APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5097896-69.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDA SALLES DA LUZ
Advogados do(a) APELADO: JANAINA RAQUEL FELICIANI DE MORAES - SP248170-N, VINICIUS CAMARGO LEAL - SP319409-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5097896-69.2024.4.03.9999 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: APARECIDA SALLES DA LUZ Advogados do(a) APELADO: JANAINA RAQUEL FELICIANI DE MORAES - SP248170-N, VINICIUS CAMARGO LEAL - SP319409-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação em ação movida em face do INSS objetivando a concessão de salário-maternidade. A sentença julgou procedente o pedido, nos seguintes termos: “Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a ação e CONDENO o INSS ao pagamento do benefício de salário-maternidade, em favor da autora, em relação a filha Laiany, com base no valor de um salário mínimo, observando-se quanto ao valor a ser pago a regra do artigo 73, inciso II, da Lei n. 8.213/91, com todos os seus acréscimos e gratificações ao benefício aderidas, a partir do pedido administrativo (20/11/2018- fls. 14). Pagará os valores atrasados de uma só vez, corrigidos pelo INPC-E e com juros na forma do artigo 1º, da Lei n. 11.960/09, conforme as teses firmadas pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 870.947 (Tema 810 e 905), observando-se quanto aos juros de mora o índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de 30.06.2009. JULGO RESOLVIDO o processo, com fulcro no art. 487, inciso I, do C.P.C.” Apela o INSS e requer a improcedência do pedido por não comprovado o labor rural em regime de economia familiar. Com contrarrazões. É o relatório. KS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5097896-69.2024.4.03.9999 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: APARECIDA SALLES DA LUZ Advogados do(a) APELADO: JANAINA RAQUEL FELICIANI DE MORAES - SP248170-N, VINICIUS CAMARGO LEAL - SP319409-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Tempestivo o apelo e presentes os demais requisitos de admissibilidade recursal. SALÁRIO-MATERNIDADE O salário-maternidade está previsto no art. 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988, nos arts. 71 a 73 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e nos arts. 93 a 103 do Decreto n.º 3.048, de 6 de maio de 1999, consistindo, segundo Sérgio Pinto Martins, "na remuneração paga pelo INSS à segurada gestante durante seu afastamento, de acordo com o período estabelecido por lei e mediante comprovação médica" (Direito da Seguridade Social. 19ª ed., São Paulo: Atlas, 2003, p. 387). O benefício é devido à segurada da Previdência Social durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, nos termos do art. 71, caput, da Lei nº 8.213/91. Depreende-se que para a concessão do referido benefício é necessário que a beneficiária possua a qualidade de segurada e comprove a maternidade. O artigo 71 da Lei Previdenciária, em sua redação original, apenas contemplava a empregada, urbana ou rural, a trabalhadora avulsa e a empregada doméstica como beneficiárias do salário-maternidade. Este rol foi acrescido da segurada especial pela Lei n.º 8.861, de 25 de março de 1994 e posteriormente, com a edição da Lei n.º 9.876, de 26 de novembro de 1999, foram contempladas as demais seguradas da Previdência Social. A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é: "denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente atendido pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão previdenciariamente cobertos." (Curso de Direito Previdenciário - Tomo II. 2ª ed., São Paulo: LTr, 1998, p. 626). Apenas as seguradas contribuintes individuais (autônomas, eventuais, empresárias etc.) devem comprovar o recolhimento de pelo menos 10 (dez) contribuições para a concessão do salário-maternidade. No caso de empregada rural ou urbana, trabalhadora avulsa e empregada doméstica tal benefício independe de carência. A trabalhadora em regime de economia familiar, considerada segurada especial, também não necessita comprovar o recolhimento de contribuições previdenciárias, bastando apenas demonstrar o exercício da referida atividade nos 12 (doze) meses anteriores ao início do benefício, ainda que de forma descontínua, nos termos do art. 39, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91. Neste sentido o entendimento de Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari: "Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de um salário-mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos doze meses imediatamente anteriores ao do início do benefício (artigo 39, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91). É que nem sempre há contribuição em todos os meses, continuamente, em função da atividade tipicamente sazonal do agricultor, do pecuarista, do pescador, e de outras categorias abrangidas pela hipótese legal." (Manual de Direito Previdenciário. 