APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000432-47.2020.4.03.6002
RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
ESPOLIO: JEAN BARTH HOSTYN LIMA
REPRESENTANTE: NAIR TERESINHA STEFANELLO LIMA
Advogados do(a) ESPOLIO: ALINE ERMINIA MAIA DE ALMEIDA - MS16167-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000432-47.2020.4.03.6002 RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL ESPOLIO: JEAN BARTH HOSTYN LIMA Advogados do(a) ESPOLIO: ALINE ERMINIA MAIA DE ALMEIDA - MS16167-A, OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora): Trata-se de apelação interposta pela União em face de r. sentença proferida em sede de ação declaratória de inexistência de débito, proposta com o fim de determinar seja declarada a extinção dos créditos tributários incluídos em parcelamento, diante da correspondente homologação tácita, e, consequentemente, seja expedida certidão de regularidade fiscal. A r. sentença julgou procedente o pedido, nos seguintes termos: Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, encerrando a fase de conhecimento com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC), a fim de reconhecer a falta de consolidação como mera irregularidade, condenando a União a proceder a imputação dos pagamentos na via administrativa, ou, se assim for de melhor entendimento, reincluir o contribuinte no parcelamento, desde que cumprida as demais obrigações (em qualquer hipótese), a fim de que a parte autora possa obter a quitação. (...) Condeno a União ao pagamento de honorários advocatícios em favor dos advogados do réu. Fixo os honorários sucumbenciais em 10% sobre o valor da causa. Argumenta a apelante, em síntese: - o interessado, quando manifestou adesão ao pagamento, a qual lhe constitui mera faculdade, submeteu-se, integralmente, à respectiva disciplina legal, assumindo os ônus decorrentes de eventual descumprimento; - a consolidação é condição essencial para a regularidade do parcelamento, cuja não observância resulta no cancelamento do pedido de adesão; - a parte autora confessa que não realizou os procedimentos necessários para a consolidação de seu débito, sem qualquer justificativa plausível, razão por que, a despeito da existência de pagamentos, o correspondente pedido de inclusão deve ser cancelado. - deve ser considerando que “o descumprimento do dever do contribuinte de proceder à consolidação não é mera irregularidade e é motivo suficiente para exclusão do programa de parcelamento”. - deve haver a inversão dos ônus sucumbenciais, porquanto o ato de cancelamento do pedido de adesão ao parcelamento não está destituído de legalidade, sendo forçoso concluir que a própria parte autora, ao deixar de prestar as informações necessárias à consolidação, deu causa ao ajuizamento deste feito. Apresentadas as contrarrazões. É o relatório. ms
REPRESENTANTE: NAIR TERESINHA STEFANELLO LIMA
VOTO VENCEDOR Apelação interposta pela União contra sentença que julgou procedente o pedido aduzido em ação ordinária, a fim de reconhecer que a falta de consolidação dos débitos incluídos em parcelamento é mera irregularidade e determinar que proceda à imputação dos pagamentos na via administrativa ou à reinclusão do contribuinte no parcelamento, desde que cumpridas as demais obrigações, a fim de que possa obter a quitação, bem como condená-la ao pagamento de honorários advocatícios em favor dos advogados do réu, arbitrados em 10% sobre o valor da causa (R$ 186.532,79, em fevereiro de 2019). A eminente relatoria deu parcial provimento à apelação para inverter os ônus sucumbenciais e condenar a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, por entender que: a despeito de o pedido ter sido julgado procedente, depreende-se que o cancelamento do pedido de adesão ao parcelamento se deu pelo descumprimento imotivado do prazo de apresentação das informações necessárias à consolidação do débito, sendo possível concluir que a parte autora é quem deu causa ao ajuizamento do presente feito. Divirjo apenas em relação à verba honorária e passo a expor as razões do voto. Para fins de atribuição dos ônus sucumbenciais, a dicção do artigo 85 do CPC dispõe que: a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. Nos casos em que não for possível estabelecer quais partes foram vencidas e vencedoras, como ocorre, por exemplo, em situações de extinção sem resolução do mérito por perda superveniente de interesse, cabível observar quem deu causa à instauração do processo. Nesse sentido, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, ao consignar que o Código de Processo Civil de 2015 elegeu o princípio da sucumbência como regra para nortear a responsabilização pela verba honorária, com a imposição do pagamento dos honorários pelo vencido ao advogado do vencedor, e ampliou, por outro lado, as hipóteses em que se deva observar o princípio da causalidade (art. 85, § 10, e 90, caput e § 4º, do CPC), na forma da sua jurisprudência (STJ - REsp: 2028443 SC 2022/0300931-0, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Julgamento: 05/03/2024, T3 - Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 12/03/2024). A respeito do princípio da causalidade, explica Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrede Nery: Pelo princípio da causalidade, aquele que deu causa à propositura da demanda ou à instauração de incidente processual deve responder pelas despesas daí decorrentes. Isto porque, às vezes, o princípio da sucumbência se mostra insatisfatório para a solução de algumas questões sobre responsabilidade pelas despesas do processo. Quando não houver resolução do mérito, para aplicar-se o princípio da causalidade na condenação da verba honorária acrescida de custas e demais despesas do processo, deve o juiz fazer exercício de raciocínio, perquirindo sobre quem perderia a demanda, se a ação fosse decidida pelo mérito. O fato de, por exemplo, o réu reconhecer o pedido de imediato (CPC 487 III a), ou deixar de contestar tornando-se revel, não o exime do pagamento dos honorários e custas, porque deu causa à propositura da ação (CPC 90). O processo não pode reverter em dano de quem tinha razão para o instaurar (RT 706/77)(In: Código de Processo Civil Comentado [livro eletrônico] / Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery. -- 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2023, p. RL-1.17)(grifos nossos) Destarte, em situações como a dos autos, em que é possível estabelecer quem é a parte vencida, ela é quem deve arcar com as despesas do processo, ainda que a vencedora tenha concorrido para o surgimento da questão discutida na demanda, pois a sucumbência se estabelece com a integral procedência do pedido aduzido em juízo. Nesse sentido, confiram-se os precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta turma: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA JULGADA IMPROCEDENTE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUCUMBÊNCIA. FIXAÇÃO À LUZ DO PRINCÍPIO DA SUCUMBÊNCIA. CONDENAÇÃO DA PARTE VENCIDA. SÚMULA 7/STJ. