apelante têm procedência estrangeira e estavam desacompanhados de documentação comprobatória de sua regular introdução no país. A origem estrangeira dos cigarros apreendidos, internados irregularmente, evidencia a transnacionalidade da conduta perpetrada acusado. Além disso, a conduta analisada é manifestamente lesiva a interesses da União, tais como a saúde e segurança públicas, a indústria nacional, o interesse estatal no controle da entrada e saída de produtos, além de, por via transversa, a atividade arrecadatória do Estado, e por isso gera a competência federal para julgamento do presente feito, de acordo com o disposto no artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal de 1988. Neste sentido, colaciono julgados do Superior Tribunal de Justiça em conflitos de competência: CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PROCESSUAL PENAL. CIGARROS DE ORIGEM ESTRANGEIRA E NACIONAL. APREENSÃO. CONTRABANDO. CONFIGURAÇÃO. COMPETÊNCIA FEDERAL ESTABELECIDA. FALSIFICAÇÃO DE SELOS TRIBUTÁRIOS (ART. 293, § 1.º, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL). CONEXÃO PROBATÓRIA EVIDENCIADA. OUTROS EVENTUAIS DELITOS CONEXOS. JUSTIÇA FEDERAL. COMPETÊNCIA. SÚMULA N. 122 DO STJ. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO SUSCITADO. AGRAVO REGIMENTAL EM CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL X JUSTIÇA ESTADUAL. AÇÃO PENAL. CONTRABANDO DE CIGARROS. VENDER OU EXPOR À VENDA, NO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE COMERCIAL, MERCADORIA ESTRANGEIRA PROIBIDA PELA LEI BRASILEIRA (ART. 334-A, § 1º, IV, DO CP). SÚMULA 151/STJ. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DO INVESTIGADO NA INTERNALIZAÇÃO DA MERCADORIA NO PAÍS. "CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. INQUÉRITO POLICIAL. JUSTIÇA FEDERAL E JUSTIÇA ESTADUAL. CONTRABANDO DE CIGARROS. DISSENSO ACERCA DA NECESSIDADE DE INDÍCIOS DE TRANSNACIONALIDADE NA CONDUTA DO AGENTE PARA FINS DE FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DESNECESSIDADE. SÚMULA 151/STJ. ORIENTAÇÃO QUE DEVE PREVALECER, A PAR DE PRECEDENTES RECENTES EM SENTIDO DIVERSO. CRIME QUE TUTELA INTERESSE DA UNIÃO. Resta rejeitada, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal. 2.2. Da justa causa para a ação penal A defesa almeja o reconhecimento da falta de justa causa para a presente ação penal, em virtude da inexistência de processo administrativo tributário. Saliento, entretanto, que seus argumentos são delineados em relação ao delito de descaminho, que não corresponde ao delito apurado no presente feito, de modo que a tese defensiva será analisada sob a ótica do crime de contrabando apurado no caso concreto. A importação, o recebimento, o transporte e a comercialização de cigarros de origem estrangeira, dentre outras condutas previstas no artigo 334-A do Código Penal, têm como consequência, para além da perda arrecadatória, a lesão a outros interesses públicos ainda mais importantes, como a saúde e a atividade comercial. Assim, o crime de contrabando consuma-se independentemente do prejuízo causado ao erário, com o não pagamento do imposto devido na entrada, e independentemente da apuração fiscal do valor do tributo sonegado. Segundo leciona Guilherme de Souza Nucci, tanto o contrabando quanto o descaminho de mercadorias classificam-se como crimes formais, não se exigindo, "para sua consumação, resultado naturalístico, consistente na produção de efetivo dano para Administração Pública", inclusive nas modalidades "exportar", "importar" ou "iludir o pagamento" (Código Penal Comentado, 14. ed. Rio de Janeiro: Gen, Forense, p. 1184). Nesse tocante, levando-se em consideração a natureza formal do contrabando, não se deve atrelar sua tipicidade à constituição definitiva do crédito tributário, não se aplicando à hipótese a súmula nº 24 do STF, cujo escopo restringe-se aos crimes materiais. Trago à colação os seguintes arestos: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS, TRÁFICO TRANSNACIONAL DE ARMAS E CONTRABANDO DE CIGARROS. VIOLAÇÃO: ART. 45 DO CP; ART. 70 DO CP; ARTS. 573, 563, 564, III, C, E IV, DO CPP; ART. 334-A DO CP; ART. 40, I, DA LEI N. 11.343/2006; ART. 18 DA LEI N. 10.826/2003; ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. ALEGAÇÃO DE COLIDÊNCIA DEFENSIVA. TESE DE NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. NOMEAÇÃO DE NOVO DEFENSOR. REDESIGNADA DATA PARA NOVO INTERROGATÓRIO. PROVAS NÃO ESPECIFICADAS PELO RECORRENTE. TESTEMUNHAS NÃO INDICADAS PELO RECORRENTE. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. TESE DA AUSÊNCIA DE CONDIÇÃO OBJETIVA DE PUNIBILIDADE QUANTO AO CRIME DE CONTRABANDO DE CIGARROS. ALEGAÇÃO DE NECESSÁRIA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. JURISPRUDÊNCIA CONTRÁRIA DO STJ. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO QUANTO AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. ALEGAÇÃO DE FRAGILIDADE PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. PEDIDO DE EXCLUSÃO DA MAJORANTE DA TRANSNACIONALIDADE. ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. TESE DE AUSÊNCIA DE PROVAS DA IMPORTAÇÃO OU TRANSNACIONALIDADE DAS ARMAS APREENDIDAS. DESCLASSIFICAÇÃO. RECONHECIMENTO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS COM SUPORTE NA QUANTIDADE E FORMA DE ACONDICIONAMENTO, BEM COMO DA LOCALIDADE ONDE SE DEU A APREENSÃO: FOZ DO IGUAÇU/PR. PRESCINDIBILIDADE DE EFETIVA TRANSPOSIÇÃO DE FRONTEIRAS. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. RECORRENTE QUE ADMITIU TER REALIZADO A VIAGEM ATÉ O PARAGUAI. ARMAS E ACESSÓRIOS, DROGAS E CIGARROS APREENDIDOS EM UM FUNDO FALSO DE ÔNIBUS. SÚMULA 607/STJ. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. INVIABILIDADE DE DESCONSTITUIÇÃO DO QUANTO AFERIDO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. QUANTIDADE E A NATUREZA DA DROGA APREENDIDA (58,3 KG DE MACONHA), FORMA DE ACONDICIONAMENTO E AS CIRCUNSTÂNCIAS DA PRISÃO. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE CONCURSO FORMAL PRÓPRIO. DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. DESCONSTITUIÇÃO. INVIABILIDADE NA VIA ELEITA. SÚMULA 7/STJ. [...] 3. Descabida a tese de que a condenação pelos crimes de contrabando e descaminho exigem, como condição de procedibilidade, a inscrição definitiva do débito tributário. Em razão da sua natureza formal, desnecessária a constituição definitiva do crédito tributário para se poder iniciar a ação penal pela suposta prática do crime de descaminho ou contrabando. 4. A Quinta Turma deste Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o delito previsto no art. 334 do Código Penal se configura no ato da importação irregular de mercadorias, sendo desnecessário, portanto, o exaurimento das vias administrativas e constituição definitiva do crédito tributário para a sua apuração criminal. (AgRg no AREsp 1.034.891/SP, Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 23/6/2017). [...] É entendimento sedimentado desta Corte que, nas hipóteses de descaminho, não é exigida a constituição definitiva do crédito tributário para a consumação do delito (AgRg no REsp 1.807.259/SC, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe de 2/8/2019). [...] "Nos termos do art. 334 do Código Penal, o crime de descaminho se perfaz com o ato de iludir o pagamento de imposto devido pela entrada de mercadoria no país. Desnecessária, portanto, a apuração administrativo-fiscal do montante que deixou de ser recolhido para a configuração do delito. O mesmo raciocínio deve ser aplicado ao delito de contrabando. Precedentes" (AgRg no REsp 1419119/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 18/03/2014, DJe 28/03/2014) (REsp n. 1.964.529/CE, Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, DJe de 10/6/2022). [...] 14. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no REsp n. 1.862.237/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 10/3/2023.) (grifo nosso) RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. TIPICIDADE. CRIME FORMAL. DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO COM FRAUDE. FALSA DECLARAÇÃO DE CONTEÚDO. ILUDIR O PAGAMENTO DE TRIBUTOS. RECURSO ESPECIAL. IMPORTAÇÃO DE CIGARROS. ART. 334, §1º, D, DO CÓDIGO PENAL. PRODUTO DE PROIBIÇÃO RELATIVA. AUSÊNCIA DA DOCUMENTAÇÃO NECESSÁRIA. DELITO PLURIOFENSIVO. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DESNECESSIDADE. 1. Hipótese em que o condenado foi surpreendido realizando o transporte de grande volume de cigarros de origem estrangeira desacompanhados da documentação comprobatória da regular importação. 2. O cigarro é mercadoria de proibição relativa, cuja importação ou exportação clandestina configura delito de contrabando, que busca tutelar o interesse estatal no controle da entrada e saída de produtos, assim como a saúde e segurança públicas. 3. É irrelevante, desse modo, o lançamento de eventual crédito tributário porque o delito se consuma com a simples entrada ou saída do produto proibido. 4. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ, REsp 1.454.586/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 02/10/2014, DJe 09/10/2014) (grifo nosso) PENAL - CRIME DE CONTRABANDO - CIGARROS DE PROCEDÊNCIA ESTRANGEIRA - COMERCIALIZAÇÃO PROIBIDA - INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - PRÉVIA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. 1.Não há que se falar em flagrante preparado no caso concreto eis que não houve agente provocador mas simplesmente campana feita pelos policiais, o que configura o flagrante esperado. 2- Os cigarros de origem estrangeira internados irregularmente no território nacional são mercadorias cuja importação é proibida, assim, como sua comercialização. 3- É inaplicável o princípio da insignificância ao caso concreto, vez que se trata de crime de contrabando de cigarros. Tratando-se de crime de contrabando o valor das mercadorias apreendidas (cigarros) é irrelevante não havendo tributos a ilidir, mas sim proibição de importação e comercialização de mercadorias. 4- A inexistência de constituição e lançamento do crédito tributário, não acarreta a atipicidade do tipo ou falta de justa causa para persecução da ação penal, nos termos da Súmula 24 do Supremo Tribunal Federal, por ser crime formal. 5- O procedimento fiscal no caso de apreensão de cigarros estrangeiros visa principalmente o perdimento das mercadorias para proteção da saúde e segurança nacional. 6- A jurisprudência unânime dos Tribunais Superiores é no sentido de que a importação de cigarros é crime de contrabando e não de descaminho com grave lesão à saúde pública, higiene, segurança e saúde pública. 7- A materialidade delitiva restou demonstrada no Auto de Exibição e Apreensão (fl. 09) e Laudo nº 297394/15 do Instituto de Criminalística à fl. 25/26. De igual sorte, a autoria delitiva está comprovada nos autos. 8- A ré confessou o crime, não alterando, contudo, o quantum da pena, vez que não pode ser fixada abaixo do mínimo, nos termos da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. 9- Mantido o regime inicial aberto e a substituição da pena corporal por duas penas restritivas de direitos consistentes em: uma pena de prestação de serviços à comunidade ou entidade pública a ser designado pelo Juiz da Execução Penal e uma pena pecuniária no valor de 04 (quatro) salários mínimos que, de ofício, fica destinada à União, nos termos do artigo 45, § 1º, do Código Penal. 10- Recurso de defesa desprovido. De ofício, alterada a destinação da prestação pecuniária para a União. (AP. 00014786020154036123, JUÍZA CONVOCADA GISELLE FRANÇA, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/10/2017. FONTE_REPUBLICACAO) (grifo nosso) Não há se falar, ao contrário do arguido pela defesa, em necessidade de constituição definitiva do crédito tributário para a tipificação do crime em tela. 3. Da materialidade Sustenta a defesa a ausência de laudo merceológico apto a demonstrar a materialidade, pelo que pugna pela absolvição. A materialidade delitiva foi comprovada pelo Auto de Apresentação e Apreensão nº 1663695/2020 (ID 282068971, p. 8), pelo Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias nº 081020-14657/2021 (ID 282069170, pp. 12/19), e pelo Demonstrativo dos créditos tributários que deixaram de ser recolhidos (ID 282069170, p. 20). Com efeito, os documentos acima elencados certificam a apreensão de 7.120 maços de cigarros de origem estrangeira, das marcas Eight, TE, Classic e R7, avaliadas em R$ 35.600,00 (trinta e cinco mil e seiscentos reais), com valor presumido de tributos federais no montante de R$ 26.344,00 (vinte e seis mil, trezentos e quarenta e quatro reais), tornando inconteste a materialidade delitiva. O laudo pericial não representa prova imprescindível para aferição da prática do crime de contrabando, quando a materialidade do delito puder ser demonstrada por outros meios de prova. Com efeito, a inexistência de exame merceológico não compromete a materialidade delitiva, tendo em vista que o conjunto probatório é farto. Deveras, o Auto de Apresentação e Apreensão, confeccionado pela Delegacia de Polícia Federal em Araçatuba, bem como o Auto de Infração e Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias, elaborado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, são documentos hábeis a comprovar a materialidade do crime em apreço, inclusive a origem alienígena dos cigarros apreendidos. Os agentes da Secretaria da Receita Federal do Brasil têm aptidão técnica para a verificação da procedência e valor dos cigarros apreendidos, dispondo os documentos de presunção de legitimidade e veracidade. Dispõe a jurisprudência: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRABANDO. CIGARROS. MATERIALIDADE. DISPENSA DO LAUDO MERCEOLÓGICO. EXISTÊNCIA DE CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA SE AFERIR A ORIGEM ESTRANGEIRA DO CIGARRO CONTRABANDEADO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. JULGAMENTO EXTRA PETITA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO ENTRE A DENÚNCIA E A SENTENÇA. INOCORRENTE. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Agravante condenado à 3 (três) anos e 1 (um) mês de reclusão, substituída por duas restritivas de direitos, pela prática do crime previsto no art. 334, §1º, "c", do CP, uma vez que manteve em depósito milhares de maços de cigarros de proveniência estrangeira, introduzidos ilegalmente em território brasileiro. 