Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005606-51.2022.4.03.6104

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO

APELADO: LUIZ FELIPE SAAD FARIAS

Advogado do(a) APELADO: ISABELLA SAAD FARIAS - SP431882-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005606-51.2022.4.03.6104

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO

 

APELADO: LUIZ FELIPE SAAD FARIAS

Advogado do(a) APELADO: ISABELLA SAAD FARIAS - SP431882-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMÓVEIS DA 2ª REGIÃO (CRECI/SP) contra sentença proferida em mandado de segurança impetrado com o objetivo de obter provimento judicial que determine ao impetrado a inscrição e registro profissional de modo a permitir o exercício da profissão de corretor imobiliário.

Deferido o pedido liminar, para determinar o afastamento da a exigência imposta pelo artigo 8º, § 1º, “e”, da Resolução COFECI n. 327/1992, deferindo-se no requerimento objeto do Processo n.2022/010005, a inscrição e registro profissional do impetrante no Conselho Regional de Corretores de Imóveis, com a consequente expedição de documentos, salvo a existência de outros óbices além do discutido nos presentes autos (ID 277138682).

A sentença julgou procedente o pedido formulado na petição inicial e concedeu a segurança, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil para determinar fosse afastada a exigência imposta pelo artigo 8º, §1º, “e”, da Resolução COFECI n. 327/1992, deferindo-se no requerimento objeto do Processo n. 2022/010005, a inscrição e registro profissional do impetrante no Conselho Regional de Corretores de Imóveis, com a consequente expedição de documentos, salvo a existência de outros óbices além do discutido nos presentes autos. Custas na forma da lei. Incabíveis na espécie honorários advocatícios, consoante os enunciados das Súmulas n. 105/STJ e 512/STF. Sentença sujeita ao reexame necessário (ID 277138689).

Em razões recursais, o apelante sustenta, em síntese, que: i) a instituição de normas disciplinadoras do exercício profissional é, preponderantemente, de competência do Conselho Federal de Corretores de Imóveis - COFECI, muito embora a própria Lei Federal n. 6.530/1978, bem como o Decreto Federal n. 81.871/1978, em diversos artigos, estabeleçam, também, algumas regras de disciplina; ii) o poder de regulamentar atribuído ao COFECI, quanto à inscrição dos corretores de imóveis e das pessoas jurídicas, está previsto nos artigos 4º, da Lei n. 6.530/1978 e 28, do Decreto n. 81.871/1978; iii) no exercício de sua competência regulamentar editou a Resolução n. 327/1992 que não impôs qualquer restrição ou requisito que extrapolasse a lei ou impedisse o regular exercício da profissão, já que a exigência de documentos pessoais é natural e rotineira; iv) no caso dos autos, o pedido de registro do impetrante foi sobrestado/ indeferido, em razão da existência de dois processos judiciais criminais, em que ele é apontado como réu pela prática de crimes em contexto de violência doméstica ou familiar, de modo que o deferimento da inscrição profissional do autor macularia a imagem e boa fama da profissão e do próprio Conselho Profissional.

Requer o provimento do recurso para, reformando a r. sentença, denegar a ordem pleiteada no mandado de segurança (ID 277138697).

Com contrarrazões (ID 277138709), subiram os autos a esta E. Corte.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento da apelação (ID 277981049).

Em 11/09/2023, os autos foram redistribuídos para minha relatoria em razão da criação desta unidade judiciária.

É o relatório. 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005606-51.2022.4.03.6104

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO

 

APELADO: LUIZ FELIPE SAAD FARIAS

Advogado do(a) APELADO: ISABELLA SAAD FARIAS - SP431882-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Cinge-se a controvérsia à regularidade da negativa de registro do impetrante nos quadros do Conselho Regional de Corretores de Imóveis da 2ª Região, em virtude de figurar como réu em processos criminais.

Conforme se extrai dos documentos encartados aos autos, ao analisar o pedido de registro do impetrante, a Comissão de Análise de Processos Inscricionários – COAPIN/SP decidiu pelo sobrestamento do processo, em razão de o interessado possuir apontamentos criminais (ID 277138667 – Pág. 21/22).

