APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005407-14.2023.4.03.6130
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: CHEFE DA AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL DE COTIA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUDA SILVA DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: LUANA MARQUES LEMOS - SP382186-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005407-14.2023.4.03.6130 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: CHEFE DA AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL DE COTIA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: NEUDA SILVA DE SOUZA Advogado do(a) APELADO: LUANA MARQUES LEMOS - SP382186-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação, em sede de mandado de segurança, impetrado por NEUDA SILVA DE SOUZA, contra ato praticado pelo GERENTE EXECUTIVO DA AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL DE COTIA/SP, objetivando o restabelecimento do benefício de auxílio acidente. Liminar deferida. (ID 306964164) A r. sentença, proferida em 23.08.2024, confirmou a liminar, e concedeu parcialmente a segurança, para determinar que a autoridade proceda ao restabelecimento do auxílio acidente da impetrante até eventual concessão de aposentadoria ou outro benefício com ele incompatível, promovendo a liberação dos valores devidos. Sem custas em razão do deferimento da justiça gratuita. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos do artigo 25 da Lei n° 12.016/2009. Sentença submetida ao duplo grau de jurisdição, de acordo com o art. 14, §1º, da Lei n° 12.016/2009. (ID 306964170). Em suas razões recursais, o INSS pugna pela denegação da segurança, ao argumento da impossibilidade de cumulação do benefício de auxílio acidente e de qualquer tipo de aposentadoria. Eventualmente, pleiteia o desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período; a observância à prescrição quinquenal; a incidência da correção monetária e de juros de mora na forma da EC 113/2021; e a isenção ao pagamento das custas processuais. Por fim, suscita o prequestionamento legal para fins de interposição de recursos. (ID 306964175) Com contrarrazões (ID 306964179), subiram os autos a este Eg. Tribunal. Parecer do Ministério Público Federal, no qual opina pelo não provimento da remessa oficial e da apelação do INSS. (ID 307247306). Distribuídos originariamente os autos à Exma. Desembargadora Federal RENATA LOTUFO da 2ª Turma, esta declinou da competência em razão da matéria debatida se encontrar abrangida pela competência da Terceira Seção (ID 307314139), sendo o feito redistribuído a este Relator. (ID 307339939) É o relatório. dcm
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005407-14.2023.4.03.6130 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: CHEFE DA AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL DE COTIA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: NEUDA SILVA DE SOUZA Advogado do(a) APELADO: LUANA MARQUES LEMOS - SP382186-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Conheço da remessa oficial na forma do artigo 14, §1º, da Lei nº 12.016/2009. Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria objeto de devolução. COMPETÊNCIA Em mandado de segurança, a competência é estabelecida em função da natureza da autoridade impetrada, sendo da competência federal quando a autoridade indicada como coatora é federal (CF, art. 109, VIII). No caso concreto, embora a impetrante requeira o restabelecimento do benefício de auxílio acidente NB 160.158.958-9, de natureza acidentária - espécie B-94 (ID 306964135 – pág. 03), a competência para a análise e julgamento do mandamus contra ato de agente federal do INSS é da Justiça Federal. Confira-se a jurisprudência: “MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA APRECIAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO CONTRA ATO DE AUTORIDADE FEDERAL. JULGAMENTO IMEDIATO. IMPOSSIBILIDADE. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS PROVIDAS. REMESSA DOS AUTOS PARA A JUSTIÇA FEDERAL. 1 - Tratando-se de mandado de segurança, a competência material é determinada de acordo com a hierarquia funcional da autoridade coatora, não importando o tema em discussão. 