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES. 1. Inexiste nos autos controvérsia acerca de matéria fático-probatória, na medida em que a questão suscitada no recurso especial é exclusivamente de direito, fundada da tese de afronta ao art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC/1973 c/c o art. 85, caput, do CPC/2015, em virtude de o Tribunal de origem ter condenado a parte vencedora, ora agravada, ao ônus da sucumbência, utilizando-se do princípio da causalidade em detrimento do princípio da sucumbência. Logo, não se aplica à espécie a Súmula 7/STJ. 2. O princípio da causalidade deve orientar a fixação dos honorários advocatícios de sucumbência nas hipóteses de extinção do feito sem a resolução do mérito. Precedentes: AgInt nos EDcl no REsp 1.402.511/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, DJe 14/06/2017; AgInt no REsp 1.731.451/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe 14/05/2019. 3. Dispõe o art. 85, caput, do CPC/2015 que "a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor". 4. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, "diante do princípio da sucumbência, o vencido fica condenado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais devem ter como base de cálculo o valor da condenação ou do proveito econômico obtido e, na hipótese de não haver condenação ou não sendo possível mensurar o proveito econômico, no valor atualizado da causa" (AgInt no REsp 1.658.473/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe 29/08/2018). Nesse mesmo sentido: AgInt no AREsp 662.835/MS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, DJe 04/10/2017. 5. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no REsp: 1811967 RJ 2019/0123055-1, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 19/08/2019, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/08/2019)(grifos nossos) PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. LITISPENDÊNCIA COM AÇÃO ANULATÓRIA ANTERIOR. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUPORTADOS PELA EXECUTADA. PRINCÍPIO DA SUCUMBÊNCIA. INCIDÊNCIA DO ENCARGO DO DL Nº 1.025/69. Pelo princípio da sucumbência a responsabilidade pelo pagamento dos encargos esteia-se no fato objetivo da derrota processual, ao passo que o princípio da causalidade é aplicado de forma subsidiária, quando o critério principal não é suficiente para auferir quem foi vencedor e vencido, a exemplo dos processos extintos sem resolução de mérito por perda de objeto. Havendo a extinção dos embargos à execução fiscal em razão do reconhecimento de litispendência com ação anulatória proposta anteriormente, em que não houve suspensão da exigibilidade do crédito tributário, os ônus da sucumbência devem ser suportados pela parte embargante. No entanto, nos casos em que há a incidência do encargo legal previsto no art. 1º do Decreto-Lei n. 1.025/69 (20%), descabe a condenação em honorários advocatícios em favor da Fazenda Nacional em embargos à execução fiscal, posto que os substitui, entendimento confirmado no REsp nº 1.143.320/RS, apreciado sob a sistemática dos recursos repetitivos. Apelação parcialmente provida tão somente para excluir a condenação do recorrente em honorários advocatícios. (TRF-3 - ApCiv: 00021442220184036102 SP, Relator: Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, Data de Julgamento: 21/03/2023, 4ª Turma, Data de Publicação: DJEN DATA: 28/03/2023)(grifos nossos) Ante o exposto, divirjo da relatoria para negar provimento à apelação e manter integralmente a sentença recorrida. É como voto. ANDRÉ NABARRETE DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR PARA ACÓRDÃO jgb
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000432-47.2020.4.03.6002
RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
ESPOLIO: JEAN BARTH HOSTYN LIMA
REPRESENTANTE: NAIR TERESINHA STEFANELLO LIMA
Advogados do(a) ESPOLIO: ALINE ERMINIA MAIA DE ALMEIDA - MS16167-A,
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V O T O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
O programa de parcelamento previsto nos termos da Lei n. 11.941, de 27/05/2009, teve sua reabertura de adesão promovida pelo artigo 2º da Lei n. 12.996, de 18/06/2014, tendo sido regulamentado pela Portaria Conjunta PGFN/RFB n. 1.064, de 30/07/2015.
A Lei n. 12.996/2014 que permitiu nova adesão ao parcelamento, prevê a necessidade de consolidação da dívida, na forma de seu artigo 2, § 5º e 6º, in verbis:
Art. 2º. (...)
§ 5º Após o pagamento das antecipações e enquanto não consolidada a dívida, o contribuinte deve calcular e recolher mensalmente parcela equivalente ao maior valor entre:
I - o montante dos débitos objeto do parcelamento dividido pelo número de prestações pretendidas, descontada s as antecipações; e
II - os valores constantes do § 6º do art. 1º da Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009, ou os valores constantes do § 6º do art. 65 da Lei nº 12.249, de 11 de junho de 2010, quando aplicável esta Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)
§ 6º Por ocasião da consolidação, será exigida a regularidade de todas as prestações devidas desde o mês de adesão até o mês anterior ao da conclusão da consolidação dos débitos parcelados nos termos do disposto neste artigo.
