APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000696-33.2016.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: FRANCISCO DE ASSIS LOPES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, OS MESMOS, FRANCISCO DE ASSIS LOPES
Advogado do(a) APELADO: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000696-33.2016.4.03.6183 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: FRANCISCO DE ASSIS LOPES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, OS MESMOS, FRANCISCO DE ASSIS LOPES Advogado do(a) APELADO: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença, que extinguiu a execução com fundamento nos artigos 924, inciso II, e 925, ambos do Código de Processo Civil. Sem condenação em honorários sucumbenciais. Em síntese, aduz que o Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC) não foi aplicada até a data do efetivo pagamento, em afronta à Emenda Constitucional (EC) n. 113/2021 (art. 3º), que fixa sua vigência desde a publicação (dez/2021), razão pela qual descabe aplicar o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – Especial (IPCA-E) no prazo constitucional para pagamento, e, portanto, a aplicação desse indexador monetário deve ser limitada à data de 30/11/2021. Assevera que o artigo 21-A da Resolução n. 303/2019 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), incluído pela Resolução n. 448/2022 do CNJ – item XIII, fixa a taxa SELIC desde a publicação da Emenda Constitucional (EC) n. 113/2021 (art. 3º) – dezembro de 2021, de modo que não há legislação que ampare o uso do IPCA-E nesse período, o que é inconstitucional. E, ainda, há diferenças decorrentes da aplicação dos juros de mora entre as datas do cálculo original e de inscrição no orçamento, diante do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) n. 579.431/RS pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – Tema repetitivo n. 96, no qual foi destacado que, o fato de constar somente a correção monetária no texto do § 5º do artigo 100 da Constituição Federal de 1988, isso não quer dizer que os juros moratórios devam ser afastados nesse lapso temporal. Nesses termos, requer o prosseguimento da execução, para que seja pago o saldo oriundo do precatório que apurou – R$ 5.990,96 (dez/2023), ou que os autos sejam remetidos à contadoria judicial, a fim de que elabore parecer e cálculos segundo os parâmetros do recurso. Sem contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000696-33.2016.4.03.6183 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: FRANCISCO DE ASSIS LOPES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, OS MESMOS, FRANCISCO DE ASSIS LOPES Advogado do(a) APELADO: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Conheço do recurso, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade. Discute-se a existência de saldo, materializado pela não incidência do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC) desde dezembro de 2021 até a data de adimplemento do precatório (exequente), consoante artigo 3º da Emenda Constitucional (EC) n. 113/2021, bem como dos juros de mora até a data de inscrição, na forma do decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – Tema n. 96. Neste feito, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi condenado ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) da aposentadoria por tempo de contribuição do exequente, com data de início de benefício (DIB) em 11/3/2014, à vista períodos de labor especial reconhecidos no decisum. Passo à análise, mediante a leitura da ação de conhecimento, na qual foi processada a execução (Autos n. 0000696-33.2016.4.03.6183). O depósito, cuja suficiência é discutida, refere-se ao cálculo acolhido em cumprimento de sentença, no tocante ao crédito do exequente, por ele atualizado para janeiro de 2020 – R$ 70.032,94 – e honorários advocatícios – R$ 3.000,25. O precatório e a requisição de pequeno valor (RPV), atinentes ao exequente e seu patrono, nessa ordem, foram transmitidos em 23/3/2023, cujo pagamento do RPV foi publicado em 26/4/2023. Quanto ao precatório – com destaque de honorários contratuais –, o pagamento ocorreu mediante um único depósito, publicado em 22/12/2023, no valor de R$ 98.453,80. De fato, o prazo para apresentação dos ofícios precatórios ao Tribunal foi alterado para 2 de abril, na forma estabelecida no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988), com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 114/2021. Tendo sido transmitido o precatório em 23/3/2023, a inscrição na proposta orçamentária ocorreu em 2/4/2023, tendo sido realizado o depósito no prazo constitucionalmente