Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011555-79.2014.4.03.6183

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: LUIZIO GONCALVES VIANA

Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: FUNDO DE GESTAO E RECUPERACAO - FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO PADRONIZADOS
 

ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: ROSELY CRISTINA MARQUES CRUZ - SP178930-A

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011555-79.2014.4.03.6183

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: LUIZIO GONCALVES VIANA

Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: FUNDO DE GESTAO E RECUPERACAO - FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO PADRONIZADOS
ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: ROSELY CRISTINA MARQUES CRUZ - SP178930-A

  

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra decisão proferida na fase de cumprimento de sentença, que extinguiu a execução, com fundamento no artigo 924, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC).

Sem condenação em honorários sucumbenciais.

Em síntese, pugna pelo prosseguimento da execução, pois o precatório pago ao exequente – destacados os honorários contratuais – carece da integralidade da correção monetária e juros de mora, até porque o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) concordou com o cálculo que apresentou – R$ 20.390,71, atualizado para a data do depósito (maio/2023).

Alega que, o fato de constar somente a correção monetária no texto do parágrafo 5º, do artigo 100 da Constituição Federal de 1988, não exclui os juros de mora entre as datas do cálculo original e de inscrição no orçamento – out/2020 até junho/2021, diante do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) n. 579.431/RS pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – Tema repetitivo n. 96, de sorte que os autos deveriam ter sido encaminhados à contadoria judicial, porque o INSS não os pagou.

Em adição, aduz que o Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC) não foi aplicada até a data do efetivo pagamento, em afronta à Emenda Constitucional (EC) n. 113/2021 (art. 3º), que fixa sua vigência desde a publicação (dez/2021), o que torna aplicável o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – Especial (IPCA-E) até novembro de 2021, segundo a conta que ofertou.

Questiona, ainda, a aplicação da SELIC somente sobre o principal, que entende contrariar o texto da Emenda Constitucional n. 113/2021 (art. 3º), que fixa a condenação – uníssona, que não admite fracionamento, como base de cálculo dessa taxa “até o efetivo pagamento”; em pedido subsidiário, pede que, pelo menos, os juros de mora sejam atualizados pelo IPCA-E.

Nesses termos, requer a intimação do INSS para pagar o saldo oriundo do precatório, apurando os juros de mora nos moldes do Tema repetitivo n. 96 do STF, além da taxa SELIC sobre o principal acrescido de juros até a data do efetivo pagamento, sob pena de causar ofensa ao ato jurídico perfeito, à coisa julgada, ao direito adquirido e à própria Constituição Federal, que assim determina.

Sem contrarrazões.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011555-79.2014.4.03.6183

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: LUIZIO GONCALVES VIANA

Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: FUNDO DE GESTAO E RECUPERACAO - FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO PADRONIZADOS
ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: ROSELY CRISTINA MARQUES CRUZ - SP178930-A

 

 

V O T O

Conheço do recurso, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.

Discute-se possível saldo em razão da não incidência de juros de mora até a data de inscrição no orçamento, nos moldes do Recurso Extraordinário (RE) n. 579.431/SC – Tema n. 96 do Supremo Tribunal Federal (STF), bem como do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC) desde dezembro de 2021 até a data de adimplemento do precatório, consoante artigo 3º da Emenda Constitucional n. 113/2021, com questionamento da base de cálculo dessa taxa, que, acaso mantida, deve-se atualizar os juros pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – Especial (IPCA-E).

Neste feito, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi condenado a pagar aposentadoria especial, com data de início de benefício (DIB) em 8/4/2014, em virtude dos períodos de atividade especial reconhecidos no título executivo judicial.

O depósito, cuja suficiência é discutida, refere-se ao cálculo acolhido em cumprimento de sentença, no tocante ao crédito do exequente, atualizado pelo INSS para outubro de 2020 – R$ 335.734,76 – e honorários advocatícios – R$ 20.889,80.

