APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5026990-53.2020.4.03.6100
RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: IVAN GARCIA GOFFI REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO IVAN GARCIA GOFFI
Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO MARTELO - SP291253-A, IVAN GARCIA GOFFI - SP165173
APELADO: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SAO PAULO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5026990-53.2020.4.03.6100 RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA APELANTE: IVAN GARCIA GOFFI Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO MARTELO - SP291253-A, IVAN GARCIA GOFFI - SP165173 APELADO: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SAO PAULO OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora): Trata-se de remessa necessária e apelação em ação popular ajuizada por IVAN GARCIA GOFFI em face da UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO (UNIFESP), objetivando seja declarada inconstitucional a Portaria Reitoria n. 3492/2020, porque expedida com usurpação de competência da União, bem assim anulados quaisquer atos que tenham sido autorizados ou expedidos com fulcro na referida portaria, especialmente, a construção, reconstrução ou adulteração de dependências da Universidade, e a alteração indevida na emissão de documentos e certificados. Deduzido pedido de concessão de medida liminar para suspender os efeitos do referido normativo. O autor popular, atuando em causa própria e por seu advogado, afirma que a Portaria n. 3492/2020 expedida, pela Universidade, com o objetivo de disciplinar o uso de banheiros e vestiários, de forma a dispensar a garantia de igualdade de tratamento às pessoas com diferentes identidades de gênero, estaria maculada por "óbices insanáveis de incompetência e ilegalidade de objeto" e, ainda, estaria a determinar a "execução de atos lesivos ao interesse econômico e histórico da instituição." Defende que a Reitoria da Universidade teria usurpado o limite de competência exclusiva da União, violando os artigos 1º, 22, 207 e 226 da Constituição da República. Pede que sejam suspensos quais atos e obras "impedindo-se a construção, reconstrução ou adulteração estrutural em banheiros e vestiários, bem como alteração indevida de material didático/administrativo, com prejuízo do erário e ao sistema jurídico correlato". A UNIFESP contestou a lide aduzindo, em síntese, que: a) o autor é carecedor da ação, pois não demonstrou a ilegalidade do ato combatido ou a lesividade ao patrimônio público, por isso o feito deve ser extinto na forma do artigo 330, III, do Código de Processo Civil (CPC); b) a ação tem caráter ideológico, tendo em vista que o autor simplesmente não concorda com os motivos que conduziram à publicação da Portaria Reitoria n. 3492/2020; c) o ato normativo impugnado atende o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADI 4.277; na ADPF n. 132; no Recurso Extraordinário RE 670.422, na ADI n. 4.275, no Mandado de Injunção n. 4.733, na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) n. 26, na ADI n. 5.543 e em diversas outras ações; d) é necessário considerar a autonomia universitária preconizada pelo artigo 207 da Constituição da República, com base no qual foi estabelecido o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2016-2020 da UNIFESP; e) ademais, “a aplicação da Portaria não causará prejuízo ao erário, pois uma simples folha adesiva de baixo custo será afixada abaixo da identificação já existente nos banheiros e vestiários”; f) considera o pedido é manifestamente improcedente. Réplica do autor apresentada rebatendo os argumentos da contestação 258960150). A r. sentença indeferiu a petição inicial e julgou extinto o processo, sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 330, I, e 485, I, do Código de Processo Civil (CPC) (ID 258960152). Apelou o autor aduzindo, nas suas razões recursais, em síntese, que (ID 258960154): a) “não pode concordar com o desfecho de IMPROCEDÊNCIA do pedido, face aos equívocos da fundamentação do julgado”; b) a inicial tem por objeto demonstrar a ocorrência de usurpação de competência e dano ao erário, calcados em ilegalidade e lesividade da Portaria UNIFESP 3492/2020; c) os fundamentos demonstrados ressaltam a lesividade não apenas quanto às despesas, “mas das próprias normas, conceitos e funções jurídicas fartamente expostas na ação”; d) quanto ao mérito, “o que importa é que, sem nenhum regramento lógico no contexto nacional, (a portaria) TRANSFORMOU O CAMPUS NUM BRASIL diferente do que é o resto do país”; e) a comissão interna não teria capacidade ou legitimidade para propor as mudanças, porquanto