AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5012763-83.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO
AGRAVANTE: DAMARIS DE BARROS PINTO MARTINS
Advogado do(a) AGRAVANTE: FABIO LAMONICA PEREIRA - PR35936-A
AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5012763-83.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO AGRAVANTE: DAMARIS DE BARROS PINTO MARTINS Advogado do(a) AGRAVANTE: FABIO LAMONICA PEREIRA - PR35936-A AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Trata-se de agravo de instrumento interposto por DAMARIS DE BARROS PINTO MARTINS em face da r. decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Araçatuba que, no bojo da Execução de Título Extrajudicial promovida pela CAIXA, rejeitou a impugnação à penhora, mantendo-a sobre o imóvel de matrícula nº 15.405 do Cartório de Registro de Imóveis de Penápolis. Na origem (autos nº 0004617-34.2016.4.03.6107), a decisão agravada fundamentou-se na ausência de comprovação de impenhorabilidade do imóvel, em razão de, embora seja o imóvel classificado como pequena propriedade rural, não estar demonstrada a exploração em regime de economia familiar. Em razões recursais (ID 290916364), argumenta a parte agravante pela impenhorabilidade do bem. Alega que é proprietária de apenas 50% do imóvel penhorado (correspondente a 18,15 hectares ou 7,5 alqueires), de maneira que o bem seria classificado como pequena propriedade rural, e que o explora em regime familiar. A título de prova documental, junta aos autos comprovantes de exploração da atividade rural no imóvel, nos termos do art. 5º, XXVI, da Constituição Federal, e do art. 833, VIII, do Código de Processo Civil. Relata que apresentou requerimento de redução da penhora ao montante suficiente ao pagamento do débito e consectários, a fim de que a execução prosseguisse pelo modo menos gravoso ao executado, nos termos dos arts. 805, 831 e 874, todos do CPC. Expõe que o bem penhorado possui área total de 36,30 hectares (15 alqueires), bem como que cada módulo fiscal, no município de Alto Alegre/SP, corresponde a 30 hectares, sendo o imóvel enquadrado como pequena propriedade para fins de aplicação da impenhorabilidade. Ressalta a agravante que, por ser detentora de apenas 50% do imóvel (7,5 alqueires), a cota parte de seu cônjuge não pode ser contemplada na execução, mas apenas a sua. Sustenta que os demais imóveis mencionados na r. decisão, notadamente quanto à aplicação do empréstimo em três imóveis (matrículas números 15.405 – Sítio Isaura; 9.844 – Sítio Dois Irmãos; 26884 e 26885 – Sítio Helen), não devem ser levados em consideração para análise da impenhorabilidade do bem objeto dos autos, uma vez que pertencem ao seu marido, bem como que, acaso fossem somadas as áreas de todas as matrículas, ainda incidiria a proteção, pois a área total é inferior a 4 módulos fiscais. Aduz que, apesar de o juízo não ter entendido pela exploração familiar do imóvel, os documentos apresentados demonstram tanto o preenchimento desse requisito como que o crédito foi liberado para utilização e exploração direta no imóvel penhorado. A agravante cita os seguintes documentos: venda de produção de cana de açúcar; compra de insumos; movimento (compra e venda de produtos); venda de produtos; declaração de perdas; requerimento entregue à CAIXA solicitando o alongamento do débito; comprovante de inscrição como produtora rural pessoa física; venda de mercadorias; recibo de prestação de serviços. Quanto à redução da penhora, sustenta que o valor da avaliação supera, em muito, a quantia exequenda, uma vez que o bem foi avaliado em R$ 1.600.000,00 em junho de 2022 e, ainda que atualizado o valor de R$ 259.385,36 em 2016, há evidente excesso de execução; que a penhora deve recair sobre valor suficiente para pagamento do principal, juros, custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 805, do CPC. Insiste, ainda, no cabimento de redução da penhora por ser proprietária de apenas 50% da Fazenda. Pugna pela concessão de efeito suspensivo ao recurso até o julgamento final. No mérito, requer o reconhecimento e a declaração da absoluta impenhorabilidade do imóvel, pois preenchidos os requisitos legais; a inversão do ônus da prova, a fim de que a CAIXA comprove que não há exploração direta em regime familiar. Sucessivamente, pleiteia a redução da penhora ao montante suficiente ao pagamento do débito e consectários, bem como que a execução tenha curso pelo modo menos gravoso; a redução da penhora considerando que detém a propriedade de apenas 50% do imóvel. Decisão de indeferimento da concessão de efeito suspensivo (ID 291585867). Formulado pedido de reconsideração (ID 294931599) e mantida a decisão de indeferimento (ID 300508773). Contraminuta (ID 295657673). É o relatório. avl