Ressalte-se, desde logo, que o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF) referendou medida cautelar anteriormente concedida em sede de ADI 7.370 MC, relator Ministro CRISTIANO ZANIN, confirmando o entendimento que veda a exclusão do contribuinte do parcelamento em decorrência de situação não prevista em lei, nos termos da seguinte ementa:
REFERENDO NA MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. PARCELAMENTO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO. LEI 9.964/2000, QUE INSTITUIU O PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL - REFIS. EXCLUSÃO DE CONTRIBUINTE POR SITUAÇÃO NÃO PREVISTA EM LEI. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA SEGURANÇA JURÍDICA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA E REFERENDADA.
I - A Lei 9.964/2000 não deixou ampla margem interpretativa para o que pode ser entendido por inadimplência, já que, expressamente, para efeito de exclusão do REFIS, revelou que ela se dará apenas nas hipóteses de não pagamento das parcelas por três meses consecutivos ou por seis meses alternados, o que acontecer primeiro.
II- Impossibilidade de exclusão de contribuinte do REFIS com base na tese das “parcelas ínfimas”, a qual vulnera o princípio da legalidade tributária, estabelecido no art. 150, I, da CF/1988, pois, por meio de atos subalternos, estipulou que fossem excluídos contribuintes os quais cumpriam há anos as regras preestabelecidas em lei com base em inovadora interpretação ampliativa da Administração Pública Federal.
III - A taxatividade das hipóteses de exclusão do REFIS, reveladas pelo art. 5° da Lei 9.964/2000, impede o uso de analogia ou interpretação extensiva que extraia do seu rol exaustivo hipótese outra que não aquelas expressamente previstas no referido dispositivo legal.
IV - Deferimento da medida cautelar, para conferir interpretação conforme à Constituição aos arts. 5º e 9º da Lei 9.964/2000, e, assim, (i) afirmar que é vedada a exclusão, com fundamento na tese das “parcelas ínfimas ou impagáveis”, de contribuintes do Refis I, os quais aceitos no parcelamento, vinham adimplindo-o em estrita conformidade com as normas existentes do programa, até o definitivo julgamento desta ação; e (ii) determinar a reinclusão dos contribuintes adimplentes e de boa-fé, que desde a adesão ao referido parcelamento permaneceram apurando e recolhendo aos cofres públicos os valores devidos, até o exame do mérito.
V - Medida cautelar referendada.
(ADI 7370 MC-Ref, Relator Ministro CRISTIANO ZANIN, Tribunal Pleno, julgado em 24/06/2024, publ. 01/07/2024)
Nesse diapasão, é de rigor que a análise do caso concreto seja norteada pela observância dos termos da lei de regência do parcelamento, em homenagem aos princípios constitucionais da segurança jurídica, da estrita legalidade tributária e da boa-fé do contribuinte, mormente em razão de a exclusão do parcelamento implicar restrição de direitos patrimoniais dos contribuintes. Precedente: RE 669196, Rel. Ministro DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, j. 26/10/2020, publ. 23/11/2020, Tema 668, Repercussão geral, trans. julg. 01/06/2021.
Na hipótese dos autos, a impetrante aderiu ao programa de parcelamento instituído pela Lei n. 11.941/2009, incluindo os débitos inscritos nas CDAs n 13 7 06 001041-55, n. 13 6 06 007624-81 e n. 13 6 06 007623-09, tendo recolhido o montante de R$ 35.240,86 (trinta e cinco mil, duzentos e quarenta reais e oitenta e seis centavos), demonstrando a sua boa-fé e o intuito de quitar a dívida com os cofres públicos (ID 219977354 - Págs. 34/35).
Nada obstante, há de se considerar que, na hipótese, a contribuinte verteu valores com o intuito de efetivamente pagar o débito pendente, assentindo aos objetivos da Secretaria da Receita Federal do Brasil de incrementar a arrecadação.
Sob essa perspectiva, o indeferimento do parcelamento vai de encontro aos princípios da legalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade, consagrados pela jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Nesse sentido:
PROGRAMA DE PARCELAMENTO TRIBUTÁRIO. REFIS. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. BOA-FÉ DO CONTRIBUINTE. REINCLUSÃO DO CONTRIBUINTE NO PROGRAMA. APRECIAÇÃO DA CONVICÇÃO FORMADA PELO TRIBUNAL A QUO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. ALEGAÇÃO DE CONTRARIEDADE AO ART. 1.022 DO CPC/2015. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 284/STF.
I - O presente feito decorre da ação pela qual foi pleiteada a reinclusão do contribuinte no programa de parcelamento oportunizado pela Lei n. 12.996/2014. No julgamento proferido pelo TRF da 4ª Região, ficou assentado que a conduta do contribuinte, no sentido de pagar a parcela em atraso, com os consectários legais, bem assim antecipar outras parcelas, é indicativo de boa-fé e a sua exclusão do programa afronta os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
II - Inviável o conhecimento da alegada violação dos arts. 489 e 1.022, do CPC/2015 (arts. 458 e 535 do CPC/1973), quando o recorrente, apesar de anunciar que o acórdão recorrido foi omisso, contraditório ou obscuro, apresenta arrazoado genérico, sem desenvolver argumentos para demonstrar especificamente a suposta mácula. Incide na espécie a Súmula n. 284/STF.
