Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012852-42.2024.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE EDUCACAO FISICA DA 4 REGIAO

APELADO: FABIO GILHO TEIXEIRA

Advogado do(a) APELADO: SILVIA ROMANO AMORIM - SP378339-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012852-42.2024.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE EDUCACAO FISICA DA 4 REGIAO

 

APELADO: FABIO GILHO TEIXEIRA

Advogado do(a) APELADO: SILVIA ROMANO AMORIM - SP378339-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Trata-se de apelação interposta pelo CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA DE SÃO PAULO DA 4ª REGIÃO contra r. sentença proferida nos autos de mandado de segurança, com pedido liminar, objetivando que a autoridade coatora se abstenha, definitivamente, de praticar qualquer ato que vise a fiscalizar, autuar ou impedir o impetrante de exercer livremente sua profissão de técnico/treinador de beach tênis, em todo o território nacional, seja no interior de estabelecimento particular ou público.

Deferida a medida liminar, para determinar à autoridade coatora que se abstivesse de fiscalizar, autuar, ou impedir o impetrante de exercer livremente sua profissão de técnico/treinador de beach tenis, em virtude de não se encontrar inscrito junto ao Conselho Regional de Educação Física-CREF-4 (ID 307771324).

A sentença julgou procedente o pedido inicial e concedeu a segurança para determinar que a autoridade impetrada se abstivesse de praticar ato tendente a impedir a atuação do impetrante como instrutor técnico de beach tennis e a obriga-lo a se registrar perante o CREF/SP, confirmando a liminar anteriormente concedida. Sem condenação em honorários, com base no art. 25 da Lei n. 12.016/2009. Custas ex lege. Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição, nos termos do artigo 496, §4º, inciso II do Código de Processo Civil (ID’s 307771355 e 307771364).

Sustenta o apelante, em síntese, que: i) a interpretação conjunta do artigo 75, §2º, I da Lei n. 14.597/2023 e do artigo. 2º, I da Lei n. 9696/1998, alterada pela Lei n. 14.382/22, indica a obrigatoriedade do registro do treinador esportivo portador de diploma de educação física no Conselho Regional de Educação Física; ii) a parte autora não comprovou ter experiência como instrutor de beach tennis, de modo que, ao receber autorização para ministrar aulas na referida modalidade, poderá expor os alunos a grave risco de dano à saúde, causando malefícios físicos e psicossociais, como graves lesões, tornando crônicos ou agravando problemas preexistentes, incapacitações temporárias e permanentes e, até mesmo, a morte; iii) a Lei n. 9.696/1998 delegou exclusivamente aos graduados em Educação Física a atuação nas atividades físicas e esportivas, não tendo arrolado em seu artigo 3º todas as modalidades esportivas, simplesmente porque é impossível, na medida em que, no atual mercado, sistematicamente são criadas e desenvolvidas novas modalidades; iv) o treinamento em qualquer modalidade esportiva deverá ser realizado exclusivamente por profissional de Educação Física, que é considerado o profissional devidamente registrado junto ao Sistema CONFEF/CREFs, na forma do artigo 2º da Lei 9.696/1998; e v) por interpretação lógico-sistemática do pedido formulado pela parte autora, a prestação jurisdicional deve necessariamente ressalvar a possibilidade de o Conselho Profissional fiscalizar a impetrante quanto à instrução de atividades de preparação e/ou condicionamento físico e outras que ultrapassam a transmissão de técnicas e táticas de jogo.

Requer o provimento do recurso para reformar a r. sentença, a fim de julgar improcedente o pedido formulado na petição inicial. Subsidiariamente, pleiteia que seja excluída a possibilidade de o apelado ministrar treinos para crianças, adolescentes e idosos (ID 307771367)..

Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.

Em seu parecer, o Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação (ID 308166730).

É o relatório.  

 

 


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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012852-42.2024.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

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Advogado do(a) APELADO: SILVIA ROMANO AMORIM - SP378339-A

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V O T O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Cinge-se a controvérsia quanto à obrigatoriedade de inscrição do impetrante no Conselho Regional de Educação Física da 4ª. Região CREF4/SP para o exercício da profissão de técnico/instrutor de beach tennis.

