Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001323-89.2022.4.03.6134

RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES

APELANTE: JAIME TADEU ROMERO

Advogado do(a) APELANTE: FELIPE FERREIRA LACERDA - SP456252-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001323-89.2022.4.03.6134

RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES

APELANTE: JAIME TADEU ROMERO

Advogado do(a) APELANTE: FELIPE FERREIRA LACERDA - SP456252-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de ação ajuizada em 02/06/2022, que tem por objeto a concessão de aposentadoria por invalidez, acrescida de adicional de 25%, ou de auxílio-doença, a partir do requerimento administrativo (25/10/2017).

O feito foi sentenciado em 21/08/2023. O pedido foi julgado improcedente, ante a não constatação de incapacidade laborativa a comprometer o autor.

O demandante  interpôs apelação. Em suas razões, sustenta, preliminarmente, a necessidade de realização de nova perícia médica por médico especialista em Endocrinologia; tachando de insuficiente o laudo produzido. No mérito, empenha-se na reforma do julgado, reiterando a gravidade das patologias que o assolam (diabetes mellitus descompensada e neuropatia diabética), impeditivas do trabalho.

Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001323-89.2022.4.03.6134

RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES

APELANTE: JAIME TADEU ROMERO

Advogado do(a) APELANTE: FELIPE FERREIRA LACERDA - SP456252-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Porque preenche os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso. 

De saída, analiso o propalado cerceamento de defesa.

Percebe-se que o autor, nascido em 28/04/1965 (ID 290280853), esteve em gozo de auxílio-doença previdenciário de 22/07/2009 a 06/02/2010 e de 30/09/2011 a 15/11/2011.

Aviou novo pedido de benefício por incapacidade em 25/10/2017. Aludido pleito  foi indeferido, de vez que não constatada incapacidade em exame médico realizado pelo INSS (ID 290280868).

Inconformado, o autor ajuizou a presente ação em 02/06/2022. Em suas dobras, observado o devido processo legal, perícia médico-judicial foi realizada em 30/06/2022, por especialista em Cirurgia Geral e Coloproctologia, conforme consulta ao sítio eletrônico do Conselho Federal de Medicina (ID 290280881).

Aludido trabalho técnico afirmou que o autor – conferente, auxiliar industrial, laboratorista de fotografia, feitor de obras, encarregado de obras e mestre de obras, com  escolaridade correspondente ao ensino técnico completo (edificações) – padece de diabetes mellitus tipo II. 

Sobre o exame, discorre a senhora Perita:

“Portador de Diabetes Mellitus tipo 2 (CID 10: E 11), diagnosticado no ano de 2010. Relata que no ano de 2017 houve piora do quadro clínico (sic), evoluindo com emagrecimento importante e fraqueza. Refere tristeza e choro fácil, além de dores por todo o corpo. Faz acompanhamento devido neuropatia diabética, não comprovada por exames. Refere que irá passar por avaliação psiquiátrica. A esposa relata que o periciando não faz dieta adequadamente. Refere usar fraldas” (ID 290280881).  

Exame Físico: Periciando em regular estado geral, corado, hidratado, acianótico, eupnéico, anictérico e afebril. Comparece ao exame pericial em cadeira de rodas; se recusa a tentar deambular. Nota-se sarcopenia moderada. Peso atual de 63 quilos e altura de 1,85 metro. Não há edema articular. Não há outras alterações ao exame físico. Exame do Estado Mental: Consciente, orientado, normotenaz, normovigil, afeto e humor hipotimicos, discurso coerente, logico, sem alteracoes de senso percepcao, sem alteracoes de psicomotricidade, memoria de evocacao, recente e remota preservadas, pragmatismo e juizo critico preservados” (ID 290280881 – Pág. 3).

“Ao exame físico há sarcopenia moderada; apresenta exames laboratoriais no dia do exame pericial sem alterações de anemia ou insuficiência renal, também não comprovadas nos exames anexados aos autos; não comprova outras patologias consuptivas ou patologia psiquiátrica descompensada” (ID 290280881 – Pág. 5).  

“Após anamnese, avaliação física e análise de exames complementares e documentos constantes nos autos entendo que o autor(a) apresenta-se apto para o trabalho referido e para suas atividades habituais. Por fim, a conclusão manifestada representa a opinião deste perito à luz dos dados e demais documentos fornecidos pelas partes e daqueles constantes nos autos até a data da emissão deste laudo. Suas conclusões poderão ser revistas e eventualmente alteradas, caso sejam apresentadas novas evidências e fatos devidamente documentados” (ID 290280881 – Pág. 4).

Concluiu em suma que “Não há elementos nos autos que comprovem incapacidade” (ID 290280881 – Pág. 6).

Embora tenha afastado a existência de patologia psiquiátrica descompensada, sugeriu, “a critério do Juízo, perícia complementar com perito psiquiatra” (ID 290280881 – Pág. 6).

Em contraponto, o autor trouxe a lume atestados médicos, emitidos por especialista em Endocrinologia, passados em 2017, 2019, 2021 e 2022, sugerindo afastamento laboral por tempo indeterminado/definitivo, em razão de diabetes tipo II descompensado, de difícil controle, em uso de insulina e com quadro de neuropatia e perda de sensibilidade nos membros inferiores, dificuldade de deambulação e quadro de caquexia (ID’s 290280857, 290280859 e 290281007 – Pág. 4).

Após a perícia judicial, juntou laudos de eletroneuromiografia dos membros superiores e inferiores, realizados em outubro e novembro de 2022, concluindo pela existência de “processo neuropático difuso, simétrico, sensitivo e motor, axonal, crônico, com sinais de atividade desnervativa atual mínima, de muito acentuada intensidade, sugestivo de polineuropatia (ID’s 290280998 e 290281002).