O precatório e a requisição de pequeno valor (RPV), atinentes ao exequente e seu patrono, nessa ordem, foram transmitidos em 17/5/2021, cujo pagamento do RPV foi publicado em 22/6/2021.

Quanto ao precatório – com destaque de honorários contratuais – foi inscrito na proposta orçamentária de 1/7/2021, cuja previsão de pagamento no exercício financeiro de 2022 não ocorreu, devido à limitação da alocação orçamentária, da qual decorreu a fixação de uma ordem para o pagamento dos precatórios, nos moldes do parágrafo 8º, do artigo 107-A do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), introduzido pela Emenda Constitucional n. 114/2021 (art. 2º).

Nesse contexto, o pagamento do precatório ocorreu mediante um único depósito, publicado em 30/5/2023, no valor de R$ 423.058,24.

A parte autora alega subsistir saldo, segundo as razões jurídicas defendidas no seu recurso, mediante a aplicação de juros de mora até a data de inscrição no orçamento, à luz do RE n. 579.431/SC, bem como da SELIC desde a publicação da Emenda Constitucional n. 113/2021 (art. 3º) – dez/2021, inclusive, com questionamento da base de cálculo dessa taxa, por defender que essa norma autoriza sua incidência, não apenas sobre o principal, mas também sobre os juros de mora.

Sem razão à parte autora, porque isso não é possível à luz dos próprios normativos constitucionais por ela invocados no recurso.

Como dito, o precatório foi inscrito no orçamento em 1/7/2021 e pago em 30/5/2023.

Pertinente à correção monetária, o STF, em sessão de 25/3/2015, ao modular os efeitos da decisão na questão de ordem suscitada nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) n. 4.357 e 4.425, decidiu, em tema de precatório ou RPV, que o cálculo acolhido deverá sofrer atualização integral, substituindo a Taxa Referencial (TR), considerada inconstitucional na referida data, pelo IPCA-E.

Do mesmo modo, o STF já decidiu a matéria dos juros de mora entre as datas do cálculo homologado e da apresentação do precatório/rpv, na sessão de julgamento de 19/4/2017, cujo acórdão foi publicado em 30/6/2017, em sede de repercussão geral (RE 579.431 – Tema 96), com trânsito em julgado na data de 16/8/2018, em que fixada a seguinte Tese:

"JUROS DA MORA - FAZENDA PÚBLICA - DÍVIDA - REQUISIÇÃO OU PRECATÓRIO. Incidem juros da mora entre a data da realização dos cálculos e a da requisição ou do precatório." (DJe-145 DIVULG 29-06-2017 PUBLIC 30-06-2017)"

Contrariamente ao alegado no recurso, os juros de mora, nos moldes do RE n. 579.431/SC – Tema n. 96 do STF, com marco inicial na data da conta homologada e término na data de inscrição no orçamento – período de 1/10/2020 até 30/6/2021 (inclusive), já foram computados na atualização do precatório, quando de sua inscrição no orçamento.

Na forma do demonstrativo que integra esta decisão, o precatório, que foi inscrito na proposta de 1/7/2021 – R$ 363.346,34, resultou da atualização monetária pelo IPCA-E, aplicado no lapso temporal entre as datas da conta original – R$ 335.734,76 (out/2020) – e da inscrição (jul/2021), acrescido dos juros variáveis da poupança nesse período, com incidência sobre o principal assim corrigido, na forma decidida pelo STF no RE n. 579.431/SC e nas ADIS n. 4.357 e 4.425.

A parte autora pede que seja aplicada a SELIC, desde a publicação da Emenda Constitucional n. 113/2021 (dez/2021) até o efetivo pagamento (maio/2023).

Vê-se que a parte autora pretende a aplicação da SELIC no período de graça constitucional.