A Constituição Federal, no artigo 5º, inciso XIII, dispõe que “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

O livre exercício de profissão constitui direito fundamental individual a ser assegurado de forma ampla, podendo, no entanto, sofrer limitações previstas em lei em sentido estrito, com objetivo de proteger a coletividade contra possíveis riscos decorrentes da própria prática profissional ou de promover outros valores de relevo constitucional como a segurança, a saúde, a ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio, a proteção especial da infância e outros.

Assim, segundo orientação firmada pelo E. Supremo Tribunal Federal, é legítima a atuação legislativa "quando o inadequado exercício de determinada atividade possa vir a causar danos a terceiro e desde que observem critérios de adequação e razoabilidade" (ADPF 183, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 27-09-2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-250  DIVULG 12-11-2019  PUBLIC 18-11-2019).

Ainda, conforme entendimento firmado por aquele E. Tribunal Superior, “são diretrizes para a atividade legislativa tendente a condicionar o exercício de alguma profissão: (a) a lei não pode estabelecer limitações injustificadas, arbitrárias ou excessivas; (b) as limitações instituídas pela lei devem fundamentar-se em critérios técnicos capazes de atenuar os riscos sociais inerentes ao exercício de determinados ofícios; e (c) as limitações instituídas pela lei não podem dificultar o acesso a determinada categoria profissional apenas sob o pretexto de favorecer os seus atuais integrantes, mediante restrição exclusivamente corporativista do mercado de trabalho” (RE 1263641, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 13-10-2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-259  DIVULG 27-10-2020  PUBLIC 28-10-2020).

No tocante à matéria tratada nos autos, a Lei n. 9.696/1998, que regulamenta a Profissão de Educação Física e cria os Conselhos Federal e Regionais de Educação Física, define em seu artigo 1º que apenas profissionais com registro regular no respectivo Conselho Regional poderão atuar na atividade de Educação Física e receber a designação de "Profissional de Educação Física".

O artigo 2º, da Lei nº 9.696/1998, ao tratar da inscrição dos profissionais nos quadros dos Conselhos Regionais de Educação Física, assim dispõe:

“Art. 2o Apenas serão inscritos nos quadros dos Conselhos Regionais de Educação Física os seguintes profissionais:

I – os possuidores de diploma obtido em curso superior de Educação Física oficialmente autorizado ou reconhecido pelo Ministério da Educação;    (Redação dada pela Lei nº 14.386, de 2022)

II - os possuidores de diploma em Educação Física expedido por instituição de ensino superior estrangeira, revalidado na forma da legislação em vigor;

III - os que tenham comprovadamente exercido atividades próprias dos Profissionais de Educação Física até a data de início da vigência desta Lei, nos termos estabelecidos pelo Conselho Federal de Educação Física (Confef);   (Redação dada pela Lei nº 14.386, de 2022)

IV - os egressos de cursos superiores de Tecnologia conexos à Educação Física, oficiais ou reconhecidos pelo Ministério da Educação, cujos eixos tecnológicos sejam direcionados às áreas de conhecimento abrangidas por esta Lei, conforme regulamentado pelo Confef.   (Incluído pela Lei nº 14.386, de 2022)”

 

De outra parte, o artigo 3º, da referida lei, elenca as atividades que competem ao Profissional de Educação Física, in verbis:

"Art. 3o Compete ao Profissional de Educação Física coordenar, planejar, programar, supervisionar, dinamizar, dirigir, organizar, avaliar e executar trabalhos, programas, planos e projetos, bem como prestar serviços de auditoria, consultoria e assessoria, realizar treinamentos especializados, participar de equipes multidisciplinares e interdisciplinares e elaborar informes técnicos, científicos e pedagógicos, todos nas áreas de atividades físicas e do desporto."

 

Como se observa, a lei não contempla previsão expressa de que o exercício das atividades de técnico/ treinador de tênis/ beach tennis seria privativo dos detentores de diploma de nível superior em Educação Física ou que obrigue a inscrição dos referidos profissionais nos Conselhos Regionais de Educação Física.

Embora o artigo 3º estabeleça rol genérico e abstrato de atividades de competência do profissional de Educação Física, não é possível conferir interpretação ampliativa ao dispositivo legal a ponto de permitir que, para o exercício de qualquer atividade de instrução relacionada ao esporte, seja exigida do profissional inscrição no Conselho de Fiscalização, sob pena de restringir de forma injustificada a garantia fundamental de livre exercício da profissão.