o assunto depende da manifestação do Congresso Nacional; f) merece destaque que está em julgamento as normas sobre o assunto em âmbito nacional, e, ainda, o tema de repercussão geral a ser definido no RE 845.779, pelo C. STF; g) pede, ao final, a procedência do recurso, visando anular total ou parcialmente a malsinada Portaria Reitoria n. 3492/2020. Com contrarrazões da UNIFESP, vieram os autos a esta E. Corte Regional ID 258960157). O r. Ministério Público Federal apresentou r. parecer pela manutenção da sentença, notadamente em razão de o conceito de patrimônio público previsto na Lei n. 4.717/1965 abarcar os bens materiais públicos, enquanto o direito discutido pelo autor está relacionado aos direitos da personalidade, inviabilizando o uso da ação popular (ID 262196670). É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5026990-53.2020.4.03.6100 RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA APELANTE: IVAN GARCIA GOFFI Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO MARTELO - SP291253-A, IVAN GARCIA GOFFI - SP165173 APELADO: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SAO PAULO OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora): O presente feito foi julgado extinto sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 485 do Código de Processo Civil (CPC), razão por que é de rigor o exame da remessa necessária, na forma do artigo 19 da Lei n. 4.717, de 1965, bem assim do recurso de apelação do autor, o qual preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecido. A ação popular configura instrumento judicial previsto pelo artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição da República (CR) por meio do qual qualquer cidadão poderá buscar provimento jurisdicional “que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência”. Na esfera infraconstitucional a ação popular foi disciplinada pela Lei n. 4.717, de 29/06/1965, e representa garantia oferecida ao cidadão que colima a proteção do interesse público, tendo por fito expurgar atos ou omissões tendentes a incidir no binômio ilegalidade e lesividade, operando em prejuízo do patrimônio público, da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural. Passemos, pois, ao exame da matéria preliminar. Desde logo, pontue-se a compreensão, pacificada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal (STF), acerca da desnecessidade de imposição de condição de procedibilidade à ação popular, consistente na apresentação de provas do prejuízo ao erário com a distribuição da petição inicial. O assunto foi pacificado pela C. Suprema Corte no julgamento do RE 824.781 da repercussão geral, que cristalizou a tese do Tema 836/STF: Não é condição para o cabimento da ação popular a demonstração de prejuízo material aos cofres públicos, dado que o art. 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal estabelece que qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular e impugnar, ainda que separadamente, ato lesivo ao patrimônio material, moral, cultural ou histórico do Estado ou de entidade de que ele participe. (ARE 824781, Relator Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, j. 27/08/2015, Repercussão Geral – Mérito, publ. 09/10/2015, Tese aprovada em 09/12/2015) Entretanto, o precedente obrigatório contido no referido Tema 836/STF não se aplica ao caso concreto, razão por que é de rigor proceder-se à distinção. Com efeito, não se trata de exigência de prova do prejuízo material aos cofres públicos, desde logo, com a petição inicial, simplesmente porque o autor está a questionar a suposta inadequação do ato normativo da Universidade. Prossigo. No caso concreto, a pretensão autoral diz respeito primordialmente à nulidade de ato normativo, o qual reputa lesivo, tendo em vista a suposta inadequação da norma consistente na Portaria Reitoria n. 3492/2020, emanada da UNIFESP. O interesse de agir para a propositura da lide popular é conferido ao cidadão para defesa de bens e direitos da esfera pública, quando maculados “bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico”, na forma do artigo 2º da Lei n. 4.717/1965. Na inicial, ressente-se o autor da política inaugurada pela UNIFESP por meio da Portaria n. 3492/2020, que considera um acinte, na medida em que determina o fim dos banheiros separados para homens e mulheres. Afirma que não se trata de questão ideológica, ponderando que as graves e insanáveis violações cometidas escancaram violação aos princípios constitucionais, e devem ser interrompidas por meio da decretação da nulidade do ato objurgado. Defende que o papel da universidade está restrito ao campo didático e científico, assim, ressalta que “não se pode