2 - Conforme previsto no art. 109, VIII, da Constituição Federal, compete aos juízes federais processar e julgar os mandados de segurança contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais. Essa competência não é afastada pela exceção contida no § 3º do mesmo artigo - jurisdição federal delegada aos Juízes de Direito para causas em que for parte o INSS e o segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal. 3 - Segundo pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a Justiça Estadual é absolutamente incompetente para julgar mandado de segurança impetrado contra autoridade federal, ainda que a questão central verse matéria previdenciária. 4 - A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou sua jurisprudência no sentido de que a delegação de competência inserta no art. 109, § 3º, da Constituição Federal, não incide em mandado de segurança no qual é discutida matéria previdenciária, sendo ainda aplicável o verbete da Súmula nº 216 do extinto Tribunal Federal de Recursos. 5 - Dessa forma, não estando o Juízo de Direito investido da competência federal delegada, patente a incompetência absoluta do Juízo da Comarca de Serra Negra/SP. 6 - O Superior Tribunal de Justiça permite o deferimento de medidas de urgência por juiz incompetente, conforme a decisão proferida no Recurso Especial nº 1.273.068 - ES (2011/0198332-0). 7 - Assim, a fim de se evitar dano irreparável à parte, por se tratar de verba alimentar, a ordem mandamental deferida em caráter de urgência em 1º grau de jurisdição deve ser mantida até que seja reapreciada pelo magistrado competente. 8 - Não se vislumbra a possibilidade de aplicação da teoria da causa madura, com o julgamento imediato do processo (art. 1.013, § 3º, I, do CPC), tendo em vista a constatação do vício apontado em apelação pelo INSS, qual seja, a ausência de ciência do feito ao órgão de representação da pessoa jurídica interessada, conforme os ditames do art. 7º, II, da Lei nº 12.016/2009. 9 – Remessa necessária e apelação do INSS providas. Remessa dos autos para a Justiça Federal.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0026582-32.2016.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 13.06.2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17.06.2020 – g.n) “MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. IMPETRAÇÃO DO MS CONTRA SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO DETERMINADA POR AGENTE DO INSS. IMPETRAÇÃO E DECISÃO EM VARA DA JUSTIÇA ESTADUAL. INCOMPETÊNCIA DO TRF PARA ANULAR QUAISQUER ATOS PRATICADOS PELO JUIZ SENTENCIANTE. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA COMUM ESTADUAL. SUSCITAÇÃO DO CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA EM FACE DO TJ DO ESTADO DE SÃO PAULO. ART. 105, I, D, DA CF. I. Pacífica a jurisprudência do STJ, no sentido de que a Justiça Estadual é absolutamente incompetente para julgar mandado de segurança impetrado contra autoridade federal, ainda que a questão central seja de cunho previdenciário. II. Não investido o Juízo de Direito da jurisdição federal, cabe à Corte Estadual analisar os recursos interpostos contra suas decisões, ainda que seja para anulá-las e remeter o feito ao órgão judiciário competente. Precedentes do STJ. III. Conflito negativo de competência suscitado perante o STJ em face do TJ do Estado de São Paulo, nos termos do art. 105, I, d, da CF. Apelação prejudicada. (g.n.) (TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 312445 - 0055724-62.2008.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, julgado em 25.10.2010, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03.11.2010 PÁGINA: 2249 – g.n.) Desse modo, no caso, sendo o ato coator atribuído ao gerente do INSS, a competência para julgamento da matéria é da Justiça Federal. MANDADO DE SEGURANÇA O writ of mandamus é o meio processual destinado à proteção de direito líquido e certo, evidente prima facie e demonstrável de imediato, sendo indispensável prova pré-constituída à apreciação do pedido. A necessidade de dilação probatória torna inadequada a via mandamental. Confira-se o magistério de Hugo de Brito Machado: "Se os fatos alegados dependem de prova a demandar instrução no curso do processo, não se pode afirmar que o direito, para cuja proteção é este requerido, seja líquido e certo". (Mandado de Segurança em Matéria Tributária, 4ª ed., Ed. Dialética, São Paulo, p. 98-99). Igualmente se manifesta o saudoso Hely Lopes Meirelles: "As provas tendentes a demonstrar a liquidez e certeza do direito podem ser de todas as modalidades admitidas em lei, desde que acompanhem a inicial, salvo no caso de documento em poder do impetrado (art. 6º parágrafo único), ou superveniente às informações. Admite-se também, a qualquer tempo, o oferecimento de parecer jurídico pelas partes, o que não se confunde com documento. O que se exige é prova preconstituída das situações e fatos que embasam o direito invocado pelo impetrante". (Mandado de Segurança, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção e Hábeas Data, 19ª ed. atualizada por Arnold Wald, São Paulo: Malheiros, 1998, p. 35). Ainda sobre o assunto, confira-se o seguinte precedente desta Corte: "PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. MANDADO DE SEGURANÇA . SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO. INDÍCIO DE FRAUDE. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRECEDENTES. I - Agravo legal interposto em face da decisão que afastou o reconhecimento da decadência e, com fundamento no §3º do art. 515 do CPC, denegou a segurança pleiteada, em mandado de segurança preventivo, extinguindo o feito sem julgamento do mérito, a teor do artigo 267, I e VI, do CPC, ao fundamento da impropriedade da via eleita, que pressupõe direito líquido e certo e ato lesivo da autoridade. II (...) VII - Não há comprovação do direito líquido e certo do impetrante, e tampouco de ato lesivo da autoridade, em razão do envio de correspondência para apresentação de defesa, a fim de restar demonstrada a regularidade da concessão do benefício. VIII - O ponto fulcral da questão diz respeito à impropriedade da via eleita. A manutenção e restabelecimento de benefício previdenciário traz consigo circunstâncias específicas que motivaram cogitar-se a suspensão, além da certificação da ocorrência de ilegalidades, a reavaliação dos documentos que embasaram a concessão, o cumprimento dos trâmites do procedimento administrativo, para lembrar apenas alguns aspectos, e não será em mandado de segurança que se vai discutir o direito ao benefício, cuja ameaça de suspensão decorre de indícios de irregularidade na concessão. IX - A incerteza sobre os fatos decreta o descabimento da pretensão através de mandado. Em tais circunstâncias, o direito não se presta a ser defendido na estreita via da segurança, e sim através de ação que comporte dilação probatória. Segue, portanto, que ao impetrante falece interesse de agir (soma da necessidade e adequação do provimento jurisdicional invocado). Precedentes jurisprudenciais. X - Agravo legal improvido." (8ª Turma, AMS n° 1999.03.99.103526-9, Rel. Des. Fed. Marianina Galante, j. 05/09/2011, DJF3 15/09/2011, p. 1019). O mandado de segurança é ação civil de rito sumário especial, destinado a proteger direito líquido e certo da violação efetiva ou iminente, praticada com ilegalidade ou abuso de poder por parte de autoridade pública (ou agente de pessoa jurídica no exercício das atribuições do Poder Púbico), diretamente relacionada à coação, de vez que investida nas prerrogativas necessárias a ordenar, praticar ou ainda retificar a irregularidade impugnada, a teor do disposto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, art. 1º da Lei nº 1.533/1951 e art. 1º da atual Lei nº 12.016/2009. AUXÍLIO ACIDENTE O benefício de auxílio acidente encontra-se disciplinado pelo art. 86 da Lei nº 8.213/1991, que, a partir da Lei nº 9.032/1995, é devido como indenização ao segurado que sofrer redução da capacidade para o trabalho, em razão de sequelas de lesões consolidadas decorrentes de acidente de qualquer natureza. A única exceção é da perda auditiva, em que ainda persiste a necessidade de haver nexo entre o trabalho exercido e a incapacidade parcial para o mesmo, conforme disposto no §4º do referido artigo, com a alteração determinada na Lei nº 9.528/1997. Em sua redação original, o art. 86 da Lei de Benefícios contemplava três hipóteses para a concessão do auxílio-acidente, considerando a diversidade de consequências das sequelas, tal como a exigência de "maior esforço ou necessidade de adaptação para exercer a mesma atividade". Com as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032 de 28.04.1995, o dispositivo contemplou apenas os casos em que houver efetiva redução da capacidade funcional. Com o advento da Lei nº 9.528/1997, a redução deve ser para a atividade habitualmente exercida. Além disso, seja qual for a época de sua concessão, este benefício independe de carência para o seu deferimento. O seu termo inicial é fixado no dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado (art. 86, §2º, da Lei nº 8.213/1991). Se não houve esta percepção anterior, nem requerimento administrativo, este deve ser na