Sobrechegou atestado médico, emitido por especialista em Neurologia, passado em 06/12/2022, consignando que o autor está acometido de polineuropatia periférica de grau grave, com fraqueza nos membros superiores e inferiores e dor (ID 290281007 – Pág. 1), fazendo uso de gabapentina para as dores (ID 290281007 – Pág. 2).

A despeito desses elementos contrastantes, o nobre juiz de origem proferiu desde logo sentença. Entendeu  desnecessária a realização de nova perícia por médico especialista em Endocrinologia, embora tenha sido requerida pelo autor (ID’s 290280990 e 290281083). Julgou improcedente o pedido, ao fundamento de ausência de incapacidade laborativa.

A concessão do benefício de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação da incapacidade do segurado para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.

Na hipótese, porque a prova dos fatos debatidos na lide dependia de conhecimento técnico, o juiz -- que deles não dispõe -- faz-se assistir por especialista.

O direito à prova pericial regularmente produzida é corolário do devido processo legal, direito inarredável à justa solução do litígio.

O artigo 465 do CPC preceitua: "O juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de imediato o prazo para a entrega do laudo".

Recurso a especialista é deveras necessário, quando se trata de esclarecer questões técnicas determinantes para o julgamento da causa. 

Na espécie,  sopesados os elementos carreados aos autos, impõe-se a realização de nova perícia por médico endocrinologista, especialista na patologia alegada pelo autor (diabetes mellitus e suas complicações),  em ordem a bem  instruir a demanda e municiar o juiz de elementos seguros à construção da decisão a ser proferida.

Comparece cerceamento de defesa quando o juiz indefere a realização de prova, requerida oportuna e justificadamente pela parte com o fito de comprovar suas alegações.

Perfilhando tal entendimento, colaciono precedentes desta Nona Turma:

“CONSTITUCIONAL. SEGURIDADE SOCIAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. BPC-LOAS. ART. 203, V, CF/88. LEI N. 8.742/93. NECESSIDADE DE PERÍCIA MÉDICA. LAUDO INSUFICIENTE. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE. APELO DA PARTE AUTORA PROVIDO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.

- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou ao idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

- Necessidade de prova pericial, a fim de que se comprove o preenchimento dos requisitos legais exigidos para a concessão do BPC-LOAS.

- O laudo médico pericial juntado aos autos não se mostrou suficiente para auxiliar esta Relatora na convicção dos fatos alegados, havendo necessidade de realização de uma nova perícia, para que as doenças apontadas pela parte autora nas suas peças sejam investigadas e as dúvidas a respeito da incapacidade dirimidas.

- O julgamento da lide, sem a realização de nova perícia, requerida pela parte autora de forma expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88).

- Apelo da parte autora provido. Sentença desconstituída” (AC nº 5496053-77.2019.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Cristina Melo, j. 13/02/2024, intimação via sistema 16/02/2024).

 

“DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA/APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. PRELIMINAR ACOLHIDA. NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA.  NECESSIDADE DE COMPLEMENTAÇÃO DO LAUDO PERICIAL. RECURSO PREJUDICADO NO MÉRITO.

- Na r. sentença foi julgado improcedente o pedido inicial, embasada na conclusão do laudo pericial, que não constatou a existência de incapacidade laboral. 

- Verifica-se que a perita é médica especialista em clínica geral, e concluiu pela ausência de incapacidade laborativa da parte autora, portadora de patologias psiquiátricas, cabendo salientar que tal conclusão não se coaduna aos documentos apresentados, que informam a existência de incapacidade laboral em razão dessas afecções.

- No entanto, apesar dos documentos médicos particulares da parte autora evidenciarem uma suposta incapacidade laborativa, vale destacar que a perícia administrativa realizada pela autarquia federal atesta a ausência de incapacidade laboral, de modo que se mostra necessária a realização de nova perícia judicial, a fim de se confirmar, ou não, a existência de incapacidade laborativa do requerente.

- Assim, para verificação do preenchimento do requisito incapacidade laboral, carecem estes autos da devida instrução em primeira instância, uma vez que a sentença apreciou o pedido inicial sem a necessária complementação do laudo pericial, o que implica cerceamento de defesa e enseja a nulidade do feito.

- Preliminar acolhida. Apelação da parte autora prejudicada no mérito” (AC nº 5002184-86.2023.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Gilberto Jordan, j. 1º/06/2023, DJEN 07/06/2023).

Salvo nova indicação,  desnecessária a realização de perícia por especialista em Psiquiatria. 

De rigor, assim, a anulação da sentença proferida, com o retorno dos autos à vara de origem para a regular instrução do feito.

Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do autor, para anular a sentença, com vistas a viabilizar perícia por médico capaz de avaliar o autor sob o prisma endócrino, na forma da fundamentação.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

 

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PROVA PERICIAL NÃO CONCLUÍDA. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA.

- O autor, portador de diabetes mellitus descompensada, queixa-se da incompletude da perícia realizada.

-  A conclusão do laudo pericial emitido por Cirurgiã Geral e Coloproctologista está discrepante de documentos médicos juntados pelo autor.

- O MM. julgou improcedente o pedido em face da ausência de incapacidade laborativa, entendendo desnecessária a realização de nova perícia médica por endocrinologista, requerida pelo autor.

- Prova pericial realizada, entretanto, que carece de aprofundamento.

- Anulação da sentença proferida. Retorno  dos autos à vara de origem para regular instrução e novo julgamento.

- Apelação do autor parcialmente provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
FONSECA GONÇALVES
DESEMBARGADOR FEDERAL