Em verdade, o pagamento do precatório guardou conformidade com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) n. 14.436, de 9/8/2022, cujo artigo 38 assim estabelece (g. n.):

“Art. 38. Nas discussões e condenações que envolvam a Fazenda Pública federal, para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, incidirá, no exercício financeiro de 2023, apenas uma vez, até o efetivo pagamento, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - taxa Selic, acumulado mensalmente.

§ 1º A atualização dos precatórios não tributários, no período a que se refere o § 5º do art. 100 da Constituição, será efetuada exclusivamente pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial – IPCA-E da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

§ 2º Na atualização monetária dos precatórios tributários, no período a que se refere o § 5º do art. 100 da Constituição, deverão ser observados os mesmos critérios pelos quais a Fazenda Pública federal corrige os seus créditos tributários.

§ 3º Após o prazo a que se refere o § 5 do art. 100 da Constituição, não havendo o adimplemento do requisitório, a atualização dos precatórios tributários e não tributários será efetuada pelo índice da taxa Selic, acumulado mensalmente, vedada a sua aplicação sobre a parcela referente à correção realizada durante o período de que trata o § 5º do art. 100 da Constituição

A Lei de Diretrizes Orçamentárias supracitada – exercício financeiro de 2023 – estabelece que, no período que corresponde à data de inscrição no orçamento até o final do exercício previsto para pagamento – no caso, de 1/7/2021 a 31/12/2022, o precatório deve ser atualizado pelo IPCA-E.

Assim, o valor apurado para o exequente – principal e juros de mora – na data de inscrição no orçamento – R$ 363.346,34 (jul/2021) – foi atualizado pelo IPCA-E até a data final do exercício financeiro para pagamento, em 31/12/2022 (inclusive), o que resultou no valor de R$ 408.052,04.

Posteriormente ao prazo constitucional supracitado, nos moldes da LDO n. 14.436/2022 (art. 38, §3º), a SELIC foi aplicada – período de jan/2023 a abril/2023 (inclusive), cujo cálculo gerou o depósito no valor de R$ 423.058,24, em 30/5/2023.

Isso desnatura o pedido subsidiário da parte autora, já que todas as atualizações supracitadas abrangeram tanto o principal, como os juros de mora.

A sistemática de pagamento do precatório aqui explicitada – IPCA-E até dezembro de 2022 (inclusive) – incluídos os juros variáveis da poupança até a data de inscrição no orçamento (RE 579.431/SC) –, e, após, a SELIC, foi reproduzida no demonstrativo que integra essa decisão.

Nos termos da LDO n. 14.436/2022 (art. 38, caput, e § 3º), a taxa SELIC deve ser aplicada desde dezembro de 2021, para o período que antecede o prazo constitucionalmente estabelecido, na forma prevista no parágrafo 5º, do artigo 100 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988), bem como após esse período de graça, já que essa taxa é composta de correção monetária e juros de mora.

A parte autora pugna pela aplicação da taxa SELIC (EC n. 113/2021, art. 3º), a partir da publicação da emenda em questão (art. 7º), mesmo no prazo constitucional para pagamento – período de graça constitucional.

Não obstante a previsão contida na Emenda Constitucional n. 113/2021 (art. 3º), acerca da aplicação da SELIC “inclusive do precatório”, do seu texto extrai-se ser essa taxa aplicável “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora”.

Pela compreensão da norma inserta nesse artigo 3º, a taxa SELIC, que já era adotada nas ações judiciais de natureza tributária, foi estendida a todos os processos contra a Fazenda Pública, devendo, a partir de dezembro de 2021, substituir todos os índices de correção monetária e juros de mora (exclusivamente).

A SELIC constitui-se taxa substitutiva de ambos – indexador monetário e juros de mora –, porquanto trata-se de taxa unificada, adotada “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório (...)” (EC, art. 3º).