2. A condenação decretada nos autos espelha fundamentação fático-jurídica calcada tanto em elementos informativos da fase policial como em provas regularmente produzidas no curso da instrução criminal, observado o devido processo legal e seus consectários - contraditório e ampla defesa. 3. A dispensa do laudo merceológico não ocorreu de forma aleatória ou infundada. No caso, a instância ordinária considerou prescindível o trabalho técnico, porquanto há nos autos diversas outras fontes probatórias idôneas para se aferir a origem estrangeira dos cigarros contrabandeados. 4. Modificar a decisão da instância ordinária, no ponto, dependeria do reexame de matéria fático-probatória, o que, em sede de recurso especial, constitui medida vedada pelo óbice da Súmula n. 7/STJ. 5. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, o réu se defende dos fatos delimitados pela denúncia, e não da capitulação jurídica atribuída pelo órgão de acusação. Precedentes. 6. No caso concreto, incorre ofensa ao princípio da correlação entre a acusação e a condenação, nem é possível se falar em julgamento extra petita, pois o fato descrito na denúncia permite visualizar o perfazimento da circunstância agravante imputada ao agravado. 7. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no AREsp n. 1.421.752/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 12/3/2019, DJe de 25/3/2019.) (grifo nosso) PENAL. PROCESSO PENAL. CONTRABANDO. AUSÊNCIA DE LAUDO MERCEOLÓGICO. POSSIBILIDADE DE CONSTATAÇÃO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. PRESENTES A COMPROVAÇÃO DE AUTORIA E MATERIALIDADE. NÃO ACOLHIMENTO. DOSIMETRIA. RECURSO DESPROVIDO. 1. O laudo merceológico não é imprescindível para comprovação da materialidade do crime de contrabando, que pode ser constatada por outros meios de prova. 2. Pedido de absolvição, porém, comprovada a materialidade e autoria delitiva, bem como, ausentes qualquer causa de exclusão de ilicitude ou culpabilidade, fica mantida a condenação. 3. Circunstâncias judiciais desfavoráveis. Ausentes atenuantes e presente causa agravante. Manutenção da pena fixada. 4. Recurso da defesa desprovido. (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 69244 - 0008941-38.2010.4.03.6120, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO, julgado em 19/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/03/2018) (grifo nosso) DIREITO PENAL. CONTRABANDO. CIGARRO. 334-A, § 1º, I, DO CÓDIGO PENAL. LAUDO MERCEOLÓGICO. IMPRESCINDIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA. COMPROVAÇÃO. 1. O laudo merceológico não é essencial para aferir a origem e o valor da mercadoria apreendida, bem como o montante de tributos iludidos, havendo outros elementos de prova, mormente os documentos elaborados pelos agentes fazendários, capacitados para a identificação e avaliação de produtos irregularmente importados. 2. O transporte de cigarros ilicitamente internalizados no país se subsume, por assimilação, ao tipo penal contido no artigo 334-A, § 1º, I, do Código Penal que, por se tratar de norma penal em branco, é complementada pelo art. 3º do Decreto-Lei nº 399/68. 3. Comprovadas a materialidade e autoria, e inexistindo causas de exclusão da ilicitude e da culpabilidade, impõe-se a condenação do réu. (TRF4, ACR 5016292-16.2016.4.04.7000, OITAVA TURMA, Relator LEANDRO PAULSEN, j. 09/08/2017) (grifo nosso) DIREITO PENAL. DESCAMINHO. NULIDADE DO FEITO POR AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO QUANTO AO AUTO DE INFRAÇÃO. NÃO RECONHECIMENTO. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DESNECESSIDADE. ORIGEM ESTRANGEIRA DAS MERCADORIAS. COMPROVAÇÃO. FRACIONAMENTO DOS TRIBUTOS. IMPOSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. 1. Consoante se verifica nos autos do IPL, os acusados foram intimados acerca do Auto de Infração quando do momento da autuação e apreensão, deixando de impugná-lo no prazo estipulado pela Receita Federal. 2. A conclusão do processo administrativo não é condição de procedibilidade para a deflagração do processo-crime pela prática de delito do artigo 334 do Código Penal, tampouco a constituição definitiva do crédito tributário é pressuposto ou condição objetiva de punibilidade. 3. A Receita Federal do Brasil é órgão responsável pelo controle e repressão do ingresso irregular de mercadorias estrangeiras no território brasileiro, possuindo seus agentes aptidão técnica para diagnosticar se as mercadorias apreendidas são efetivamente de origem estrangeira e, contam os mesmos com instrumentos hábeis para mensurar o seu valor, sendo desnecessária a elaboração de laudo merceológico para constatação da materialidade do crime de contrabando.[...] (TRF4, ACR 5006643-55.2015.4.04.7002, SÉTIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, j. 22/11/2017) (g.n.) Inconteste, portanto, a materialidade delitiva. 4. Do pedido de desclassificação A defesa aventa a desclassificação da conduta imputada ao réu para o crime do artigo 349 do Código Penal, o que não merece acolhida. Não interfere na subsunção da conduta ao crime de contrabando o fato de os cigarros já se encontrarem em território nacional quando o apelante iniciou o transporte dos mesmos, uma vez que a conduta imputada ao réu não é a de importar os cigarros internalizados irregularmente, mas sim a de transportá-los, e de recebê-los, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial. O artigo 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal estabelece que incorre na pena prescrita para o delito de contrabando aquele que pratica fato assimilado em lei especial. O art. 3º do Decreto nº 399/68, por sua vez, complementa a referida norma penal em branco, e equipara ao delito de contrabando a conduta de transportar cigarro de procedência estrangeira. Tampouco eventual alegação de que o réu não exerce atividade comercial ou industrial é apto a afastar a subsunção de sua conduta ao tipo penal de contrabando, que não pressupõe o domínio da mercadoria, praticando tal conduta aquele que, na hipótese dos autos (artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, c.c. arts. 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/1968), transporta mercadoria proibida, ou a recebe, em proveito alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial. No caso sob análise, resta evidente a destinação comercial dos cigarros, em razão da expressiva quantidade de itens apreendidos. Assim, incabível a desclassificação da conduta do réu para o crime de favorecimento real, conforme requerido pela defesa, uma vez que a conduta do réu caracteriza o delito previsto no artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, na redação dada pela Lei 13.008/14, combinado com os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/1968. 