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5012763-83.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO AGRAVANTE: DAMARIS DE BARROS PINTO MARTINS Advogado do(a) AGRAVANTE: FABIO LAMONICA PEREIRA - PR35936-A AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Cinge-se a controvérsia ao reconhecimento de impenhorabilidade de imóvel rural com fundamento no art. 833, VIII, do Código de Processo Civil. Alega a parte agravante que é proprietária de apenas 50% do imóvel penhorado (correspondente a 18,15 hectares ou 7,5 alqueires), de maneira que o bem seria classificado como pequena propriedade rural, e que o explora em regime de economia familiar. Pois bem. Para reconhecer a impenhorabilidade, nos termos do art. 833, VIII, do CPC, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: 1) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e 2) que seja explorado pela família. As Turmas da Seção de Direito Privado do C. Superior Tribunal de Justiça firmaram as seguintes orientações: para o reconhecimento da impenhorabilidade, não é necessário que o débito exequendo seja oriundo da atividade produtiva, tampouco que o imóvel sirva de moradia do executado e de sua família (REsp 1591298/RJ, DJe 21/11/2017; AgInt no REsp 1177643/PR, DJe 19/12/2019) e a proteção remanesce, ainda que a propriedade rural seja oferecida em garantia hipotecária pelos respectivos proprietários (AgInt no AREsp 1361954/PR, DJe 30/05/2019; AgInt no AREsp 1428588/PR, DJe 16/05/2019). Até o momento, não existe uma lei que defina especificamente o que constitui uma pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade. Em razão dessa lacuna legislativa, a jurisprudência tem adotado o conceito estabelecido na Lei nº 8.629/1993, que regulamenta as normas constitucionais relativas à reforma agrária. No artigo 4º, inciso II, alínea "a", atualizado pela Lei nº 13.465/2017, há a previsão de que uma pequena propriedade rural é o imóvel rural "com área de até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento". O magistrado a quo concluiu que a parte penhorada é inferior a 4 módulos fiscais em razão de possuir área total de 36,30 hectares (15 alqueires), porém, manteve a penhora sobre o imóvel rural devido à não comprovação de que a área é explorada pelo trabalho familiar. Quanto ao requisito “exploração familiar”, num primeiro momento, o C. STJ entendeu que haveria a presunção de que a propriedade, enquadrando-se como diminuta, seria explorada pelo ente familiar, em razão de se tratar de decorrência natural do que normalmente se espera que aconteça no mundo real, inclusive das regras de experiência (REsp 1408152/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 1/12/2016, DJe 2/2/2017; AgInt no REsp 1826806/RS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 23/3/2020, DJe 26/3/2020). Atualmente, porém, a Corte Superior considera que o art. 833, VIII, do CPC é expresso ao condicionar o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural à sua exploração familiar, cabendo à parte que alega o ônus de demonstrar a veracidade desse fato. PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE IMÓVEL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. ÔNUS DA PROVA DO EXECUTADO DE QUE O BEM CONSTRITO É TRABALHADO PELA FAMÍLIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. JULGAMENTO: CPC/2015. 1. Recurso especial interposto em 23/09/2019 e atribuído ao gabinete em 28/10/2020. 2. O propósito recursal consiste em definir sobre qual das partes recai o ônus da prova de que a pequena propriedade rural é trabalhada pela família e se a proteção da impenhorabilidade subsiste mesmo que o imóvel tenha sido dado em garantia hipotecária. 3. Para reconhecer a impenhorabilidade, nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (iii) que seja explorado pela família. Até o momento, não há uma lei definindo o que seja pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade. Diante da lacuna legislativa, a jurisprudência tem tomado emprestado o conceito estabelecido na Lei 8.629/1993, a qual regulamenta as normas constitucionais relativas à reforma agrária. Em seu artigo 4ª, II, alínea “a”, atualizado pela Lei 13.465/2017, consta que se enquadra como pequena propriedade rural o imóvel rural “de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento”. 