Nessa esteira, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu: “(...) Especificamente quanto à taxa SELIC, esta SUPREMA CORTE já firmou entendimento de que este parâmetro é um índice composto, isto é, serve a um só tempo como indexador de correção monetária e também de juros moratórios, nos termos do art. 406 do Código Civil.” (Rcl 54886 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 05-09-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 05-09-2022 PUBLIC 08-09-2022).

Efetivamente, os precatórios e as requisições de pequeno valor (RPV) têm rito próprio, nos quais há o afastamento dos juros de mora no prazo constitucionalmente estabelecido – período de graça –, por ser a taxa SELIC “um índice composto, isto é, serve a um só tempo como indexador de correção monetária e também de juros moratórios”. (STF – Rcl 54.886).

Nesse passo, transcrevo o artigo 100 da Constituição Federal de 1988 (§ 5º):

“Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). (Vide Emenda Constitucional nº 62, de 2009). (Vide ADI 4425)

(...)

 “§ 5º É obrigatória a inclusão no orçamento das entidades de direito público de verba necessária ao pagamento de seus débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado constantes de precatórios judiciários apresentados até 2 de abril, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 114, de 2021) (Vigência)”

O STF também firmou o entendimento de que, por força do § 5º do artigo 100 da CF/1988 (antigo § 1º), no período compreendido entre a data-limite para a apresentação do precatório e o término do exercício para pagamento, não devem incidir juros de mora, consoante Súmula Vinculante n. 17 dessa Corte Suprema (in verbis):

“Durante o período previsto no parágrafo 1º do artigo 100 da Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos.”

Vale dizer: não houve alteração da legislação de regência em razão do julgamento do STF do Tema n. 1.037 (RE 1.169.289) – trânsito em julgado em 15/10/2020, cuja tese foi assim firmada:

“O enunciado da Súmula Vinculante 17 não foi afetado pela superveniência da Emenda Constitucional 62/2009, de modo que não incidem juros de mora no período de que trata o § 5º do art. 100 da Constituição. Havendo o inadimplemento pelo ente público devedor, a fluência dos juros inicia-se após o período de graça.”

A toda evidência, descabe computar juros de mora no prazo previsto no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, registra-se o seguinte precedente do STF (g. n.):

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRECATÓRIOS. PERÍODO DE GRAÇA CONSTITUCIONAL. INADMISSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS. PRECEDENTES. TAXA SELIC ENGLOBA JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TAXA SELIC NO INTERVALO PREVISTO NO ART. 100, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APARENTE COLISÃO DE NORMAS CONSTITUCIONAIS. UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO E CONCORDÂNCIA PRÁTICA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO.

1. Durante o período de que trata o § 5º do art. 100 da Constituição Federal, não incidem juros de mora, somente com o inadimplemento do ente público devedor, ou seja, após o período de graça, é possível a fluência dos juros moratórios (Súmula Vinculante 17/STF e RE 1.169.289/SC, tema 1.037 da repercussão geral).

2. O art. 3º da EC 113/2021, cuja constitucionalidade já foi reconhecida por esta Suprema Corte (ADI’s 7.047/DF e 7.064/DF), estabelece que, a partir de sua entrada em vigor, em todas as condenações que envolvam a Fazenda Pública, para fins de atualização monetária, juros moratórios e juros compensatórios, inclusive do precatório, deve ser aplicada, uma única vez, até o efetivo pagamento, a taxa SELIC.

3. A taxa SELIC engloba juros e correção monetária, de modo que não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem (ADC’s 58/DF e 59/DF e ADI’s 5.867/DF e 6.021/DF).

4. A adequada compatibilização entre as normas constitucionais deve manter a efetividade dessas normas, sendo certo que admitir a incidência da taxa SELIC no período de graça de expedição de precatório acarretaria o esvaziamento completo da parte final do § 5º do art. 100 do texto constitucional, em nítida transgressão ao princípio da unidade da Constituição.

