
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004148-07.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS
AGRAVANTE: THOMAS DE BARROS AMARAL
Advogado do(a) AGRAVANTE: THOMAS DE BARROS AMARAL - SP438516-A
AGRAVADO: UNIVERSIDADE MUNICIPAL DE SAO CAETANO DO SUL, CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DA 6 REGIAO - CRP-06
Advogado do(a) AGRAVADO: JOAO PAULO DOS REIS GALVEZ - SP88213-A
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004148-07.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS AGRAVANTE: THOMAS DE BARROS AMARAL Advogado do(a) AGRAVANTE: THOMAS DE BARROS AMARAL - SP438516-A AGRAVADO: UNIVERSIDADE MUNICIPAL DE SAO CAETANO DO SUL, CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DA 6 REGIAO - CRP-06 Advogado do(a) AGRAVADO: JOAO PAULO DOS REIS GALVEZ - SP88213-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto por THOMAS DE BARROS AMARAL contra a decisão que indeferiu a liminar em mandado de segurança, que buscava o reconhecimento da ilegalidade da aplicação de nota de corte única para os candidatos da ampla concorrência e das cotas, determinando-se, por conseguinte, a correção da prova discursiva do candidato PCD melhor classificado para o cargo de Especialista em Gestão - Advogado. Sustenta o agravante, em síntese, que o Decreto nº 9.508/2018 estipula que os candidatos PCDs concorrerão em igualdade de condições com os demais candidatos no que diz respeito à nota mínima exigida, porém, no caso, houve a estipulação da mesma nota de corte para todos os candidatos, em clara violação ao referido decreto. Requer a concessão da tutela de urgência e, ao final, o provimento do recurso. Com contraminuta. A tutela de urgência foi deferida. O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004148-07.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS AGRAVANTE: THOMAS DE BARROS AMARAL Advogado do(a) AGRAVANTE: THOMAS DE BARROS AMARAL - SP438516-A AGRAVADO: UNIVERSIDADE MUNICIPAL DE SAO CAETANO DO SUL, CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DA 6 REGIAO - CRP-06 Advogado do(a) AGRAVADO: JOAO PAULO DOS REIS GALVEZ - SP88213-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Ao analisar o pedido de tutela de urgência, foi proferida a seguinte decisão: "De início, assevero que, no âmbito de exames e concursos públicos, não cabe ao Poder Judiciário proceder à análise de mérito do ato administrativo, devendo a sua atuação se restringir ao controle da legalidade e da observância das regras contidas no edital. No mais, o artigo 37, VIII, da CF estabelece a reserva de percentual de cargos e empregos públicos às pessoas com deficiência, cabendo à lei definir os critérios de admissão. Por sua vez, a Lei nº 8.112/90 dispõe que "às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso" (artigo 5º, § 2o ). Quanto ao percentual mínimo, o Decreto nº 9.508/2018 o fixou em 5% das vagas oferecidas para o provimento de cargos efetivos e para a contratação por tempo determinado, no âmbito da administração pública federal direta e indireta. Ademais, nos termos do artigo 1º, §5º, do referido Decreto, não havendo inscrição ou aprovação de candidatos com deficiência, as vagas reservadas a eles poderão ser ocupadas por candidatos sem deficiência. O Decreto também determina que os editais dos concursos públicos deverão indicar o número total de vagas previstas e o número de vagas correspondentes à reserva para pessoas com deficiência, por cargo, bem como a sistemática de convocação dos candidatos classificados, respeitado o percentual mínimo previsto. Ainda, nos termos de seu artigo 2º, a pessoa com deficiência participará de concurso público ou de processo seletivo de que trata a Lei nº 8.745/1993, em igualdade de condições com os demais candidatos no que diz respeito: I - ao conteúdo das provas; II - à avaliação e aos critérios de aprovação; III - ao horário e ao local de aplicação das provas; e IV - à nota mínima exigida para os demais candidatos. O resultado do concurso deverá ser publicado em lista única com a pontuação dos candidatos e a sua classificação, observada a reserva de vagas às pessoas com deficiência, e a nomeação deverá obedecer à ordem de classificação, observados os critérios de alternância e de proporcionalidade entre a classificação de ampla concorrência e da reserva para as pessoas com deficiência. No tocante à cláusula de barreira, o C. STF, no julgamento do RE 635739 / AL, consolidou o entendimento de que: "A “cláusula de barreira”, que possibilita a realização de uma etapa de concurso somente aos melhores classificados – conforme notas obtidas em provas técnicas – elege critério diferenciador de candidatos em perfeita consonância com os interesses protegidos pela Constituição Federal. Em outros termos, o denominado “afunilamento” de candidatos no decorrer das fases do concurso viabiliza a investidura em cargo público com aprovação em concurso de provas ou de provas e títulos, obedecendo aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput e inciso II, da CF). (...) Outra situação comum de previsão de “cláusula de