III - A jurisprudência do STJ reconhece a viabilidade da aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos parcelamentos tributários, quando tal procedência visa evitar práticas contrárias à própria teleologia da norma instituidora do benefício fiscal, especialmente se verificada a boa-fé do contribuinte e a ausência de prejuízo do erário. Precedentes: REsp n. 1.671.118/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 9/10/2017; AgInt no REsp n. 1.660.934/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 5/4/2018, DJe 17/4/2018; AgInt no REsp n. 1.513.491/SC, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 25/10/2018, DJe 29/11/2018
IV - Por outro lado, verifica-se que, para se cogitar do afastamento do entendimento apresentado pelo Tribunal a quo, faz-se impositiva a análise das peculiaridades do caso concreto, sindicando as razões para a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade a justificar a reinclusão do contribuinte no programa de parcelamento tributário, restando impositivo o reexame do conjunto probatório, o que é inviável no âmbito do recurso especial. Incidindo o óbice contido na Súmula n. 7/STJ. Precedentes: REsp n. 1.653.926/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 18/9/2018, DJe 26/9/2018; REsp n. 1.737.902/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 12/6/2018, DJe 23/11/2018.
V - Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.
(REsp n. 1.736.024/PR, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 6/6/2019, DJe de 14/6/2019.)
Ainda, tratando-se na hipótese de descumprimento de formalidade, é mister assegurar a manutenção do impetrante no parcelamento, mediante a possibilidade de permanecer no programa.
Nesse mesmo sentido já se manifestou esta E. Quarta Turma:
TRIBUTÁRIO. PARCELAMENTO. LEI 13.496/2017. PRAZO DESISTÊNCIA. EXTEMPORÂNEO. PAGAMENTOS EFETUADOS. APELAÇÃO PROVIDA.
-O parcelamento corresponde a um benefício dado ao contribuinte, que deve obedecer estritamente às regras estabelecidas na legislação própria, sob pena de eventual exclusão. Porém, ainda assim, o Fisco deve ser razoável e não gerar impedimentos para o cidadão efetivamente vir a exercer o benefício. Nesse sentido, as partes - tanto o Estado quanto o contribuinte - devem agir na mais absoluta boa-fé e transparência, procurando efetivar a quitação dos débitos que, em última análise é o objetivo do programa.
-A apelante não se atentou para o prazo de desistência previsto nas Portarias editadas pela RFB, que, segundo a apelante, era até o dia 30.11.2017. Assim, em razão do não cumprimento da obrigação acessória foi excluída do PERT.
-No caso concreto, a apresentação extemporânea dos pedidos de desistência, é erro que não pode levar à exclusão da contribuinte do programa de parcelamento, sob pena de ser desproporcional, máxime porque demonstrada a boa-fé da impetrante ao realizar o pagamento das cinco parcelas do débito e atendido o interesse público de recebimento dos tributos.
- Realmente, o descumprimento da obrigação acessória não causou efetivo dano ao erário, uma vez que as parcelas foram recolhidas tempestivamente aos cofres públicos. Ademais, os programas de parcelamento têm por finalidade precípua não apenas a recuperação fiscal dos contribuintes em débito junto à Secretaria da Receita Federal - o que se dá por meio de política de concessão de vantagens -, como também a ampliação da arrecadação tributária.
- Buscando a teleologia da lei instituidora do parcelamento, não se deve impedir o reconhecimento da quitação do débito em razão de erro procedimental.
- Frise-se que a desistência implícita dos recursos administrativos interpostos é corolário lógico da sucessão de ações adotadas pela impetrante, que empenhou-se em pagar o débito tributário que era questionado no recurso administrativo.
- Sobre o ponto especificamente controvertido nos autos o C. Superior Tribunal de Justiça decidiu, em recurso repetitivo de controvérsia (REsp 1143216/RS), que a falta de desistência do recurso administrativo não serve para motivar a exclusão do parcelamento, quando observada a boa-fé do contribuinte e o pagamento de todas as prestações mensais estabelecidas.
- Apelação provida.
(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000519-34.2019.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, j. em 05/05/2023, Intimação via sistema DATA: 08/05/2023)
TRIBUTÁRIO. PROGRAMA DE PARCELAMENTO DE DÉBITOS. EXCLUSÃO OU CANCELAMENTO. DESCUMPRIMENTO DE FORMALIDADE.PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. REGULARIDADE DOS PAGAMENTOS. BOA-FÉ DO CONTRIBUINTE. REINCLUSÃO.
1. É cediço que a adesão a programas de parcelamento de débitos tributários constitui benefício fiscal colocado à disposição do contribuinte, cuja adesão e permanência é condicionada à observância das condições impostas pela legislação pertinente, sujeitando-se o contribuinte à exclusão nos casos de descumprimento. Ademais, o art. 111, I, do CTN determina que deve ser interpretada literalmente a legislação nos casos de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, a exemplo do que ocorre em relação aos programas de parcelamento de débitos, a teor do especificamente previsto pelo art. 155-A, caput, do CTN.
2. Consolidada a jurisprudência quanto à aplicabilidade dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade mesmo em relação a pedidos de parcelamento de débitos, caso constatado mero descumprimento de formalidade; ademais, cabe frisar que a meta de tais programas é tanto a recuperação fiscal dos contribuintes quanto o próprio adimplemento, isto é, a ampliação do montante arrecadado pelo Fisco.