5. Necessidade de promover, portanto, com base na concordância prática, ajuste hermenêutico em relação ao art. 3º da EC 113/2021, de modo a, mantendo sua eficácia, reduzir, minimamente, seu âmbito de incidência. Assim, a partir da entrada em vigor da EC 113/2021, apenas no período a que se refere o art. 100, § 5º, da Constituição Federal, a taxa SELIC não deve incidir (art. 3º da EC 113/2021), preservando-se, em tal período, a imunidade aos juros e mantendo-se exclusivamente a correção monetária.

6. O IPCA-E deve continuar sendo utilizado para correção monetária dos precatórios, exclusivamente, no período de graça constitucional, nos termos do decidido por esta Corte nas ADI’s 4.357-QO/DF e 4.425-QO/DF.

7. Recurso extraordinário não provido.” (RE 1475938/SC, Relator: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 07/05/2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 14-05-2024 PUBLIC 15-05-2024)

Em respeito “ao princípio da unidade da Constituição", mostra-se descabido “admitir a incidência da taxa SELIC no período de graça de expedição de precatório”, pois esta conduta “acarretaria o esvaziamento completo da parte final do § 5º do art. 100 do texto constitucional” (STF).

Não por outro motivo, o STF procedeu ao “ajuste hermenêutico em relação ao art. 3º da EC 113/2021”, a fim de que “a partir da entrada em vigor da EC 113/2021, apenas no período a que se refere o art. 100, § 5º, da Constituição Federal, a taxa SELIC não deve incidir (art. 3º da EC 113/2021), preservando-se, em tal período, a imunidade aos juros e mantendo-se exclusivamente a correção monetária”. (RE n. 1.475.938/SC, g. n.).

Ao final, no mesmo julgamento (RE n. 1.475.938/SC), deliberou: “(...) O IPCA-E deve continuar sendo utilizado para correção monetária dos precatórios, exclusivamente, no período de graça constitucional, nos termos do decidido por esta Corte nas ADI’s 4.357-QO/DF e 4.425-QO/DF”.

É possível concluir pelo acerto da sistemática empregada no pagamento do precatório em tela, em que aplicado o indexador monetário previsto na LDO n. 14.436/2022 até o final do exercício seguinte para pagamento (IPCA-E), em detrimento da taxa SELIC, aplicada no período de mora da Fazenda Pública – após o prazo constitucionalmente estabelecido (art. 100, § 5º, CF).

Aliás, o depósito superou o valor devido, consoante demonstrativo que integra esta decisão, o qual reproduz o pagamento do precatório do exequente – destacada a verba contratual.

Segundo esse demonstrativo, após o prazo constitucional para pagamento – jan/2023 até abril/2023 (inclusive) –, a taxa SELIC acumulada (4,13%) foi aplicada sobre o crédito do exequente, que é composto de principal e juros de mora, em afronta à Emenda Constitucional n. 113/2021 (art. 3º), que veda a incidência dessa taxa sobre os juros – nela abrangidos, por configurar anatocismo.

Desse vício, em maior extensão, a parte autora também padece, porque o cálculo que ofertou revela a multiplicação das taxas SELIC, publicadas no período de dezembro de 2021 até abril de 2023 (inclusive), cujo acumulado foi base do saldo que apurou – R$ 20.390,71 (maio/2023).

Diferentemente dos demais índices de correção monetária – INPC, IGP-DI, IPCA-E e outros, o acumulado da SELIC não decorre de multiplicação das suas taxas, mas do somatório delas, as quais são divulgadas mensalmente, com incidência no principal, motivo de a parte autora ter apurado saldo, e, ainda, de grande monta, que derivou não apenas da aplicação da taxa SELIC no período de graça constitucional, em afronta ao § 5º do artigo 100 da Constituição Federal, mas também por tê-la aplicado na modalidade de capitalização composta e não simples.

No âmbito do Judiciário, a taxa SELIC deve ser aplicada na forma simples – metodologia linear, com incidência somente sobre o capital (principal), conforme divulgado no sítio da Receita Federal do Brasil, que não destoa do que estabelece o artigo 406 do Código Civil, abaixo transcrito:

Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.”