barreira” em editais são as notas de corte da prova objetiva, que estabelecem que - entre os não eliminados – terá sua prova discursiva avaliada apenas número predeterminado de candidatos, considerando-se o custo operacional do concurso. Nesse ponto, destacamos que o expediente não constitui apenas uma medida operacional fundada em questões financeiras, mas também na limitação de recursos humanos presente na maioria dos concursos. A restrição de participantes da etapa discursiva é medida muitas vezes necessária à adequada correção das provas pela comissão avaliadora do concurso, dentro dos prazos estabelecidos pelo edital para a publicação dos resultados de cada fase. Trata-se de um imperativo determinado pela limitação de tempo e de recursos humanos e administrativos." No caso, o agravante participou do concurso público para o cargo de Especialista em Gestão - Advogado do Conselho Regional de Psicologia da 6ª Região (CRP06), regido pelo Edital nº 01/2023 e organizado pela Coordenadoria de Apoio a Instituições Públicas da Universidade Municipal de São Caetano do Sul – CAIP/USCS, obtendo 76 pontos na prova objetiva. De acordo com o edital, para o referido cargo havia 02 vagas efetivas, 16 vagas para o cadastro de reserva, bem como 01 vaga reservada às pessoas com deficiência e 03 vagas às pessoas negras e afrodescendentes. No tocante à habilitação para a segunda e terceira fase do concurso, dispõe o item 24 da seção II do edital: 24. Para o julgamento da Prova Objetiva e para fins de aprovação nesta etapa do certame, será aplicado critério de nota de corte e somente serão considerados/as habilitados/as para a segunda fase e/ou terceira fase (Prova Discursiva e/ou Avaliação de Títulos) os/as candidatos/as que obtiverem 50,00 (cinquenta) pontos, nesta prova objetiva e, concomitantemente, a NOTA MÍNIMA/CORTE para fins de habilitação do/a candidato/a que será igual à nota obtida pelo último/a candidato/a habilitado/a, considerando-se, para esse fim, o que dispõe a Tabela de Habilitação para a Segunda Fase. 24.1. Para efeito de Classificação para realização da Segunda Fase (Prova Discursiva), de acordo com o que dispõe este item, será aplicado, nesta fase, o critério de desempate. 24.2. Tendo caráter eliminatório, os/as candidatos/as que não obtiverem classificação na Prova Objetiva, nos termos deste item, serão excluídos/as do Concurso Público. (g.n.) Nessa senda, a mencionada Tabela de Habilitação estabelece em 36 o número de candidatos habilitados para a segunda fase (prova discursiva) - sem distinguir quantos serão da ampla concorrência e quantos serão das cotas para pessoas com deficiência e das cotas para pessoas negras - em 18 o número para a terceira fase (avaliação de títulos) e em 18 o número de classificados finais. Portanto, é o número preestabelecido de candidatos habilitados para a segunda fase (36) que determina a nota de corte, e não o contrário. Em outras palavras, a nota de corte só passa a existir depois de se saber quem é o último habilitado para a segunda fase. Desta feita, ao contrário do que constou na decisão agravada, a eliminação do agravante do certame não se deu por ele não ter alcançado a nota de corte, mas, sim, porque foi publicada apenas uma única lista de candidatos aprovados, colocando em concorrência conjunta os candidatos da ampla concorrência, das cotas raciais e das cotas PCD. Assim, de fato, não foi observada a reserva de vagas em todas as etapas do certame, restando evidenciada a ilegalidade do ato administrativo em questão. Diante do exposto, vislumbro os requisitos para a concessão da tutela de urgência, devendo ser corrigida a prova discursiva do candidato PCD melhor classificado na prova objetiva, para o cargo de Especialista em Gestão - Advogado.. Com tais considerações, defiro a tutela urgência." Assim sendo, em nova análise, este Relator confirma o acerto da r. decisão monocrática que apreciou o mérito do agravo de instrumento, devendo, portanto, ser mantida integralmente. Ressalte-se, por fim, que, conforme bem assinalado pelo Ministério Público Federal em seu parecer, "seria plenamente possível respeitar o comando editalício por meio da correção da prova dos 2 candidatos com deficiência, dos 6 candidatos negros ou afrodescendentes e dos 28 candidatos sob ampla concorrência mais bem classificados na primeira fase, conforme já exposto. Ao fim, restariam corrigidas as 36 provas dissertativas dos candidatos mais bem classificados, cada quais em seus respectivos grupos. A ilegalidade exsurge do resultado decorrente da opção da banca examinadora, de considerar nota de corte única". Diante do exposto, mantenho a decisão acima transcrita e, por isso, dou provimento ao agravo de instrumento. É como voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. VAGAS RESERVADAS A PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. ESTABELECIMENTO DE NOTA DE CORTE ÚNICA PARA CANDIDATOS DA AMPLA CONCORRÊNCIA E DAS COTAS. NÃO OBSERVÂNCIA DA RESERVA DE VAGAS EM TODAS AS ETAPAS. ILEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. TUTELA CONCEDIDA. RECURSO PROVIDO.
