Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0016062-17.2009.4.03.6100

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: BASF SA

Advogados do(a) APELANTE: DANIELLA ZAGARI GONCALVES - SP116343-A, MARCELO PAULO FORTES DE CERQUEIRA - SP144994-A, MARCO ANTÔNIO GOMES BEHRNDT - SP173362-A, PRISCILA MARIA MONTEIRO COELHO BORGES - SP257099-A, RODRIGO CESAR DE OLIVEIRA MARINHO - SP233248-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0016062-17.2009.4.03.6100

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: BASF SA

Advogados do(a) APELANTE: DANIELLA ZAGARI GONCALVES - SP116343-A, MARCO ANTÔNIO GOMES BEHRNDT - SP173362-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de recurso de apelação interposto por BASF S.A, em face de sentença que, julgou improcedente o pedido e denegou a segurança, nos termos do art. 269, inciso I do CPC, para declarar a legalidade e legitimidade de multa aplicada com fulcro na Lei nº 8.218/1991, em decorrência de não cumprimento de obrigação acessória.

Alega a apelante, em síntese, desproporcionalidade e irrazoabilidade do da multa aplicada, que atingiu à época da autuação valor superior a 28 milhões de reais; violação ao princípio da isonomia, caráter confiscatório da multa e ocorrência de denúncia espontânea. Requer a reforma da sentença.

Com contrarrazões.

O representante do Ministério Público Federal deixou de opinar quanto ao mérito, restituindo os autos para regular processamento.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0016062-17.2009.4.03.6100

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: BASF SA

Advogados do(a) APELANTE: DANIELLA ZAGARI GONCALVES - SP116343-A, MARCO ANTÔNIO GOMES BEHRNDT - SP173362-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Inicialmente, convém salientar que, considerando tratar-se de sentença e recursos de apelação veiculados sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, aplicam-se a este feito as disposições do referido diploma processual, à época vigente.

A controvérsia recursal cinge-se à verificação de legitimidade de multa imposta ao contribuinte com fulcro nos arts. 11 e 12, da Lei nº 8.218/1991, com redação dada pelo art. 72 da Medida Provisória nº 2.158-34/2001, por descumprimento de obrigação acessória.

Pois bem.

De acordo com o Termo de Verificação e Constatação Fiscal (ID nº 149099058, p. 43-49), a multa foi aplicada no valor de R$ 28.786.266,96 em razão da apresentação extemporânea (51 dias de atraso) de arquivos magnéticos para a verificação da legitimidade dos saldos negativos de IRPJ e CSLL dos anos-calendário 2000 a 2002.

Não obstante o valor da multa tenha como fundamento os artigos 11 e 12, inciso III da Lei nº 8.218/1991, essa revela-se desproporcional e irrazoável, especialmente, diante do conteúdo do Parecer Normativo nº 03/2013, que assim dispôs:

O presente Parecer Normativo cuida em analisar as consequências da nova redação do art. 57 da Medida Provisória (MP) nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, dada pela Lei nº 12.766, de 27 de dezembro de 2012, em relação a atos inerentes da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), principalmente concernentes à fiscalização e ao controle do crédito tributário.

[...]

4.4. Na literalidade do disposto na Lei nº 12.766, de 2012, a multa é para aqueles sujeitos, quaisquer que sejam, que não apresentem ou o façam incorreta ou intempestivamente declaração, demonstrativo ou escrituração digital. Eles não apresentam, mas possuem a escrituração eletrônica. Já a Lei nº 8.218, de 1991, é para aquelas pessoas jurídicas que nem mantêm os arquivos digitais e sistemas à disposição da fiscalização de maneira contínua. Objetivamente a infração ocorre (seu “fato gerador”) com a não apresentação, apresentação incorreta ou intempestiva, mas os elementos materiais são distintos.

4.5. Caso a Fiscalização comprove que a pessoa jurídica não apresentou o demonstrativo ou escrituração digital por não ter escriturado e, concomitantemente, não mantém os arquivos à disposição de maneira contínua à RFB, tal conduta se amolda no aspecto material dos arts. 11 e 12 da Lei nº 8.218, de 1991. Ressalte-se que a falta de existência de comprovação da falta de escrituração digital de maneira contínua quando seja obrigatória (caso da Escrituração Contábil Digital (ECD), por exemplo) deve ser demonstrada e comprovada.

