RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5050922-78.2022.4.03.6301
RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: OTACILIO ANDRE NOGUEIRA CABRAL
Advogados do(a) RECORRENTE: EDIMEIRE GONCALVES VIEIRA - MG212208-A, LUCAS DE ALMEIDA ANDRADE - MG212226-A, ROBSON LOPES GONCALVES - MG142500-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) RECORRIDO: JOSE RICARDO RIBEIRO - SP340230-N
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5050922-78.2022.4.03.6301 RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: OTACILIO ANDRE NOGUEIRA CABRAL Advogados do(a) RECORRENTE: EDIMEIRE GONCALVES VIEIRA - MG212208-A, LUCAS DE ALMEIDA ANDRADE - MG212226-A, ROBSON LOPES GONCALVES - MG142500-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) RECORRIDO: JOSE RICARDO RIBEIRO - SP340230-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5050922-78.2022.4.03.6301 RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: OTACILIO ANDRE NOGUEIRA CABRAL Advogados do(a) RECORRENTE: EDIMEIRE GONCALVES VIEIRA - MG212208-A, LUCAS DE ALMEIDA ANDRADE - MG212226-A, ROBSON LOPES GONCALVES - MG142500-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) RECORRIDO: JOSE RICARDO RIBEIRO - SP340230-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
VOTO-EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.
1. Pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, com o reconhecimento de tempo rural e especial.
2. Conforme consignado na sentença:
“(...)
Tempo de serviço rural
Pleiteia a parte autora o reconhecimento de tempo de serviço rural, no período de 30/11/1979 a 14/03/1994.
Indiscutível que a lei preceitua a possibilidade de o segurado provar o tempo laborado como rural para que, somado ao tempo de serviço urbano, venha a se aposentar por tempo de contribuição.
No entanto, para essa comprovação do tempo de serviço, a Lei 8.213/91, em seu art. 55, § 3º e o artigo 143 do Decreto 3.048/99 exigem, ao menos, o início de prova material, vedada a prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido, também a jurisprudência dos tribunais superiores:
Ementa: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA. SOMENTE PROVA TESTEMUNHAL A CORROBORAR A QUALIDADE DE RURÍCOLA DA AUTORA. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. SÚMULA 149 DO C. STJ. - Conforme dispõe o § 3º do art. 55, da Lei 8.213/91, a comprovação da qualidade de trabalhador rural só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não se admitindo prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. - Verifica-se, compulsando os autos, que a autora apresentou como documento apenas cópia de carteirinha de afiliação de sindicato rural, na qual alega ser rurícola e, a teor do entendimento esposado pelo eg. Tribunal a quo, o mencionado documento não é suficiente a caracterizar início de prova material. - Agravo improvido.
(STJ, Agresp 744699 - CE, 6ª T., v.u., Rel. Min. HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, DJ 27/06/2005). (grifei)
Há, inclusive, súmula da jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça, que sedimentou referido entendimento: “a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário” (Súmula 149).
Por outro lado, nos termos do art. 106, parágrafo único da Lei 8.213/91, admite-se a prova da atividade rural por intermédio de contrato individual de trabalho, anotações na Carteira de Trabalho, contrato de arrendamento, parceria, comodato, declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS ou MP, comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar e blocos de notas de produtor rural.
E ainda, ante a precariedade das condições de trabalho do homem do campo, a jurisprudência tem entendido que a qualificação profissional do interessado como rurícola, quando alicerçada em certificado de alistamento militar, título eleitoral e atos de registro civil é aceita como início de prova material para o efeito de comprovar o exercício de atividade rural.
No entanto, tais documentos, de acordo com a jurisprudência, devem ser contemporâneos à data dos fatos que se pretendem comprovar, como in verbis:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. VALORAÇÃO DE PROVA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. SÚMULA Nº 7 DO STJ.
(...)
2. O início de prova material, de acordo com a interpretação sistemática da lei, é aquele feito mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos a serem contados, devendo ser contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função exercida pelo trabalhador....”
(STJ, Agresp 712705 - CE, 6ª T., v.u., Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJ 01/07/2005). (grifei).
In casu, o autor, nascido em 30/11/1967, pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço rural do período de 30/11/1979 a 14/03/1994.
No entanto, não obstante os documentos apresentados pelo autor quando do segundo requerimento administrativo (DER 30/03/2020), ele não apresentou nenhum documento em seu nome e contemporâneo demonstrando, efetivamente, o exercício de atividade rural em regime de economia familiar.