5. Da autoria e do dolo A autoria delitiva restou comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante, corroborado pelas provas produzidas em juízo. O dolo, por sua vez, foi evidenciado tanto pelas circunstâncias em que os cigarros foram apreendidos como pela prova oral angariada. Com efeito, extrai-se dos depoimentos dos policiais militares rodoviários Edman Silazaki de Oliveira e Vinícius Amoroso Andreazzi que, em 07/12/2020, por volta de 23h e 30min, na altura do km 44,5, da Rodovia SP-461, Deputado Rollemberg, no Município de Brejo Alegre, fiscalizavam o tráfego local, quando o veículo GM, modelo Classic, placas CWQ 1120, passou pelo local sentido sul e imediatamente apagou os faróis. Decidiram ir atrás do veículo suspeito. Aproximadamente três quilômetros depois, o veículo em fuga perdeu o controle e saiu da pista. Conseguiram avistar dois ocupantes saindo do carro e empreendendo fuga, mas após pequena perseguição conseguiram capturá-los. Tratava-se do casal ANDERSON AUGUSTO VIEIRA e JESSICA DELFINO VIEIRA. O veículo estava cheio de cigarros de origem paraguaia. ANDERSON disse ser o proprietário da carga, o que foi confirmado por Jéssica. ANDERSON alegou que teria obtido a carga em Buritama/SP, e a levaria até Birigui/SP (ID 282069171, pp. 02/03). Os policiais reiteraram suas declarações em juízo (ID's 282069244 e 282069245). O policial Edman Silazaki detalhou que o veículo não obedeceu à ordem de parada obrigatória, empreendeu fuga, apagando os faróis do veículo. Depois de percorridos cerca de 3km, havia uma curva na rodovia, e, por ser no período noturno, e estar em alta velocidade, o veículo não conseguiu fazer a curva. Pararam sobre um barranco, chocando-se com alguns galhos de árvores. ANDERSON e a mulher que o acompanhava abandonaram o veículo e saíram do carro, em direção a uma plantação próxima do local. A mulher foi detida, e, logo após, ANDERSON foi detido. Retornaram ao local onde o carro foi abandonado, e puderam constatar que ele estava completamente carregado com cigarros. Informalmente, ANDERSON disse aos policiais que os cigarros seriam comercializados em bares no município de Birigui/SP. Parte dos cigarros estavam em caixas, e parte já estava em pacotes, sendo uma maneira de acondicionar quantidade maior em cada veículo. Sabia que os cigarros eram de origem paraguaia por sua experiência, pela confissão informal do réu e pelo que vinha escrito nas embalagens (ID 282069244). O policial Vinícius Andreazzi, por sua vez, detalhou que avistaram o veículo, que, ao visualizá-los, quis mudar seu trajeto. Deram ordem de parada, e o veículo fez menção de parar, mas então começou a empreender fuga, apagando os faróis, e vindo a se chocar com uma árvore. A moça que acompanhava ANDERSON disse que os cigarros seriam revendidos em um bar. Os cigarros ocupavam todo o porta-malas e o banco traseiro. As marcas de cigarros são conhecidamente vindas do Paraguai, sendo que tal informação consta das embalagens das caixas dos produtos fumígenos (ID 282069245). O réu exerceu seu direito constitucional de permanecer em silêncio quando interrogado pela autoridade policial (ID 282069171, p. 04). Em juízo, ANDERSON declarou que trabalha como servente, pintor, e vendedor autônomo, auferindo cerca de R$ 1.500,00 mensais. Admitiu já ter sido processado por contrabando/descaminho. Com relação aos fatos ora apurados, narrou ter sido contratado para transportar mercadorias de Buritama a Birigui, pela quantia de R$ 200,0 (duzentos reais). Disse que o contratante lhe disse que os cigarros fossem fabricados no Brasil, nas cidades de Piedade, São Paulo e Ibitinga. Não tinha conhecimento de que a conduta configurava crime. O contratante colocou os cigarros dentro de seu carro. Respondeu que estava muito nervoso no dia dos fatos, e perdeu o controle do carro. Questionado do motivo de ter fugido da polícia, respondeu "na hora do desespero...". Depois, disse que não fugiu, sendo que a viatura estava trafegando no outro sentido (ID 282069243). ANDERSON negou ter conhecimento da origem dos cigarros, e que a conduta que praticou configurasse crime. Não obstante a não admissão pelo réu da veracidade dos fatos a ele imputados, sua versão carece de verossimilhança, visando, ao negá-los, eximir-se de responsabilidade penal. O erro de proibição é aquele que incide sobre a ilicitude do fato. O agente pratica a conduta definida no tipo penal sem consciência de que age ilicitamente, excluindo-se, por essa razão, a culpabilidade. No entanto, o erro de proibição que enseja a excludente de culpabilidade "significa que o agente não teve, no momento da prática da conduta típica, noção da ilicitude, nem teria condições de saber, em razão das circunstâncias do caso concreto. Em síntese, para se configurar o erro de proibição escusável, torna-se indispensável que o agente não saiba, nem tenha condições de saber, que o ato praticado é ilícito, ainda que típico" (in Código Penal Comentado, Guilherme de Souza Nucci, 11ª Ed. 2012 pp. 234-235 - g.n.). A alegação de que não sabia que estava cometendo um delito não tem o condão de ilidir a conduta criminosa. Isso porque o erro de proibição somente se verifica quando o agente não tem possibilidade de saber que o fato é proibido, circunstância que inocorre na presente hipótese. Nesse contexto, o art. 21, 1ª parte, do Código Penal, é expresso: "O desconhecimento da lei é inescusável". Ademais, é de conhecimento comum o controle na comercialização de cigarros, com edição de normas pela ANVISA, regulamentando o registro dos produtos fumígenos e dos importadores, sendo inclusive realizadas operações de fiscalização. O erro de tipo, por sua vez, é preceituado pelo Código Penal como: "Art. 20. O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei." Em que pese ANDERSON tenha alegado acreditar que os cigarros tinham fabricação nacional, verifica-se dos registros fotográficos de ID 282068971, pp. 23/26, que as embalagens dos pacotes de cigarros transportados no veículo continham inscrições com o nome das marcas, frases em espanhol, bem como local de fabricação, permitindo ao acusado saber que se tratava de produtos advindos do Paraguai. Soma-se a isto que consta do ID 282069132 que ANDERSON também é réu na ação penal nº 0000059-82.2017.4.03.6107. Em consulta ao Processo Judicial Eletrônico, pode-se constatar que, naquele feito, ANDERSON é acusado por, em maio de 2016, ter transportado cigarros contrabandeados da marca Eight, uma das marcas que também transportava nos fatos apurados neste feito. Tal fato enfraquece sobremaneira sua alegação tanto de desconhecimento da procedência dos produtos fumígenos, quanto da alegação de ignorância quanto ao fato de sua conduta configurar crime. Ademais, verifica-se que contra o réu constam outros procedimentos administrativos junto ao Ministério da Fazenda decorrentes da apreensão de mercadorias (p. 17 do ID 282069170). Diante dos fatos, a versão de ANDERSON resta isolada nos autos, sendo descabido cogitar-se da ocorrência de erro de proibição ou de erro de tipo. Assim, todas essas circunstâncias demonstradas enfraquecem a tese defensiva e denotam a autoria delitiva e o dolo do acusado relativamente à conduta descrita no artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal. De rigor, portanto, manter a condenação do réu como incurso no artigo 334-A, § 1º, inciso IV, do Código Penal, c.c. arts. 2º e 3º do Decreto Lei 399/68. Passo à dosimetria. 