APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002895-09.2018.4.03.6102
RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, OPERAÇÃO CINDERELA
APELADO: AGDA DIAS DA SILVA, ALEXANDRE FERREIRA DA COSTA, ANA PAULA OLIVEIRA BORGES DA SILVEIRA, ANTONIO ALENISIO DA SILVA, ARTUR PEREIRA CERQUEIRA, FELIPE SABINO DE FREITAS FELICIANO, MAURICIO ALVES DE OLIVEIRA, AGATHA VITORIA DIAS DA SILVA, RENAN LOPES CAMARGOS
Advogado do(a) APELADO: LUIS FELIPE RIZZI PERRONE - SP464876-A
Advogado do(a) APELADO: SANDRA DE MORAES PEPORINI - SP190331-A
Advogado do(a) APELADO: SANTA APARECIDA RAMOS NOGUEIRA - SP129860-A
Advogado do(a) APELADO: HAMILTON PAULINO PEREIRA JUNIOR - SP126874-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANO DIOGENES ZANARDO MATIAS - SP207786-A
Advogados do(a) APELADO: KARINA MAGALHAES ZACARIAS SANTOS - SP312640-A, PRISCILA MAGALHAES ZACARIAS SANTOS - SP312665-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002895-09.2018.4.03.6102 RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, OPERAÇÃO CINDERELA APELADO: AGDA DIAS DA SILVA, ALEXANDRE FERREIRA DA COSTA, ANA PAULA OLIVEIRA BORGES DA SILVEIRA, ANTONIO ALENISIO DA SILVA, ARTUR PEREIRA CERQUEIRA, FELIPE SABINO DE FREITAS FELICIANO, MAURICIO ALVES DE OLIVEIRA, AGATHA VITORIA DIAS DA SILVA, RENAN LOPES CAMARGOS Advogado do(a) APELADO: LUIS FELIPE RIZZI PERRONE - SP464876-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: Trata-se de embargos de declaração, opostos NICOLY CASTRO (representada pela d. Defensoria Pública da União) contra o v. acórdão de ID 296407413, cuja ementa transcrevo: DIREITO PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ORGANIZAÇÃO CRIMINAL. RUFIANISMO QUALIFICADO. TRÁFICO DE PESSOAS. EXPLORAÇÃO. REDUÇÃO A CONDIÇÃO ANÁLOGA À ESCRAVIDÃO. PROCEDÊNCIA PARCIAL DAS IMPUTAÇÕES. RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. Tendo a denúncia e seu aditamento descrito suficientemente o contexto fático em seus caracteres objetivos e subjetivos, e presentes elementos iniciais sólidos e hígidos de materialidade e autoria, deve ser reconhecida a aptidão da denúncia e seu lastro probatório (justa causa para instauração de ação penal), tratando-se, os demais desenvolvimentos, de matéria atinente ao mérito. 2. Rejeitada preliminar de nulidade de interceptações telefônicas. Autorização judicial fundamentada e baseada em elementos iniciais idôneos. 2.1 Não é necessária, à validade ou à avaliação da prova, que seja feita perícia de voz a partir do teor das interceptações, mormente quanto ausente qualquer dado concreto que coloque em dúvida a autoria das comunicações. 2.2 Inexiste determinação normativa no sentido de ser necessária a degravação completa do conteúdo das interceptações, bastando a garantia de acesso integral dos arquivos à defesa, o que se deu. Questão pacífica na jurisprudência. 3. Não há pertinência nas discussões levantadas acerca de suposta quebra de cadeira de custódia. Não apenas as diligências foram feitas anteriormente à Lei 13.964/2019, como não há nenhum indicativo (ou argumento concreto) no sentido de uma eventual malversação na produção ou acondicionamento de elementos probatórios. Rejeitada a preliminar. 4. Tráfico de pessoas com finalidade de exploração sexual (Código Penal, art. 149-A, caput e inciso V). Não comprovação. Provas de materialidade insuficientes. 5. Rufianismo qualificado (Código Penal, art. 230, § 2º). Comprovação quanto a parte dos acusados. Desclassificação da conduta de uma das rés para a figura do rufianismo simples (Código Penal, art. 230, caput). 6. Redução a condição análoga à escravidão (Código Penal, art. 149). Inviabilidade de acolhimento no contexto concreto, sob pena de bin in idem. A redução a condições análogas à escravidão, para ocorrer em concreto, teria que advir de condutas e situações que, ainda que coligadas ou relacionadas faticamente a isso, expressassem alguma objetividade própria, irredutível ao exato escopo lesivo que caracteriza o rufianismo qualificado. Não se confunda isso com a ocorrência de concurso formal. Neste, há um mesmo ato (simples ou complexo) que gera dois resultados distintos, duas objetividades lesivas identificáveis e independentes entre si. Diversamente, no bis in idem, há dupla punição por uma mesma lesividade, uma mesma ação, guiada por uma só finalidade. É o que ocorreria aqui se aceita a tese ministerial à luz do quadro fático provado nesta ação, o que o ordenamento pátrio veda. 7. Organização criminosa (Lei 12.850/13, art. 2º). Comprovação de materialidade e autoria com relação a quatro acusados. 