Foram ouvidas testemunhas.
Infere-se dos documentos acostados aos autos e dos depoimentos colhidos que o autor trabalhava nas terras de seu pai, com aproximadamente 75 hectares, produzindo, entre outras coisas, leite, que era comercializado com uma cooperativa da região. A propriedade contava, ainda, com engenho. A certidão do INCRA acostada aos autos (fls. 64[i]) indica que no imóvel rural do pai do autor ele contava, no período de 1979 a 1991, com um empregado eventual/temporário.
Assim, a questão a ser dirimida reside justamente na natureza dessa atividade rural, a fim de se fazer o correto enquadramento do autor como segurado frente à Previdência Social.
Com efeito, da análise dos documentos em nome do pai do autor e dos depoimentos, verifico, não obstante o alegado, que o autor não poderia ser enquadrado como segurado especial, eis que pelos elementos de prova constantes dos autos, resta claro que o trabalho rural em questão não era de economia familiar e sim de atividade rural, como produtor empregador rural, corroborando, inclusive, o mencionado no cadastro do INCRA.
Passo a tecer considerações a respeito da atividade rural.
Quanto ao reconhecimento do período laborado como trabalhador rural, de acordo com o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
Por tal razão, é necessário delimitar exatamente a quem se refere a Lei 8.213/1991 ao tratar do trabalhador rural, a fim de saber se seu intuito seria isentar de contribuição somente o trabalhador rural empregado ou também o trabalhador rural empregador. Para tanto, devemos nos socorrer da legislação específica da época.
Nesse sentido, o Estatuto do Trabalhador Rural, Lei 4.214/1963, dispunha:
“Art. 2º Trabalhador rural para os efeitos desta é toda pessoa física que presta serviços a empregador rural, em propriedade rural ou prédio rústico, mediante salário pago em dinheiro ou in natura, ou parte in natura e parte em dinheiro.
Art. 3º - Considera-se empregador rural, para os efeitos desta lei, a pessoa física ou jurídica, proprietário ou não, que explore atividades agrícolas, pastoris ou na indústria rural, em caráter temporário ou permanente, diretamente ou através de prepostos”.
A Lei 4.214/1963 foi expressamente revogada pelo artigo 21 da Lei 5.889/1973, que por sua vez assim define:
“Art. 2º Empregado rural é toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural, sob a dependência deste e mediante salário.
Art. 3º - Considera-se empregador rural, para os efeitos desta Lei, a pessoa física ou jurídica, proprietário ou não, que explore atividade agro-econômica, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou através de prepostos e com auxílio de empregados.”
A conclusão a que se chega é que já existia no ordenamento jurídico um conceito bem delimitado de trabalhador rural como sendo especificamente o empregado rural, em oposição ao empregador rural. Aquele aufere renda do fruto de seu trabalho; este aufere renda do fruto da terra.
Ainda em consonância com essa interpretação, vale lembrar da Lei 6.260/1975, que criou o FUNRURAL e instituiu, em favor dos empregadores rurais e seus dependentes os benefícios de previdência e assistência social (artigo 1º da referida lei), estabelecendo em seguida as espécies de benefício e a forma de custeio obrigatório, a cargo do empregador rural.
Nesse sentido, é possível afirmar que o empregador rural não foi contemplado no artigo 55, § 2º, da Lei 8213/1991, cumprindo a ele, em qualquer tempo, o recolhimento de contribuições.
E ora voltando a atenção para o empregador rural, vemos que seu conceito encontra-se também bem delimitado pela legislação, como o que explora a atividade rural (aufere lucros) “diretamente ou através de prepostos”, segundo a Lei 4.214/1963, ao que a Lei 5.889/1973 veio acrescentar “e com auxílio de empregados”.
Tornando à Lei 8213/91, observamos que também neste ponto ela se harmoniza com o sistema prévio, incluindo o empregador rural na condição de contribuinte individual previsto no artigo 11, V, a, e destacando expressamente a figura do segurado especial no artigo 11, VII, a fim de que não fosse ele confundido com a figura do empregador rural:
“Art. 11 (...)
V - como contribuinte individual:
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária ou pesqueira, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua;
...