6. Da dosimetria Não houve impugnação quanto à dosimetria, pelo que é incontroversa e, ademais, não se verifica a existência de qualquer ilegalidade a ser corrigida de ofício por este Tribunal. A sentença assim restou fundamentada quanto ao ponto: Na primeira fase de aplicação da pena, atento às circunstâncias do artigo 59 do Código Penal, verifico que: a) a culpabilidade do denunciado, entendida como juízo de reprovação que recai sobre o agente em virtude da realização do injusto penal, deve ser valorada negativamente, pois ANDERSON, ao tentar percorrer várias cidades paulistas, deu sinais inequívocos do quão determinado estava a concretizar seu intento delituoso (dolo intenso), além da premeditação (teve tempo suficiente para refletir sobre o que estava fazendo, mas mesmo assim decidiu não cessar sua atividade); b) o acusado possui antecedente criminal, conforme condenação transitada em julgado em desfavor de ANDRESON, de 02 anos e 06 meses de reclusão, pelo crime do artigo 302, da lei nº 9.503/97 (processo nº 3491/2006, 3ª. Vara Criminal em Mirassol/SP – id 43050977, p. 2), sentença datada de 09/10/2008. c) à míngua de elementos seguros, torna-se leviano qualquer juízo de valor que se pretenda fazer ao derredor da conduta social e da personalidade do denunciado, malgrado a presença de vários inquéritos e ações penais em seu desfavor, o que revela que, possivelmente, o meio de subsistência do réu é realizado com a prática reiterada de crimes de contrabando e descaminho; d) o motivo do crime, consistente no impetuoso anseio de obtenção da vantagem econômica prometida (R$ 200,00), será valorado como circunstância agravante na segunda fase da dosimetria (CP, art. 62, IV); e) as circunstâncias do delito merecem reprovação, tendo em vista a elevada quantidade de cigarros apreendidos (7.120 maços de cigarros) — os quais seriam comercializados a um sem número de usuários, não fosse o trabalho da Polícia Militar Rodoviária do Estado de São Paulo —, o que denota, inclusive, que o réu se colocou a serviço de uma organização criminosa muito bem estruturada economicamente (os cigarros foram avaliados em R$ 35.600,00). Além disso, não se pode perder de vista que a conduta do réu se subsumiu tanto no inciso I quanto no inciso V do § 1º do artigo 334-A do Código Penal. f) as consequências delituosas foram as esperadas para o crime, não carecendo de valoração adicional; g) por fim, tratando-se de crime que teve como sujeito passivo o próprio Estado, nada há a ser considerado em termos de comportamento da vítima. Havendo, portanto, duas circunstâncias judiciais desfavoráveis (“culpabilidade” e “circunstâncias”), fixo a pena-base em 02 anos e 10 meses anos de reclusão. Na segunda fase da aplicação da pena, não há que se falar em confissão do acusado, pois ele negou os fatos deduzidos na denúncia. Deve ser levada em conta a circunstância agravante da paga ou promessa de recompensa (CP, art. 62, IV), consoante acima fundamentado, motivo por que agravo a reprimenda em 1/6, estabelecendo-a em 03 anos, 03 meses e 20 dias de reclusão. Por fim, na terceira fase de fixação da sanção, não há causas de aumento ou de diminuição a incidirem, motivo por que a torno DEFINITIVA em 03 anos, 03 meses e 20 dias de reclusão." Do regime inicial de cumprimento da pena Tendo em vista o quantum da pena aplicada, mantenho o regime inicial aberto para o cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal. Da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos Encontram-se preenchidos os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal, na medida em que a pena definitivamente aplicada não é superior a 4 (quatro) anos, o réu não é reincidente, e a análise das circunstâncias judiciais indica que a substituição atende aos fins de prevenção e retribuição pelo delito praticado. Mantenho a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, a ser estabelecida pelo Juízo da Execução Penal, e prestação pecuniária, que, observada a condição socioeconômica do réu, conforme aferido em seu interrogatório judicial, bem como a proporcionalidade à pena, reduzo, de ofício, para dois salários mínimos, mantida a destinação fixada pelo juízo de origem. 7. Da inabilitação para dirigir veículos A defesa pugna pelo afastamento da inabilitação para dirigir veículo, alegando que o apelante necessita da habilitação para locomover-se ao trabalho, levar as filhas na creche e sua esposa O artigo 92 do Código Penal é claro ao dispor sobre os efeitos da condenação: "Art. 92 - São também efeitos da condenação: I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos. II - a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado; III - a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso. Parágrafo único - Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença." (grifo nosso) A sentença, ao aplicar a pena de inabilitação para dirigir veículos, asseverou: “Como efeito da condenação, aplico ao réu, nos termos do artigo 92, inciso III, do Código Penal, a inabilitação para dirigir veículo pelo mesmo tempo da pena privativa de liberdade estabelecida, tendo em vista ter ele se valido de veículo para o cometimento do crime doloso em análise.” Ainda que dado veículo tenha sido utilizado como meio para a prática de crime doloso, como no caso em apreço, em que o carro foi empregado, de forma dolosa, para o transporte de cigarros contrabandeados, o Superior Tribunal de Justiça entende que tal efeito da sentença condenatória não é automático, devendo ser demonstrada a imprescindibilidade da sua decretação. Nesse aspecto: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SÚMULA 182/STJ. AFASTAMENTO. DESCAMINHO. HABITUALIDADE DELITIVA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. INABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULO. ART. 92, INCISO III, DO CP. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PENA ACESSÓRIA AFASTADA. 1. Efetivamente impugnados os fundamentos da decisão de inadmissão do recurso especial, o agravo merece ser conhecido, em ordem a que se evolua para o mérito. 2. A habitualidade delitiva afasta a aplicação do princípio da insignificância nos crimes de descaminho, sobretudo na hipótese de multiplicidade de procedimentos administrativos, como na espécie. Precedentes. 3. O entendimento do acórdão, de que a aplicação da penalidade prevista no art. 92, III, do CP "exige apenas que o veículo tenha sido utilizado como meio para a prática de crime doloso", diverge da jurisprudência desta Corte, firmada na compreensão de que a aplicação da pena acessória de inabilitação para dirigir veículo ao crime de descaminho exige, além da constatação de que o veículo tenha sido utilizado para a prática do delito, a demonstração da necessidade da medida no caso concreto, sobretudo por não se tratar de efeito automático da condenação. 