Posteriormente, o pedido de inscrição foi indeferido pela Diretoria, após parecer jurídico do Departamento de Secretaria do CRECI/SP que opinara pelo indeferimento do requerimento, “por expressa incompatibilidade da conduta verificada com a profissão de Corretor de Imóveis” (ID 277138666 – Pág. 25 e 28). Vejamos.

A Constituição Federal de 1988, no inciso II do art. 5º, consagra o princípio da legalidade, ao dispor que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

O princípio é reforçado pelo caput do art. 37, segundo o qual a Administração Pública deve observar, dentre outros, o princípio da legalidade.

De outra parte, a Constituição Federal, no artigo 5º, inciso XIII, dispõe que “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

O livre exercício de profissão constitui direito fundamental individual a ser assegurado de forma ampla, podendo, no entanto, sofrer limitações previstas em lei em sentido estrito, com objetivo de proteger a coletividade contra possíveis riscos decorrentes da própria prática profissional ou de promover outros valores de relevo constitucional como a segurança, a saúde, a ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio, a proteção especial da infância e outros.

Assim, segundo orientação firmada pelo E. Supremo Tribunal Federal, é legítima a atuação legislativa "quando o inadequado exercício de determinada atividade possa vir a causar danos a terceiro e desde que observem critérios de adequação e razoabilidade" (ADPF 183, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 27-09-2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-250 - DIVULG 12-11-2019 - PUBLIC 18-11-2019).

Ainda, conforme entendimento firmado por aquele E. Tribunal Superior, “são diretrizes para a atividade legislativa tendente a condicionar o exercício de alguma profissão: (a) a lei não pode estabelecer limitações injustificadas, arbitrárias ou excessivas; (b) as limitações instituídas pela lei devem fundamentar-se em critérios técnicos capazes de atenuar os riscos sociais inerentes ao exercício de determinados ofícios; e (c) as limitações instituídas pela lei não podem dificultar o acesso a determinada categoria profissional apenas sob o pretexto de favorecer os seus atuais integrantes, mediante restrição exclusivamente corporativista do mercado de trabalho” (RE 1263641, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 13-10-2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-259  DIVULG 27-10-2020  PUBLIC 28-10-2020).

Neste contexto, os Conselhos Profissionais são entidades autárquicas federais que, por meio de delegação da União, desempenham atividade típica de Estado de fiscalização do exercício profissional.

Tais entidades são dotadas de poder polícia, podendo realizar a cobrança das anuidades das pessoas naturais e jurídicas, a fiscalização de estabelecimentos, verificação de documentos para averiguação da regularidade do exercício da profissão regulamentada compreendida em seu âmbito de atuação e a imposição de penalidades disciplinares, devendo, contudo, atuar nos estreitos limites da autorização legal conferida pela norma de regência, sob pena de limitar indevidamente as garantias do livre exercício profissional e da liberdade econômica.

A Lei n. 6.530/1978, que dispõe sobre a profissão de corretor de imóveis, disciplina o funcionamento de seus órgãos de fiscalização e dá outras providências, estabelece em seu artigo 4º que “a inscrição do Corretor de Imóveis e da pessoa jurídica será objeto de Resolução do Conselho Federal de Corretores de Imóveis”.

A pretexto do exercício da competência regulamentar conferida pela citada norma, o Conselho Federal de Corretores de Imóveis (COFECI) editou a Resolução n. 327/1992 estabelecendo normas para inscrição de pessoas físicas e jurídicas nos Conselhos Regionais de Corretores de Imóveis, ato infralegal  que impõe restrição à inscrição como corretor de imóveis àqueles que respondem ou responderam a inquéritos criminais (artigo 8º, § 1º, alínea “e”), que baseou a decisão de indeferimento do pedido de inscrição do apelado:

“Art. 8º - A inscrição principal de Corretor de Imóveis se fará mediante requerimento dirigido ao Presidente do CRECI, com menção:

§ 1º - O requerimento a que se refere este artigo será instruído com os seguintes documentos:

(...)

e) declaração do requerente, sob as penas da lei, de que não responde nem respondeu a inquérito criminal ou administrativo, execução civil, processo falimentar e que não tenha títulos protestados no último quinquênio, bem como os locais de residências no mesmo período”.

