Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5081357-28.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES

APELANTE: ALINE FISCARELLI GAMBERO

Advogado do(a) APELANTE: HENRIQUE CUENCA SEGALA - SP408643-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5081357-28.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES

APELANTE: ALINE FISCARELLI GAMBERO

Advogado do(a) APELANTE: HENRIQUE CUENCA SEGALA - SP408643-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de ação ajuizada em 22/09/2022, que tem por objeto a concessão de aposentadoria por invalidez ou o restabelecimento auxílio-doença, a partir da cessação administrativa de benefício por incapacidade anterior (03/03/2022).

O feito foi sentenciado em 21/02/2024. O pedido foi julgado improcedente, porque não percebida na autora incapacidade para o trabalho.

A requerente interpôs apelação. Nas razões desfiadas, requer a reforma do julgado, reiterando a gravidade das patologias cardíacas que a assolam, absolutamente impeditivas do trabalho. Sustenta que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial, de modo que pode  considerar outras provas constantes dos autos. Esteada nisso, pleiteia a reforma do julgado para obter do instituto previdenciário aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.

Sem contrarrazões, os autos acederam a esta Corte.

É o relatório. 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5081357-28.2024.4.03.9999

RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES

APELANTE: ALINE FISCARELLI GAMBERO

Advogado do(a) APELANTE: HENRIQUE CUENCA SEGALA - SP408643-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

Percebo que a autora, nascida em 30/07/1992 (ID 294675584 – Pág. 1), esteve em gozo de auxílios-doença previdenciários nos períodos de 11/12/2015 a 12/02/2016, de 03/09/2016 a 04/12/2016, de 19/01/2017 a 30/01/2017 e de 23/07/2019 a 03/03/2022, este último concedido em razão de ação judicial (AC nº 5004217-20.2021.4.03.9999 -- processo de origem nº 0801673-49.2019.8.12.0024) (ID’s 294675587 e 294675596 e consulta atualizada ao CNIS).

Aludidos benefícios por incapacidade foram concedidos em razão das seguintes enfermidades: insuficiência cardíaca (CID I50), doenças reumáticas da valva mitral (CID I05), síncope e colapso (CID R55) e insuficiência da valva mitral (CID I340) (ID 294675595 – Págs. 1/6 e consulta aos laudos médicos do sistema SAT Central).

Requerimento de prorrogação do benefício, formulado em 17/01/2022 (ID 294675587), não foi acolhido,  porquanto não constatada a persistência da incapacidade em exame médico realizado pelo  INSS (consulta ao SAT Central).

À cata de benefício por incapacidade, a autora intentou a presente ação em 22/09/2022.

Em suas dobras, observado o devido processo legal, exame médico-pericial foi elaborado em 27/01/2023, pelo doutor Fábio da Hora Silva, ginecologista e obstetra (ID 294675620).

Os achados revelam que a autora – auxiliar de produção, com escolaridade correspondente ao  segundo grau incompleto – acusa ou apresentou  estenose mitral (CID I05), síncope e colapso (CID R55), insuficiência cardíaca (CID I50) e infarto agudo do miocárdio (CID I21.9).

No corpo do laudo, expôs o  senhor Louvado: “Mediante avaliação da autora Sr(a). Aline Fiscarelli Gambero Borges, portadora de doença cardíaca ano de 2016, tendo passado por tratamento cirúrgico comissurotomia mitral e papilotomia anterior e posterior com sucesso, estando autora clinicamente estável em tratamento medicamentoso, negou agenda de cirurgia. EF: ausência de agravos clínicos e ortopédicos, com redução da capacidade física funcional para atividades com grandes esforços; em atual perícia não foi constatado incapacidade para o trabalho ou atividade habitual (ID 294675620 – Pág. 4).

Em contraponto, a autora trouxe a lume relatórios médicos, emitidos por especialista em Cardiologia, passados em 24/03/2020 e 02/03/2022 (ID 294675589 – Págs. 1/2). Os documentos revelam que a autora “foi submetida a cirurgia cardíaca de comissurotomia mitral e papilostomia anterior e posterior. Apresenta refluxo v. aórtico de grau moderado, estenose mitral de grau moderado e aumento do átrio esquerdo. Está sob tratamento medicamentoso e não possui capacidade laborativa por tempo indeterminado.