4. Agravo regimental parcialmente provido, para afastar a penalidade prevista no art. 92, III, do CP. (AgRg no AREsp n. 2.078.176/SP, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 2/8/2022, DJe de 5/8/2022.) (grifo nosso) Também nesse sentido: AgRg no AgRg no AREsp nº 2.283.166/PR, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 06.06.2023, DJe 15.06.2023; AgRg no HC nº 594.092/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quinta Turma, j. 15.02.2022, DJe 21.02.2022; EDcl no AgRg no REsp nº 1.922.918/PR, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 13.12.2021, DJe 16.12.2021). No mesmo sentido, já decidiu esta E. Décima Primeira Turma: PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. DESCAMINHO. INABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULO. 1. O parágrafo único do art. 92 do Código Penal dispõe que os efeitos de que trata esse artigo não são automáticos, "devendo ser motivadamente declarados na sentença". 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que esse efeito da sentença condenatória não é automático, devendo ser demonstrada, de forma concreta, a imprescindibilidade dessa medida. 3. No caso, o juízo não apresentou motivação suficiente para a aplicação da inabilitação para dirigir veículo como efeito da sentença condenatória. 4. Apelação provida. (ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 5000878-41.2020.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal NINO OLIVEIRA TOLDO, julgado em 11/08/2023, DJEN DATA: 17/08/2023) Indubitável que no caso em apreço o réu, na condição de motorista, utilizou a licença para conduzir veículo concedida pelo Estado para perpetrar o crime de contrabando, tendo plena ciência da ilicitude de sua conduta. Verifica-se que o réu possui maus antecedentes, responde a outra ação penal por crime análogo, e que constam em seu desfavor procedimentos administrativos junto ao Ministério da Fazenda, decorrentes da apreensão de mercadorias (p. 17 do ID 282069170). Assim, constata-se que o réu se utilizou de veículo para perpetrar crimes reiteradamente, de modo que a inabilitação para dirigir veículo é justificada no presente caso, uma vez que, ainda que não impeça a reiteração criminosa, não há dúvida que a torna mais difícil, além de possuir efeito dissuasório, desestimulando a prática criminosa sem encarceramento. O efeito da condenação em questão deve ser aplicado em casos de descaminho, contrabando, bem como de tráfico de drogas, armas, animais ou pessoas, restando o agente inabilitado para conduzir veículo, em especial quando evidenciado que a fruição do direito de dirigir teve importância no "iter criminis" (ACR 50037438020124047010, Márcio Antônio Rocha, TRF4 - Sétima Turma, D.E. 17/09/2014). Por tais razões, e tendo em vista o comando previsto no artigo 92, inciso III, do Código Penal, mantenho a aplicação da pena de inabilitação para dirigir veículo ao réu, que deverá perdurar até o cumprimento integral da pena privativa de liberdade. 8. Da assistência judiciária gratuita A defesa, em suas razões de apelação, requereu o afastamento da condenação pelo pagamento das custas processuais, e a concessão do benefício da Justiça Gratuita. Entendo que se mostra cabível a concessão da justiça gratuita ao réu, observada, contudo, a forma do artigo 98 da Lei nº 13.105/2015. Esclareço que a mera concessão da gratuidade da justiça não exclui a condenação do réu nas custas do processo, nos termos do artigo 804 do Código de Processo Penal, ficando, contudo, seu pagamento sobrestado enquanto perdurar seu estado de pobreza, pelo prazo de cinco anos, quando então a obrigação estará prescrita, conforme determina o artigo 98, § 3º, do novo Código de Processo Civil. O pertinente exame acerca da miserabilidade deverá ser realizado em sede do Juízo de Execução, fase adequada para aferir a real situação financeira do condenado, em sintonia com o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO. JUÍZO DA EXECUÇÃO. SÚMULA N. 83 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. APLICAÇÃO ÀS ALÍNEAS "A" E "C" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. LEI ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO. SÚMULA N. 280 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. - O Tribunal de origem, ao manter a condenação do réu nas custas processuais e reconhecer que eventual isenção deve ser promovida no Juízo da Execução, decidiu a lide de acordo com a jurisprudência desta Corte. Incidência da Súmula n. 83/STJ - O óbice dessa Súmula também se aplica ao recurso especial interposto com fulcro na alínea "a" do permissivo constitucional. - A assertiva relativa ao inciso II do art. 10 da Lei n. 14.939/2003 do Estado de Minas Gerais não pode ser conhecida, ante o impedimento do verbete sumular n. 280 do Pretório Excelso, aplicável por analogia no caso. Súmula n. 280: "Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário." Agravo regimental desprovido." (6ª Turma, AGARESP 201400925253, Rel. Des. Conv. do TJ/SP Ericson Maranho, DJE: 24.04.2015) (g.n.) "PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 804 DO CPP. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE CUSTAS. IMPOSSIBILIDADE. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. FASE DE EXECUÇÃO. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Esta Corte sufragou o entendimento de que o beneficiário da justiça gratuita não faz jus a isenção do pagamento das custas processuais, mas tão somente a suspensão da exigibilidade destas, pelo período de 5 anos, a contar da sentença final, quando então, em não havendo condições financeiras de o recorrente quitar o débito, restará prescrita a obrigação. 2. O momento de verificação da miserabilidade do condenado, para fins de suspensão da exigibilidade do pagamento, é na fase de execução, visto que é possível que ocorra alteração na situação financeira do apenado entre a data da condenação e a execução da sentença condenatória. 3. Agravo regimental improvido." (6ª Turma, AgInt no REsp 1.637.275/RJ, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 06/12/2016, DJe: 16/12/2016) "PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 804 DO CPP. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE CUSTAS. IMPOSSIBILIDADE. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. FASE DE EXECUÇÃO. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Esta Corte sufragou o entendimento de que o beneficiário da justiça gratuita não faz jus a isenção do pagamento das custas processuais, mas tão somente a suspensão da exigibilidade destas, pelo período de 5 anos, a contar da sentença final, quando então, em não havendo condições financeiras de o recorrente quitar o débito, restará prescrita a obrigação. 2. O momento de verificação da miserabilidade do condenado, para fins de suspensão da exigibilidade do pagamento, é na fase de execução, visto que é possível que ocorra alteração na situação financeira do apenado entre a data da condenação e a execução da sentença condenatória. 3. Agravo regimental improvido." (6ª Turma, AgInt no REsp 1.637.275/RJ, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 06/12/2016, DJe: 16/12/2016) Concedo, portanto, a gratuidade da justiça ao réu, nos moldes acima expostos. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso defensivo, apenas para conceder ao réu os benefícios da Justiça Gratuita, nos termos do voto; DE OFÍCIO, reduzo a pena de prestação pecuniária para o valor de dois salários mínimos.