4.6. Na situação do item 4.5, é importante que a aplicação da multa prevista nos arts. 11 e 12 da Lei nº 8.218, de 1991, se coadune com a distinção dos aspectos materiais dela em relação ao novo art. 57 da MP nº 2158-35, de 2001. A simples não apresentação de documentos sem a comprovação de que faltou a escrituração não pode gerar a multa mais gravosa, mas sim a geral de que trata o novo art. 57 da MP nº 2158-35, de 2001. Havendo dúvidas quanto a esse fato ou não se conseguindo comprová-lo, aplica-se a multa mais benéfica da Lei nº 12.766, de 2012, em decorrência do que determina o art. 112, inciso II, da Lei nº 5.172, de 1966 - Código Tributário Nacional (CTN). Grifo meu.

Assim, aplica-se ao presente caso o princípio da retroatividade da norma mais benigna, previsto no art. 106, inciso II, alínea ‘c’ do CTN.

O entendimento desta Corte é no mesmo sentido, senão veja:

TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO VERIFICADA. IPI. SAÍDA DE VEÍCULOS DO ESTABELECIMENTO PARA A CONCESSIONÁRIA. NÃO RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. VOTO DE QUALIDADE. LEI N.º 10.522/02. DEVERES INSTRUMENTAIS. MULTAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.

[...]

-  O Parecer Normativo RFB n.º 03/2013 afirma que não houve a revogação dos artigos 11 e 12 da Lei nº 8.218/91 pelo artigo 57 da MP n.º 2.158-35/2001, ao argumento de que o elemento material da norma sancionatória é distinto. Entretanto, os artigos 12, inciso III, da Lei n. º nº 8.218/91 e 57, inciso I, da MP n.º 2.158-35/2001 cuidam da sanção aplicada à apresentação extemporânea de demonstrativos, documentos ou declarações natureza contábil e/ou fiscal em formato físico ou digital. Assim, com a edição das Leis n.º 12.766/12 e 12.873/2013, a multa aplicável foi reduzida e, por consequência, tornou-se mais benéfica ao contribuinte, de modo que, conforme disposto no artigo 106, inciso II, alínea “c”, do CTN, deve ser aplicada.

- O item 4.6 do Parecer Normativos RFB n.º 03/2013 estabeleceu que a simples não apresentação de documentos sem a comprovação de que faltou a escrituração não pode gerar a multa mais gravosa, mas sim a geral de que trata o artigo 57 da MP nº 2158-35/2001, na forma do artigo 112, inciso II, do CTN, como ocorrido no caso.

[...]

(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0003126-81.2015.4.03.6121, Rel. Desembargador Federal SIDMAR DIAS MARTINS, julgado em 07/03/2023, DJEN DATA: 10/03/2023).

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. ARTIGO 1.021 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE DA DECISÃO UNIPESSOAL, AINDA QUE NÃO SE AMOLDE ESPECIFICAMENTE AO QUANTO ABRIGADO NO NCPC. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DAS EFICIÊNCIA (ART. 37, CF), ANÁLISE ECONÔMICA DO PROCESSO E RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO (ART. 5º, LXXVIII, CF - ART. 4º NCPC). ACESSO DA PARTE À VIA RECURSAL (AGRAVO). APRECIAÇÃO DO TEMA DE FUNDO: AGRAVOS INTERNOS IMPROVIDOS.

[...]

3. A Embargante requereu, administrativamente, no ano de 2011, perante a Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB), a apuração e o ressarcimento de créditos relativos ao imposto incidente sobre produtos industrializados (IPI) no tocante às operações realizadas no âmago de sua atividade empresarial; o período apurado correspondeu ao ano de 2006.

4. A Embargante deixou de entregar/apresentar todos os documentos requisitados pela administração fazendária, de modo a descumprir uma obrigação acessória e, por isso, sujeitar-se à aplicação de uma penalidade que, ao sentir do fisco, corresponde àquela prevista no art. 12 da Lei 8.218/91.

5. A Lei 8.218/91, por intermédio da norma contida em seu art. 12, sanciona o contribuinte pessoa jurídica que não apresenta o demonstrativo ou escrituração digital por não ter escriturado e, exatamente por isso, não mantém os arquivos à disposição de maneira contínua à SRFB. Noutros termos, a penalidade se dá em virtude da absoluta inexistência de escrituração, isto é, ela deveria ter sido empreendida, porém não foi. O substrato material da multa reclama, portanto, um non facere em termos absolutos.

6. A Embargante, por sua vez, reputa aplicável outra penalidade, com amparo no art. 57, inciso I, alínea "b", da MP 2158-35/2001, com a redação dada pela Lei n.º 12.766/2012 e parcialmente revogada pela Lei nº 12.873/2013, em virtude de sua retroatividade benigna, nos termos do art. 106, inciso II, alínea "c", do CTN.