4. Na vigência do CPC/73, a Terceira Turma já se orientava no sentido de que, para o reconhecimento da impenhorabilidade, o devedor tinha o ônus de comprovar que além de pequena, a propriedade destinava-se à exploração familiar (REsp 492.934/PR; REsp 177.641/RS). Ademais, como regra geral, a parte que alega tem o ônus de demonstrar a veracidade desse fato (art. 373 do CPC/2015) e, sob a ótica da aptidão para produzir essa prova, ao menos abstratamente, é certo que é mais fácil para o devedor demonstrar a veracidade do fato alegado. Demais disso, art. 833, VIII, do CPC/2015 é expresso ao condicionar o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural à sua exploração familiar. Isentar o devedor de comprovar a efetiva satisfação desse requisito legal e transferir a prova negativa ao credor importaria em desconsiderar o propósito que orientou a criação dessa norma, o qual, repise-se, consiste em assegurar os meios para a manutenção da subsistência do executado e de sua família. 5. O oferecimento do bem em garantia não afasta a proteção da impenhorabilidade, haja vista que se trata de norma de ordem pública, inafastável pela vontade das partes. Precedentes. 6. A ausência de comprovação, pela parte executada, de que o imóvel penhorado é explorado pela família afasta a incidência da proteção da impenhorabilidade. 7. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico e a demonstração da similitude fática entre o acórdão recorrido e os acórdãos paradigmas. 8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. ( REsp 1.913.234 - SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, j. em 8/2/2023, DJe 7/3/2023) g.n. In casu, à vista do exposto, entendo, nessa fase recursal, que a parte agravante não se desincumbiu do ônus de demonstrar a presença do segundo requisito legal, qual seja, a exploração da propriedade em regime de economia familiar. Como exposto na decisão agravada, os documentos juntados aos autos comprovam o exercício da atividade rural, “mas não indicam a exploração direta e pessoal pela família”. Assim, não preenchidos os pressupostos condicionantes previstos em lei, de rigor a manutenção da decisão agravada. Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. É como voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. PENHORA DE IMÓVEL RURAL. REQUISITOS DO ART. 833, VIII, DO CPC, NÃO DEMONSTRADOS. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA.
- Cinge-se a controvérsia ao reconhecimento de impenhorabilidade de imóvel rural com fundamento no art. 833, VIII, do Código de Processo Civil.
- Alega a parte agravante que é proprietária de apenas 50% do imóvel penhorado (correspondente a 18,15 hectares ou 7,5 alqueires), de maneira que o bem seria classificado como pequena propriedade rural, e que o explora em regime de economia familiar.
- Para reconhecer a impenhorabilidade, nos termos do art. 833, VIII, do CPC, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: 1) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e 2) que seja explorado pela família.
- As Turmas da Seção de Direito Privado do C. Superior Tribunal de Justiça firmaram as seguintes orientações: para o reconhecimento da impenhorabilidade, não é necessário que o débito exequendo seja oriundo da atividade produtiva, tampouco que o imóvel sirva de moradia do executado e de sua família (REsp 1591298/RJ, DJe 21/11/2017; AgInt no REsp 1177643/PR, DJe 19/12/2019) e a proteção remanesce, ainda que a propriedade rural seja oferecida em garantia hipotecária pelos respectivos proprietários (AgInt no AREsp 1361954/PR, DJe 30/05/2019; AgInt no AREsp 1428588/PR, DJe 16/05/2019).
- Em razão da lacuna legislativa quanto à definição do que constitui uma pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade, a jurisprudência tem adotado o conceito estabelecido na Lei nº 8.629/1993, que regulamenta as normas constitucionais relativas à reforma agrária. No artigo 4º, inciso II, alínea "a", atualizado pela Lei nº 13.465/2017, há a previsão de que uma pequena propriedade rural é o imóvel rural "com área de até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento".
- O magistrado a quo concluiu que a parte penhorada é inferior a 4 módulos fiscais em razão de possuir área total de 36,30 hectares (15 alqueires), porém, manteve a penhora sobre o imóvel rural devido à não comprovação de que a área é explorada pelo trabalho familiar.
- Quanto ao requisito “exploração familiar”, atualmente, o STJ considera que o art. 833, VIII, do CPC, é expresso ao condicionar o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural à sua exploração familiar, cabendo à parte que alega o ônus de demonstrar a veracidade desse fato. Precedente.
- In casu, à vista do exposto, a parte agravante não se desincumbiu do ônus de demonstrar a presença do segundo requisito legal, qual seja, a exploração da propriedade em regime de economia familiar. Como exposto na decisão agravada, os documentos juntados aos autos comprovam o exercício da atividade rural, “mas não indicam a exploração direta e pessoal pela família”.
- Não preenchidos os pressupostos condicionantes previstos em lei, de rigor a manutenção da decisão agravada.
- Agravo de instrumento não provido.