8. Recurso ministerial acolhido em parte. Nas razões recursais (ID 302427637), alega-se, em suma, haver omissão no aresto, pelo seguinte: Trata-se da primeira decisão condenatória nos autos, de modo que é necessário que essa E. Turma se pronuncie sobre o direito ao recurso defensivo amplo contra acórdão que inaugura condenação, consoante jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Como forma de se garantir a ampla defesa e o devido processo legal àqueles que foram absolvidos em primeira instância, é necessário que, contra acórdão condenatório seja admissível o cabimento de recurso da defesa, com os mesmos amplos pressupostos de cabimento e de devolutividade do recurso de apelação, nos termos do art. 599 do CPP, do art. 8.2.h da CADH e da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que, em mais de uma oportunidade, decidiu que o referido dispositivo convencional inclui o direito do réu, condenado somente após recurso acusatório, de recorrer, de forma ampla, contra tal decisão condenatória. [...] No plano constitucional de proteção dos direitos humanos, temos que a mesma extensão do direito ao recurso do art. 8.2.h da CADH encontra amparo no art. 5º, LV, da CF, que, por força do §2º do mesmo artigo, também deve servir de fundamento para impugnação ampla de condenação criminal inaugural em segunda instância. Nesses termos, requer-se o pronunciamento desse E. Tribunal sobre o tratado internacional assinado e ratificado pela República Federativa do Brasil (Decreto nº 678/92), bem como acerca do art. 5º, LV, da CF, e § 2º. Com base nisso, “requer-se sejam conhecidos e acolhidos os presentes embargos de declaração, para fins de prequestionamento, pronunciando-se essa E. Turma acerca das normas acima indicadas.” A Procuradoria Regional da República se manifestou pelo acolhimento dos declaratórios (ID 308063358). É o relatório. Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
Advogado do(a) APELADO: SANDRA DE MORAES PEPORINI - SP190331-A
Advogado do(a) APELADO: SANTA APARECIDA RAMOS NOGUEIRA - SP129860-A
Advogado do(a) APELADO: HAMILTON PAULINO PEREIRA JUNIOR - SP126874-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANO DIOGENES ZANARDO MATIAS - SP207786-A
Advogados do(a) APELADO: KARINA MAGALHAES ZACARIAS SANTOS - SP312640-A, PRISCILA MAGALHAES ZACARIAS SANTOS - SP312665-A
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002895-09.2018.4.03.6102 RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, OPERAÇÃO CINDERELA APELADO: AGDA DIAS DA SILVA, ALEXANDRE FERREIRA DA COSTA, ANA PAULA OLIVEIRA BORGES DA SILVEIRA, ANTONIO ALENISIO DA SILVA, ARTUR PEREIRA CERQUEIRA, FELIPE SABINO DE FREITAS FELICIANO, MAURICIO ALVES DE OLIVEIRA, AGATHA VITORIA DIAS DA SILVA, RENAN LOPES CAMARGOS Advogado do(a) APELADO: LUIS FELIPE RIZZI PERRONE - SP464876-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso, e passo a seu exame. Os embargos não devem ser providos, porquanto ausente a omissão neles aventada, como passo a expor. O que se traz nestes declaratórios envolve interessante tese acerca da extensão da garantia do duplo grau de jurisdição e seus contornos, à luz do disposto no art. 8.2.h da Convenção Americana de Direitos Humanos, internalizada no ordenamento brasileiro pelo Decreto 678/92. É indiscutível que se trata de norma de alta relevância, cujo status formal é o de norma supralegal, conforme pacificado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acerca da natureza dos tratados internacionais de direitos humanos em nosso sistema normativo. Não obstante, inexiste qualquer omissão sobre o tema no julgado. Há duas razões para essa constatação. A primeira é que o tratamento de eventuais possibilidades recursais futuras não se encontra no escopo de uma decisão judicial. Independentemente de recursos serem cabíveis ou não, não cabe ao órgão julgador listá-los de antemão. Uma decisão deve fundamentar as razões da conclusão nela contida e demais providências pertinentes. As atitudes passíveis de adoção pelas partes é tema que escapa a uma decisão, inclusive porque a análise a respeito deverá ser realizada se e quando a parte promovê-las. A segunda diz com a própria competência para exame acerca do cabimento de um recurso. Em muitos casos, a admissibilidade inicial de um recurso não compete ao órgão julgador. Cito exemplos pertinentes ao segundo grau de jurisdição na esfera penal. Os recursos especial e extraordinário têm seu exame de admissibilidade iniciado na Vice-Presidência deste Tribunal (com eventual recurso aos Tribunais Superiores em caso de negativa de seguimento), não cabendo às Turmas julgadoras proferir entendimento prévio a respeito. No caso dos embargos infringentes, embora o Relator do acórdão embargado possa reconhecer eventual causa de indeferimento processual prima facie, eventual agravo movido pela parte contra