1. A existência de cigarros de origem estrangeira, dentre aqueles apreendidos, é suficiente para demonstrar ter havido a prática do crime de contrabando, firmando a competência da Justiça Federal, ainda que não evidenciado o caráter transnacional da conduta.
Precedentes desta Corte Superior.
2. Competência federal que se estende, pela conexão probatória, a eventual crime de falsificação de selos tributários, tipificado no art. 293, § 1.º, inciso I, do Código Penal, independentemente de qual seja o sujeito ativo do tributo a que se refiram, ou a outros possíveis crimes conexos. Inteligência da Súmula n. 122 do Superior Tribunal de Justiça.
3. Conflito conhecido para declarar competente o JUÍZO FEDERAL DA 1.ª VARA DE LIMEIRA - SJ/SP, o Suscitado.
(CC n. 180.476/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, julgado em 25/8/2021, DJe de 1/9/2021.)
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 1. A competência para o processamento e julgamento dos crimes de contrabando e descaminho foi atribuída, inicialmente, por esta Corte, à Justiça Federal, com a edição do verbete sumular n. 151/STJ, em 26/02/1996.
2. Tal entendimento prevaleceu até que, em 2017, no julgamento do CC 149.750/MS, inaugurou-se nova orientação que demandava, para a fixação da competência federal em relação ao delito de contrabando, fossem identificados fortes indícios (e/ou provas) tanto da origem estrangeira da mercadoria quanto da participação do investigado em sua entrada ilegal no país. O raciocínio ali desenvolvido, entretanto, utilizava-se, equivocadamente, de requisito necessário para a definição de competência em crime diverso (violação de direito autoral) 3. Posteriormente (em 08/08/2018), no entanto, a Terceira Seção desta Corte, ao examinar o CC 159.680/MG, reconheceu que a competência para o julgamento do descaminho será sempre federal, dado o evidente interesse da União no recolhimento de tributos que lhe são destinados constitucionalmente, repercutindo, também na ordem econômica e financeira do país, assim como na livre concorrência.
4. Em recente reexame da matéria, por ocasião do julgamento do CC 160.748/SP, a Terceira Seção desta Corte, por unanimidade, reconheceu a necessidade de restabelecimento do entendimento outrora fixado na Súmula 151/STJ, dando tratamento igual ao contrabando e ao descaminho, e atribuindo à Justiça Federal a competência para o seu julgamento. Isso porque os crimes de contrabando e descaminho tutelam prioritariamente interesses da União, que é a quem compete privativamente (arts. 21, XXII, e 22, VII, ambos da CF) definir os produtos de ingresso proibido no país, além de exercer a fiscalização aduaneira e das fronteiras, mediante atuação da Receita Federal e da Polícia Federal. De consequência, é despiciendo perquirir sobre a existência de indícios de transnacionalidade do iter criminis, seja dizer da participação do investigado na internalização da mercadoria estrangeira no país.
5. Agravo regimental do Ministério Público Federal a que se nega provimento.
(AgRg no CC n. 160.673/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 13/2/2019, DJe de 19/2/2019.)
1. A jurisprudência desta Corte orientava para a competência da Justiça Federal para o julgamento dos crimes de contrabando e descaminho (Súmula 151/STJ), até que julgado (CC n. 149.750/MS, de 26/4/2017), fundado em conflito que debateu crime diverso (violação de direito autoral), modificou a orientação sedimentada, para limitar a competência federal, no caso de contrabando, às hipóteses em que for constatada a existência de indícios de transnacionalidade na conduta do agente.
2. Consolidada a nova compreensão, sobreveio o julgamento do CC n. 159.680/MG (realizado em 8/8/2018), no qual a Terceira Seção entendeu pela competência federal para o julgamento do crime de descaminho, ainda que inexistentes indícios de transnacionalidade na conduta.
3. Tal orientação, no sentido da desnecessidade de indícios de transnacionalidade, deve prevalecer não só para o crime de descaminho, como também para o delito de contrabando, pois resguarda a segurança jurídica, na medida em que restabelece a jurisprudência tradicional; além do que o crime de contrabando, tal como o delito de descaminho, tutela prioritariamente interesse da União, que é a quem compete privativamente (arts. 21, XXII e 22, VII, ambos da CF) definir os produtos de ingresso proibido no país, além de exercer a fiscalização aduaneira e de fronteira.
4. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo Federal da 4ª Vara Criminal da Seção Judiciária do Estado de São Paulo, o suscitante."
(STF, CC 160748/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, j. 26/09/2018, DJe 04/10/2018) (g.n.)
1. "Nos termos do art. 334 do Código Penal, o crime de descaminho se perfaz com o ato de iludir o pagamento de imposto devido pela entrada de mercadoria no país. Desnecessária, portanto, a apuração administrativo-fiscal do montante que deixou de ser recolhido para a configuração do delito. O mesmo raciocínio deve ser aplicado ao delito de contrabando. Precedentes" (AgRg no REsp 1419119/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 18/03/2014, DJe 28/03/2014).