Por sua vez, na perícia judicial do feito da AC nº 5004217-20.2021.4.03.9999 (processo de origem nº 0801673-49.2019.8.12.0024), realizada em 22/09/2020, o senhor Perito atestou: “(...) a Autora passou por tratamento cardiocirúrgico, mas não houve indicação de troca de válvula mitral da pericianda, com realização de comissurotomia (abertura da válvula) anterior e posterior. A autora informa sintomas de comprometimento valvar, com dispnéia aos grandes esforços. A autora não faz uso de medicamentos específicos para insuficiência cardíaca, estando em uso regular de Slozok e AAS infantil. O exame de edodopplercardiograma (fls. 30/31), datado de 09/08/2018, informa fração de ejeção de 67%, evidenciando boa contratilidade cardíaca (normal) e comprometimento valvular mínimo (insuficiência aórtica discreta e estenose valvar mitral discreta). Não há qualquer indicação de hipertensão pulmonar no exame. Salienta-se que houve uma recuperação da função cardíaca global de grau importante, com alguns sintomas residuais. A autora atualmente apresenta sinais discretos de comprometimento valvar, com dispneia aos grandes esforços. A Autora, no momento, não apresenta sintomas ou sinais importantes de insuficiência cardíaca. Portanto, a Autora pode realizar atividade física leve e leve moderada. Está contra-indicado o exercício de trabalho com carregamento de peso e esforços físicos moderados e intensos”. Tachou a incapacidade de parcial e permanente, motivo pelo qual à autora foi deferido  auxílio-doença (ID 294675590 e consulta ao PJe de segundo grau).

Em consulta ao sistema SAT Central, verifico que a autora não foi submetida a processo de reabilitação profissional após a concessão do último auxílio-doença deferido judicialmente.

 Não custa remarcar que os auxílios-doença concedidos nos períodos de 11/12/2015 a 12/02/2016, 03/09/2016 a 04/12/2016, 19/01/2017 a 30/01/2017 e 23/07/2019 a 03/03/2022, foram todos em decorrência de problemas cardíacos que na autora se infiltraram.

Segundo o CNIS atualizado, verifico que após a cessação do auxílio-doença em 03/03/2022, a autora tornou a exercer atividade laborativa como auxiliar de produção na empresa “GALA – IBB Indústria Brasileira de Brinquedos e Embalagens Ltda”, no período de 19/06/2024 a 08/10/2024, a corroborar  que permaneceu na mesma ocupação e não foi reabilitada para outra atividade profissional.

Mesmo em meio a esses elementos em importante medida descoincidentes, o nobre juiz de origem proferiu desde logo sentença. Julgou improcedente o pedido, ao fundamento de ausência de incapacidade laborativa.

Entretanto, a concessão do benefício de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação da (in)capacidade do segurado para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.

Na hipótese, porque a prova dos fatos debatidos na lide dependia de conhecimento técnico, o juiz -- que deles não dispõe -- faz-se assistir por especialista.

O direito à prova pericial regularmente produzida é corolário do devido processo legal, direito inarredável à justa solução do litígio.

O artigo 465 do CPC preceitua: "O juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de imediato o prazo para a entrega do laudo".

Recurso a especialista é deveras necessário, quando se trata de esclarecer questões técnicas determinantes para o julgamento da causa. 

Na espécie,  sopesados os elementos carreados aos autos, impõe-se a realização de nova perícia por médico cardiologista,  especialista na patologia alegada pela autora,  em ordem a bem  instruir a demanda e municiar o juiz de elementos seguros à construção da decisão a ser proferida.

Nesse sentido:

“CONSTITUCIONAL. SEGURIDADE SOCIAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. BPC-LOAS. ART. 203, V, CF/88. LEI N. 8.742/93. NECESSIDADE DE PERÍCIA MÉDICA. LAUDO INSUFICIENTE. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE. APELO DA PARTE AUTORA PROVIDO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.

- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou ao idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

- Necessidade de prova pericial, a fim de que se comprove o preenchimento dos requisitos legais exigidos para a concessão do BPC-LOAS.

- O laudo médico pericial juntado aos autos não se mostrou suficiente para auxiliar esta Relatora na convicção dos fatos alegados, havendo necessidade de realização de uma nova perícia, para que as doenças apontadas pela parte autora nas suas peças sejam investigadas e as dúvidas a respeito da incapacidade dirimidas.

- O julgamento da lide, sem a realização de nova perícia, requerida pela parte autora de forma expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88).

- Apelo da parte autora provido. Sentença desconstituída” (AC nº 5496053-77.2019.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Cristina Melo, j. 13/02/2024, intimação via sistema 16/02/2024).

“DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA/APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. PRELIMINAR ACOLHIDA. NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA.  NECESSIDADE DE COMPLEMENTAÇÃO DO LAUDO PERICIAL. RECURSO PREJUDICADO NO MÉRITO.

- Na r. sentença foi julgado improcedente o pedido inicial, embasada na conclusão do laudo pericial, que não constatou a existência de incapacidade laboral. 

- Verifica-se que a perita é médica especialista em clínica geral, e concluiu pela ausência de incapacidade laborativa da parte autora, portadora de patologias psiquiátricas, cabendo salientar que tal conclusão não se coaduna aos documentos apresentados, que informam a existência de incapacidade laboral em razão dessas afecções.

- No entanto, apesar dos documentos médicos particulares da parte autora evidenciarem uma suposta incapacidade laborativa, vale destacar que a perícia administrativa realizada pela autarquia federal atesta a ausência de incapacidade laboral, de modo que se mostra necessária a realização de nova perícia judicial, a fim de se confirmar, ou não, a existência de incapacidade laborativa do requerente.

- Assim, para verificação do preenchimento do requisito incapacidade laboral, carecem estes autos da devida instrução em primeira instância, uma vez que a sentença apreciou o pedido inicial sem a necessária complementação do laudo pericial, o que implica cerceamento de defesa e enseja a nulidade do feito.

- Preliminar acolhida. Apelação da parte autora prejudicada no mérito” (AC nº 5002184-86.2023.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Gilberto Jordan, j. 1º/06/2023, DJEN 07/06/2023).

De rigor, assim, a anulação da sentença proferida, com o retorno dos autos à vara de origem para a regular instrução do feito.

Ante o exposto, de ofício, anulo a sentença, com vistas a viabilizar perícia por médico capaz de avaliar a autora sob o prisma cardiológico,   julgando  prejudicada a apelação da autora, na forma da fundamentação.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PROVA PERICIAL NÃO CONCLUÍDA.  SENTENÇA ANULADA.

- A autora, auxiliar de produção e portadora de patologias cardíacas, alega estar total e permanentemente incapacitada para o labor.

-  A conclusão do laudo pericial emitido por médico Ginecologista e Obstetra está discrepante de documentos médicos juntados pela autora, passados por especialista, embora não se controverta sobre a existência das enfermidades.

- Não custa remarcar que os auxílios-doença concedidos nos períodos de 11/12/2015 a 12/02/2016, de 03/09/2016 a 04/12/2016, de 19/01/2017 a 30/01/2017 e de 23/07/2019 a 03/03/2022, deveram-se todos a  problemas cardíacos que acometeram a autora.

- O MM. julgou improcedente o pedido em face da ausência de incapacidade laborativa, entendendo desnecessária a realização de complementação da perícia médica.

- Prova pericial realizada, a qual, entretanto, carece de aprofundamento.

- De ofício, promove-se a anulação da sentença proferida. Retorno  dos autos à vara de origem para regular instrução e novo julgamento.

- Apelação da autora prejudicada.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, anular a sentença, com vistas a viabilizar perícia por médico capaz de avaliar a autora sob o prisma cardiológico, e julgar prejudicada a apelação da autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
VANESSA MELLO
JUÍZA FEDERAL CONVOCADA