vilipendiar o conteúdo científico, função primordial da universidade, em favor de modismos socialistas, de igualdade de gênero ou outra estultice impertinente e irrelevante à função acadêmica”. Sobressai evidente, portanto, que o autor se vale da ação popular como via transversa para questionar a política da Universidade, ao arrepio dos estreitos limites estabelecidos pelo artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição da República, pois o tratamento a respeito do uso de banheiros e vestiários dispensado àqueles que se autoidentifiquem com o seu respectivo gênero, não configura violação do patrimônio público. Ademais, o autor popular não referiu à lesão ao patrimônio da Universidade por malbaratamento da coisa pública. Insiste, apenas, na obtenção de provimento judicial que assegure o cancelamento da Portaria Reitoria n. 3492/2020, expedida pela UNIFESP, por discordar dos pressupostos que conduziram à sua expedição. Trata-se, portanto, de tentativa equivocada do uso da ação popular, cujo caráter desconstitutivo não abarca os direitos da personalidade, mormente quanto à orientação acerca de gênero e quando se cuida de providências administrativas tendentes a assegurar a efetividade do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e a garantir a igualdade de tratamento. O autor referiu a necessidade de se aguardar a manifestação da C. Suprema Corte sobre o assunto, tendo em vista o RE 845.779, no qual havia sido reconhecida a repercussão geral para fins de definição da tese do Tema 778/STF, acerca da “possibilidade de uma pessoa, considerados os direitos da personalidade e a dignidade da pessoa humana, ser tratada socialmente como se pertencesse a sexo diverso do qual se identifica e se apresenta publicamente” (RE 845779, Rel. Min. LUÍS ROBERTO BARROSO, publ. 10/03/2015) Todavia, o C. STF procedeu ao julgamento em 06/06/2024 do RE 845.779 por meio do qual “O Tribunal, por maioria, negou seguimento ao recurso extraordinário, cancelando o reconhecimento da repercussão geral da matéria atinente ao Tema 778, nos termos do voto do Ministro Luiz Fux, Redator para o acórdão”. (RE 845779, Ata de Julgamento publ. 17/06/2024). Emana, assim, a carência da ação popular tanto da ilegitimidade ativa do autor e quanto da inadequação da via eleita. Não há dúvida de que a ação popular pode ser promovida por qualquer cidadão, na medida em que configura instrumento de participação ativa na coletividade. Todavia, como remédio constitucional, não tem o alcance pretendido na presente demanda. Evidente, portanto, a ausência de interesse de agir do autor, que é carecedor da ação constitucional popular para o fim que almeja. Esse é o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça, in verbis: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR. IRREGULARIDADES FORMAIS AVERIGUADAS NO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO, QUE NÃO ENSEJARAM, CONTUDO, DANO AO ERÁRIO, CONFORME RECONHECIDO EM PERÍCIA JUDICIAL E PELO TCE DE MINAS GERAIS. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DOS RECORRENTES NO RESSARCIMENTO DOS COFRES PÚBLICOS, COM ESTEIO EM LESÃO PRESUMIDA À MUNICIPALIDADE, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DO ENTE ESTATAL. (...) 4. A Ação Popular consiste em um relevante instrumento processual de participação política do cidadão, destinado eminentemente à defesa do patrimônio público, bem como da moralidade administrativa, do meio-ambiente e do patrimônio histórico e cultural; referido instrumento possui pedido imediato de natureza desconstitutiva-condenatória, pois colima, precipuamente, a insubsistência do ato ilegal e lesivo a qualquer um dos bens ou valores enumerados no inciso LXXIII do art. 5o. da CF/88 e, consequentemente, a condenação dos responsáveis e dos beneficiários diretos ao ressarcimento ou às perdas e danos correspondentes. 5. Tem-se, dessa forma, como imprescindível a comprovação do binômio ilegalidade-lesividade, como pressuposto elementar para a procedência da Ação Popular e consequente condenação dos requeridos no ressarcimento ao erário em face dos prejuízos comprovadamente atestados ou nas perdas e danos correspondentes. 