estabelecido. A parte autora alega subsistir saldo, sob o entendimento de que o precatório não teria sido atualizado pela taxa SELIC até a data do efetivo pagamento (22/12/2023), em afronta ao artigo 3º da Emenda Constitucional n. 113/2021 (dez/2021), sobretudo no prazo previsto constitucionalmente, no qual foi atualizado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), além da ausência de cômputo dos juros de mora até a data de inscrição no orçamento, nos moldes do Recurso Extraordinário (RE) n. 579.431/SC – Tema n. 96 do STF. Com esses parâmetros, o exequente apresentou cálculo, no qual apurou o saldo de R$ 5.990,96, atualizado para dezembro de 2023. Sem razão à parte autora, porque isso não é possível à luz do texto constitucional por ela invocado no recurso (EC n. 113/2021, art. 3º), que deve ser interpretado conjuntamente ao § 5° do artigo 100 da Constitucional Federal de 1988, além do que o critério de pagamento do precatório não destoa do julgamento do Tema n. 96 pelo STF (RE 579.431/SC). Como dito, o cálculo homologado, cujo pagamento se discute, foi atualizado até janeiro de 2020 e o precatório foi inscrito no orçamento em 2/4/2023 e pago em 22/12/2023. Pertinente à correção monetária, o STF, em sessão de 25/3/2015, ao modular os efeitos da decisão na questão de ordem suscitada nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) n. 4.357 e 4.425, decidiu, em tema de precatório ou RPV, que o cálculo acolhido deverá sofrer atualização integral, substituindo a Taxa Referencial (TR), considerada inconstitucional na referida data, pelo IPCA-E. Do mesmo modo, o STF já decidiu a matéria dos juros de mora entre as datas do cálculo homologado e da apresentação do precatório/rpv, na sessão de julgamento de 19/4/2017, cujo acórdão foi publicado em 30/6/2017, em sede de repercussão geral (RE 579.431 – Tema 96), com trânsito em julgado na data de 16/8/2018, em que fixada a seguinte Tese: "JUROS DA MORA - FAZENDA PÚBLICA - DÍVIDA - REQUISIÇÃO OU PRECATÓRIO. Incidem juros da mora entre a data da realização dos cálculos e a da requisição ou do precatório." (DJe-145 DIVULG 29-06-2017 PUBLIC 30-06-2017)" Consoante demonstrativo que integra esta decisão, o pagamento do precatório resultou da atualização monetária pelo IPCA-E, aplicado no lapso temporal entre as datas da conta original (total de R$ 70.032,94 – jan/2020) e de dezembro de 2021, acrescido dos juros da poupança nesse período, com incidência sobre o principal devidamente atualizado (RE n. 579.431 e nas ADIs n. 4.357 e 4.425). Como o precatório do exequente foi inscrito na proposta de 2/4/2023 (R$ 96.296,75), a taxa SELIC serviu à atualização (acumulada 15,71%) – período de dez/2021 a março/2023 (inclusive). No prazo constitucional previsto para pagamento, o IPCA-E foi aplicado nos moldes da LDO n. 14.436/2022, (art. 38, §1º), no período de abril/2023 a nov/2023 (inclusive), levando ao depósito de R$ 98.453,80 (em 22/12/2023). Por consequência, o cálculo do exequente – que requer seja acolhido, reflete a continuidade da aplicação da taxa SELIC, no período de graça constitucional, sem validade constitucional (art. 100, § 5º). O pagamento do precatório guardou conformidade com o LDO n. 14.436, de 9/8/2022, que, em seu artigo 38, estabelece (g. n.): “Art. 38. Nas discussões e condenações que envolvam a Fazenda Pública federal, para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, incidirá, no exercício financeiro de 2023, apenas uma vez, até o efetivo pagamento, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - taxa Selic, acumulado mensalmente. § 1º A atualização dos precatórios não tributários, no período a que se refere o § 5º do art. 100 da Constituição, será efetuada exclusivamente pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial – IPCA-E da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. § 2º Na atualização monetária dos precatórios tributários, no período a que se refere o § 5º do art. 100 da Constituição, deverão ser observados os mesmos critérios pelos quais a Fazenda Pública federal corrige os seus créditos tributários. § 3º Após o prazo a que se refere o § 5 do art. 100 da Constituição, não havendo o adimplemento do requisitório, a atualização dos precatórios tributários e não tributários será efetuada pelo índice da taxa Selic, acumulado mensalmente, vedada a sua aplicação sobre a parcela referente à correção realizada durante o período de que trata o § 5º do art. 100 da Constituição.” Segundo essa lei (exercício financeiro de 2023), no período que corresponde à data de inscrição no orçamento até o final do exercício previsto para pagamento – de 