7. A MP 2158-32/01 sanciona aqueles sujeitos que não apresentam ou façam incorreta - ou intempestiva - declaração, demonstrativo ou escrituração digital. Equivale dizer: pune-se o sujeito que não apresenta a escrituração eletrônica, apesar de tê-la lavrado.

8. Consta do procedimento administrativo fiscal a existência de uma série de notificações endereçadas à Embargante, todas solicitando a entrega da escrituração contábil nos moldes exigidos pela RFB, mas nenhuma outra diligência foi empreendida no sentido de evidenciar a absoluta ausência de escrituração pela Embargante.

9. Há, de fato, uma abissal diferença entre o não ser e a mera extemporaneidade. Por outro lado, considerada a natureza da Embargante - Sociedade Anônima -, o seu porte - multinacional -, bem como o seu destaque no mercado, as regras da experiência ditam a inverossimilhança da alegada inexistência de escrituração contábil.

10. Como o próprio parecer normativo da SRFB impinge à fiscalização fazendária o ônus de provar que a pessoa jurídica não encetou a sua escrituração, é defeso à Administração Pública adotar diligências que se plasmem como venire contra factum proprio, porquanto a efetiva comprovação a que alude o sobredito parecer é dependente de maior vanguarda, eficiência e dinamismo na atuação administrativa.

11. Assim, a subsunção dos fatos à norma foi açodada e, por isso mesmo, imperfeita. Com efeito, a fiscalização fazendária deveria ter agido de forma mais prestimosa e pristina, nos termos de seu próprio parecer.

12. Nesse tocante, assiste razão à Embargante, razão pela qual é procedente o pedido a fim de aplicar aos fatos a norma contida no art. 57, inciso I, alínea "b", da MP 2158-35/2001, com a redação dada pela lei 12.766/2012, em virtude da retroatividade benigna (art. 106, inciso II, alínea "c", do CTN).

[...]

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0002578-22.2016.4.03.6121, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 09/02/2023, DJEN DATA: 15/02/2023).

O caso é de reforma da sentença, para determinar a aplicação da multa nos termos do art. 57, inciso I, alínea ‘b’ da MP nº 2.158-35/2001, com a redação alterada pela Lei nº 12.766/2012.

Ante o exposto, dou provimento à apelação, nos termos da fundamentação.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

APELAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. MULTA. ILEGITIMIDADE. PROPORCINALIDADE E RAZOABILIDADE. VIOLAÇÃO. RECURSO PROVIDO.

- No presente caso, a apelante deixou de entregar/apresentar os documentos requisitados pela administração fazendária, tempestivamente, de modo a descumprir obrigação acessória e, por isso, sujeitar-se à aplicação de uma penalidade que, ao sentir do fisco, corresponde àquela prevista nos arts. 11 e 12 da Lei 8.218/91.

- A Lei 8.218/91, por intermédio da norma contida em seu art. 12, sanciona o contribuinte pessoa jurídica que não apresenta o demonstrativo ou escrituração digital por não ter escriturado e, exatamente por isso, não mantém os arquivos à disposição de maneira contínua à SRFB. Noutros termos, a penalidade se dá em virtude da absoluta inexistência de escrituração, isto é, ela deveria ter sido empreendida, porém não foi. O substrato material da multa reclama, portanto, um não fazer em termos absolutos.

- A MP 2158-32/01 sanciona aqueles sujeitos que não apresentam ou façam incorreta - ou intempestiva - declaração, demonstrativo ou escrituração digital. Equivale dizer: pune-se o sujeito que não apresenta a escrituração eletrônica, apesar de tê-la lavrado.

- Nos termos do Parecer Normativo RFB nº 03/2013, “a simples não apresentação de documentos sem a comprovação de que faltou a escrituração não pode gerar a multa mais gravosa, mas sim a geral de que trata o novo art. 57 da MP nº 2158-35, de 2001”.

- Aplica-se o princípio da retroatividade da norma mais benigna, previsto no art. 106, inciso II, alínea ‘c’ do CTN.

- Recurso provido.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do voto da Des. Fed. MÔNICA NOBRE (Relatora), com quem votaram o Des. Fed. MARCELO SARAIVA e o Des. Fed. WILSON ZAUHY. Ausente, justificadamente, por motivo de licença médica, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MONICA NOBRE
DESEMBARGADORA FEDERAL