data da citação. Precedente: STJ, REsp 1.095.523/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 3ª Seção, DJE 05/11/2009. Por sua vez, o art. 18, §1º, da Lei nº 8.213/1991, relaciona os segurados que fazem jus ao auxílio acidente: o empregado, o trabalhador avulso e o segurado especial. Na redação original, revogada pela Lei nº 9.032 de 28.04.1995, ainda contemplava os presidiários que exercessem atividade remunerada. Dentre as modificações de maior relevância, desde a vigência do Plano de Benefícios, destaca-se a relativa ao valor do auxílio, que, originalmente, correspondia a 30% (trinta por cento), 40% (quarenta por cento) ou 60% (sessenta por cento) do salário-de-contribuição do segurado, não podendo ser inferior a este percentual do seu salário de benefício, e, com as alterações introduzidas pela Lei nº 9.528/1997, passou a 50% (cinquenta por cento) do salário de benefício. É benefício que independe de carência, segundo o disposto no art. 26 da Lei nº 8.213/1991. DO CASO DOS AUTOS Busca a impetrante o restabelecimento do benefício de auxílio acidente NB n° 160.158.958-9. Alega que o impetrado cessou o pagamento do auxílio acidente recebido, valendo-se do óbice configurado pela emissão de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC), previsto pelo artigo 129 do Decreto n°3.048/1999, mesmo texto do artigo 450 da IN 77/2015. Sustenta a impetrante que, inconformada com a cessação do benefício em razão de não estar aposentada, ingressou com processo administrativo (protocolo n° 43149933 – ID 306964135), visando o restabelecimento do benefício de auxílio acidente, com fundamento no artigo 86, §1º da Lei n° 8.213/1991 e no Princípio da Hierarquia das Normas. Em posição contrária, o impetrado informa: “que o recurso administrativo relativo ao pedido de benefício do(a) impetrante foi julgado em última instância administrativa pelo Conselho de Recursos da Previdência Social, conforme anexo, e teve seu indeferimento mantido” (ID’s 306964159-160). A análise da documentação apresentada (ID’s 306964135-136/138-139/143) revela que a impetrante instruiu o mandamus de maneira suficiente ao exame do direito alegado. Portanto, adequada a via eleita, uma vez que se mostra possível a apreciação do pleito da impetrante sem necessidade de dilação probatória. Cinge-se a controvérsia à possibilidade de o INSS cessar benefício de auxílio acidente em razão de emissão de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) para aposentação em outro regime. Da análise dos documentos juntados aos autos (ID’s 306964135/139/160), observa-se que o impetrado cessou em 25.09.2020 o pagamento do benefício de auxílio acidente concedido administrativamente à impetrante desde 07.07.2004, em razão da emissão de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) para aproveitamento no Regime Próprio de Previdência Social/RPPS. Por sua vez, conforme se verifica do extrato do sistema do CNIS (ID 306964143 e consulta atual sistema DATAPREV/INSS), a impetrante não se encontra aposentada, inclusive após a emissão da Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) em 25.09.2020, efetuou recolhimento de contribuições previdenciárias perante o RGPS, na condição de contribuinte individual, em 12.2021, em 12.2022 e em 09.2023; bem como requereu abono de permanência perante o Município de Embu das Artes/SP em 05.11.2020 (ID 306964136 - págs. 02-03), com pagamento comprovado no salário de 07.2023 (ID 306964138). Quanto à hipótese de cessação do benefício de auxílio acidente, cabe destacar o teor do art. 86, §1°, da Lei n° 8.213/1991, que assim dispõe: “Art. 86. (...). § 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinqüenta por cento do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado” (g.n.) Ora, diante do teor da norma acima mencionada, nota-se que o artigo 129 do Decreto n° 3.048/1999, bem como os artigos 339 e 450 da IN INSS/PRES nº 77/2015, extrapolaram o poder regulamentar ao ampliar a regra de cessação do benefício para quando da emissão da Certidão de Tempo de Contribuição (CTC), conforme segue: “Art. 129. O segurado em gozo de auxílio-acidente, auxílio-suplementar ou abono de permanência em serviço terá o benefício encerrado na data da emissão da certidão de tempo de contribuição.” (Redação dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003) Art.339. Ressalvado o direito adquirido, na forma do inciso V do art. 528 , não é permitido o recebimento conjunto de auxílio-acidente com