2. Devidamente delimitados os fatos nos autos, no sentido da existência de declaração de importação com fraude nos preços e falsa declaração de conteúdo, com o fim de iludir o pagamento de tributos federais, deve ser restabelecida a sentença condenatória pela prática do delito de delito de descaminho.
3. Recurso especial provido.
(REsp n. 1.964.529/CE, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 10/6/2022.)
no trabalho em localidade diferente do domicílio.
E M E N T A
APELAÇÃO CRIMINAL. CONTRABANDO DE CIGARROS. ARTIGO 334-A, §1º, I e V, DO CÓDIGO PENAL, C/C ARTS. 2º e 3º DO DECRETO LEI Nº 399/1968. COMPETÊNCIA FEDERAL. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE LAUDO MERCEOLÓGICO. PRESCINDIBILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO INCABÍVEL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA INCONTROVERSA. PENA MANTIDA. REGIME ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. REDUÇÃO DO VALOR DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. INABILITAÇÃO PARA DIRIGIR MANTIDA. GRATUIDADE JUDICIÁRIA CONCEDIDA. APELO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Trata-se de apelação criminal interposta pela defesa de ANDERSON AUGUSTO VIEIRA, em face de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Araçatuba/SP, que julgou procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia, para condenar o réu como incurso nas disposições do artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, c.c. artigos 1º e 2º do Decreto-Lei nº 399/1968.
2. A origem estrangeira dos cigarros apreendidos, internados irregularmente, evidencia a transnacionalidade da conduta perpetrada acusado. Além disso, a conduta analisada é manifestamente lesiva a interesses da União, tais como a saúde e segurança públicas, a indústria nacional, o interesse estatal no controle da entrada e saída de produtos, além de, por via transversa, a atividade arrecadatória do Estado, e por isso gera a competência federal para julgamento do presente feito, de acordo com o disposto no artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal de 1988. Resta rejeitada, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal.
3. Não interfere na subsunção da conduta ao crime de contrabando o fato de os cigarros já se encontrarem em território nacional quando o apelante iniciou o transporte dos mesmos, uma vez que a conduta imputada ao réu não é a de importar os cigarros internalizados irregularmente, mas sim a de transportá-los, e de recebê-los, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial. Assim, incabível a desclassificação da conduta do réu para o crime de favorecimento real, conforme requerido pela defesa, uma vez que a conduta do réu caracteriza o delito previsto no artigo 334-A, § 1º, incisos I e V, do Código Penal, na redação dada pela Lei 13.008/14, combinado com os artigos 2º e 3º do Decreto-Lei nº 399/1968.
4. A importação, o armazenamento, o transporte e a comercialização de cigarros de origem estrangeira, dentre outras condutas previstas no artigo 334-A do Código Penal, têm como consequência, para além da perda arrecadatória, a lesão a outros interesses públicos ainda mais importantes, como a saúde e a atividade comercial. Assim, o crime de contrabando consuma-se independentemente do prejuízo causado ao erário, com o não pagamento do imposto devido na entrada, e independentemente da apuração fiscal do valor do tributo sonegado.
5. Levando-se em consideração a natureza formal do contrabando, não se deve atrelar sua tipicidade à constituição definitiva do crédito tributário, não se aplicando à hipótese a súmula nº 24 do STF, cujo escopo restringe-se aos crimes materiais. Não há se falar, portanto, em necessidade de constituição definitiva do crédito tributário para a tipificação do crime em tela.
6. A materialidade delitiva foi comprovada pelo Auto de Apresentação e Apreensão, pelo Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias, e pelo Demonstrativo dos créditos tributários que deixaram de ser recolhidos, os quais certificam a apreensão de 7.120 maços de cigarros de origem estrangeira, das marcas Eight, TE, Classic e R7, avaliadas em R$ 35.600,00 (trinta e cinco mil e seiscentos reais), com valor presumido de tributos federais no montante de R$ 26.344,00 (vinte e seis mil, trezentos e quarenta e quatro reais), tornando inconteste a materialidade delitiva.
7. A inexistência de exame merceológico não compromete a materialidade delitiva, tendo em vista que o conjunto probatório é farto, e que a Relação de Mercadorias e a Representação fiscal para fins penais da Delegacia da Receita Federal do Brasil atestam que os cigarros apreendidos com o réu eram de origem paraguaia. Os agentes da Secretaria da Receita Federal do Brasil têm aptidão técnica para a verificação da procedência e valor dos cigarros apreendidos, dispondo os documentos de presunção de legitimidade e veracidade.
8. A autoria delitiva restou comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante, corroborado pelas provas produzidas em juízo. O dolo, por sua vez, foi evidenciado tanto pelas circunstâncias em que os cigarros foram apreendidos como pela prova oral angariada. A versão de ANDERSON resta isolada nos autos, sendo descabido cogitar-se da ocorrência de erro de proibição ou de erro de tipo. De rigor, portanto, manter a condenação do réu como incurso no artigo 334-A, § 1º, inciso IV, do Código Penal, c.c. arts. 2º e 3º do Decreto Lei 399/68. Passo à dosimetria.
9. Não houve impugnação quanto à dosimetria, pelo que é incontroversa e, ademais, não se verifica a existência de qualquer ilegalidade a ser corrigida de ofício por este Tribunal. Pena mantida no patamar de 3 (três) anos, 3 (três) meses e 20 (vinte) dias de reclusão.
10. Tendo em vista o quantum da pena fixada, mantenho o regime inicial aberto para o seu cumprimento, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.
11. Preenchidos os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal, mantenho a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, a ser estabelecida pelo Juízo da Execução Penal, e prestação pecuniária, que, observada a condição socioeconômica do réu, conforme aferido em seu interrogatório judicial, bem como a proporcionalidade à pena, reduzo-a, de ofício, para dois salários mínimos, mantida a destinação fixada pelo juízo de origem.
12. A inabilitação para conduzir veículo automotor do artigo 92, inciso III, do Código Penal é efeito secundário da condenação, exigindo-se para a sua aplicação que o veículo tenha sido utilizado como meio para a prática de crime doloso, como no caso em tela, em que o automóvel foi empregado, de forma dolosa, para o transporte de mercadorias contrabandeadas. Foi demonstrada a habitualidade delitiva do apelante, sendo recomendável a manutenção da pena. Ainda que a inabilitação para dirigir não impeça a reiteração criminosa, não há dúvida que a torna mais difícil, além de possuir efeito dissuasório, desestimulando a prática criminosa sem encarceramento. Por tais razões, mantenho a aplicação da pena de inabilitação para dirigir veículo ao réu, que deverá perdurar até o cumprimento integral da pena privativa de liberdade.
13. Justiça Gratuita concedida, nos termos do voto.
14. Apelo defensivo a que se dá parcial provimento.