APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002239-25.2022.4.03.6005
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: LOCALIZA RENT A CAR SA
Advogado do(a) APELADO: LUIZ HENRIQUE NERY MASSARA - MG128362-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002239-25.2022.4.03.6005 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: LOCALIZA RENT A CAR SA Advogado do(a) APELADO: LUIZ HENRIQUE NERY MASSARA - MG128362-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto por UNIÃO FEDERAL, em face de sentença que julgou procedente o pedido, para decretar a nulidade de auto de infração que impôs pena de perdimento de veículo à apelada. Alega a apelante, em síntese, legalidade do auto de infração, nos termos do art. 95, inciso II e demais do Decreto-lei nº 37/1966. Com contrarrazões. É o relatório.
PROCURADOR: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002239-25.2022.4.03.6005 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: LOCALIZA RENT A CAR SA Advogado do(a) APELADO: LUIZ HENRIQUE NERY MASSARA - MG128362-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Trata-se na origem de ação anulatória de ato administrativo. A controvérsia recursal cinge-se à verificação da legalidade da imposição de pena de perdimento de bem, em relação a locadora de veículos. Pois bem. Realmente, a pena de perdimento de veículo é expressamente prevista pelo artigo 688 do Decreto nº 6.759/2009 nas seguintes hipóteses: Art. 688. Aplica-se a pena de perdimento do veículo nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário (Decreto-Lei no 37, de 1966, art. 104; Decreto-Lei no 1.455, de 1976, art. 24; e Lei no 10.833, de 2003, art. 75, § 4o): I - quando o veículo transportador estiver em situação ilegal, quanto às normas que o habilitem a exercer a navegação ou o transporte internacional correspondente à sua espécie; II - quando o veículo transportador efetuar operação de descarga de mercadoria estrangeira ou de carga de mercadoria nacional ou nacionalizada, fora do porto, do aeroporto ou de outro local para isso habilitado; III - quando a embarcação atracar a navio ou quando qualquer veículo, na zona primária, se colocar nas proximidades de outro, um deles procedente do exterior ou a ele destinado, de modo a tornar possível o transbordo de pessoa ou de carga, sem observância das normas legais e regulamentares; IV - quando a embarcação navegar dentro do porto, sem trazer escrito, em tipo destacado e em local visível do casco, seu nome de registro; V - quando o veículo conduzir mercadoria sujeita a perdimento, se pertencente ao responsável por infração punível com essa penalidade; VI - quando o veículo terrestre utilizado no trânsito de mercadoria estrangeira for desviado de sua rota legal sem motivo justificado; e VII - quando o veículo for considerado abandonado pelo decurso do prazo referido no art. 648. No caso, a proprietária do veículo é empresa locadora, tendo sido contratado por terceiro para, tão somente, proceder à locação do automóvel, não tendo ficado comprovado nos autos a sua participação na conduta lesiva, tampouco a ciência do conteúdo ilícito a ser transportado no automóvel. Não há de se falar em sanção administrativa de perdimento, se não apurada a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito penal de contrabando, em processo regular, com observância dos direitos constitucionais de ampla defesa e contraditório. Portanto, de ser observado o disposto no § 2º do citado artigo 617 do Regulamento Aduaneiro: § 2º Para efeitos de aplicação do perdimento do veículo, na hipótese do inciso V, deverá ser demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito. Sem dúvida, nos termos da legislação, verifica-se a necessidade do Poder Público em comprovar que o proprietário do veículo apreendido tenha agido com má-fé. Tal condição é pressuposto para a aplicação da pena de perdimento, consoante estabelecido pelo verbete da Súmula 138 do extinto TRF, in verbis: "A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade de seu proprietário na prática do ilícito." Ressalte-se, outrossim, consistir a pena de perdimento na restrição ao direito de propriedade do particular, protegido constitucionalmente, não podendo ser admitidos excessos na sua aplicação, havendo a necessidade da apuração da presença do dolo no comportamento do transportador. Não basta a mera responsabilização por culpa in elegendo ou in vigilando, ou seja, imprescindível a comprovação da intenção do proprietário do veículo em participar na prática do ilícito. Até mesmo porque, pela documentação juntada aos autos, restou por comprovada a conduta, não tendo a apelada participado do ilícito como coautora, sendo, conforme já dito, tão somente, proprietária do veículo em questão. Tal premissa vai ao encontro da pacificada jurisprudência no sentido de que a aplicação da pena de perdimento do veículo só é possível quando comprovada a responsabilidade do proprietário, senão veja: DIREITO ADMINISTRATIVO. ADUANEIRO. APELAÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO. PENA DE PERDIMENTO. VEÍCULO UTILIZADO PARA CRIME DE CONTRABANDO E DESCAMINHO. VEÍCULO ALUGADO. LOCADORA NÃO PODE SE PUNIDA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. Trata-se de reexame necessário e recurso de apelação interposto pela UNIÃO (FAZENDA NACIONAL) em face da r. sentença de fls. 121/127 que, em autos de ação