6. Eventual violação à boa-fé e aos valores éticos esperados nas práticas administrativas não configura, por si só, elemento suficiente para ensejar a presunção de lesão ao patrimônio público, conforme sustenta o Tribunal a quo; e assim é porque a responsabilidade dos agentes em face de conduta praticada em detrimento do patrimônio público exige a comprovação e a quantificação do dano, nos termos do art. 14 da Lei 4.717/65; assevera-se, nestes termos, que entendimento contrário implicaria evidente enriquecimento sem causa do Município, que usufruiu dos serviços de publicidade prestados pela empresa de propaganda durante o período de vigência do contrato. (...) (REsp 1447237/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 09/03/2015) PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR. DECRETO MUNICIPAL. TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. DIREITOS PATRIMONIAIS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. VIOLAÇÃO DO ART. 480 DO CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N.º 282 E 356 DO STF. INDICAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. COMPETÊNCIA DO PRETÓRIO EXCELSO. 1. A ação popular não é servil à defesa de interesses particulares, tampouco de interesses patrimoniais individuais, ainda que homogêneos. 2. É que o art. 1.º da Lei n.º 4.717/65 dispõe que: (...) 3. O objeto mediato da ação popular é sempre o patrimônio das entidades públicas, o que não se confunde com o patrimônio público em geral, no qual estão encartados os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos de caráter tributário. 4. Deveras, mesmo em se tratando de interesses transindividuais, a própria Lei n.º 7.347/85 interdita o uso da Ação Civil Pública para veicular pretensões individuais homogêneas de caráter tributário. 5. In casu, o pleito é de anulação do Decreto Municipal n.º 062/2003, que regulamentou a cobrança de Contribuição de Iluminação Pública, instituída pela Lei Municipal n.º 2.379/02, bem como a restituição dos valores indevidamente recolhidos pelo Município a este título, o que evidencia a inadequação da via eleita pelos autores populares. (...) 8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido, para extinguir o processo sem resolução de mérito. (REsp n. 776.857/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 16/12/2008, DJe de 18/2/2009.) PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR. CONCESSÃO DE SERVIÇO. SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES DE EMPRESA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO DE GESTÃO DE ÁREAS DESTINADAS A ESTACIONAMENTO ROTATIVO. INOBSERVÂNCIA DE DIREITO CONSUMERISTA. INÉPCIA DA INICIAL. ILEGITIMIDADE ATIVA. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. SÚMULA 211/STJ. 1. A Ação Popular não é servil à defesa dos consumidores, porquanto instrumento flagrantemente inadequado mercê de evidente ilegitimatio ad causam (art. 1º, da Lei 4717/65 c/c art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal) do autor popular, o qual não pode atuar em prol da coletividade nessas hipóteses. 2. A ilegitimidade do autor popular, in casu, coadjuvada pela inadequação da via eleita ab origine, porquanto a ação popular é instrumento de defesa dos interesses da coletividade, utilizável por qualquer de seus membros, revela-se inequívoca, por isso que não é servil ao amparo de direitos individuais próprios, como sóem ser os direitos dos consumidores, que, consoante cediço, dispõem de meio processual adequado à sua defesa, mediante a propositura de ação civil pública, com supedâneo nos arts. 81 e 82 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). 3. A concessão de serviço de gestão das áreas destinadas ao estacionamento rotativo, denominado "zona azul eletrônica", mediante a realização da concorrência pública nº 001/2001 (processo nº 463/2001), obedecida a reserva legal, não resta eivada de vícios acaso a empresa vencedora do certame, ad argumentandum tantum, por ocasião da prestação dos serviços, não proceda à comprovação do estacionamento do veículo e da concessão de horário suplementar, não empreenda à identificação dos dados atinentes ao seu nome, endereço e CNPJ, nos cupons de estacionamento ensejando a supressão de receita de serviços e, consectariamente, redução do valor pago mensalmente a título de ISSQN e utilize paquímetros sem aferição pelo INMETRO, porquanto questões insindicáveis pelo E. S.T.J à luz do verbete sumular nº 07 e ocorrentes ex post facto (certame licitatório). 4. A carência de ação implica extinção do processo sem resolução do mérito e, a fortiori: o provimento não resta coberto pelo manto da res judicata (art. 468, do CPC). 5. In casu, o autor na ação popular não ostenta legitimidade tampouco formula pedido juridicamente possível em ação desta natureza para a vindicar a suspensão das atividades da empresa concessionária de serviço de gestão das áreas destinadas ao estacionamento rotativo, denominado "zona azul eletrônica", e a fortiori da cobrança do preço pelo serviço de estacionamento, bem como o lacramento das máquinas pelo tempo necessário à tomada de providências atinentes à adequação da empresa à legislação municipal e federal, especialmente no que pertine ao fornecimento de cupom contendo a identificação das máquinas, numeração do equipamento emissor e número de controle para o cupom fiscal e denominação da empresa, endereço, CNPJ, além da comprovação acerca da aferição dos taquímetros pelo INMETRO. 