2/4/2023 a 31/12/2023 –, o precatório deve ser atualizado pelo IPCA-E. Assim, a partir de dezembro de 2021, o precatório foi atualizado pela taxa SELIC até a data de inscrição na proposta orçamentária – R$ 96.296,75 (2/4/2023) –, e, em seguida, pelo IPCA-E acumulado (1,02240006), que gerou o depósito do valor de R$ 98.453,80, em 22/12/2023. Nos termos da EC n. 113/2021 (art. 3º) e LDO n. 14.436/2022 (art. 38, caput, e § 3º), a taxa SELIC deve ser aplicada no período anterior e posterior ao prazo constitucionalmente estabelecido para pagamento, previsto no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988). Não é demais destacar o fato de que a taxa SELIC é composta de correção monetária e juros de mora, esses últimos afastados pela CF/1988 durante o prazo constitucional para pagamento. A parte autora pugna pela aplicação da taxa SELIC (EC N. 113/2021, art. 3º), a partir da publicação da emenda em questão (art. 7º), em todo o período do cálculo, mesmo no prazo constitucional para pagamento – período de graça constitucional. Assim, o exequente fez incidir os índices econômicos (SELIC) publicados para o período de dezembro de 2021 até dezembro de 2023 (inclusive), cujo acumulado resultou da multiplicação de suas taxas – 1,279997428 (quase 28%), aplicado sobre o principal acrescido dos juros de mora da conta homologada, ambos atualizados até dezembro de 2021, somados, ao final, aos juros em continuação nos moldes do RE n. 579.431/SC, base do saldo que apurou – R$ 5.990,96 (dez/2023). Não obstante a previsão contida na Emenda Constitucional n. 113/2021 (art. 3º) acerca da aplicação da taxa SELIC – “inclusive do precatório” –, de seu texto extrai-se ser essa taxa aplicável “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora”. Pela compreensão da norma inserta nesse artigo 3º, a taxa SELIC, que já era adotada nas ações judiciais de natureza tributária, foi estendida a todos os processos contra a Fazenda Pública, devendo, a partir de dezembro de 2021, substituir todos os índices de correção monetária e juros de mora (exclusivamente). A taxa SELIC substitui ambos – indexador monetário e juros de mora –, porquanto trata-se de taxa unificada, adotada “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório (...)” (EC, art. 3º). Nessa esteira, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu: “(...) Especificamente quanto à taxa SELIC, esta SUPREMA CORTE já firmou entendimento de que este parâmetro é um índice composto, isto é, serve a um só tempo como indexador de correção monetária e também de juros moratórios, nos termos do art. 406 do Código Civil”. (Rcl 54886 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 05-09-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 05-09-2022 PUBLIC 08-09-2022) Efetivamente, os precatórios e as requisições de pequeno valor (RPV) têm rito próprio, para os quais há o afastamento dos juros de mora no prazo constitucionalmente estabelecido – período de graça –, por ser a taxa SELIC “um índice composto, isto é, serve a um só tempo como indexador de correção monetária e também de juros moratórios”. (STF – Rcl 54.886) Nesse passo, transcrevo o artigo 100 da Constituição Federal de 1988 (§ 5º): “Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). (Vide Emenda Constitucional nº 62, de 2009). (Vide ADI 4425) (...) “§ 5º É obrigatória a inclusão no orçamento das entidades de direito público de verba necessária ao pagamento de seus débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado constantes de precatórios judiciários apresentados até 2 de abril, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 114, de 2021) (Vigência)” O STF também firmou o entendimento de que, por força do § 5º do artigo 100 da CF/1988 (antigo § 1º), no período compreendido entre a data-limite para a apresentação do precatório e o término do exercício para pagamento, não devem incidir juros de mora, consoante Súmula Vinculante n. 17 dessa Corte Suprema (in verbis): “Durante o período previsto no parágrafo 1º do artigo 100 da Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos.” Vale dizer: não houve alteração da legislação de regência em razão do julgamento do STF do Tema n. 1.037 (RE 1.169.289) – trânsito em julgado em 15/10/2020, cuja tese foi assim firmada: “O enunciado da Súmula Vinculante 17 não foi afetado pela superveniência da Emenda Constitucional 62/2009, de modo que não incidem juros de mora no período de que trata o § 5º do art. 100 da Constituição. Havendo o inadimplemento pelo ente público devedor, a fluência dos juros inicia-se após o período de graça.” A toda evidência, descabe computar juros