Não se compreendem no âmbito da ciência da Educação Física simples atividades de instrução técnica de práticas desportivas, visando apenas à iniciação ou ao aprimoramento técnico do desportista, que não se confundam com a capacitação e desenvolvimento físico em si, estes de exercício exclusivo do profissional de Educação Física. 

A instrução técnica consiste apenas em oferecer noções sobre as regras de uma modalidade esportiva, bem como posturas corporais adequadas ao melhor desempenho, inconfundíveis com as atividades de capacitação físico-orgânicas de que cuidam os profissionais da Educação Física. 

A respeito da matéria, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos REsp 1.959.824/SP, 1.963.805/SP e 1.966.023/SP, Tema Repetitivo n. 1149 definiu a seguinte tese: “A Lei 9.969/1998 não prevê a obrigatoriedade de inscrição de técnico ou treinador de tênis nos Conselhos de Educação Física, nem estabelece a exclusividade do desempenho de tal função aos profissionais regulamentados pela referida norma, quando as atividades desenvolvidas pelo técnico ou treinador de tênis restrinjam-se às táticas do esporte em si e não se confundam com preparação física, limitando-se à transmissão de conhecimentos de domínio comum decorrentes de sua própria experiência em relação ao referido desporto, o que torna dispensável a graduação específica em Educação Física” (REsp n. 1.959.824/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 8/3/2023, DJe de 25/4/2023).

De igual maneira, o C. Superior Tribunal de Justiça já manifestou entendimento quanto ao não enquadramento das atividades instrutor/ técnico de tênis de mesa, beach tennis e squash na legislação específica de profissional de educação física, por não estarem elencadas na Lei n. 9.696/1998:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSELHOS REGIONAIS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL E AFINS. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. O ARESTO RECORRIDO ENCONTRA-SE EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. NÃO HÁ DETERMINAÇÃO DE SOBRESTAMENTO.

I - Na origem, trata-se de mandado de segurança contra ato do Presidente do Conselho Regional de Educação Física da 4ª Região - CREF4/SP objetivando tutela jurisdicional no sentido de lhe ser garantido o direito de exercer a atividade remunerada de treinador/técnico de tênis de quadra/saibro sem a obrigatoriedade de sua inscrição perante o CREF da 4ª Região/SP, bem assim para que a autoridade impetrada se abstenha de fiscalizar suas atividades laborais. Na sentença foi concedida a segurança. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida.

II - No que trata da indicação de negativa de vigência aos arts. 2º, III, e 3º, da Lei n. 9.696/1998, sem razão a autarquia recorrente, encontrando-se o aresto recorrido em consonância com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que: "[...] a atividade de um técnico, instrutor ou treinador está associada às táticas do esporte em si, e não à atividade física propriamente dita, o que torna dispensável a graduação específica em Educação Física. Tais competências não estão contempladas no rol do art. 3º da Lei 9.696/1998, que delimita tão somente as atribuições dos profissionais de educação física."

III - Assim, no sentido da jurisprudência do STJ, o treinador, instrutor ou técnico de tênis de quadra ou saibro (ou mesmo de mesa) não está obrigado a inscrever-se no Conselho Regional de Educação Física para o exercício profissional dessas atividades, tampouco pode haver qualquer restrição para o pleno exercício delas para quem não tem o diploma em educação física ou é inscrito no referido conselho profissional.

IV - Considerando-se que não há determinação de sobrestamento, deve ser indeferido o pedido.

V - Agravo interno improvido.

(AgInt no AREsp n. 1.974.991/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 25/4/2022, DJe de 28/4/2022.)

 

ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA. PROFESSOR DE TÊNIS. REGISTRO. NÃO OBRIGATORIEDADE.

I - Trata-se, na origem, de mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente do Conselho Regional de Educação Física da 5ª Região, consubstanciado na emissão de Termo de Fiscalização por suposta infração de exercício de atividade profissional sem o registro perante o CREF5. Na sentença, concedeu-se a segurança para reconhecer o direito do impetrante de ministrar aulas de beach tênis, independente de inscrição no CREF. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida. Esta Corte conheceu do agravo para negar provimento ao recurso especial.

