Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5066916-13.2022.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: JULIA DOS SANTOS SILVA

Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO BASSOLI GANARANI - SP213210-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5066916-13.2022.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: JULIA DOS SANTOS SILVA

Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO BASSOLI GANARANI - SP213210-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­R E L A T Ó R I O

 

 

A parte autora intentou a presente ação objetivando a revisão do seu benefício de pensão por morte, alegando a inconstitucionalidade do artigo 23 da Emenda Constitucional 103/2019, que reduziu de forma desproporcional os valores das pensões por morte. Invoca as determinações normativas da segurança jurídica e do direito adquirido, sustentando que as regras vigentes não retroagem, considerando que o instituidor, quando de sua aposentadoria, atendeu todos os requisitos exigidos por lei à época vigentes, garantindo seu direito e o pós-morte aos seus familiares, pleiteando sejam aplicados ao benefício pensão por morte a lei anteriormente em vigor.

A sentença julgou improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento da verba honorária, fixada em  10% do valor atribuído à causa, com observância do artigo 98, §§ 2º e 3º do CPC.

A autora apela, requerendo, em síntese, seja declarada a inconstitucionalidade da forma de cálculo estabelecida pelo art. 23 da E/C 103/2019, por ter reduzido de forma desproporcional os valores das pensões por morte, condenando-se o INSS a recalcular o benefício conforme regras anteriores à mencionada emenda, de modo que a pensão seja paga pelo valor da aposentadoria do segurado falecido.

Sem contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

 

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5066916-13.2022.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: JULIA DOS SANTOS SILVA

Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO BASSOLI GANARANI - SP213210-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­V O T O

 

 

Tempestivos os recursos e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

PENSÃO POR MORTE

O benefício de pensão por morte encontra-se disciplinado pelos arts. 74 a 79 da Lei n.º 8.213/91, cujo texto original foi objeto de alterações, vigorando atualmente a redação dada pela Lei n.º 13.846, de 18/6/2019.

Aplicável, quanto à concessão desse benefício, a lei vigente à época do óbito do segurado, consoante o teor do verbete n.º 340, da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Para se obter a implementação da aludida pensão, é necessário o preenchimento de dois requisitos: o falecido deve deter a qualidade de segurado e é imprescindível subsistir relação de dependência econômica entre ele e os requerentes do benefício.

Dispensa-se a demonstração do período de carência, nos termos do art. 26, inciso I, da Lei n.° 8.213/91, conquanto sua duração possa variar conforme a quantidade de contribuições recolhidas pelo instituidor, consoante o disposto no art. 77 do mesmo diploma legal.

Com relação à dependência econômica, o art. 16 da Lei n.º 8.213/91 estabelece o rol dos beneficiários, dividindo-os em três classes e indicando tanto as hipóteses em que a dependência econômica é presumida quanto aquelas em que ela deverá ser comprovada.

Cumpre observar, ainda, que é vedada a concessão da pensão aos dependentes do segurado que perder essa qualidade, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, salvo se antes preenchidos os requisitos para a obtenção da aposentadoria, conforme previsto no art. 102, §§ 1.º e 2.º.,

DO CASO DOS AUTOS

A autora pleiteou a revisão da pensão por morte decorrente do falecimento de seu marido, Neuton da Silva, ocorrido em 8/7/2021.

Denota-se, no que pertine a forma de cálculo do benefício, que os arts. 23 e 24, da Emenda Constitucional n.º 103/2019, de 12 de novembro de 2019, em vigor por ocasião do  falecimento do segurado, assim prescrevem:

“Art. 23. A pensão por morte concedida a dependente de segurado do Regime Geral de Previdência Social ou de servidor público federal será equivalente a uma cota familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da aposentadoria recebida pelo segurado ou servidor ou daquela a que teria direito se fosse aposentado por incapacidade permanente na data do óbito, acrescida de cotas de 10 (dez) pontos percentuais por dependente, até o máximo de 100% (cem por cento).

§ 1.º As cotas por dependente cessarão com a perda dessa qualidade e não serão reversíveis aos demais dependentes, preservado o valor de 100% (cem por cento) da pensão por morte quando o número de dependentes remanescente for igual ou superior a 5 (cinco).

§ 2.º Na hipótese de existir dependente inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave, o valor da pensão por morte de que trata o caput será equivalente a:

I - 100% (cem por cento) da aposentadoria recebida pelo segurado ou servidor ou daquela a que teria direito se fosse aposentado por incapacidade permanente na data do óbito, até o limite máximo de benefícios do Regime Geral de Previdência Social; e

II - uma cota familiar de 50% (cinquenta por cento) acrescida de cotas de 10 (dez) pontos percentuais por dependente, até o máximo de 100% (cem por cento), para o valor que supere o limite máximo de benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

§ 3.º Quando não houver mais dependente inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave, o valor da pensão será recalculado na forma do disposto no caput e no § 1.º.