3. Comprovou-se que o pagamento da integralidade das parcelas ocorreu muito antes de iniciado o prazo para apresentação das informações; ora, ante tal cenário se mostra draconiano o cancelamento, haja vista a desproporcionalidade entre o descumprimento e a sanção, devendo prevalecer os princípios da razoabilidade e proporcionalidade – em relação aos quais, diga-se de passagem, é indiferente se houve exclusão ou cancelamento.
4. O recolhimento do tributo devido revela a boa-fé do contribuinte, princípio agasalhado pelo Direito Tributário, inexistindo lesão ao Erário.
5. Remessa Oficial improvida.
6. Apelo improvido.
(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5005687-71.2020.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, julgado em 23/05/2024, Intimação via sistema DATA: 28/05/2024)
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LEI N° 11.941/2009. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. PARCELAMENTO ESPECIAL DE DÉBITOS. INDICAÇÃO DE DÉBITOS FORA DO PRAZO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO PARA A FAZENDA PÚBLICA.
No caso concreto, os débitos a serem incluídos em programa de parcelamento estão inscritos em Dívida Ativa da União. Logo, a inscrição em dívida ativa transfere à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a administração do respectivo crédito tributário e retira dos Delegados da Receita Federal do Brasil o poder de ingerência direta. Ressalte-se que eventual regulamentação conjunta dos parcelamentos ou, ainda, eventual atuação da Receita Federal do Brasil em alguma etapa do benefício não têm o condão de transferir para esta a competência exclusiva da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Preliminar de ilegitimidade passiva ad causam afastada.
A Lei nº 11.941/09, que instituiu modalidade de parcelamento também conhecida como REFIS, assegurou ao contribuinte o direito de parcelar os seus débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, inclusive o saldo remanescente dos débitos consolidados em parcelamentos anteriores. E em seu art. 12, o legislador delegou aos órgãos fazendários a regulamentação dos atos necessários à execução do parcelamento, bem como a forma e o prazo para a confissão dos débitos a serem parcelados.
Restou incontroverso nos autos que a impetrante fez a opção pelo parcelamento regido pela Lei nº 11.941/2009, em 27/11/2009, manifestando-se pela não inclusão da totalidade dos débitos, uma vez que estava discutindo judicialmente débitos de COFINS. Assim, optando pela inclusão parcial dos débitos em alguma modalidade, a recorrida deveria indicar pormenorizadamente quais débitos deveriam constar daquela modalidade, com apresentação do Anexo III, nos termos e prazos da Portarias Conjuntas PGFN/RFB nºs 03/2010, 11/2010 e, posteriormente, postergado pela Portaria Conjunta PGFN/RFB n° 13/2010, cujo descumprimento implicaria no cancelamento automático da opção.
Malgrado o prazo para consolidação estivesse encerrado, fato que autorizaria o cancelamento do parcelamento, a jurisprudência vem se firmando no sentido da adoção do princípio da proporcionalidade nos casos em que o contribuinte esteja em dia com os pagamentos e os tenha feito nos valores mínimos exigidos para a modalidade correspondente, bem assim a ausência de prejuízo para a Fazenda Pública. Não se trata de desconsiderar requisitos exigidos pela Lei nº 11.941/2009 ou, mesmo, de medida que quebre a isonomia em relação a outras empresas que tenham se submetido às condições impostas pela legislação, mas de aplicação, em concreto, do princípio da proporcionalidade em sentido estrito, diante, de um lado, da inexistência de prejuízo irreparável ao Fisco e, de outro, da conduta zelosa adotada pela impetrante, que cumpriu as demais determinações legais para ingresso e permanência no programa. Impor à impetrante a pena de exclusão, nesse caso, seria medida desnecessária e excessiva.
Apelação e remessa oficial improvidas.
(TRF 3ª Região, 4ª Turma, - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0020115-70.2011.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, j. 07/12/2023, Intimação: 14/12/2023)
No mesmo sentido, o entendimento desta E. Corte: 1ª Turma, ApCiv 5027119-29.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, j. 02/02/2021, DJEN 09/02/2021; 6ª Turma, AI 5017280-44.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, j. em 18/12/2018, Intimação: 15/01/2019)
A respeito da exclusão, ressalte-se a compreensão do C. STJ, no julgamento do REsp 1.143.216, relator Ministro LUIZ FUX, que consagrou o Tema 401/STJ: “A exclusão do contribuinte do programa de parcelamento (PAES), em virtude da extemporaneidade do cumprimento do requisito formal da desistência de impugnação administrativa, afigura-se ilegítima na hipótese em que tácito o deferimento da adesão (à luz do artigo 11, § 4º, da Lei 10.522/2002, c/c o artigo 4º, III, da Lei 10.684/2003) e adimplidas as prestações mensais estabelecidas por mais de quatro anos e sem qualquer oposição do Fisco”.
Eis a ementa do acórdão:
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. PAES. PARCELAMENTO ESPECIAL. DESISTÊNCIA INTEMPESTIVA DA IMPUGNAÇÃO ADMINISTRATIVA X PAGAMENTO TEMPESTIVO DAS PRESTAÇÕES MENSAIS ESTABELECIDAS POR MAIS DE QUATRO ANOS SEM OPOSIÇÃO DO FISCO. DEFERIMENTO TÁCITO DO PEDIDO DE ADESÃO. EXCLUSÃO DO CONTRIBUINTE. IMPOSSIBILIDADE. PROIBIÇÃO DO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO (NEMO POTEST VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM).