 

Ocorre que a restrição imposta ao impetrante, além de não estar prevista na Lei n. 6.530/1978, baseia-se em norma infralegal revogada pela Resolução COFECI n. 1.288, de 10/12/2012.

Mesmo que se tratasse de norma vigente, é sabido que no âmbito do direito administrativo a resolução é um ato normativo expedido por autoridades do Poder Executivo, do Poder Judiciário ou do Poder Legislativo, com o propósito de disciplinar matérias específicas. Apesar do conteúdo, não se trata de espécie normativa capaz de inovar o ordenamento jurídico, criando direitos ou deveres para os administrados que não se encontrem previstos em uma lei.

A Constituição Federal reservou à lei, stricto sensu, a possibilidade de criar obrigações (art. 5º, II), donde se torna obrigatório concluir que a Resolução do Conselho Federal de Corretores de Imóveis extrapolou o poder regulamentar ao estabelecer limitações para o registro da pessoa física não previstas na Lei n. 6.530/1978.

Nesse sentido, aliás, os precedentes deste E. Tribunal Regional Federal:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONSELHO PROFISSIONAL. CRECI-SP. INDEFERIMENTO DE INSCRIÇÃO. RESTRIÇÃO AO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE DE CORRETOR DE IMÓVEIS. AÇÃO PENAL EM CURSO. RESOLUÇÃO 327/92 COFECI. OFENSA AO LIVRE EXERCÍCIO PROFISSIONAL. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS.

1. O impetrante foi denunciado pela prática de crime ambiental, por ter realizado a poda de duas árvores nativas em área de preservação permanente. O Ministério Público propôs a suspensão condicional do processo e a elaboração de Termo de Compromisso de Recuperação Ambiental. À época em que requerida a inscrição perante o CRECI/SP, não havia notícia acerca do andamento da proposta e eventual extinção da punibilidade.

2. De acordo com a Lei n. 6.530/1979, que regulamenta a profissão em questão, “o exercício da profissão de Corretor de Imóveis será permitido ao possuidor de título de Técnico em Transações Imobiliárias” (art. 2º). De acordo com o art. 4º, tal inscrição será objeto de resolução do Conselho Federal de Corretores de Imóveis (COFECI).

3. A Resolução n. 327/1992 do COFECI dispõe sobre a inscrição do corretor de imóveis. Quanto ao requisito do art. 8º, § 1º, alínea ‘e’, encontra-se em desacordo com o disposto no art. 5º, XIII, da Constituição Federal, que trata do direito fundamental ao livre exercício da atividade profissional.

4. A Resolução do COFECI acrescenta requisito que a própria lei que regulamenta a profissão do corretor de imóveis não exige. Não há previsão legal que impeça a inscrição em virtude de ação penal ou civil, de modo que a atuação do CRECI/SP se revela abusiva e ilegal. Precedentes desta Corte.

5. Apelação e remessa oficial desprovidas.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5000956-96.2021.4.03.6135, Rel. Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS, julgado em 09/07/2024, DJEN DATA: 16/07/2024)

                                       

ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. CRECI. INSCRIÇÃO. RESTRIÇÃO AO EXERCÍCIO  DA PROFISSÃO DE CORRETOR DE IMÓVEIS. IMPOSIÇÃO DE CONDIÇÕES. RESOLUÇÃO COFECI 327/92. ILEGALIDADE. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1.No caso em apreço, o impetrante teve seu pedido de registro no Conselho suspenso em razão de ter sido condenado em processo criminal registrado em 2013 e não tem previsão de julgamento.

 2.O artigo 5.º, XIII, da Constituição Federal, assegura que "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer".

3.Nesse sentido, o art. 2.º da Lei 6.530/78, que regula a profissão de Corretor de Imóveis, determina que "o exercício da profissão de Corretor de Imóveis será permitido ao possuidor de título de Técnico em Transações Imobiliárias". O art. 4.º, da mesma Lei, dispõe que "a inscrição do Corretor de Imóveis e da pessoa jurídica será objeto de Resolução do Conselho Federal de Corretores de Imóveis".