aposentadoria, a partir de 11 de novembro de 1997, datada publicação da Medida Provisória nº 1.596-14, de 10 de novembro de 1997, convertida na Lei nº 9.528, de 10 de dezembro de 1997, devendo o auxílio-acidente ser cessado: I - no dia anterior ao início da aposentadoria ocorrida a partir dessa data; II - na data da emissão de CTC na forma da contagem recíproca; ou III - na data do óbito, observado o disposto no art. 176. Art. 450. Se o segurado estiver em gozo de abono de permanência em serviço, auxílio-acidente e auxílio-suplementar e requerer CTC referente ao período de filiação ao RGPS para efeito de aposentadoria junto ao RPPS, poderá ser atendido em sua pretensão, porém o benefício será encerrado na data da emissão da respectiva certidão.” (g.n.) Insista-se que inexistindo previsão legal acerca da cessação do benefício de auxílio acidente em caso de emissão de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC), resta evidente que o disposto no artigo 129 do Decreto n° 3.048/1999, e nos artigos 339 e 450 da IN 77/2015, impõe hipótese não prevista em lei, desbordando da função regulamentadora ancilar à lei, em afronta ao princípio da hierarquia das normas e ao art. 5º, II, da Constituição da República, segundo o qual “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Confira-se a jurisprudência sobre o tema: “PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. CESSAÇÃO APÓS A EMISSÃO DA CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. INADMISSIBILIDADE. 1. Cuidaram os autos, na origem, de ação visando ao restabelecimento de auxílio-acidente cessado em virtude do requerimento de aposentadoria. A Sentença determinou a reimplantação do benefício. O acórdão manteve a sentença. 2. O auxílio-acidente é benefício concedido após a cessação do auxílio-doença, quando resulta sequela geradora de redução da capacidade laboral proveniente de acidente ou doença do trabalho; todavia, não impossibilita o retorno ao trabalho. Este benefício é pago pelo INSS também durante o exercício de atividade profissional, seja na mesma função e empresa ou em outras, e independe do tempo de contribuição. 3. É inviável analisar a tese defendida no Recurso Especial, de que a mudança de regime afasta a obrigação do INSS de pagar o auxílio-acidente. Isso porque é inarredável a revisão do conjunto probatório dos autos para afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido, de que não se verificou a concessão de qualquer aposentadoria e de que o art. 86, § 1°, do referido diploma legal estabelece que o auxílio-acidente cessará apenas nas hipóteses de concessão da aposentadoria ou do óbito do segurado. 4 Recurso Especial não conhecido.” (STJ, RESP - RECURSO ESPECIAL - 1823547 2019.01.25042-0, HERMAN BENJAMIN - SEGUNDA TURMA, DJE DATA: 10.09.2019 ..DTPB:. – g.n.) E M E N T A EMISSÃO DE CTC. PARTE EM GOZO DE AUXÍLIO-ACIDENTE. A CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-ACIDENTE DEVE OCORRER QUANDO CONCEDIDA A APOSENTADORIA E NÃO NA MERA EMISSÃO DA CTC. DECRETO TRAZ CONDIÇÃO NÃO PREVISTA DA LEI, EXTRAPOLANDO A SUA FUNÇÃO REGULAMENTAR. NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS. (TRF3, RI 5002266-73.2022.4.03.6339, MARCIO RACHED MILLANI - 8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, julgamento: 01.12.2023, DJEN DATA: 11.12.2023. – g.n.) PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA EM MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE PASSIVA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-ACIDENTE. CESSAÇÃO POR EMISSÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. INDEVIDA. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO. MULTA. REDUÇÃO NO VALOR. (...) 5. Evidencia-se nos autos que: I) a suspensão do benefício de auxílio-acidente se deu pelo motivo "029 CONCESSAO DE OUTRO BENEFICIO", o que, conforme bem pontuado pelo Magistrado sentenciante "o INSS não chegou a indicar concretamente no ato de cessação"; II) de acordo com o documento "Declaração de Benefícios", extraído do site oficial do INSS, o Impetrante percebia, apenas, o auxílio-acidente em questão; III) notificado para prestar informações, o ente público se quedou inerte e, IV) tão somente após a prolação da sentença (03/07/2022), o INSS veio aos autos (id nº 4058300.23409151) esclarecer que a cessação em 25/08/2021 do "Auxílio-acidente" ocorreu, na verdade, em virtude da concessão de uma "Certidão de Tempo de Contribuição", nos termos do art. 644, I da IN 128/2022. 