RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000858-41.2022.4.03.6341
RELATOR: 7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: JOSE CARLOS RIBEIRO DE MELLO
Advogado do(a) RECORRENTE: FELIPE BARBOSA LORIAGA LEAO - SP351128-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000858-41.2022.4.03.6341 RELATOR: 7º Juiz Federal da 3ª TR SP RECORRENTE: JOSE CARLOS RIBEIRO DE MELLO Advogado do(a) RECORRENTE: FELIPE BARBOSA LORIAGA LEAO - SP351128-N RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora contra sentença que julgou extinto o processo sem resolução do mérito quanto ao período de labor rural (11/09/1976 a 04/12/1988) por ausência de início de prova material, e improcedente o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição. O recorrente alega que: a) houve cerceamento de defesa pela não realização de audiência para comprovar o labor rural, havendo documentos suficientes como início de prova material; b) subsidiariamente, pede a reafirmação da DER para a data em que implementou os requisitos para aposentadoria conforme art. 17 da EC 103/2019. Quanto ao período rural, afirma ter apresentado como início de prova material: certidão de nascimento do irmão (1957), sua própria certidão (1964) e da irmã (1973), em que consta a profissão do pai como lavrador; autorização para talão de notas de produtor rural do genitor (1981); e filiação sindical rural em 1988. Sem contrarrazões. É o relatório.
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000858-41.2022.4.03.6341 RELATOR: 7º Juiz Federal da 3ª TR SP RECORRENTE: JOSE CARLOS RIBEIRO DE MELLO Advogado do(a) RECORRENTE: FELIPE BARBOSA LORIAGA LEAO - SP351128-N RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O No presente caso, a questão recursal controvertida diz respeito ao reconhecimento, para efeitos previdenciários, do período de trabalho rural de 11/09/1976 a 04/12/1988. Também há o pedido subsidiário de reafirmação da DER. A sentença extinguiu sem resolução do mérito o pedido de reconhecimento da atividade rural, por ausência de início de prova material. O recurso merece parcial provimento. O período é anterior a 1º de janeiro de 2023, de modo que, a partir da interpretação da Lei nº 13.846/2019, que incluiu os arts. 38-A e 38-B na Lei nº 8.213/1991 e deu nova redação ao art. 55, § 3º, da última lei, a prova testemunhal, embora não exclusivamente, é meio pertinente para, juntamente com a prova documental, comprovar o tempo de serviço rural. A jurisprudência do STJ firmou orientação de que o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/91, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo, inclusive que estejam em nome de membros do grupo familiar ou ex-patrão. Nesse sentido, a tese fixada pela TNU no julgamento do Tema 18 (PEDILEF 2009.71.95.000509-1/RS): A certidão do INCRA ou outro documento que comprove propriedade de imóvel em nome de integrantes do grupo familiar do segurado é razoável início de prova material da condição de segurado especial para fins de aposentadoria rural por idade, inclusive dos períodos trabalhados a partir dos 12 anos de idade, antes da publicação da Lei n. 8.213/91. Desnecessidade de comprovação de todo o período de carência. Ainda, segundo o STJ, início de prova material não se confunde com prova plena: deve ser interpretado como meros indícios que podem ser complementados com os depoimentos testemunhais. Convém registrar, na mesma direção, o esclarecimento do conceito de início de prova material, feito pela TNU no PEDILEF nº 2007.70.63.00.0210-9: [...] Assim sendo, impende verificar o que significa a exigência de início de prova material contida no § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 para que a comprovação de tempo de serviço, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, gere os efeitos nela previstos, exigência reconhecida como legítima, aliás, no enunciado da Súmula n° 149 do STJ. Como início de prova material, sem dúvida, se incluem todas as modalidades de prova material direta, como aquelas relativas ao exercício mesmo de atividade rural pela pessoa em relação à qual se pretende comprovar o fato. A propósito, resta saber se indício