4.O CRECI/SP, todavia, não pode impor restrição ao livre exercício profissional, direito assegurado pela Constituição Federal, com base em regramento infralegal (Resolução COFECI 327/92). Com efeito, inexiste previsão legal expressa que obste a inscrição profissional na hipótese dos autos, ou seja, que determine o impedimento do exercício da atividade de corretor de imóveis pela existência de açãopenal em trâmite ou de condenação criminal anterior.

5.A restrição imposta única e exclusivamente com fundamento em Resolução do COFECI revela-se abusiva e ilegal, pois o ato normativo extrapola os limites estabelecidos em lei.

6.Apelação e remessa oficial não providas.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5021283-36.2022.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 24/06/2024, Intimação via sistema DATA: 26/06/2024)

 

MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO EM CONSELHO PROFISSIONAL. EXIGÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS. EXIGÊNCIA PREVISTA EM NORMA INFRALEGAL. RESOLUÇÃO COFECI Nº 327/92. ILEGALIDADE.

1. O artigo 5º, inciso XIII, da Constituição da República assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, dentre outros direitos, o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão.

2. A imposição de declaração de antecedentes criminais pelo Conselho Regional de Corretores de Imóveis, por meio de regulamento infralegal, extrapolou os limites legais, bem como impôs restrição ao livre exercício profissional, direito assegurado pela Constituição Federal, de modo que a decisão de indeferimento de pedido de inscrição profissional não poderia ser fundamentada em uma Resolução que contraria a lei.

3. O CRECI/SP CRECI/SP não poderia impor restrição ao livre exercício profissional, direito assegurado pela Constituição Federal, com base em regramento infralegal, razão pela qual a manutenção da r. sentença que concedeu a ordem é medida que se impõe.

4. Esse E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, na Ação Civil Pública nº 0009073-24.2011.4.03.6100/SP, ajuizada pelo Ministério Público Federal, reconheceu a ilegalidade da exigência de certidão de distribuição como condição para inscrição do indivíduo no CRECI, por entender que ela não decorre de lei, incorrendo, portanto, em vício de legalidade.

5. Apelação e remessa oficial desprovidas.

(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5030551-51.2021.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, julgado em 01/02/2024, Intimação via sistema DATA: 14/02/2024)

 

Por oportuno, conforme bem observou o MM. Juízo a quo, esta E. Terceira Turma, ao julgar a apelação interposta nos autos da ação civil pública n. 0009073-24.2011.4.03.6100/SP, ajuizada pelo Ministério Público Federal, reconheceu a ilegalidade da exigência de certidão de distribuição como condição para inscrição do indivíduo no CRECI, por entender que ela não decorre de lei, incorrendo, portanto, em vício de legalidade. Confira-se a ementa do julgado:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARA PROPOSITURA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO DE INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. RESTRIÇÃO AO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE CORRETOR DE IMÓVEIS. IMPOSIÇÃO DE CONDIÇÕES. RESOLUÇÃO COFECI 327/92. ILEGALIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.

I. Rejeitada a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal para a propositura de ação civil pública na defesa de interesses individuais homogêneos que possuam repercussão no interesse público, como é o caso dos autos, tendo em vista que a amplitude dos indivíduos afetados revela o evidente interesse social da presente demanda.

II. A Constituição Federal assegura o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer (art. 5º, inciso XIII).

III. É ilegal a alínea "e" do § 1º do art. 8º, da Resolução COFECI 327/92, ao exigir certidão de distribuição como condição para a inscrição do Corretor de Imóveis no respectivo Conselho Regional de Corretores de Imóveis.

IV. Considerando que a exigência não decorre de lei, ao inovar o procedimento de inscrição a Resolução COFECI nº 327/92 incorreu no vício de ilegalidade.

V. Sentença mantida. Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2097558 - 0009073-24.2011.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, julgado em 15/12/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/01/2017 )

                                       

Sendo assim, considerando a fundamentação lançada, concluo pela manutenção da r. sentença.

Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos do artigo 25 da Lei n. 12.016/2009 e das Súmulas 512 do STF e 105 do STJ.

Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária e à apelação.

É o voto.

 



E M E N T A

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMÓVEIS. REGISTRO DE PESSOA FÍSICA. RESOLUÇÃO COFECI N. 327/1992. EXIGÊNCIAS NÃO PREVISTAS EM LEI. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.

- Cinge-se a controvérsia à regularidade da negativa de registro do impetrante nos quadros do Conselho Regional de Corretores de Imóveis da 2ª Região, em virtude de figurar como réu em processos criminais.

- A Constituição Federal de 1988, no inciso II do art. 5º, consagra o princípio da legalidade, ao dispor que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. O princípio é reforçado pelo caput do art. 37, segundo o qual a Administração Pública deve observar, dentre outros, o princípio da legalidade.

- Os Conselhos Profissionais são entidades autárquicas federais que, por meio de delegação da União, desempenham atividade típica de Estado de fiscalização do exercício profissional. Tais entidades são dotadas de poder polícia, podendo realizar a cobrança das anuidades das pessoas naturais e jurídicas, a fiscalização de estabelecimentos, verificação de documentos para averiguação da regularidade do exercício da profissão regulamentada compreendida em seu âmbito de atuação e a imposição de penalidades disciplinares, devendo, contudo, atuar nos estreitos limites da autorização legal conferida pela norma de regência, sob pena de limitar indevidamente as garantias do livre exercício profissional e da liberdade econômica.

- A pretexto do exercício da competência regulamentar conferida no artigo 4º da Lei n. 6.530/1978, o Conselho Federal de Corretores de Imóveis (COFECI) editou a Resolução n. 327/1992 estabelecendo normas para inscrição de pessoas físicas e jurídicas nos Conselhos Regionais de Corretores de Imóveis, ato infralegal  que impõe restrição à inscrição como corretor de imóveis àqueles que respondem ou responderam a inquéritos criminais (artigo 8º, § 1º, alínea “e”), que baseou a decisão de indeferimento do pedido de inscrição do apelado.

- Ocorre que a restrição imposta ao impetrante, além de não estar prevista na Lei n. 6.530/1978, baseia-se em norma infralegal revogada pela Resolução COFECI n. 1.288, de 10/12/2012. Mesmo que se tratasse de norma vigente, é sabido, que no âmbito do direito administrativo a resolução é um ato normativo expedido por autoridades do Poder Executivo, do Poder Judiciário ou do Poder Legislativo, com o propósito de disciplinar matérias específicas. Apesar do conteúdo, não se trata de espécie normativa capaz de inovar o ordenamento jurídico criando direitos ou deveres para os administrados que não se encontrem previstos em uma lei.

- A Constituição Federal reservou à lei, stricto sensu, a possibilidade de criar obrigações (art. 5º, II), donde se torna obrigatório concluir que a Resolução do Conselho Federal de Corretores de Imóveis extrapolou o poder regulamentar ao estabelecer limitações para o registro da pessoa física não previstas na Lei n. 6.530/1978.

- Ademais, esta E. Terceira Turma, ao julgar a apelação interposta nos autos da ação civil pública n. 0009073-24.2011.4.03.6100/SP, ajuizada pelo Ministério Público Federal, reconheceu a ilegalidade da exigência de certidão de distribuição como condição para inscrição do indivíduo no CRECI, por entender que ela não decorre de lei, incorrendo, portanto, em vício de legalidade.

- Mantida a sentença que concedeu a segurança, para determinar fosse afastada a exigência imposta pelo artigo 8º, §1º, “e”, da Resolução COFECI n. 327/1992, deferindo-se a inscrição e registro profissional do impetrante no CRECI/SP, com a consequente expedição de documentos, salvo a existência de outros óbices além do discutido nos presentes autos.

- Remessa necessária e apelação desprovidas.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à remessa necessária e à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

RUBENS CALIXTO
DESEMBARGADOR FEDERAL