isso terá a Quarta Seção como órgão competente para apreciação (RITRF3, art. 266, caput e § 1º). Portanto, em nenhum dos casos é atribuição jurídica da Turma que julgou uma apelação criminal analisar previamente o cabimento de um recurso, ou afirmar sua possibilidade. Isso implicaria invasão da esfera de competência de outros órgãos jurisdicionais (seja no âmbito desta Corte, seja dos E. Tribunais Superiores). De resto, a análise inicial por parte do Relator do aresto embargado pressupõe a interposição dos infringentes, não podendo precedê-la. Vistas essas razões, conclui-se não ter havido omissão deste colegiado em relação a tema que devesse constar do julgado, posto que a menção a possibilidades recursais futuras não compõe a fundamentação necessária de uma decisão, nem tampouco caberia a esta Turma afirmar uma tal possibilidade de ação da parte, sob pena de invadir competência de admissibilidade de outros órgãos jurisdicionais. No caso dos embargos infringentes, como cogita a d. Procuradoria Regional da República em sua manifestação (ID 308063358), estar-se-ia a impor um juízo de admissibilidade prévio, sem a interposição do próprio recurso e sem que a Quarta Seção tenha se manifestado a respeito. Acrescento, por fim, que não houve qualquer negativa de vigência a disposições da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ante a garantia dos direitos fundamentais dos acusados e a análise jurídica de recurso do Ministério Público pelo órgão competente do Poder Judiciário (esta Décima Primeira Turma, tendo em vista a distribuição do feito, por sorteio, à minha Relatoria). O eventual manejo de recursos contra o acórdão constitui iniciativa voluntária da parte, cabendo ao Estado-Juiz – por meio do órgão competente para tanto em cada hipótese, nos termos do ordenamento - a análise de admissibilidade quando provocado pela iniciativa do recorrente. Nesses termos, rejeito a tese recursal. Inexistem outras alegações; tampouco constato, de ofício, omissões, obscuridades, ambiguidades ou contradição no julgado. Sem que sejam adequadamente demonstrados quaisquer dos vícios elencados no artigo 619 do Código de Processo Penal, não devem ser providos os embargos de declaração, que não se prestam a veicular simples inconformismo com o julgamento, nem têm, em regra, efeito infringente. Quanto ao mais, não devem prosperar os embargos nem sequer para fins exclusivos de prequestionamento, visto que, mesmo que tenham tal objetivo, os embargos devem antes ser passíveis de acolhida, é dizer, deve haver a constatação de que há omissão, obscuridade, ambiguidade ou contradição na decisão (ou ainda, erro material relevante). Ante o exposto, conheço dos embargos de declaração, e nego-lhes provimento. É como voto.
Advogado do(a) APELADO: SANDRA DE MORAES PEPORINI - SP190331-A
Advogado do(a) APELADO: SANTA APARECIDA RAMOS NOGUEIRA - SP129860-A
Advogado do(a) APELADO: HAMILTON PAULINO PEREIRA JUNIOR - SP126874-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANO DIOGENES ZANARDO MATIAS - SP207786-A
Advogados do(a) APELADO: KARINA MAGALHAES ZACARIAS SANTOS - SP312640-A, PRISCILA MAGALHAES ZACARIAS SANTOS - SP312665-A
E M E N T A
PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. EMBARGOS REJEITADOS.
1. Embargos de declaração em que se alega omissão do acórdão objeto do recurso. Tese relativa às possibilidades recursais em caso de condenação em segundo grau que modifique sentença absolutória (acolhendo recurso do Ministério Público). Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), art. 8, 2, h.
2. Inexiste qualquer omissão sobre o tema no julgado. Há duas razões para essa constatação.
3. A primeira é que o tratamento de eventuais possibilidades recursais futuras não se encontra no escopo de uma decisão judicial. As atitudes passíveis de adoção pelas partes é tema que escapa a um édito, inclusive porque a análise a respeito deverá ser realizada se e quando a parte intentar eventual recurso.
4. A segunda diz com a própria competência para exame acerca do cabimento de um recurso. Seja nos recursos especial e extraordinário, seja nos embargos infringentes, o órgão competente para exame de admissibilidade não é a Turma responsável pelo julgamento da apelação.
5. Sem que sejam adequadamente demonstrados quaisquer dos vícios elencados no artigo 619 do Código de Processo Penal, não devem ser providos os embargos de declaração, nem mesmo para fins exclusivos de prequestionamento, visto que, mesmo que tenham tal objetivo, os embargos devem antes ser passíveis de acolhida, é dizer, deve haver a constatação de que há omissão, obscuridade, ambiguidade ou contradição na decisão (ou ainda, erro material relevante).
6. Recurso desprovido.