§ 4.º O tempo de duração da pensão por morte e das cotas individuais por dependente até a perda dessa qualidade, o rol de dependentes e sua qualificação e as condições necessárias para enquadramento serão aqueles estabelecidos na Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.

§ 5.º Para o dependente inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave, sua condição pode ser reconhecida previamente ao óbito do segurado, por meio de avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, observada revisão periódica na forma da legislação.

§ 6.º Equiparam-se a filho, para fins de recebimento da pensão por morte, exclusivamente o enteado e o menor tutelado, desde que comprovada a dependência econômica.

§ 7.º As regras sobre pensão previstas neste artigo e na legislação vigente na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderão ser alteradas na forma da lei para o Regime Geral de Previdência Social e para o regime próprio de previdência social da União.

§ 8.º Aplicam-se às pensões concedidas aos dependentes de servidores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios as normas constitucionais e infraconstitucionais anteriores à data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, enquanto não promovidas alterações na legislação interna relacionada ao respectivo regime próprio de previdência social.

Art. 24. É vedada a acumulação de mais de uma pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro, no âmbito do mesmo regime de previdência social, ressalvadas as pensões do mesmo instituidor decorrentes do exercício de cargos acumuláveis na forma do art. 37 da Constituição Federal.

§ 1.º Será admitida, nos termos do § 2.º, a acumulação de:

I - pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro de um regime de previdência social com pensão por morte concedida por outro regime de previdência social ou com pensões decorrentes das atividades militares de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal;

II - pensão por morte deixada por cônjuge ou companheiro de um regime de previdência social com aposentadoria concedida no âmbito do Regime Geral de Previdência Social ou de regime próprio de previdência social ou com proventos de inatividade decorrentes das atividades militares de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal; ou

III - pensões decorrentes das atividades militares de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal com aposentadoria concedida no âmbito do Regime Geral de Previdência Social ou de regime próprio de previdência social.

§ 2.º Nas hipóteses das acumulações previstas no § 1.º, é assegurada a percepção do valor integral do benefício mais vantajoso e de uma parte de cada um dos demais benefícios, apurada cumulativamente de acordo com as seguintes faixas:

I - 60% (sessenta por cento) do valor que exceder 1 (um) salário-mínimo, até o limite de 2 (dois) salários-mínimos;

II - 40% (quarenta por cento) do valor que exceder 2 (dois) salários-mínimos, até o limite de 3 (três) salários-mínimos;

III - 20% (vinte por cento) do valor que exceder 3 (três) salários-mínimos, até o limite de 4 (quatro) salários-mínimos; e

IV - 10% (dez por cento) do valor que exceder 4 (quatro) salários-mínimos.

§ 3.º A aplicação do disposto no § 2.º poderá ser revista a qualquer tempo, a pedido do interessado, em razão de alteração de algum dos benefícios.

§ 4º As restrições previstas neste artigo não serão aplicadas se o direito aos benefícios houver sido adquirido antes da data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional.

§ 5.º As regras sobre acumulação previstas neste artigo e na legislação vigente na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderão ser alteradas na forma do § 6.º do art. 40 e do § 15 do art. 201 da Constituição Federal.”

Ressalte-se que o valor da pensão por morte não poderá ser inferior a um salário mínimo, conforme estabelecido no artigo 201, § 2.º, da Constituição Federal, in verbis:

“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a:          (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)

(...)

§ 2.º Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo.         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

 

Quadra observar, outrossim, a Instrução Normativa PRES/INSS n.º 128, de 28/3/2022, que disciplina as regras, procedimentos e rotinas necessárias à efetiva aplicação das normas de direito previdenciário, que na Subseção III, “Da Renda Mensal Inicial da Pensão por Morte e do Auxilio-Reclusão”, em seu art. 235, § 7.º, assim dispôs:

“Art. 235. A renda mensal inicial da pensão por morte será constituída pela soma da cota familiar e da (s) cota(s) individual(is), observado o §§ 3.º e 4.º, e será rateada em partes iguais aos dependentes habilitados.

(...)

§ 7.º A renda mensal inicial da pensão por morte não poderá ser inferior ao valor de 1 (um) salário mínimo”

 

Anote-se que a legislação anterior previa o valor da renda mensal da pensão por morte em 100% do valor da aposentadoria do segurado instituidor ou daquela que teria direito em caso de aposentadoria por invalidez (artigo 75 da Lei n. 8.213/1991), de forma que é inegável que a nova legislação em vigor, por força da alteração instituída pela EC 103/2019, ensejou significativa redução na pensão a ser recebida pelos dependentes do segurado, a partir de 13/11/2019.

Todavia, o STF, por maioria de votos, quando do julgamento da ADI n. 7051/DF, em 26/6/2023, transitada em julgado em 26/10/2023, entendeu pela constitucionalidade do referido artigo, fixando a seguinte tese: "É constitucional o art. 23, caput, da Emenda Constitucional nº 103/2019, que fixa novos critérios de cálculo para a pensão por morte no Regime Geral e nos Regimes Próprios de Previdência Social".