6. Revela-se, por oportuno, que, consoante o art. 86, § 1º da Lei nº 8.213/1991, o auxílio-acidente será devido até a data de início da aposentadoria ou do óbito do Segurado, não havendo referência à suspensão em razão de expedição de "Certidão de Tempo de Contribuição/CTC", não podendo, portanto, instrução normativa se sobrepor ao que prevê a Lei de regência para limitar o direito do Segurado, ora Impetrante, sob pena de violação à hierarquia das normas. 7. Percebe-se que, de fato, o benefício recebido pela parte Impetrante foi suspenso indevidamente. A emissão de CTC não é motivo justificador da cessação imediata do benefício de caráter compensatório recebido pelo Impetrante, sobretudo quando o próprio INSS, repita-se, não registra que ele percebe algum outro benefício que possa causar o cancelamento do auxílio-acidente. (...) 9. Remessa necessária parcialmente provida para, apenas, fixar em R$ 100,00 (cem reais) o valor da multa diária. (TRF5, PROCESSO: 0806778-34.2022.4.05.8300, Relator Des.Fed. FERNANDO BRAGA DAMASCENO - 3ª Turma, JULGAMENTO: 08.09.2022). APELAÇÃO CÍVEL – Restabelecimento de "auxílio-acidente" – Admissibilidade – Benefício cessado em virtude de o segurado ter solicitado emissão de Certidão de Tempo de Contribuição ao INSS – Ilegalidade – Inviabilidade da adoção do art. 129, do Decreto nº 3.048/99 – Prevalência do art. 86, §1º, da Lei nº 8.213/91 – Aplicação do princípio da hierarquia das normas – Precedentes – Ação julgada procedente – Recurso da autarquia e reexame necessário – Juros de mora contados de modo englobado até a citação e, após, mês a mês, decrescentemente, correspondentes ao índice de remuneração da caderneta de poupança, na forma do art. 1º-F, da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, segundo uma das teses definidas pelo Col. STF no julgamento do RE nº 870.947/SE, ao apreciar o Tema 810, com repercussão geral reconhecida, aplicando-se o IPCA-e na correção monetária dos atrasados desde 30.06.2009, data de vigência da Lei nº 8.213/91, na medida em que, ao rejeitar, por maioria de votos, em 03.10.2019, em acórdão publicado em 03.02.2020, todos os "embargos de declaração" opostos ao aludido Recurso Extraordinário, não modulando os efeitos da decisão anteriormente proferida, o Pretório Excelso considerou aquele índice empregável desde junho de 2009 em diante para a atualização dos débitos judiciais das Fazendas Públicas – Apelo do INSS não provido, provido, em parte, o outro recurso, confirmada a tutela de urgência para o imediato restabelecimento do benefício.” (g.n.) (TJSP; Apelação / Remessa Necessária 1006574-83.2019.8.26.0510; Relator (a): Aldemar Silva; Órgão Julgador: 17ª Câmara de Direito Público; Foro de Rio Claro - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 19.06.2020; Data de Registro: 19.06.2020)" Por fim, prejudicada a análise dos pedidos subsidiários do INSS, quanto aos consectários, em vista de que o eventual direito de liberação dos valores retroativos do benefício esbarra na vedação à utilização do mandado de segurança como substituto da ação de cobrança, nos moldes do art. 14, §4º, da Lei n° 12.016/2009, e das Súmulas 269 e 271 do STF, “in verbis”: “Art. 14. (...). (...) § 4o O pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial. Súmula 269: O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança. Súmula 271: Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria.” Com efeito, demonstrada a existência de direito líquido e certo ao restabelecimento do benefício de auxílio-acidente; frise-se, não infirmado pela autoridade coatora, a quem competia a prova de fato impeditivo do direito alegado (art. 373, II, CPC), de rigor a manutenção da sentença que concedeu parcialmente a segurança para determinar o restabelecimento do auxílio acidente da impetrante até eventual concessão de aposentadoria ou outro benefício com ele incompatível. Sem custas e sem condenação em honorários advocatícios, nos termos das Súmulas 512 do STF e 105 do STJ e do disposto no artigo 25 da Lei nº 12.016/2009. DISPOSITIVO Ante o exposto, nego provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, nos termos da fundamentação. É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO DE AUXÍLIO ACIDENTE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL DE CESSAÇÃO NA EMISSÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. DESCONFORMIDADE DO ART. 129 DO DECRETO N° 3.048/1999 À LEI N° 8.213/1991. CONSECTÁRIOS. REMESSA OFICIAL E RECURSO NÃO PROVIDOS.