de mora no prazo previsto no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, registra-se o seguinte precedente do STF (g. n.): “RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRECATÓRIOS. PERÍODO DE GRAÇA CONSTITUCIONAL. INADMISSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS. PRECEDENTES. TAXA SELIC ENGLOBA JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TAXA SELIC NO INTERVALO PREVISTO NO ART. 100, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APARENTE COLISÃO DE NORMAS CONSTITUCIONAIS. UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO E CONCORDÂNCIA PRÁTICA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO. 1. Durante o período de que trata o § 5º do art. 100 da Constituição Federal, não incidem juros de mora, somente com o inadimplemento do ente público devedor, ou seja, após o período de graça, é possível a fluência dos juros moratórios (Súmula Vinculante 17/STF e RE 1.169.289/SC, tema 1.037 da repercussão geral). 2. O art. 3º da EC 113/2021, cuja constitucionalidade já foi reconhecida por esta Suprema Corte (ADI’s 7.047/DF e 7.064/DF), estabelece que, a partir de sua entrada em vigor, em todas as condenações que envolvam a Fazenda Pública, para fins de atualização monetária, juros moratórios e juros compensatórios, inclusive do precatório, deve ser aplicada, uma única vez, até o efetivo pagamento, a taxa SELIC. 3. A taxa SELIC engloba juros e correção monetária, de modo que não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem (ADC’s 58/DF e 59/DF e ADI’s 5.867/DF e 6.021/DF). 4. A adequada compatibilização entre as normas constitucionais deve manter a efetividade dessas normas, sendo certo que admitir a incidência da taxa SELIC no período de graça de expedição de precatório acarretaria o esvaziamento completo da parte final do § 5º do art. 100 do texto constitucional, em nítida transgressão ao princípio da unidade da Constituição. 5. Necessidade de promover, portanto, com base na concordância prática, ajuste hermenêutico em relação ao art. 3º da EC 113/2021, de modo a, mantendo sua eficácia, reduzir, minimamente, seu âmbito de incidência. Assim, a partir da entrada em vigor da EC 113/2021, apenas no período a que se refere o art. 100, § 5º, da Constituição Federal, a taxa SELIC não deve incidir (art. 3º da EC 113/2021), preservando-se, em tal período, a imunidade aos juros e mantendo-se exclusivamente a correção monetária. 6. O IPCA-E deve continuar sendo utilizado para correção monetária dos precatórios, exclusivamente, no período de graça constitucional, nos termos do decidido por esta Corte nas ADI’s 4.357-QO/DF e 4.425-QO/DF. 7. Recurso extraordinário não provido.” (RE 1475938/SC, Relator: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 07/05/2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 14-05-2024 PUBLIC 15-05-2024) Em respeito “ao princípio da unidade da Constituição", mostra-se descabido "admitir a incidência da taxa SELIC no período de graça de expedição de precatório”, pois está conduta “acarretaria o esvaziamento completo da parte final do § 5º do art. 100 do texto constitucional” (STF). Não por outro motivo, o STF procedeu ao “ajuste hermenêutico em relação ao art. 3º da EC 113/2021”, a fim de que “a partir da entrada em vigor da EC 113/2021, apenas no período a que se refere o art. 100, § 5º, da Constituição Federal, a taxa SELIC não deve incidir (art. 3º da EC 113/2021), preservando-se, em tal período, a imunidade aos juros e mantendo-se exclusivamente a correção monetária”. (RE n. 1.475.938/SC, g. n.) Ao final, no mesmo julgamento desse (RE n. 1.475.938/SC), deliberou: “(...) O IPCA-E deve continuar sendo utilizado para correção monetária dos precatórios, exclusivamente, no período de graça constitucional, nos termos do decidido por esta Corte nas ADI’s 4.357-QO/DF e 4.425-QO/DF”. Tampouco o exequente poderá aduzir – como no recurso, que o artigo 21-A da Resolução n. 303/2019, incluído pela Resolução n. 448/2022, ambas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – item XIII, fixa o limite de aplicação do IPCA-E na data de 30/11/2021, por furtar-se à aplicação do § 5º desse artigo, que exclui a incidência da SELIC no período de graça (art. 100, § 5º, CF), como abaixo (g. n.): “Art. 21-A Os precatórios não tributários requisitados anteriormente a dezembro de 2021 serão atualizados a partir de sua data-base mediante os seguintes indexadores: (incluído pela Resolução n. 448, de 25.3.2022). (...); XII – IPCA-E/ IBGE - de 26.03.2015 a 30 de novembro de 2021; XIII – Taxa Referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) - de dezembro de 2021 em