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.” (grifei)
Ora, o artigo 11 da Lei 8.213/1991 inclui o produtor rural e assemelhados, em economia familiar, como segurado obrigatório, sendo ele dispensado de contribuir para o sistema até a vigência da Lei 8.213/1991, numa interpretação sistemática com o artigo 55, § 2º já visto. Afinal, em relação ao trabalhador rural não é possível exigir recolhimento em qualquer período, mesmo quando passou a ser segurado da Previdência Social com a edição da Lei Complementar 11/71, eis que cabe à Autarquia Previdenciária diligenciar para verificação de regulares recolhimentos por parte do empregador. Sendo assim, o artigo 55, § 2º, da Lei 8.213/1991 não teria nenhum sentido de existir a não ser equiparar o segurado especial ao trabalhador rural (empregado rural) para efeito de dispensa de contribuições.
As razões aqui expostas encontram abrigo na jurisprudência, como se vê do julgado a seguir:
“PREVIDENCIÁRIO. RURÍCOLA. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. EMPREGADOR RURAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. NECESSIDADE. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
I - Em obediência ao artigo 202, II, da Constituição Federal, editou-se a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, cujos artigos 52 e seguintes forneceram o regramento legal sobre o benefício previdenciário aqui pleiteado, e segundo os quais restou afirmado ser devido ao segurado da Previdência Social que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se mulher, ou 30 (trinta) anos, se homem, evoluindo o valor do benefício de um patamar inicial de 70% do salário-de-benefício para o máximo de 100%, caso completados 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 35 (trinta e cinco) anos, se do sexo masculino.
II - A tais requisitos, some-se o cumprimento da carência, acerca da qual previu o artigo 25, II, da Lei nº 8.213/91 ser de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais no caso de aposentadoria por tempo de serviço.
III - Ao segurado trabalhador rural, foi assegurado o cômputo do tempo de serviço anterior à data de início de vigência da Lei 8.213/91, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme previsto no § 2º do artigo 55.
IV - Para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador não registrado, é exigido pelo menos um início de prova documental razoável, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, nos termos do § 3º do artigo 55 da Lei acima citada.
V - Não foi comprovado o regime de economia familiar, no qual o trabalho é exercido pelos membros da família, em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados, tido como indispensável à própria subsistência, nos termos do artigo 11, § 1º, da Lei nº 8.213/91, sendo tal conceito já esboçado no artigo 160 do Estatuto do Trabalhador Rural (Lei nº 4.214/63).
VI - Perante a Previdência Social, o apelado ostentava a condição de empregador rural, e não de lavrador em regime de economia familiar, como quer fazer crer. Por isso, deve receber o tratamento outorgado pela Lei nº 4.214/63, artigos 3º e 161. Posteriormente, pela Lei nº 6.260/975, até ser equiparado a trabalhador autônomo, nos termos do artigo 11, V, "a", da Lei nº 8.213/91, em sua redação original.
VII - No caso presente, para fins de aposentadoria por tempo de serviço, somente é possível o cômputo do período laborado em atividade rural com o recolhimento das contribuições correspondentes à Previdência Social, como prevê o artigo 55, § 1º, da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, o que o apelado não demonstrou ter feito.
VIII - Restou demonstrado, e reconhecido pelo INSS, que o apelado desenvolveu atividade urbana por 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 11 (onze) dias.
IX - Não comprovado o tempo de serviço necessário, não faz jus à concessão do benefício pleiteado.
X - Apelação do INSS provida.”
(TRF 3, AC 00148952519974039999, 9ª Turma, Des. Fed. Marisa Santos, DJU:23/10/2003)
Contudo, como já concluído, o autor não se enquadra na categoria de segurado especial. Dessa forma, sendo certo que o autor exerceu atividade laborativa como rurícola, nesse caso, como produtor não empresarial, a ausência de recolhimento das contribuições correspondentes impediria o reconhecimento do tempo de serviço, mesmo em período anterior a 1991.
Portanto, a procedência do pedido do autor na presente lide exigiria, além da prova da condição de rurícola no período indicado, a demonstração de recolhimento das pertinentes contribuições.
Ocorre que, compulsando os autos, não há qualquer comprovação de eventuais recolhimentos de contribuição no período em que exerceu atividades rurais.
Considero, portanto, que o autor se enquadrava, no período pretendido, não como segurado especial do inciso VII do artigo 11 da Lei 8.213/1991, mas como contribuinte individual da alínea a do inciso V do mesmo artigo, sendo seu dever, portanto, verter contribuições para o sistema previdenciário, sem as quais não pode haver a contagem do tempo respectivo.
Assim, não há como reconhecer o período de 30/11/1979 a 14/03/1994 como sendo de prestação de atividade rural.
Da possibilidade de conversão de tempo especial em comum
(...)