pode, também, ser considerado início de prova material. Isto porque o indício configura, juntamente com a presunção, modalidade de prova indireta, consistindo na prova que, resultante de um fato, convence a existência de outro fato. Nesse contexto, pode-se afirmar que como início de prova material podem ser enquadradas tanto a prova material direta quanto a prova material indireta, desde que mantenha “nexo lógico e próximo com o fato a ser provado” (STF, HC n° 70.344-85, Rel. Min. Paulo Brossard, DJU 22.10.93). Por conseguinte, em se tratando de tempo de serviço rural, por início de prova material se compreende não apenas a prova material direta, consubstanciada em documentos em nome da própria parte e diretamente relacionados com o tempo de serviço, como, também, a prova material indireta, consubstanciada em documentos em nome de terceiros (indiretos quanto à pessoa) direta ou indiretamente relacionados com o tempo de serviço. Com efeito, os documentos relativos terceiros integrantes do grupo familiar da parte autora (como pais, cônjuge, companheiro(a), sogros e filhos), embora indiretos quanto à pessoa, servem como prova material indireta apta a atuar como o início de prova material de que cogita o § 3° do art. 55 da Lei n° 8.213/91, a qual, por não configurar prova plena, deverá ser corroborada por prova testemunhal, se guardarem “nexo lógico e próximo com o fato a ser provado”. Nesse sentido, documentos em nome de terceiros integrantes do grupo familiar da parte autora, como os relativos à terra na qual a parte autora alega ter exercido a atividade rural (por exemplo matrícula imobiliária, escritura pública, INCRA, ITR, etc) e os relativos ao exercício de atividade rural pelo terceiro (por exemplo notas de produtor rural, ficha de associação em Sindicato de Trabalhadores Rurais, recibos de pagamento de contribuições associativas, etc) servem como início de prova material em relação a todo o grupo familiar, inclusive em relação à parte autora. Nessa mesma linha, os documentos públicos que indicam expressamente a profissão da parte autora ou de terceiros integrantes do seu grupo familiar (como pais, cônjuge, companheiro(a), sogros e filhos), conquanto indiretos quanto ao exercício propriamente dito da atividade, também servem como início de prova material, como certidões de nascimento, óbito e casamento, certificado de reservista, etc. Aliás, neste sentido há entendimento sumulado por Turma Nacional: “Súmula nº 06. A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola”. Finalmente, também servem como início de prova material documentos comprobatórios da propriedade ou da posse de terra rural em nome de terceiro estranho ao núcleo familiar da parte autora, na qualidade de prova material indireta, mas desde que o nome ou condição (de proprietário, arrendador, comodante, etc) do terceiro seja confirmado pelas testemunhas em relação ao alegado trabalho rural da parte autora nesta terra, ou seja, desde que haja prova testemunhal específica que confirme a existência de “nexo lógico e próximo com o fato a ser provado”, como já decidiu esta TNU no julgamento do Proc. nº 2005.39.00.70.9844-5, em 27.03.2009. [...] No caso concreto, dentro do intervalo controvertido (tempo rural de 11/09/1976 a 04/12/1988), o autor apresentou início de prova material válido, consistente nos seguintes documentos: - Autorização para impressão de nota fiscal de produtor em nome do pai do autor (1981) (ID. 302590971 - Pág. 41); - CTPS do autor com anotação do cargo de "Tarefeiro rural", com data de admissão em 05/12/1988 (ID. 302590971 - Pág. 8); - Carteira de admissão do autor em sindicato de trabalhadores rurais (1988) (ID. 302590971 - Pág. 43). O início de prova material contemporâneo possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à sua data, desde que corroborado por prova testemunhal robusta, convincente e harmônica (TRU/3ª Região – Assunto 55/2020 - Pedido de Uniformização Regional nº 0001059-10.2018.403.9300 – Relator Juiz Federal João Carlos Cabrelon de Oliveira - Julgado na sessão de 19/02/2020). A prova oral tem pertinência e necessidade na espécie para, devidamente cotejada com a prova documental, confirmar