II - A irresignação não merece prosperar. O STJ já firmou entendimento no sentido do acórdão recorrido, relativamente ao não enquadramento de determinadas atividades na legislação específica de profissional de educação física, por não estarem elencadas na legislação de regência, conforme se constata da leitura dos seguintes precedentes: (AgRg no REsp n. 1.210.526/PR, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 21/2/2017, DJe 6/3/2017, AgRg no REsp n. 1.513.396/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/4/2015, DJe 4/8/2015, AgRg no REsp n. 1.520.395/SP, Rel. Ministra Diva Malerbi (Desembargadora convocada TRF 3ª Região), Segunda Turma, julgado em 17/3/2016, DJe 31/3/2016, AgRg no REsp n. 1.568.434/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 18/2/2016, DJe 24/2/2016 e AgInt no AREsp n. 907.088/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 20/9/2016, DJe 23/9/2016).

III - Observado que o entendimento aqui consignado, lastreado na jurisprudência, é prevalente no Superior Tribunal de Justiça, aplica-se o enunciado da Súmula n. 568/STJ.

IV - Agravo interno improvido.

(AgInt no AREsp 1.535.150/CE, rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 20/5/2020.)

 

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INSCRIÇÃO PERANTE O CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA. TÉCNICO DE TÊNIS DE MESA. INEXISTÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE. FALTA DE PREVISÃO LEGAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 3o. DA LEI 9.696/1998. A INTERVENÇÃO ESTATAL, IMPONDO REQUISITOS SUBJETIVOS À LIBERDADE PROFISSIONAL (NO SENTIDO DE ACESSO A DETERMINADA PROFISSÃO), NECESSITA DE ROBUSTA JUSTIFICAÇÃO NA TUTELA DE BENS JURÍDICO-CONSTITUCIONAIS COLETIVOS. IRRELEVÂNCIA DA CLASSIFICAÇÃO DA ATIVIDADE DE TÉCNICO DESPORTIVO COMO PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA PELO ANTIGO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. NORMA INFRALEGAL E, ADEMAIS, VOLTADA A FINALIDADES DISTINTAS, NOS ASPECTOS TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO DA AUTARQUIA FEDERAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. O presente Recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo 3 do STJ, segundo o qual, aos recursos interpostos com fundamento no Código Fux (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo Código.

2. A controvérsia cinge-se a definir se o técnico de esporte (tênis de mesa) é obrigado, para poder exercer suas atividades profissionais, a inscrever-se junto ao Conselho Regional de Educação Física (CREF) respectivo.

3. A questão já foi enfrentada diversas vezes por esta Corte Superior, cuja jurisprudência entende pela desnecessidade da inscrição, por inexistir qualquer previsão legal que a determine. Julgados: AgInt no AREsp. 1.176.148/SP, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 16.10.2018; AgInt no AREsp. 958.427/SP, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJe 14.2.2018; AgRg no REsp. 1.513.396/SC, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 4.8.2015.

4. O art. 3o. da Lei 9.696/1998 não estatui quais são os profissionais de educação física que devem se inscrever nos Conselhos de Educação Física, mas, tão somente, elenca as atribuições daqueles que inserem na mencionada categoria (STJ, AgRg no REsp. 1.541.312/RS, Rel. Min. DIVA MALERBI DJe 31.3.2016).

5. Não há, destarte, qualquer norma legal obrigando a inscrição dos técnicos desportivos perante o Conselho, de maneira que exigi-la do particular à margem de previsão em Lei implicaria grave ofensa ao direito fundamental à liberdade profissional (art. 5o., XIII da CF/1988).

6. A própria conformação desse direito, aliás, repele intervenções estatais desmedidas em sua área de proteção, que devem sempre restar justificadas na tutela de outros bens jurídico-constitucionais e na inexistência de alternativa menos gravosa à posição jurídica do particular.

7. Não custa lembrar que a exigência de inscrição do técnico desportivo perante o CREF traz consigo, além do ônus financeiro de pagamento das contribuições anuais, uma outra limitação relevante ao exercício do direito à liberdade de profissão, a saber: a comprovação de uma específica qualificação profissional, por meio do diploma em curso de educação física, nos termos do art. 2o., I e II da Lei 9.696/1998.