Confira-se a ementa do julgado:

“DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REFORMA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019. CRITÉRIOS DE CÁLCULO DA PENSÃO POR MORTE NO RGPS.

 1. Ação direta contra o art. 23, caput, da Emenda Constitucional nº 103/2019, que fixou novos critérios para o cálculo da pensão por morte no regime geral (RGPS) e nos regimes próprios de previdência social (RPPS). A requerente se volta, especificamente, contra a norma referente ao RGPS.

2. A população brasileira está vivendo mais. De acordo com projeções da Organização das Nações Unidas, em 2100, o Brasil será o 10º maior país do mundo em proporção de idosos. Em paralelo, a população em idade ativa vem diminuindo, em razão da queda na taxa de fecundidade. Com isso, há menos jovens para financiar os benefícios dos mais idosos.

3. O déficit previdenciário é incontestável e teve piora significativa nos últimos anos. O pagamento de aposentadorias e pensões consome fatia relevante do PIB e do orçamento estatal, deixando poucos recursos para setores como saúde e educação. Reformas na Previdência Social que reduzam o endividamento público podem ter impactos macroeconômicos positivos, como o estímulo ao consumo e à produção.

4. Dever de autocontenção judicial. As questões abrangidas pela reforma previdenciária são divisivas, de difícil obtenção de consenso. A cautela e deferência próprias da jurisdição constitucional acentuam-se aqui pelo fato de se tratar de uma emenda à Constituição, cuja aprovação tem o batismo da maioria de três quintos de cada Casa do Congresso Nacional. Além disso, a intervenção do Poder Judiciário deve ter em conta os limites impostos por sua capacidade institucional e pelos efeitos sistêmicos que as decisões judiciais podem produzir nessa matéria.

5. Novos critérios de cálculo da pensão por morte (art. 23 da EC nº 103/2019), que asseguram uma cota familiar de 50%, mais uma cota por dependente de 10% dos proventos do segurado falecido. O patamar está próximo à realidade de outros países e é compatível com os valores de pensão alimentícia comumente fixados pelo Poder Judiciário. Ademais, leva em conta as condições de elegibilidade para os benefícios previdenciários estabelecidas pela legislação brasileira, tais como a idade dos beneficiários e o tempo de convívio marital ou de união estável. Qualquer interferência judicial no montante da prestação deveria considerar todos esses aspectos, o que se mostra praticamente inviável. Os limites oriundos da capacidade institucional do Judiciário e o risco de efeitos sistêmicos recomendam, também aqui, a autocontenção.

6. Improcedência do pedido, com a fixação da seguinte tese de julgamento: “É constitucional o art. 23, caput, da Emenda Constitucional nº 103/2019, que fixa novos critérios de cálculo para a pensão por morte no Regime Geral e nos Regimes Próprios de Previdência Social”.

 

Via de consequência, no presente caso, tendo o óbito ocorrido em 8/7/2021 (Id. 262742605 - Pág. 3), devem ser aplicadas as regras dos arts. 23 e 24 da EC n.º 103/2019, respeitado o estabelecido no artigo 201, § 2.º, da Constituição Federal e no art. 235, § 7.º da Instrução Normativa PRES/INSS n.º 128, de 28/3/2022, em respeito ao princípio do tempus regit actum.

Dessa forma, a irresignação da autora não merece prosperar.

Desprovido seu recurso, os honorários fixados na sentença devem, in casu, ser majorados em 2%, observada a suspensão prevista no artigo 98, parágrafo 3º, da mesma lei.

Por essas razões, nego provimento ao apelo.

É o voto.

 

 

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REVISÃO. PENSÃO POR MORTE. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 103/2019. CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 23. ADI N. 7051/DF.

- Pedido de declaração de inconstitucionalidade da forma de cálculo estabelecida pelo art. 23 da E/C 103/2019, por ter reduzido de forma desproporcional os valores das pensões por morte, condenando-se o INSS a recalcular o benefício conforme regras anteriores à emenda de modo que a pensão seja paga pelo valor da aposentadoria do segurado falecido.

- O STF, por maioria de votos, quando do julgamento da ADI n. 7051/DF, em 26/6/2023, transitada em julgado em 26/10/2023, entendeu pela constitucionalidade do referido artigo, fixando a seguinte tese: "É constitucional o art. 23, caput, da Emenda Constitucional nº 103/2019, que fixa novos critérios de cálculo para a pensão por morte no Regime Geral e nos Regimes Próprios de Previdência Social".

- Tendo o óbito do instituidor ocorrido na vigência da EC n. 103/2019, devem ser aplicadas as regras dos arts. 23 e 24 previstas pelo novo regramento, em respeito ao princípio do tempus regit actum.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, negou provimento ao apelo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
THEREZINHA CAZERTA
DESEMBARGADORA FEDERAL