1. No âmbito de exames e concursos públicos, não cabe ao Poder Judiciário proceder à análise de mérito do ato administrativo, devendo a sua atuação se restringir ao controle da legalidade e da observância das regras contidas no edital.
2. O artigo 37, VIII, da CF estabelece a reserva de percentual de cargos e empregos públicos às pessoas com deficiência, cabendo à lei definir os critérios de admissão. Por sua vez, a Lei nº 8.112/90 dispõe que "às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso" (artigo 5º, § 2o ).
3. Quanto ao percentual mínimo, o Decreto nº 9.508/2018 o fixou em 5% das vagas oferecidas para o provimento de cargos efetivos e para a contratação por tempo determinado, no âmbito da administração pública federal direta e indireta. Ademais, nos termos do artigo 1º, §5º, do referido Decreto, não havendo inscrição ou aprovação de candidatos com deficiência, as vagas reservadas a eles poderão ser ocupadas por candidatos sem deficiência.
4. O Decreto também determina que os editais dos concursos públicos deverão indicar o número total de vagas previstas e o número de vagas correspondentes à reserva para pessoas com deficiência, por cargo, bem como a sistemática de convocação dos candidatos classificados, respeitado o percentual mínimo previsto.
5. Ainda, nos termos de seu artigo 2º, a pessoa com deficiência participará de concurso público ou de processo seletivo de que trata a Lei nº 8.745/1993, em igualdade de condições com os demais candidatos no que diz respeito: I - ao conteúdo das provas; II - à avaliação e aos critérios de aprovação; III - ao horário e ao local de aplicação das provas; e IV - à nota mínima exigida para os demais candidatos.
6. O resultado do concurso deverá ser publicado em lista única com a pontuação dos candidatos e a sua classificação, observada a reserva de vagas às pessoas com deficiência, e a nomeação deverá obedecer à ordem de classificação, observados os critérios de alternância e de proporcionalidade entre a classificação de ampla concorrência e da reserva para as pessoas com deficiência.
7. No tocante à “cláusula de barreira”, o C. STF, no julgamento do RE 635739 / AL, entendeu que esta se coaduna com os interesses protegidos pela Constituição Federal, sendo comumente prevista em editais na forma de nota de corte da prova objetiva.
8. No caso, o agravante participou do concurso público para o cargo de Especialista em Gestão - Advogado do Conselho Regional de Psicologia da 6ª Região (CRP06), regido pelo Edital nº 01/2023 e organizado pela Coordenadoria de Apoio a Instituições Públicas da Universidade Municipal de São Caetano do Sul – CAIP/USCS, obtendo 76 pontos na prova objetiva.
9. De acordo com o edital, para o referido cargo havia 02 vagas efetivas, 16 vagas para o cadastro de reserva, bem como 01 vaga reservada às pessoas com deficiência e 03 vagas às pessoas negras e afrodescendentes. Para a habilitação para a segunda e terceira fase do concurso, o candidato deveria obter 50 pontos na prova objetiva e, concomitantemente, atingir a nota de corte, que corresponderia à nota obtida pelo último candidato habilitado.
10. A Tabela de Habilitação do edital estabeleceu em 36 o número de candidatos que seriam habilitados para a segunda fase (prova discursiva) - sem distinguir quantos seriam da ampla concorrência e quantos das cotas para pessoas com deficiência e das cotas para pessoas negras -, em 18 o número para a terceira fase (avaliação de títulos) e em 18 o número de classificados finais. Portanto, é o número preestabelecido de candidatos habilitados para a segunda fase (36) que determinaria a nota de corte, e não o contrário. Em outras palavras, a nota de corte só passaria a existir depois de se saber a nota do 36º classificado no concurso.
11. Ao contrário do que constou na decisão agravada, a eliminação do agravante do certame não se deu por ele não ter alcançado a nota de corte, mas, sim, porque foi publicada apenas uma única lista de candidatos aprovados, colocando em concorrência conjunta os candidatos da ampla concorrência, das cotas raciais e das cotas PCD. Conforme bem assinalado pelo Ministério Público Federal, "seria plenamente possível respeitar o comando editalício por meio da correção da prova dos 2 candidatos com deficiência, dos 6 candidatos negros ou afrodescendentes e dos 28 candidatos sob ampla concorrência mais bem classificados na primeira fase, conforme já exposto. Ao fim, restariam corrigidas as 36 provas dissertativas dos candidatos mais bem classificados, cada quais em seus respectivos grupos. A ilegalidade exsurge do resultado decorrente da opção da banca examinadora, de considerar nota de corte única".
12. De fato, não foi observada a reserva de vagas em todas as etapas do certame, restando evidenciada a ilegalidade do ato administrativo em questão.
13. Tutela concedida, para determinar a correção da prova discursiva do candidato PCD melhor classificado na prova objetiva, para o cargo de Especialista em Gestão - Advogado.
14. Agravo de instrumento provido.