1. A exclusão do contribuinte do programa de parcelamento (PAES), em virtude da extemporaneidade do cumprimento do requisito formal da desistência de impugnação administrativa, afigura-se ilegítima na hipótese em que tácito o deferimento da adesão (à luz do artigo 11, § 4º, da Lei 10.522/2002, c/c o artigo 4º, III, da Lei 10.684/2003) e adimplidas as prestações mensais estabelecidas por mais de quatro anos e sem qualquer oposição do Fisco.
2. A Lei 10.684, de 30 de maio de 2003 (em que convertida a Medida Provisória 107, de 10 de fevereiro de 2003), autorizou o parcelamento (conhecido por PAES), em até 180 (cento e oitenta) prestações mensais e sucessivas, dos débitos (constituídos ou não, inscritos ou não em Dívida Ativa, ainda que em fase de execução fiscal) que os contribuintes tivessem junto à Secretaria da Receita Federal ou à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional com vencimento até 28.02.2003 (artigo 1º).
3. O aludido diploma legal, no inciso II do artigo 4º, estabeleceu que: "Art. 4o O parcelamento a que se refere o art. 1o: (...) II ? somente alcançará débitos que se encontrarem com exigibilidade suspensa por força dos incisos III a V do art. 151 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966, no caso de o sujeito passivo desistir expressamente e de forma irrevogável da impugnação ou do recurso interposto, ou da ação judicial proposta, e renunciar a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundam os referidos processos administrativos e ações judiciais, relativamente à matéria cujo respectivo débito queira parcelar; (....)" 4. Destarte, o parcelamento tributário previsto na Lei 10.684/03 somente poderia alcançar débitos cuja exigibilidade estivesse suspensa por força de pendência de recurso administrativo (artigo 151, III, do CTN) ou de deferimento de liminar ou tutela antecipatória (artigo 151, incisos IV e V, do CTN), desde que o sujeito passivo desistisse expressamente e de forma irrevogável da impugnação ou recurso administrativos ou da ação judicial proposta, renunciando a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundassem as demandas intentadas.
5. A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e a Secretaria da Receita Federal expediram portarias conjuntas a fim de definir o dies ad quem para que os contribuintes (interessados em aderir ao parcelamento e enquadrados no artigo 4º, II, da Lei 10.684/03) desistissem das demandas (judiciais ou administrativas) porventura intentadas, bem como renunciassem ao direito material respectivo.6. A Portaria Conjunta PGFN/SRF 1/2003, inicialmente, fixou o dia 29.08.2003 como termo final para desistência e renúncia, prazo que foi prorrogado para 30.09.2003 (Portaria Conjunta PGFN/SRF 2/2003) e, por fim, passou a ser 28.11.2003 (Portaria Conjunta PGFN/SRF 5/2003).7. Nada obstante, o § 4º, do artigo 11, da Lei 10.522/2002 (parágrafo revogado pela Medida Provisória 449, de 3 de dezembro de 2008, em que foi convertida a Lei 11.941, de 27 de maio de 2009), aplicável à espécie por força do princípio tempus regit actum e do artigo 4º, III, da Lei 10.684/03, determinava que: "Art. 11. Ao formular o pedido de parcelamento, o devedor deverá comprovar o recolhimento de valor correspondente à primeira parcela, conforme o montante do débito e o prazo solicitado. (...) § 4º Considerar-se-á automaticamente deferido o parcelamento, em caso de não manifestação da autoridade fazendária no prazo de 90 (noventa) dias, contado da data da protocolização do pedido. (...)" 8. Consequentemente, o § 4º, da aludida norma, erigiu hipótese de deferimento tácito do pedido de adesão ao parcelamento formulado pelo contribuinte, uma vez decorrido o prazo de 90 (noventa) dias (contados da protocolização do pedido) sem manifestação da autoridade fazendária, desde que efetuado o recolhimento das parcelas estabelecidas.
9. In casu, consoante relatado na origem: "... o impetrante apresentou, em janeiro de 2001, impugnação em relação ao lançamento fiscal referente ao processo administrativo nº 11020.002544/00-31 (fls. 179 e ss.), tendo posteriormente efetuado pedido de inclusão de tal débito no PAES, em agosto de 2003 (fl..08), com o recolhimento da primeira parcela em 28-08-2003 (fl.. 25), mantendo-se em dia com os pagamentos subsequentes até a impetração do presente mandamus, em outubro de 2007 (fls. 25/41 e 236). Ocorre que, em julho de 2007, a Secretaria da Receita Federal notificou o requerente de que haveria a compensação de ofício dos valores a serem restituídos a título de Imposto de Renda com o aludido débito (fl.. 42), informando que o contribuinte não teria desistido da impugnação administrativa antes referida (fl.. 03). Buscando solucionar o impasse, formulou pedido de desistência e requereu a manutenção do parcelamento, ao que obteve resposta negativa, sob a justificativa da ausência de manifestação abdicativa no prazo previsto no art. 1º da Portaria Conjunta PGFN/SRF nº 05, de 23-10-2003 (fl.. 43). (...) Não obstante tenha o impetrante, por lapso, desrespeitado tal prazo, postulou a inclusão do débito impugnado no PAES e efetuou o pagamento de todas as prestações mensais no momento oportuno, por mais de quatro anos, de 28-08-2003 (fl.. 25) a 31-10-2007 (fl..236), formulando, posteriormente, pleito de desistência (fl.. 43), todas atitudes que demonstram a sua boa-fé e a intenção de solver a dívida, depreendendo-se ter se resignado, de forma implícita e desde o início do parcelamento, em relação à discussão travada no processo administrativo nº 11020.002544/00-31. Além disso, saliente-se que a Administração Fazendária recebeu o pedido de homologação da opção pelo parcelamento em agosto de 2003 (fl.. 08) e sobre ele não se manifestou no prazo legal, de 90 dias, a teor do art. 4º, inciso III, da Lei nº 10.684/03, c/c art. 11, § 4º, da Lei nº 10.522/02, o que implica considerar automaticamente deferido o parcelamento. Frise-se, ainda, que recebeu prestações mensais por mais de quatro anos, sem qualquer insurgência, além de ter deixado de dar o devido seguimento ao processo administrativo nº 11020.002544/00-31.(...)" 10. A ratio essendi do parcelamento fiscal consiste em: (i) proporcionar aos contribuintes inadimplentes forma menos onerosa de quitação dos débitos tributários, para que passem a gozar de regularidade fiscal e dos benefícios daí advindos; e (ii) viabilizar ao Fisco a arrecadação de créditos tributários de difícil ou incerto resgate, mediante renúncia parcial ao total do débito e a fixação de prestações mensais contínuas.