Como se nota, a parte autora somente apura saldo a ela favorável, por desbordar do texto da norma que ela almeja aplicar (EC n. 113/2021, art. 3º), porquanto considera a taxa SELIC na modalidade de capitalização composta e no prazo previsto no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal, no qual é aplicável a correção monetária (exclusivamente), preservando-se a imunidade aos juros de mora, cuja fluência somente é possível após o período de graça, nos moldes do entendimento firmado pelo STF na Súmula Vinculante n. 17 e RE n. 1.169.289 – Tema 1.037 da repercussão geral.

Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora, ficando mantida a decisão que extinguiu o feito, conforme fundamentação.

Deixo de aplicar a majoração recursal prevista no Diploma Processual Civil (art. 85, § 11º), por não ter havido condenação em honorários sucumbenciais na origem.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. LIMITE ORÇAMENTÁRIO. ARTIGO 107-A INTRODUZIDO AO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS (ADCT) PELO ARTIGO 2º DA EMENDA CONSTITUCIONAL (EC) Nº 114/2021. ORDEM DE PAGAMENTO PREVISTA NO PARÁGRAFO 8º DO ARTIGO 107-A DO ADCT. PAGAMENTO EM PARCELA ÚNICA.  JUROS DE MORA. TERMO "AD QUEM". DATA DE INSCRIÇÃO NO ORÇAMENTO. PAGAMENTO NOS MOLDES DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) Nº 579.431/SC.  ARTIGO 3º DA EMENDA CONSTITUCIONAL (EC) Nº 113/2021. SISTEMA ESPECIAL DE LIQUIDAÇÃO E DE CUSTÓDIA (SELIC). PERÍODO DE GRAÇA CONSTITUCIONAL. INAPLICABILIDADE. TAXA SELIC ENGLOBA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. PRAZO CONSTITUCIONAL. IMUNIDADE AOS JUROS DE MORA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 (ART. 100, § 5º). CÁLCULO DO EXEQUENTE. TAXA SELIC. MODALIDADE DE CAPITALIZAÇÃO COMPOSTA. ANATOCISMO. ERRO MATERIAL. INEXISTÊNCIA DE DIFERENÇAS. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. MAJORAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. SEM CONDENAÇÃO NA ORIGEM. DECISÃO EXTINTIVA DA EXECUÇÃO MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

- A decisão recorrida extinguiu a execução, com fundamento no artigo 924, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC).

- A parte autora alega persistir saldo em razão da não incidência de juros de mora até a data de inscrição no orçamento, nos moldes do Recurso Extraordinário (RE) n. 579.431/SC – Tema n. 96 do Supremo Tribunal Federal (STF), bem como do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC) desde dezembro de 2021 até a data de adimplemento do precatório, consoante artigo 3º da Emenda Constitucional (EC) n. 113/2021, com questionamento da base de cálculo dessa taxa, que, acaso mantida, deve-se atualizar os juros pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – Especial (IPCA-E).

- O artigo 2º da Emenda Constitucional n. 114/2021 introduziu o artigo 107-A ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que impôs uma ordem para o pagamento dos precatórios (§ 8º), em virtude de limitação da alocação orçamentária nele prevista.

- Nesse contexto, o precatório do exequente – com destaque de honorários contratuais –, foi inscrito na proposta orçamentária de 1/7/2021, tendo sido atualizado pelo IPCA-E, na forma decidida pelo STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) n. 4.357 e 4.425, com pagamento mediante um único depósito, publicado na data de 30/5/2023.

- Contrariamente ao alegado, o pagamento do precatório já abrangeu os juros de mora, nos moldes do RE n. 579.431/SC – Tema n. 96 do STF, com marco inicial na data da conta homologada e término na data de inscrição no orçamento – período de 1/10/2020 a 30/6/2021, com incidência no principal, corrigido pelo IPCA-E.