ordinária de anulação de atos administrativos com pedido de antecipação de tutela, julgou procedente o pedido da autora, para declarar nulo o ato de perdimento do veículo Ford/Focus 2L Flex, placas AUF-3175, Renavam nº 33.668800-8 e condenar a ré a pagar a indenização por perdas e danos à parte autora, na quantia de R$ 28.000,00 (vinte e oito mil reais), com correção e com juros de mora nos termos do Decreto-Lei nº 1.455/76 e do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Houve ainda a condenação da ré ao pagamento de honorários advocatícios, que foram fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC. 2. Como cediço, no bojo da legislação aduaneira há previsão de vários tipos de sanção, dentre as quais a de perdimento de bens prevista expressamente nos Decretos-Lei nº 37/66 e 1.455/76. 3. In casu, a apelada, que é empresa atuante na atividade comercial de locação de veículos, locou o veículo Ford/Focus 2L Flex, placas AUF-3175, Renavam nº 33.668.800-8, em 06/10/2011, para Jefferson Rodrigues. No entanto, em 17/04/2013, a Polícia Rodoviária Federal, realizando patrulhamento de rotina, apreendeu o veículo descrito acima com mercadoria estrangeira - cigarros, charutos ou fumo - desprovida de documentação comprobatória de introdução regular no país (auto de infração nº 0140100/EFA000663/2012), culminando na apreensão do veículo para futura pena de perdimento. 4. Pela simples leitura dos autos percebe-se que a destinação dada ao veículo não era de conhecimento da apelada e, justamente por isso, não pode a ela ser imputada pena tão grave como o é a de perdimento do bem. 5. Não se pode punir o locador do veículo, pessoa jurídica regularmente constituída para esse fim, por, no exercício de sua atividade empresarial, ter firmado contrato de locação com pessoa cuja finalidade, desconhecida, era espúria. Ainda que se diga que a empresa assume o risco da atividade econômica que ela exerce, há de haver razoabilidade no que se insere no conceito de risco. 6. Ademais, a proprietária do veículo sequer foi mencionada no procedimento que apura os fatos aparentemente praticados pelo locatário do veículo; e não foi mencionada porque nem comunicada do ocorrido, tanto que no momento da propositura da ação a destinação/leilão do veículo já havia ocorrido. Ou seja, a apelada não foi acusada de nada, não há prova de qualquer ato ilícito por ela cometido, não participou de qualquer processo administrativo com contraditório e da ampla defesa, mas foi, ao fim, punida sob o simples argumento da desnecessidade de perquirir se o proprietário do veículo está ou não de má-fé. 7. A jurisprudência, para respaldar a aplicação da pena de perdimento, exige que esteja comprovada, na infração imputada, a responsabilidade e má-fé do proprietário do veículo. Assim, cabe ao Fisco provar que teve o proprietário do veículo transportador responsabilidade diante do ato praticado pelo motorista, provar que agiu em conluio, com má-fé, que se aproveitou ou consentiu com o proveito que este teve da atividade ilícita exercida. 8. Reexame necessário não provido. 9. Apelação a que se nega provimento." (TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2256370 - 0001198-70.2015.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, julgado em 06/12/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/12/2017). Efetivamente, não comporta qualquer alteração a r. sentença de primeiro grau, pela qual restou julgado procedente o pedido e afastada a pena de perdimento do veículo em questão. Em razão da sucumbência recursal, majoro em 1% o percentual relativo aos honorários advocatícios, nos termos do art. 85, do CPC. Ante o exposto, nego provimento à apelação, nos termos da fundamentação. É o meu voto.
PROCURADOR: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
E M E N T A
APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. ADUANEIRO. VEÍCULO UTILIZADO NA PRÁTICA DE CONTRABANDO. APLICAÇÃO DE PENA DE PERDIMENTO. NÃO PARTICIPAÇÃO DO PROPRIETÁRIO NO ILÍCITO. LOCADORA. ILEGITIMIDADE DA PENA. VERBETE 138 DO TFR. RECURSO NÃO PROVIDO.
- A pena de perdimento de veículo é expressamente prevista pelo artigo 688 do Decreto nº 6.759/2009.
- No caso, a proprietária do veículo é empresa locadora, tendo sido contratado por terceiro para, tão somente, proceder à locação do automóvel, não tendo ficado comprovado nos autos a sua participação na conduta lesiva, tampouco a ciência do conteúdo ilícito a ser transportado no automóvel.
- Não há de se falar em sanção administrativa de perdimento, se não apurada a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito penal de contrabando, em processo regular, com observância dos direitos constitucionais de ampla defesa e contraditório.
- De ser observado o disposto no § 2º do citado artigo 617 do Regulamento Aduaneiro: § 2º Para efeitos de aplicação do perdimento do veículo, na hipótese do inciso V, deverá ser demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito.
- Sem dúvida, nos termos da legislação, verifica-se a necessidade do Poder Público em comprovar que o proprietário do veículo apreendido tenha agido com má-fé. Tal condição é pressuposto para a aplicação da pena de perdimento, consoante estabelecido pelo verbete da Súmula 138 do extinto TRF in verbis: "A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade de seu proprietário na prática do ilícito."
- Recurso não provido.