No processo em análise, pleiteia a parte autora o reconhecimento como especial do período de 01/03/2000 a 26/04/2011 (PRADLEY IND. E COM. DE CIRCUITOS ELETRÔNICOS LTDA.ME).
Analisando-se o conteúdo dos autos, verifico que para comprovar a natureza especial da atividade exercida, a parte autora apresentou o Perfil Profissiográfico Previdenciário da empresa acima – fls. 124/125.
No entanto, não é possível reconhecer o período de 01/03/2000 a 26/04/2011 (PRADLEY IND. E COM. DE CIRCUITOS ELETRÔNICOS LTDA.ME) como tempo de serviço especial, pois o PPP apresentado indica a utilização de EPI eficaz para o agente mencionado (químico), o que descaracteriza a especialidade, de acordo com o entendimento do STF (ARE 664.335/SC).
Cumpre salientar, por oportuno, que o acerto/complementação dos recolhimentos efetuados com valor inferior a um salário-mínimo não pode ser realizada nestes autos, tendo em vista que é necessária a prévia análise na via administrativa, esfera, na qual, devem ser realizados os respectivos cálculos para a complementação devida.
Desta forma, é de rigor a improcedência do pedido da parte autora.
Ante do exposto, julgo improcedente o pedido, extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do disposto no artigo 487, inciso I do CPC.
Sem custas e honorários.
Defiro a gratuidade de justiça.
Publicada e registrada neste ato.
Intimem-se as partes.”
3. Recurso da parte autora: aduz que trabalhou por muitos anos quando jovem no período de 30/11/1979 a 14/03/1994, como segurado especial juntamente com sua família no imóvel Ribeirão dos Pires e Floresta de propriedade de Cirilo Cabral Nogueira. Para que pudesse haver descaracterização do labor em regime de economia familiar do mesmo, deveria constar na Certidão do INCRA que o pai do mesmo possuía funcionário permanente assalariado, o que não ocorre. A própria certidão do INCRA é clara ao informar a existência de colaboração EVENTUAL de terceiro, o que não descaracteriza a qualidade de segurado especial nem na própria VIA ADMINISTRATIVA. Nada obstante, o próprio tamanho da terra (31,8 HAS) é bem inferior ao limite legal de 120 HAS (equivalente a quatro módulos fiscais na região). Eis que, além do já exposto acima, o recorrente em audiência de instrução trouxe testemunhas que de forma uníssona afirmaram que o mesmo sempre exerceu labor campesino em regime de economia familiar sem auxílio de empregado. Afirma, ainda, que fez o pedido para pagar buracos e diferenças tanto em via administrativa quanto judicial, e em ambas as vezes não teve satisfeito seu direito, isso porque verteu contribuições ao RGPS como Contribuinte Individual em alíquota inferior a 20% no período de 2011 em diante, e deseja, após ver reconhecido o tempo rural, quitar as diferenças devidas em número de meses a atingir o tempo necessário. No que tange ao não reconhecimento da atividade especial (exercida e comprovada por meio de PPP), o MM. Juiz insurge que o recorrente utilizava EPI, e que assim, o mesmo não exercia atividade insalubre, contudo, tal fato por si só não garante que o fator de risco não prejudique a saúde do trabalhador, além do que, como se sabe, tal equipamento na sua grande maioria é utilizado de forma errada, não sendo totalmente eficiente na proteção. Sendo assim, merece ser reconhecido o tempo especial proposto pelo recorrente. Requer o reconhecimento do período rural de 30/11/1979 a 14/03/1994 seja julgado procedente o pedido inicial, sendo assim reformada a decisão do MM. Juiz determinando-se a concessão do Benefício de Aposentadoria Por Tempo de Contribuição ao recorrente com pagamento das parcelas vencidas.
4. Tempo rural: Para comprovação do tempo de labor rural, a parte autora apresentou: sua CTPS, emitida em 1988, constando apenas vínculos urbanos, sendo que o primeiro teve início em 15/04/1994 (fls. 07/26 – ID 290638373); declaração, emitida pela Escola Municipal “Padre Jacinto Trombert”, atestando que Cirilo Cabral Nogueira, pai do autor, teve os filhos matriculados na escola nos anos de 1977/1979, 1982/1983 e em 1985, constando a profissão de lavrador ou agricultor (fl. 34); documentos escolares do autor, referentes aos anos de 1977, 1978, 1982, 1983 e 1985, constando a profissão de agricultor do seu pai (fls. 35/48); sua certidão de nascimento; documento do autor, com validade até 31/12/1985, constando a informação de trabalho agrícola, 1º grau, 6ª série (fl. 49); certidão emitida pelo INCRA, informando a existência de cadastro de imóvel rural, localizado no Município de Senador Firmino/ MG, com declarações apresentadas nos períodos de 1979/1991 e 1992/1996, em nome de Cirilo Cabral Nogueira (fl. 50); certidão, emitida pelo Registro de Imóveis de Senador Firmino, atestando transmissão, em 1963, de imóvel rural denominado Ribeirão dos Pires e Floresta, constando o genitor do autor como adquirente e sua profissão de lavrador (fl. 51).