- O IPCA-E também foi o indexador monetário adotado no período de graça constitucional, segundo a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) n. 14.436/2022 (art. 38, § 1º).

- Na hipótese, a aplicação da taxa SELIC foi limitada ao período de mora da Fazenda Pública – 1/1/2023 a 30/4/2023 (inclusive), com respeito ao prazo constitucional previsto no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal.

- Isso desnatura o pedido subsidiário da parte autora, já que todas as atualizações supracitadas abrangeram tanto o principal, como os juros de mora – juros da conta original e em continuação, nos moldes do RE n. 579.431/SC.

- A parte autora pugna pela aplicação da taxa SELIC (EC n. 113/2021, art. 3º), a partir da publicação da emenda em questão (art. 7º), mesmo no prazo constitucional para pagamento – período de graça constitucional.

- A SELIC constitui-se taxa substitutiva de ambos – indexador monetário e juros de mora –, porquanto trata-se de taxa unificada, adotada “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório (...)” (EC, art. 3º).

- Nessa esteira, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu: “(...) Especificamente quanto à taxa SELIC, esta SUPREMA CORTE já firmou entendimento de que este parâmetro é um índice composto, isto é, serve a um só tempo como indexador de correção monetária e também de juros moratórios, nos termos do art. 406 do Código Civil.” (Rcl 54886 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 05-09-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 05-09-2022 PUBLIC 08-09-2022).

- Efetivamente, os precatórios e as requisições de pequeno valor (RPV) têm rito próprio, nos quais há o afastamento dos juros de mora no prazo constitucionalmente estabelecido.

- Admitir a aplicação da taxa SELIC no período de graça constitucional ter-se-á afronta à Constituição Federal, que confere imunidade aos juros de mora, de sorte que, nesse lapso temporal, somente é cabível correção monetária.

- É possível concluir pelo acerto da sistemática empregada no pagamento do precatório em tela, em que aplicado o indexador monetário previsto na LDO n. 14.436/2022 até o final do exercício seguinte à inscrição no orçamento (IPCA-E), em detrimento da taxa SELIC, aplicada após o prazo constitucional – mora da Fazenda Pública (art. 100, § 5º, CF/1988).

- Vale dizer, o depósito, na forma do demonstrativo que integra esta decisão, superou o valor devido, porquanto a SELIC foi aplicada sobre o principal acrescido dos juros de mora, em afronta ao artigo 3º da EC n. 113/2021, que veda a incidência dessa taxa sobre os juros – nela abrangidos, por configurar anatocismo.

- Desse vício, em maior extensão, também padece o cálculo da parte autora, por ter obtido o acumulado da SELIC consoante multiplicação das suas taxas, em detrimento do somatório delas, motivo de ter apurado saldo, e, ainda, de grande monta.

- A parte autora somente apura saldo a ela favorável, por desbordar do texto da norma que ela almeja aplicar (EC n. 113/2021, art. 3º), porquanto considera a taxa SELIC na modalidade de capitalização composta e no prazo previsto no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal, no qual é aplicável a correção monetária (exclusivamente), preservando-se a imunidade aos juros de mora, cuja fluência somente é possível após o período de graça, nos moldes do entendimento firmado pelo STF na Súmula Vinculante n. 17 e RE n. 1.169.289 – Tema 1.037 da repercussão geral.

- Inexistência de saldo remanescente do precatório pago, com evidente erro material no cálculo apresentado pelo exequente (art. 494, I, CPC) – inclusão de parcelas indevidas.

- Por não ter havido condenação na verba advocatícia de sucumbência, não se mostra possível aplicar a majoração recursal prevista no Código de Processo Civil (art. 85, § 11º).

- Sentença extintiva da execução mantida.

- Apelação desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

DALDICE SANTANA
DESEMBARGADORA FEDERAL