eventual exercício da atividade rural da parte demandante (cf. Súmula 149 do STJ). Neste caso específico, a prova oral requerida na petição inicial (item "c" dos pedidos finais - ID. 302590966) não foi produzida pelo Juizado de origem, que julgou antecipadamente a lide (ID. 302590966) e aplicou inadequadamente a tese do Tema 629 do STJ, haja vista a existência de início de prova material em fração do período rural postulado pela parte recorrente. Houve cerceamento do direito de produzir provas, o que implica a nulidade da sentença. Nesse sentido: - Observa-se da r. sentença proferida que benefício por incapacidade foi deferido com base no início de prova material e nas declarações de terceiros reduzidas a termo, com firma reconhecida, substitutivas da prova testemunhal. - Comparece cerceamento de defesa quando o juiz, apesar de requerida prova oral pela parte e apresentado rol de testemunhas, não designa audiência de instrução a fim de ouvi-las, interditando à parte a comprovação de suas alegações (AgInt no REsp n. 2.004.764/SP, Rel. o Min. Raul Araújo, j. em 26/09/2022). - A comprovação da condição de rurícola da autora exige início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea, que dizer, a produzida em audiência submetida a contraditório simultâneo (art. 361 do CPC). - No caso concreto, a prova testemunhal em audiência é imprescindível para a formação da convicção do julgador acerca dos requisitos necessários à concessão do benefício em testilha, em obediência ao devido processo legal. - Sentença anulada de ofício para a produção da prova testemunhal em audiência. - Apelação do INSS e reexame necessário prejudicados. (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 6215456-88.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal FERNANDO DAVID FONSECA GONCALVES, julgado em 14/11/2024, DJEN DATA: 21/11/2024) Devido aos fundamentos acima, fica prejudicado o exame do pedido subsidiário de reafirmação da DER. Pelo exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso para anular a sentença e determinar a produção da prova testemunhal em audiência. Sem honorários (art. 55 da Lei nº 9.099/1995). É o voto.
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TRABALHADORA RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL EM AUDIÊNCIA. DECLARAÇÕES DE TERCEIRO COM FIRMA RECONHECIDA. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA.
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO INOMINADO DO AUTOR. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. NECESSIDADE DE PROVA TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA.
I- CASO EM EXAME
1- Recurso inominado contra sentença que extinguiu sem resolução do mérito o pedido de reconhecimento de atividade rural no período de 11/09/1976 a 04/12/1988, por ausência de início de prova material.
II- QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2- A questão em discussão consiste em verificar se houve cerceamento de defesa pela não produção de prova testemunhal, tendo em vista a existência de início de prova material do trabalho rural.
III- RAZÕES DE DECIDIR
3- O autor apresentou início de prova material do trabalho rural, consistente em autorização para impressão de nota fiscal de produtor em nome do pai (1981), CTPS com anotação de cargo de tarefeiro rural (1988) e carteira de admissão do autor em sindicato de trabalhadores rurais (1988).
4- A prova documental apresentada constitui início razoável de prova material que, nos termos da Súmula 149 do STJ, deve ser corroborada por prova testemunhal.
5- A não designação de audiência para produção da prova testemunhal requerida caracteriza cerceamento de defesa.
IV- DISPOSITIVO
6- Recurso parcialmente provido para anular a sentença e determinar a produção de prova testemunhal em audiência.
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Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.213/1991, arts. 38-A, 38-B e 55, § 3º; Lei nº 13.846/2019.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 149; TNU, PEDILEF 2009.71.95.000509-1/RS, Tema 18; TRF3, ApelRemNec 6215456-88.2019.4.03.9999, 9ª Turma, Rel. Des. Fed. Fernando David Fonseca Gonçalves, j. 14/11/2024.