8. Portanto, requerer do particular a inscrição no Conselho Profissional não corresponderia apenas a uma limitação formal em sua liberdade de profissão, mas verdadeira restrição à escolha da atividade profissional, por impor uma condição bastante onerosa ao estabelecer quem poderá exercer tal atividade profissional: apenas os titulares do diploma em curso de educação física.

9. A doutrina constitucional, amparada na conhecida decisão do Tribunal Constitucional Federal Alemão no caso Farmácias (Apotheken-Urteil), proferida em 1958, costuma classificar as intervenções estatais na liberdade profissional em três degraus (Dreistufentheorie), conforme a intensidade do ônus colocado sobre o particular.

10. No primeiro degrau, estão as intervenções mais leves, que tratam somente do modo como deve ser exercida determinada profissão - sem restringir, portanto, o acesso à atividade profissional em si.

11. O segundo degrau, que interessa mais propriamente a este processo, contém as intervenções que preveem requisitos subjetivos para a escolha de uma profissão, a exemplo da exigência de qualificação prévia ou obtenção de algum diploma.

12. No terceiro degrau, por fim, se incluem as restrições objetivas à escolha profissional, impondo obstáculos ao acesso a determinada profissão que não dependem de qualquer atividade do particular para que sejam superados - por exemplo, um número máximo de inscritos em determinada atividade, justamente o caso julgado pela Corte Alemã.

13. A relevância da classificação então empreendida é a conclusão de que a restrição à liberdade profissional só é válida se a proteção do bem jurídico-constitucional por ela buscada não puder ser alcançada por um degrau anterior (em outras palavras, por uma intervenção estatal menos gravosa), até mesmo como corolário da proibição de excesso, que orienta o princípio da proporcionalidade.

14. No presente caso, a parte agravante pleiteia que seja aplicada uma séria limitação subjetiva no acesso à profissão de técnico desportivo, à margem de qualquer previsão legal e sem justificar, minimamente, a necessidade concreta dessa restrição.

15. Assim, soma-se à completa ausência de previsão legal para a exigência de inscrição a falta de uma justificativa suficiente à pretendida intervenção estatal no direito à liberdade profissional da parte agravada.

16. Quanto à alegada existência de classificação, feita pelo antigo Ministério do Trabalho e Emprego, que elenca o técnico de desporto individual ou coletivo como subcategoria do gênero profissional de educação física, também não procede a argumentação da parte agravante.

17. Primeiramente, porque o escopo da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) não é obrigar a inscrição de quem quer que seja perante Conselhos Profissionais, em evidente limitação à liberdade profissional. Na realidade, e conforme destacado pela nota técnica colacionada pela própria parte agravante (fls. 570), a CBO destina-se ao cumprimento das obrigações previdenciárias e trabalhistas, não podendo, destarte, fundamentar a pretensão de exigir inscrição junto ao Conselho.

18. Em segundo lugar, a norma instituidora da CBO, com o status de Portaria expedida pelo Poder Executivo, é de natureza infralegal, e por isso não poderia, jamais, substituir a necessidade de Lei em sentido formal.

19. Apenas a previsão em Lei, e devidamente justificada pela necessidade de proteção a um bem jurídico-constitucional, portanto, poderia embasar a exigência de submeter o agravado à inscrição no Conselho. Inexistindo tal norma, deve ser mantida a garantia ao livre exercício da profissão, conforme assegurado pelas instâncias ordinárias e pela decisão agravada.

20. Agravo Interno da Autarquia Federal a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp n. 1.222.766/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 24/9/2019, DJe de 3/10/2019.)

 

Deste modo, não é obrigatório o registro do impetrante nos quadros do Conselho Regional de Educação Física para exercer a profissão de técnico/treinador de beach tennis, desde que as atividades se restrinjam à técnica do esporte e não se confundam com preparação física.

Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos do artigo 25 da Lei n. 12.016/2009 e das Súmulas 512 do STF e 105 do STJ.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É o voto.

 



E M E N T A

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA. INSTRUTOR/ TÉCNICO DE BEACH TENNIS. INEXIGIBILIDADE DE REGISTRO PROFISSIONAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.