5. Prova oral:
- Depoimento da parte autora: Informa que trabalhou dos 7 aos 24 anos, quando veio para São Paulo, em 1994. Trabalhava nas terras do seu pai, Sítio Ribeirão dos Pires, no Município de Senador Firmino. Tirava leite, plantava milho, feijão, arroz, cana, capim e, às vezes plantavam coisas de horta como alho, abóbora, tomate e frutas (laranja). Trabalha os pais, o autor e os 11 irmãos, porque não tinham dinheiro para pagar ajudante de fora. Uma parte da produção era para despesa e a sobra era vendida. A cana servia para fazer rapadura, não compravam açúcar. As terras tinham uns 24 alqueires (75 hectares). Tinham vacas para produção de leite, alguns porcos, galinhas, patos para despesa. O pai do autor fazia parte no Funrural e todos os filhos eram cadastrados no Funrural. Após o falecimento dos pais, as terras foram divididas entre o autor e seus irmãos. Estudou até a 7ª série, com 16 ou 17 anos, sempre no período da manhã.
- Primeira testemunha: Informa que o autor nasceu no Ribeirão dos Pires e conhece dele desde que ele era criança, porque eram vizinhos. Os sítios faziam divisa. O sítio em que a testemunha mora era do seu pai, João Francisco Neto. Depois que o autor saiu do sítio, nunca mais o viu. Estudou com o irmão mais velho do autor e acha que ele tinha uns 10 irmãos. Trabalhavam no sítio os pais, o autor e os irmãos. Ninguém de fora trabalhava e não utilizavam maquinários. Eles plantavam milho, feijão, arroz, café, cana, tiravam leite. A lavoura de café era só para consumo e tinham entre 15 e 20 cabeças de gado. Acredita que vendiam um pouco de leite para a cooperativa. O autor saiu da região com uns 24 ou 25 anos. Não tinham outra fonte de renda, viviam só da roça. Os pais do autor tinham engenho e, às vezes, moíam para a testemunha.
- Segunda testemunha: Informa que conhece o autor porque eram vizinhos em Ribeirão dos Pires. Não há distinção do nome de fazenda, todos tem o mesmo nome. Conhece o autor desde que ele nasceu, porque é um pouco mais velho. Os pais do autor chamavam Cirilo Cabral e Francisca. Eles plantavam milho, feijão, arroz, cana, capim. Os pais tiveram uns 9 ou 10 filhos e só eles trabalhavam. Não tinham parceria nem troca de dias. A propriedade deles tinha de alqueires para cima, sendo uma parte pastagem. Criavam vaca de leite. Não tinham maquinário, utilizavam apenas tração animal. O autor estudou até 4ª ou 5ª série primária, na Escola Francisco Miguel Nogueira, mesma escola em que estudou a testemunha. O autor saiu da região com 19 ou 20 anos. A família do autor vivia só da roça e até ir para São Paulo, o autor ficou direto na roça.
6. Outrossim, com relação ao tempo rural, a despeito das alegações recursais, reputo que a sentença analisou corretamente todas as questões trazidas no recurso inominado, de forma fundamentada, não tendo o recorrente apresentado, em sede recursal, elementos que justifiquem sua modificação, motivo pelo qual a sentença deve ser mantida, neste ponto, por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95.
7. Tempo especial. As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período, ressalvando-se apenas a necessidade de observância, no que se refere à natureza da atividade desenvolvida, ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço. Com efeito, o Decreto n.º 4827/03 veio a dirimir a referida incerteza, possibilitando que a conversão do tempo especial em comum ocorra nos serviços prestados em qualquer período, inclusive antes da Lei nº 6.887/80. Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é possível a transmutação de tempo especial em comum, seja antes da Lei 6.887/80 seja após maio/1998. Ademais, conforme Súmula 50, da TNU, é possível a conversão do tempo de serviço especial em comum do trabalho prestado em qualquer período.
8. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece o direito ao cômputo do tempo de serviço especial exercido antes da Lei 9.032/95 (29/04/1995), com base na presunção legal de exposição aos agentes nocivos à saúde pelo mero enquadramento das categorias profissionais previstas nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. A partir da Lei 9.032/95, o reconhecimento do direito à conversão do tempo de serviço especial se dá mediante a demonstração da exposição aos agentes prejudiciais à saúde, por meio de formulários estabelecidos pela autarquia, até o advento do Decreto 2.172/97 (05/03/1997). A partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
9. O PPP deve ser emitido pela empresa com base em laudo técnico de condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança, substituindo, deste modo, o próprio laudo pericial e os formulários DIRBEN 8030 (antigo SB 40, DSS 8030). Para que seja efetivamente dispensada a apresentação do laudo técnico, o PPP deve conter todos os requisitos e informações necessárias à análise da efetiva exposição do segurado ao referido agente agressivo.
10. EPI EFICAZ: O Supremo Tribunal Federal pacificou a questão no leading case ARE 664335/SC, de relatoria do I. Ministro Luiz Fux, firmando, em síntese, o seguinte entendimento a respeito: “1) “o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial”; 2) “em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete” e 3) no caso do ruído, a exposição do trabalhador a níveis acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.” Destarte, caso haja expressa menção à redução efetiva do nível de exposição a agentes agressivos para dentro dos limites de tolerância fixados pela legislação previdenciária em razão do uso de EPI, não pode o período laborado ser considerado como especial, exceto no caso do ruído, onde o uso de protetores auriculares não possui o condão de afastar a insalubridade do ambiente de trabalho. Por sua vez, a TNU assim decidiu, no TEMA 213: “I - A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) eficaz pode ser fundamentadamente desafiada pelo segurado perante a Justiça Federal, desde que exista impugnação específica do formulário na causa de pedir, onde tenham sido motivadamente alegados: (i.) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii.) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii.) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv.) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso o uso adequado, guarda e conservação; ou (v.) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI. II - Considerando que o Equipamento de Proteção Individual (EPI) apenas obsta a concessão do reconhecimento do trabalho em condições especiais quando for realmente capaz de neutralizar o agente nocivo, havendo divergência real ou dúvida razoável sobre a sua real eficácia, provocadas por impugnação fundamentada e consistente do segurado, o período trabalhado deverá ser reconhecido como especial.” Ainda, com relação ao uso de EPI, considere-se que este não impede a especialidade em se tratando de agentes cancerígenos. Neste sentido, o Memorando Circular Conjunto n.2/DIRSAT/DIRBEN/INSS de 23.07.2015 que assim dispõe: “a utilização de Equipamentos de Proteção Coletiva-EPC e/ou Equipamentos de Proteção Individual -EPI não elide a exposição aos agentes reconhecidamente cancerígenos, ainda que considerados eficazes”. Conforme decidido no TEMA 170, pela TNU: "A redação do art. 68, § 4º, do Decreto 3.048/99 dada pelo Decreto 8.123/2013 pode ser aplicada na avaliação de tempo especial de períodos a ele anteriores, incluindo-se, para qualquer período: (1) desnecessidade de avaliação quantitativa; e (2) ausência de descaracterização pela existência de EPI". Por fim, a neutralização da exposição a agentes agressivos pelo uso de EPI para efeitos previdenciários gera efeitos jurídicos a partir da vigência da MP 1.729/89, convertida na Lei 9.732/98, o que se deu aos 03/12/1998, conforme Súmula 87 da TNU: “A eficácia do EPI não obsta o reconhecimento de atividade especial exercida antes de 03/12/1998, data de início da vigência da MP 1.729/98, convertida na Lei n. 9.732/98”.
11. Período de 01/03/2000 a 26/04/2011: PPP (fls. 27/28 – ID 290638373), emitido por Pradley Ind. e Com. de circuitos Eletrônicos Ltda ME em 26/04/2011, atesta a função de operador de galvânica, com exposição a hidróxido de sódio, ácido sulfúrico, cloreto de hidrogênio e ácido nítrico, substâncias não previstas como insalubres nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. Ademais, consta o uso de EPI eficaz, o que afasta a insalubridade, conforme fundamentação supra. Assim, não é possível o reconhecimento do período como especial.
12. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
13. Recorrente condenado ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa. Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do artigo 98, § 3º do CPC.