11. Destarte, a existência de interesse do próprio Estado no parcelamento fiscal (conteúdo teleológico da aludida causa suspensiva de exigibilidade do crédito tributário) acrescida da boa-fé do contribuinte que, malgrado a intempestividade da desistência da impugnação administrativa, efetuou, oportunamente, o pagamento de todas as prestações mensais estabelecidas, por mais de quatro anos (de 28.08.2003 a 31.10.2007), sem qualquer oposição do Fisco, caracteriza comportamento contraditório perpetrado pela Fazenda Pública, o que conspira contra o princípio da razoabilidade, máxime em virtude da ausência de prejuízo aos cofres públicos.
12. Deveras, o princípio da confiança decorre da cláusula geral de boa-fé objetiva, dever geral de lealdade e confiança recíproca entre as partes, sendo certo que o ordenamento jurídico prevê, implicitamente, deveres de conduta a serem obrigatoriamente observados por ambas as partes da relação obrigacional, os quais se traduzem na ordem genérica de cooperação, proteção e informação mútuos, tutelando-se a dignidade do devedor e o crédito do titular ativo, sem prejuízo da solidariedade que deve existir entre ambos.
13. Assim é que o titular do direito subjetivo que se desvia do sentido teleológico (finalidade ou função social) da norma que lhe ampara (excedendo aos limites do razoável) e, após ter produzido em outrem uma determinada expectativa, contradiz seu próprio comportamento, incorre em abuso de direito encartado na máxima nemo potest venire contra factum proprium.
14. Outrossim, a falta de desistência do recurso administrativo, conquanto possa impedir o deferimento do programa de parcelamento, acaso ultrapassada a aludida fase, não serve para motivar a exclusão do parcelamento, por não se enquadrar nas hipóteses previstas nos artigos 7º e 8º da Lei 10.684/2003 (inadimplência por três meses consecutivos ou seis alternados; e não informação, pela pessoa jurídica beneficiada pela redução do valor da prestação mínima mensal por manter parcelamentos de débitos tributários e previdenciários, da liquidação, rescisão ou extinção de um dos parcelamentos) (Precedentes do STJ: REsp 958.585/PR, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 14.08.2007, DJ 17.09.2007; e REsp 1.038.724/RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 17.02.2009, DJe 25.03.2009).
15. Consequentemente, revela-se escorreito o acórdão regional que determinou que a autoridade coatora mantivesse o impetrante no PAES e considerou suspensa a exigibilidade do crédito tributário objeto do parcelamento.
16. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.
(REsp n. 1.143.216/RS, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 24/3/2010, DJe de 9/4/2010.)
Na hipótese em exame, é evidente a necessidade de observância do entendimento consolidado pelo C. STJ no referido REsp 1.143.216, que consagrou o Tema 401/STJ, tendo em vista que a exclusão do impetrante do parcelamento se deu em razão de descumprimento de formalidade.
Além disso, com fulcro nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e, ainda, considerando a boa-fé da impetrante, é mister assegurar o direito à reabertura do prazo para a consolidação do seu parcelamento, na medida em que o descumprimento está relacionado a requisito meramente formal.
Quanto aos honorários advocatícios, reputa-se que assiste razão à apelante.
Com efeito, a despeito de o pedido ter sido julgado procedente, depreende-se que o cancelamento do pedido de adesão ao parcelamento se deu pelo descumprimento imotivado do prazo de apresentação das informações necessárias à consolidação do débito, sendo possível concluir que a parte autora é quem deu causa ao ajuizamento do presente feito.
No mesmo sentido, oportuna a reprodução dos seguintes precedentes firmados no âmbito desta E. Corte Regional:
TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. INDEFERIMENTO. PROGRAMA DE PARCELAMENTO. EQUÍVOCO DO CONTRIBUINTE. BOA-FÉ. PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. ERRO DO CONTRIBUINTE. CAUSALIDADE. VERBA HONORÁRIA EXCLUÍDA. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DA UNIÃO PARCIALMENTE PROVIDAS.
1. Não se desconhece que a adesão ao parcelamento implica ciência e concordância com as normas legais e infralegais que o regem, consoante inteligência do art. 155-A, do CTN. Todavia, em determinadas hipóteses, é cabível, na análise de caso a caso, a superação de obstáculos legais e infralegais à luz dos princípios da razoabilidade e da boa-fé.
2. O objetivo do parcelamento fiscal previsto na Lei nº 11.941/2009, ao prever a exclusão do programa, é atingir o inadimplente e não prejudicar aquele que, por equívoco ou falta de informação ou orientação técnica adequada, deixou de cumprir formalidades quanto às modalidades de adesão ao programa, demonstrando intenção de cumprir com o compromisso.