6. A simples indicação do dispositivo tido por violado (arts. 81 e 82 do Código de Defesa do Consumidor), sem referência com o disposto no acórdão confrontado, obsta o conhecimento do recurso especial. Incidência da Súmula 211/STJ: "Inadimissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo." 7. Recurso especial provido (REsp n. 818.725/SP, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 13/5/2008, DJe de 16/6/2008.) PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR. FGTS. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. AÇÃO PESSOAL. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. CARÊNCIA DE AÇÃO. ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CUSTOS LEGIS. 1. Ação popular proposta sob o argumento de que os requeridos perpetraram diversas irregularidades nas contas consideradas inativas de FGTS de servidores públicos, acarretando os desvios. 2. A Ação popular não é servil à defesa do patrimônio dos particulares in casu, os fundistas para os quais os advogados não repassaram as verbas levantadas no FGTS. 3. É inadmissível o recurso especial, in casu, por ausência de prequestionamento dos artigos 284 e 296 do CPC e 1º e 6º da Lei 4.717/65, sequer ventilados no acórdão recorrido (Súmula 282 do STF). 4. A ação popular que se funda em prejuízo de particulares e potencial exercício do direito de regresso revela a ilegitimidade passiva e falta de interesse de agir, tanto mais que o fato objeto da causa é fruto de ação pessoal, cujo desate implica na reparação do dano ex delicto uti singuli. 5. Ausência de prejuízo ao erário porquanto o mesmo endereçou-se aos particulares, o que denota carência de ação. 6. A ação popular "é instrumento de defesa dos interesses da coletividade, utilizável por qualquer de seus membros, por isso que, através da mesma não se amparam direitos individuais próprios, mas antes interesses da comunidade. O beneficiário direito e imediato desta ação não é o autor; é o povo, titular do direito subjetivo ao governo honesto. O cidadão a promove em nome da coletividade, no uso de uma prerrogativa cívica que a Constituição da República lhe outorga." (Hely Lopes Meirelles, in Mandado de Segurança, 27ª Edição, Malheiros, página 126) 7. O artigo 296 do CPC inaugurou um poder do qual o juiz pode ou não valer-se para reformar a decisão terminativa, o que não implica error in procedendo remeter a apelação ao Tribunal, providência que significa, tacitamente, a recusa da reforma do ato decisório. 8. Deveras, a ilegitimidade flagrante não é defeito sanável à luz do artigo 284 do CPC, máxime por que o juiz, por força do princípio dispositivo, não pode indicar ao dominus litis o demandado correto. 9.In casu, há possibilidade de o Ministério Público intervir, porquanto, à ação popular aplica-se a regra do artigo 499 do CPC. 10. Recurso parcialmente conhecido, e nesta parte, desprovido. (REsp n. 801.080/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 16/10/2007, DJ de 29/10/2007, p. 183.) Por fim, como bem destacado pelo r. Ministério Público Federal, não foram apresentados indícios de condutas lesivas à moralidade administrativa, ao patrimônio público, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico cultural, a ensejar o manejo da ação popular. Dessa forma, avulta a carência da ação popular, na medida em que a sua propositura fundada em direitos da personalidade desvirtua o instrumento constitucional, configurando evidente falta de interesse de agir e ilegitimidade ativa do autor popular. No mesmo sentido, o entendimento desta E. Quarta Turma: AÇÃO POPULAR. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AGRAVO NÃO PROVIDO. - (...) ajuizou ação popular em face da UNIÃO FEDERAL e ANVISA - AGENCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, objetivando, liminarmente, seja determinada a inserção, nos rótulos de todas as embalagens de bebidas que contenham álcool, da expressão: “O álcool é droga e pode causar dependência”, “obedecendo-se aos mesmos padrões de divulgação utilizados para a advertência já obrigatória (§ 2º do artigo 4º da Lei 9.294/96), de forma rotativa para o caso dos produtos em que já é feita, por ordem legal, alguma inserção de advertência e ininterrupta para o caso daqueles em que não é exigida qualquer advertência (parágrafo único do artigo 1º da Lei 9.294/96), – devendo tais medidas entrarem em vigor em prazo não inferior a 5 (cinco) meses (lapso temporal previsto pela RDC/ANVISA 195/17 para implementação das mudanças relacionadas a produtos derivados do tabaco, donde a razoabilidade do prazo aqui requerido)”. - A ação popular é o meio processual a que tem direito qualquer cidadão que deseje questionar judicialmente a validade de atos que considera lesivos ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. O art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal e o art. 1º, caput, da Lei nº 4.717/65, descrevem as hipóteses que podem ensejar a propositura desta ação. - Após análise do conjunto probatório, entendo que não estão presentes as hipóteses previstas na Constituição ou na Lei nº 4.717/65. - Busca o autor popular através deste meio processual o amparo do direito à saúde, revelando-se inequívoca sua ilegitimidade ativa ad causam, mercê a inadequação da via eleita ab origine, pois não pode atuar em prol da coletividade nesta hipótese. - Não se admite, como pretende o agravante, possa se estender o conceito de patrimônio público para abarcar também o direito à saúde. O termo patrimônio público abrange tão somente os bens da Administração Direta, da Administração Indireta e dos entes privados e subvencionados, não abarcando o direito à saúde, que dispõe de instrumento processual coletivo próprio à sua defesa, mediante a propositura de ação civil pública. - Agravo não provido. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5007536-88.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, j. 12/03/2020, Intimação 17/03/2020) Nessa senda, não merece reparos a r. sentença. Mantida a isenção de custas e honorários advocatícios, na forma do artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição da República, por ausência de prova de má-fé. Dispositivo Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária e à apelação. É o voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR. NULIDADE DE ATO NORMATIVO. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO. VIOLAÇÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO NÃO CONFIGURADA. DIREITOS DA PERSONALIDADE. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. ILEGITIMIDADE ATIVA.
1 – Cabível o exame da remessa necessária na forma do artigo 19 da Lei n. 4.717/1965.
2 - A ação popular configura instrumento judicial previsto pelo artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição da República. Na esfera infraconstitucional, foi disciplinada pela Lei n. 4.717/1965 e representa garantia oferecida ao cidadão que colima a proteção do interesse público, tendo por fito expurgar atos ou omissões tendentes a incidir no binômio ilegalidade e lesividade, operando em prejuízo do patrimônio público, da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural.
3 – Afastada a aplicação do precedente obrigatório contido no Tema 836/STF, que assentou a desnecessidade da apresentação de prova do prejuízo ao erário como condição de procedibilidade à ação popular.
4 - O interesse de agir para a propositura da lide popular é conferido ao cidadão para defesa de bens e direitos da esfera pública, na forma do artigo 2º da Lei n. 4.717/1965.
5 - A pretensão autoral diz respeito ao cancelamento da Portaria Reitoria n. 3492/2020, expedida pela UNIFESP.
6 - Evidencia-se que o autor se vale da ação popular como via transversa para questionar a política da Universidade, ao arrepio dos estreitos limites estabelecidos pelo artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição da República, pois o tratamento a respeito do uso de banheiros e vestiários dispensado àqueles que se autoidentifiquem com o seu respectivo gênero, não configura violação do patrimônio público.
7 - Trata-se de tentativa equivocada do uso da ação popular, cujo caráter desconstitutivo não abarca os direitos da personalidade, mormente quanto à orientação acerca de gênero e quando se cuida de providências administrativas tendentes a assegurar a efetividade do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e a garantir a igualdade de tratamento.
8 - Desnecessidade de se aguardar a manifestação do C. Supremo Tribunal Federal no Tema 778/STF, cujo reconhecimento da repercussão geral foi cancelado, conforme julgamento realizado em 06/06/2024.
9 - Carência da ação popular, pois a sua propositura fundada em direitos da personalidade desvirtua o instrumento constitucional, configurando evidente falta de interesse de agir e ilegitimidade ativa do autor.
10 - Mantida a isenção de custas e honorários advocatícios, na forma do artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição da República, por ausência de prova de má-fé.
11 - Recurso de apelação e remessa necessária desprovidos.