1. Remessa oficial conhecida na forma da Lei nº 12.016/2009.
2. Apelação do INSS contra sentença que concedeu parcialmente a segurança para determinar que a autoridade proceda ao restabelecimento do auxílio acidente da impetrante até eventual concessão de aposentadoria ou outro benefício com ele incompatível, promovendo a liberação dos valores devidos.
3. A questão em discussão consiste em saber se a emissão de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) autoriza a cessação do benefício de auxílio acidente.
4. O art. 86, §1°, da Lei n° 8.213/1991 dispõe sobre as hipóteses de cessação do benefício de auxílio acidente, indicando que esta deverá acontecer com o início do pagamento de qualquer aposentadoria ou com o óbito do segurado.
5. O artigo 129 do Decreto n° 3.048/1999, bem como os artigos 339 e 450 da IN INSS/PRES nº 77/2015, extrapolaram o poder regulamentar ao ampliar a regra de cessação do benefício para quando da emissão da Certidão de Tempo de Contribuição (CTC), em afronta ao princípio da hierarquia das normas e ao art. 5º, II, da Constituição da República, segundo o qual “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
6. Inexistente impedimento legal, faz jus a impetrante ao restabelecimento do benefício de auxílio acidente, suspenso pela autoridade coatora, até eventual concessão de aposentadoria ou outro benefício incompatível com o auxílio acidente, nos termos da sentença.
7. Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos das Súmulas 512 do STF e 105 do STJ e do disposto no artigo 25 da Lei nº 12.016/2009.
8. Remessa oficial e apelação do INSS não providas.
Tese de julgamento: “1. A simples emissão de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) não autoriza a suspensão de eventual benefício de auxílio acidente, nos termos do que dispõe o art. 86, §1°, da Lei n° 8.213/1991”.
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Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, LXIX e art. 109, VIII; CPC, art. 373, II; Lei n° 8.213/1991, art. 86, §1º; Lei nº 1.533/1951, art. 1º; Lei nº 12.016/2009, art. 1º, art. 14, §1º e §4º e art. 25; Decreto n° 3.048/1999, art. 129; IN INSS/PRES nº 77/2015, art. 339 e art. 450.
Jurisprudência relevante citada: STF, Súmula 269, Súmula 271 e Súmula 512; STJ, Súmula 105; RESP - RECURSO ESPECIAL - 1823547 2019.01.25042-0, HERMAN BENJAMIN - SEGUNDA TURMA, DJE DATA: 10.09.2019; TRF3, AMS n° 1999.03.99.103526-9, Rel. Des. Fed. Marianina Galante - 8ª Turma, j. 05.09.2011, DJF3 15.09.2011, p. 1019; TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0026582-32.2016.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 13.06.2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17.06.2020; TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 312445 - 0055724-62.2008.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, julgado em 25.10.2010, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 03.11.2010, PÁGINA: 2249; TRF3, RI 5002266-73.2022.4.03.6339, MARCIO RACHED MILLANI - 8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, julgamento: 01.12.2023, DJEN DATA: 11.12.2023; TRF5, PROCESSO: 0806778-34.2022.4.05.8300, Relator Des.Fed. FERNANDO BRAGA DAMASCENO - 3ª Turma, JULGAMENTO: 08.09.2022; TJSP; Apelação / Remessa Necessária 1006574-83.2019.8.26.0510; Relator (a): Aldemar Silva; Órgão Julgador: 17ª Câmara de Direito Público; Foro de Rio Claro - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 19.06.2020; Data de Registro: 19.06.2020.