3. No caso dos autos, verifica-se que a causa única apontada pela autoridade fiscal para o deferimento parcial da adesão da parte autora ao programa de parcelamento foi o fato de que os débitos de IRPJ e CSLL em questão teriam sido declarados após o prazo estabelecido na lN 1049/2010 (30/07/2010), em que pese ter havido o pagamento à vista de tais débitos.
4. Conforme consignado na sentença, “a não inclusão desses débitos de IRPJ e de CSLL (relativos às competências de ago/2007, nov/2007 e dez/2007) em DCTF entregue até 30.07.2010 foi erro ou omissão normal que contraria o comportamento material da parte-autora”.
5. Evidenciada a ausência de prejuízo ao Fisco e a boa-fé do contribuinte, não se compatibiliza com o princípio da proporcionalidade a imposição de restrição à manutenção do contribuinte no programa, especialmente porque o seu objetivo é viabilizar as atividades das empresas que buscam regularizar sua situação fiscal.
6. O Superior Tribunal de justiça, por sua vez, quando do julgamento do REsp 1.111.002/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos, entendeu que o contribuinte que erra no preenchimento da declaração deve ser responsabilizado pelo pagamento dos honorários advocatícios.
7. Não obstante, no caso vertente, a ação tenha sido julgada procedente, restou claro que o indeferimento parcial do parcelamento se deu por erro atribuído exclusivamente à parte autora. Logo, indevida a condenação da União ao pagamento de verba honorária.
8. Remessa necessária e apelação da União parcialmente providas.
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0022860-23.2011.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 29/06/2023, DJEN DATA: 08/08/2023)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO PERT. LEI 13.496/2017. OFENSA AO PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. CONFIGURADA. APELAÇÃO PROVIDA.
-Na hipótese, não obstante constar da Instrução Normativa/RF nº 1.711/2017, publicada em 21/06/2017, vigente à época da adesão do apelante ao parcelamento que, depois da formalização do requerimento de adesão, a RFB divulgaria, por meio de ato normativo e em seu sítio na Internet, o prazo para que o sujeito passivo apresentasse as informações necessárias à consolidação do parcelamento ou do pagamento à vista com utilização de créditos, verifica-se que, quando da edição da Instrução Normativa/RF nº 1.855/2018, ocorrida em dezembro de 2018, o apelante já havia pago todas as parcelas do PERT.
-Manter a exclusão do parcelamento, corresponderia a exigir tributo quando se sabe não ser ele devido.
-Descabe a condenação da União ao pagamento de honorários advocatícios, em atenção ao princípio da causalidade, eis que a máquina judiciária foi movimentada, em razão do equívoco cometido pela autora. Precedentes.
- Apelação provida.
(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5000237-42.2019.4.03.6117, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, julgado em 20/09/2021, DJEN DATA: 23/09/2021)
Assim, ficam invertidos os ônus sucumbenciais, cabendo à parte autora o pagamento da verba honorária, sob o patamar de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.
Dispositivo
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação, na forma da fundamentação.
É o voto.
Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5000432-47.2020.4.03.6002 |
Requerente: | UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL |
Requerido: | JEAN BARTH HOSTYN LIMA |
Ementa: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. AÇÃO PELO RITO ORDINÁRIO. PARCELAMENTO. FORMALIDADE. DESCUMPRIMENTO. MANUTENÇÃO DO CONTRIBUINTE NO BENEFÍCIO FISCAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO DA UNIÃO FEDERAL. RECURSO DESPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Apelação contra sentença que julgou procedente o pedido para reconhecer que a falta de consolidação dos débitos incluídos em parcelamento é mera irregularidade e determinar que se proceda à imputação dos pagamentos na via administrativa ou a reinclusão do contribuinte no parcelamento, desde que cumpridas as demais obrigações, a fim de que possa obter a quitação, bem como condenou ao pagamento de honorários advocatícios em favor dos advogados do réu, arbitrados em 10% sobre o valor da causa.
II. Questão em discussão
2. Manutenção do contribuinte no parcelamento quando houver o descumprimento de mera formalidade e honorários advocatícios.
III. Razões de decidir
3. Em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e, ainda, considerada a boa-fé do contribuinte, deve ser assegurado o direito à reabertura do prazo para a consolidação do parcelamento, na medida em que o descumprimento está relacionado a requisito meramente formal.
4. Em situações em que é possível estabelecer quem é a parte vencida, ela é quem deve arcar com as despesas do processo, ainda que a vencedora tenha concorrido para o surgimento da questão discutida na demanda, pois a sucumbência se estabelece com a integral procedência do pedido aduzido em juízo.
IV. Dispositivo e tese
6. Apelação desprovida.
_________
Dispositivos relevantes citados: Lei n. 11.941/2009, artigo 2º, §§ 5º e 6º, da Lei n. 12.996/2014, artigo 85 do CPC.
Jurisprudência relevante citada: REsp n. 1.143.216/RS, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 24/3/2010, DJe de 9/4/2010; ADI 7370 MC-Ref, Relator Ministro CRISTIANO ZANIN, Tribunal Pleno, julgado em 24/06/2024, publ. 01/07/2024; TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5005687-71.2020.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, julgado em 23/05/2024, Intimação via sistema DATA: 28/05/2024; STJ - AgInt no REsp: 1811967 RJ 2019/0123055-1, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 19/08/2019, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/08/2019.