3ª ed., São Paulo; LTr, 2002, p. 390). DO CASO DOS AUTOS A autora pleiteia o recebimento do benefício de salário maternidade em face do nascimento da filha, Laiany Rafaelle da Luz, ocorrido em 03.07.18. A ocorrência do parto na data acima mencionada é fato incontroverso, suficientemente comprovado pela Certidão de Nascimento acostada aos autos (fls. 18, ID 304678224). O regime de economia familiar caracteriza-se quando os membros de uma família trabalham em dependência e colaboração mútua, objetivando a própria subsistência, conforme estabelece o art. 11, § 1°, da Lei 8.213/91: “§ 1° - Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria susbsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.” A fim de comprovar o labor rural, a autora juntou diversos documentos, dentre os quais destaco: Notas fiscais de produtor rural em nome do esposo dos anos de 2011 a 2014 e 2018 (fls. 61/112, id 304678231). Foram ouvidas testemunhas que afirmaram que a autora e o esposo desenvolvem atividade de natureza rural, com cadastro como pequeno Produtor Rural, desde o ano de 2007. Contudo, as notas fiscais de venda de mercadorias juntadas aos autos apresentam valores consideravelmente elevados e demonstram a comercialização de grande quantidade de produtos, o que é incompatível com a agricultura familiar de subsistência. O volume de produção é expressivo, como se verifica na competência de junho, com diversas vendas de valor alto (vide nota de fl.69, no valor de R$ 42.047,00), o que demonstra que o marido da autora é grande produtor rural. Ainda, no mês de 09/2018, há venda superior a R$ 15.000,00, de mais de 700 caixas de legumes, verduras e frutas, entre outros meses com faturamento acima de R$ 15.000,00. Os documentos juntados são apenas notas de produtor rural em nome do marido da autora dos quais não é possível comprovar a efetiva atividade em regime de economia familiar, senão descaracterizam o regime em questão, que exige trabalho familiar em auxílio mútuo para fins de subsistência. A descaracterização do regime de subsistência é corroborada pelo fato de o esposo da autora ser proprietário de um caminhão de grande porte, modelo VOLVO/VM 260, com grande capacidade de carregamento de mercadorias, outros dois caminhões (FORD/11000 e Mercedez Benz/ L 1113) e uma Pick-up de luxo VW - AMAROK CD 4x4 e uma moto (conforme relatório detalhado dos veículos anexado ao recurso do INSS). Desses fatos se infere que o esposo da autora é fazendeiro e não pequeno produtor rural em regime de economia familiar, de modo que, na verdade, ele e a autora devem efetuar recolhimentos previdenciários na qualidade de contribuinte individual, nos termos do art. 11, V, a, da Lei nº 8.213/91. Sobre o tema, confira-se: “PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR DESCARACTERIZADO. 1. Os documentos trazidos aos autos comprovam que a produção e comercialização agrícola da fazenda do autor, ora apelante excede em muito o indispensável ao seu sustento e de sua família, provavelmente, necessitando de auxílio de maquinário e operadores técnicos no manejo dessas máquinas, desvirtuando, portanto, os conceitos de segurado especial e o regime de economia familiar, constante do art. 11, inciso VII e §1º1 da Lei nº 8.213/91. 2. Descaracterizado, portanto, o regime de economia familiar, não se aplica, ao caso concreto, o entendimento consagrado no âmbito do REsp 1352721/SP, julgado sob a sistemática de recursos repetitivos. 3. Não comprovado o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, a improcedência da ação era de rigor. 4. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei, ficando sua exigibilidade condicionada à futura deliberação sobre o Tema nº 1.059/STJ, o que será examinado oportunamente pelo Juízo a quo. 5. Recurso desprovido, condenando a parte autora ao pagamento de honorários recursais, na forma delineada.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000699-04.2021.4.03.6125, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 05/07/2023, Intimação via sistema DATA: 06/07/2023) De todo o explanado, a improcedência do pedido é medida que se impõe. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00, a teor do disposto no art. 85, §8, do CPC/2015. DISPOSITIVO Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido, fixados os honorários advocatícios na forma acima fundamentada. É o voto.
E M E N T A
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO EM AÇÃO DE RITO COMUM. BENEFÍCIO DE SALÁRIO-MATERNIDADE. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
I. CASO EM EXAME
1 – Ação de rito comum objetivando a concessão do benefício de salário-maternidade.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. A questão em discussão consiste em saber se há prova do labor rural e caracterização de regime de economia familiar para fazer jus a autoria à concessão do benefício.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. O salário-maternidade está previsto no art. 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988, nos arts. 71 a 73 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e nos arts. 93 a 103 do Decreto n.º 3.048, de 6 de maio de 1999, consistindo no valor pago pelo INSS à segurada gestante durante seu afastamento, mediante comprovação médica, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, nos termos do art. 71, caput, da Lei nº 8.213/91.
4. O regime de economia familiar caracteriza-se quando os membros de uma família trabalham em dependência e colaboração mútua, objetivando a própria subsistência, conforme estabelece o art. da Lei 8.213/91.
4. Considerando o expressivo volume de produção e comercialização agrícola em valores elevados, tem-se que o esposo da autora é grande produtor rural, não se caracterizando para fins de concessão do benefício, a agricultar familiar de subsistência.
5. Condenado a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00.
IV. DISPOSITIVO E TESE
6. Apelação do INSS provida.
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Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.213/91, art. 11, § 1°.
Jurisprudência relevante citada: TRF 3ª/R, ApCiv 5000699-04.2021.4.03.6125, Rel. Des. Fed. Inês Virginia Prado Soares, 7ª Turma, j. 05/07/2023.