- Cinge-se a controvérsia quanto à obrigatoriedade de inscrição do impetrante no Conselho Regional de Educação Física da 4ª. Região CREF4/SP para o exercício da profissão de técnico/instrutor de beach tennis.

- O livre exercício de profissão insculpido no artigo 5º, XIII, da Constituição Federal, constitui direito fundamental individual a ser assegurado de forma ampla, podendo, no entanto, sofrer limitações previstas em lei em sentido estrito, com objetivo de proteger a coletividade contra possíveis riscos decorrentes da própria prática profissional ou de promover outros valores de relevo constitucional como a segurança, a saúde, a ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio, a proteção especial da infância e outros.

- Conforme entendimento firmado pelo E. Supremo Tribunal Federal, “são diretrizes para a atividade legislativa tendente a condicionar o exercício de alguma profissão: (a) a lei não pode estabelecer limitações injustificadas, arbitrárias ou excessivas; (b) as limitações instituídas pela lei devem fundamentar-se em critérios técnicos capazes de atenuar os riscos sociais inerentes ao exercício de determinados ofícios; e (c) as limitações instituídas pela lei não podem dificultar o acesso a determinada categoria profissional apenas sob o pretexto de favorecer os seus atuais integrantes, mediante restrição exclusivamente corporativista do mercado de trabalho” (RE 1263641, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 13-10-2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-259  DIVULG 27-10-2020  PUBLIC 28-10-2020).

- No tocante à matéria tratada nos autos, a Lei n. 9.696/1998, que regulamenta a Profissão de Educação Física e cria os Conselhos Federal e Regionais de Educação Física, não contempla previsão expressa de que o exercício das atividades de técnico/ treinador de tênis/ beach tennis seria privativo dos detentores de diploma de nível superior em Educação Física ou que obrigue a inscrição dos referidos profissionais nos Conselhos Regionais de Educação Física.

Embora o artigo 3º estabeleça rol genérico e abstrato de atividades de competência do profissional de Educação Física, não é possível conferir interpretação ampliativa ao dispositivo legal a ponto de permitir que, para o exercício de qualquer atividade de instrução relacionada ao esporte, seja exigida do profissional inscrição no Conselho de Fiscalização, sob pena de restringir de forma injustificada a garantia fundamental de livre exercício da profissão.

- Não se compreendem no âmbito da ciência da Educação Física simples atividades de instrução técnica de práticas desportivas, visando apenas à iniciação ou ao aprimoramento técnico do desportista, que não se confundam com a capacitação e desenvolvimento físico em si, estes de exercício exclusivo do profissional de Educação Física.

- A instrução técnica consiste apenas em oferecer noções sobre as regras de uma modalidade esportiva, bem como posturas corporais adequadas ao melhor desempenho, inconfundíveis com as atividades de capacitação físico-orgânicas de que cuidam os profissionais da Educação Física. 

- Com efeito, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos REsp 1.959.824/SP, 1.963.805/SP e 1.966.023/SP, Tema Repetitivo n. 1149 definiu a seguinte tese: “A Lei 9.969/1998 não prevê a obrigatoriedade de inscrição de técnico ou treinador de tênis nos Conselhos de Educação Física, nem estabelece a exclusividade do desempenho de tal função aos profissionais regulamentados pela referida norma, quando as atividades desenvolvidas pelo técnico ou treinador de tênis restrinjam-se às táticas do esporte em si e não se confundam com preparação física, limitando-se à transmissão de conhecimentos de domínio comum decorrentes de sua própria experiência em relação ao referido desporto, o que torna dispensável a graduação específica em Educação Física” (REsp n. 1.959.824/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 8/3/2023, DJe de 25/4/2023).

- De igual maneira, o C. Superior Tribunal de Justiça já manifestou entendimento quanto ao não enquadramento das atividades instrutor/ técnico de tênis de mesa, beach tennis e squash na legislação específica de profissional de educação física, por não estarem elencadas na Lei n. 9.696/1998.

- Deste modo, não é obrigatório o registro do impetrante nos quadros do Conselho Regional de Educação Física para exercer a profissão de técnico/treinador de beach tennis, desde que as atividades se restrinjam à técnica do esporte e não se confundam com preparação física.

- Apelação desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RUBENS CALIXTO
DESEMBARGADOR FEDERAL