diante. (...). § 5o A atualização dos precatórios não-tributários deve observar o período a que alude o § 5o do artigo 100 da Constituição Federal, em cujo lapso temporal o valor se sujeitará exclusivamente à correção monetária pelo índice previsto no inciso XII deste artigo. (incluído pela Resolução n. 448, de 25.3.2022)” É possível concluir pelo acerto da sistemática empregada no pagamento do precatório em tela, em que aplicada a taxa SELIC no período que antecede a data de inscrição na proposta orçamentária (2/4/2023), a partir da qual foi observado o indexador monetário previsto na LDO n. 14.436/2022 até o final do exercício para pagamento (IPCA-E) – de abril/2023 a dez/2023, tendo em vista a quitação do precatório dentro do prazo constitucionalmente estabelecido (art. 100, § 5º, CF). Aliás, o depósito superou o valor devido, consoante demonstrativo que integra esta decisão, o qual reproduz o pagamento do precatório do exequente. Segundo esse demonstrativo, para o lapso temporal entre as datas de início da taxa SELIC e de inscrição do precatório no orçamento – dezembro de 2021 até março de 2023 (inclusive) –, esse índice econômico acumulado (15,71%) foi aplicada sobre o crédito do exequente, que é composto de principal e juros de mora, em afronta à Emenda Constitucional n. 113/2021 (art. 3º), que veda sua incidência sobre os juros – abrangidos pela taxa SELIC –, por configurar anatocismo. Desse vício, em maior extensão, a conta da parte autora também padece, pois revela anatocismo, não apenas por ter aplicado a taxa SELIC sobre os juros de mora, mas também porque o acumulado desse índice econômico resultou da multiplicação das suas taxas, publicadas no período de dezembro de 2021 até dezembro de 2023 (inclusive) – base do saldo pugnado R$ 5.990,96 (dez/2023). Diferentemente dos demais índices de correção monetária – INPC, IGP-DI, IPCA-E e outros, o acumulado da taxa SELIC não decorre de multiplicação das suas taxas, mas do somatório delas, as quais são divulgadas mensalmente, com incidência no principal, motivo de a parte autora ter apurado saldo, que derivou não apenas da aplicação da taxa SELIC no período de graça constitucional, em afronta ao § 5º do artigo 100 da Constituição Federal, mas também por tê-la aplicado na modalidade de capitalização composta e não simples, na forma supracitada. No âmbito do Poder Judiciário, a taxa SELIC deve ser aplicada na forma simples – metodologia linear, com incidência somente sobre o capital (principal), conforme divulgado no sítio da Receita Federal do Brasil, que não destoa do disposto no artigo 406 do Código Civil, abaixo transcrito: “Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional." Como se nota, a parte autora somente apura saldo a ela favorável, por desbordar do texto da norma por ela invocado (EC n. 113/2021, art. 3º), de que a SELIC engloba juros, e, por isso, essa taxa não deve ser aplicada no prazo previsto no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal, no qual é aplicável a correção monetária (exclusivamente), para preservar a imunidade aos juros de mora, cuja fluência somente é possível após o período de graça, nos moldes do entendimento firmado pelo STF na Súmula Vinculante n. 17 e no RE n. 1.169.289 – Tema 1.037 da repercussão geral. Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora, ficando mantida a decisão que extinguiu o feito, conforme fundamentação. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. SELIC. INEXISTÊNCIA DE DIFERENÇAS. APELAÇÃO DESPROVIDA.
- Segundo a Lei n. 14.436/2022 (Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO para o exercício financeiro de 2023), no período que corresponde à data de inscrição no orçamento até o final do exercício previsto para pagamento – de 2/4/2023 a 31/12/2023 –, o precatório deve ser atualizado pelo IPCA-E.
- Nos termos da EC n. 113/2021 (art. 3º) e LDO n. 14.436/2022 (art. 38, caput, e § 3º), a taxa SELIC deve ser aplicada no período anterior e posterior ao prazo constitucionalmente estabelecido para pagamento, previsto no § 5º do artigo 100 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988).
- A taxa SELIC é composta de correção monetária e juros de mora, esses últimos afastados pela CF/1988 (art. 100, § 5º) durante o prazo constitucional para pagamento.
- No prazo constitucional para pagamento do precatório é aplicável unicamente a correção monetária, para preservar a imunidade aos juros de mora, cuja fluência somente é possível depois do período de graça, consoante entendimento firmado pelo STF na Súmula Vinculante n. 17 e no Tema n. 1.037 da repercussão geral.
- Apelação desprovida.