Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5028797-22.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: DIRCE ALVARENGA DA SILVA

Advogado do(a) APELADO: SELMA SUELI SANTOS DO NASCIMENTO - SP72107-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5028797-22.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: DIRCE ALVARENGA DA SILVA

Advogado do(a) APELADO: SELMA SUELI SANTOS DO NASCIMENTO - SP72107-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­R E L A T Ó R I O

 

 

Demanda proposta objetivando a declaração de que a requerente trabalhou na atividade rural nos períodos de 1.º/6/1956 a 31/12/1968 e a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, desde a DER, em 18/10/2016.

O juízo a quo julgou procedente o pedido para o fim de reconhecer que a parte autora trabalhou na lavoura no período compreendido entre 1.º/6/1956 a 31/12/1968 e condenar a parte requerida a implantar em favor da parte autora o benefício previdenciário consistente na aposentadoria por idade, correspondente a um salário mínimo nacional (art. 39, parágrafo único, da Lei nº 8.213/1991), a partir do requerimento administrativo (18/10/2016), nos termos do art. 49, da Lei nº 8.213/1991.

O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, que não há prova material para averbação de tempo de serviço no meio rural desde os 12 anos de idade, bem como que, na época em que completado o requisito etário,  a autora não mais trabalhava nas lides rurais, não se justificando a concessão da aposentadoria por idade.

Com contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5028797-22.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: DIRCE ALVARENGA DA SILVA

Advogado do(a) APELADO: SELMA SUELI SANTOS DO NASCIMENTO - SP72107-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­V O T O

 

 

Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

 

APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)

 

O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.

Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).

Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício.

Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.

Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.

O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.

Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.

Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).

Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.

Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.

Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06.

Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.

É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.

Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.

Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”

 

"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

 

DO CASO DOS AUTOS

 

O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 1.º/6/1999, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 108 meses.

Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:

- RG e CPF;

- Certidão de casamento da autora, celebrado em 30/8/1965, sem a qualificação do marido e com a qualificação da autora como líder doméstica;

- Certidão de casamento dos pais da autora, celebrado em 28/11/1941, constado a profissão de lavrador do seu pai;

- Certidão de nascimento da irmã da autora, em 28/1/1955, constando a profissão de lavrador do genitor;

- Certidão de nascimento de Maria Lucia da Silva, filha da autora, em 4/7/1966, constando o domicílio na Fazenda Dourados;

- Certidão de nascimento de Orlando Carlos da Silva, filho da autora, em domicílio, no dia 11/11/1967, constando a profissão de lavrador do genitor;

- Comunicado de indeferimento do benefício requerido em 18/10/2016 “por não ter sido comprovado o efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua no período correspondente à carência do benefício imediatamente anterior ao requerimento ou a data em que implementou a idade exigida necessária”.

 

Cabe ressaltar a existência de prova oral. Em audiência realizada em 5/9/2019 foram ouvidas duas testemunhas.

Lázara de Souza Barbosa Sergio, nascida em 1955, disse que conhece a autora da Fazenda Eldorado desde quando tinha 5 anos de idade. A autora mudou para lá quando ela tinha 5 anos de idade. Contou que a autora  trabalhava na roça. Lá tinha arroz, milho, algodão, feijão. A testemunha ficou lá até 1975. A D. Dirce mudou de lá em 1968. Nesse período a autora trabalhou na roça. Quem trabalhava com ela era a família dela, seu pai, sua mãe.

Julia Andrade Cruz Nishina, nascida em 1952, contou conhecer a autora lá da Fazenda Eldorado. A testemunha tinha uns 5, 6 anos. Por volta de 1960. Ambas moravam na Fazenda Eldorado e trabalhavam na roça. Lá tinha arroz, feijão, milho, algodão. Ela ficou muitos anos lá. Uns 8 anos ou mais. Depois a autora saiu e a testemunha continuou lá. Lá era trabalho de roça. Capinar, plantar, colher.

O início de prova material foi corroborado pela prova testemunhal, permitindo verificar que a autora exerceu atividade rural de 1.º/6/1956 a 31/12/1968.

Todavia, não há qualquer prova do exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário/requerimento do benefício.

Esclareça-se que o Colendo Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, no julgamento do RESP n.º 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário.

Anote-se que na inicial a autora não faz qualquer menção ao exercício de atividade rural após 1968.

Ademais, a pesquisa ao CNIS revela que o marido da autora iniciou vínculo em construção civil em 1973, permanecendo nesse ramo de atividade até 2014.

Em suma, além da autora não ter declarado qualquer exercício de atividade rural após 1968, não há qualquer prova, material ou oral, que demonstre o exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao cumprimento do requisito etário/requerimento do benefício, razão pela qual a concessão do benefício resta indeferida.

Ante a sucumbência mínima do INSS, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do art. 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça.

Posto isso, mantenho o reconhecimento do exercício de atividade rural no período compreendido entre 1.º/6/1956 a 31/12/1968  e dou parcial provimento ao apelo do INSS para julgar improcedente o pedido de concessão da aposentadoria por idade, na forma da fundamentação.

É o voto.

 

 

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. DECLARAÇÃO DE TEMPO DE ATIVIDADE RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova testemunhal.

- Restou comprovados nos autos o exercício de atividade rural de 1.º/6/1956 a 31/12/1968.

- A autora não declarou qualquer exercício de atividade rural após 1968.

- Indeferida a concessão do benefício.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, manteve o reconhecimento do exercício de atividade rural no período compreendido entre 1.º/6/1956 a 31/12/1968 e deu parcial provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
THEREZINHA CAZERTA
DESEMBARGADORA FEDERAL