RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5027044-56.2024.4.03.6301
RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: DANILO SERGIO PEREIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: CARLOS CESAR SPOSITO DE CAMARGO BRAGA - SP135396-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5027044-56.2024.4.03.6301 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: DANILO SERGIO PEREIRA Advogado do(a) RECORRENTE: CARLOS CESAR SPOSITO DE CAMARGO BRAGA - SP135396-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: RELATÓRIO No início do Voto.
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5027044-56.2024.4.03.6301 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: DANILO SERGIO PEREIRA Advogado do(a) RECORRENTE: CARLOS CESAR SPOSITO DE CAMARGO BRAGA - SP135396-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O V E N C E D O R Vistos. Disse a r. sentença, cujo relatório tomo a liberdade de adotar: “Trata-se de ação proposta por DANILO SERGIO PEREIRA em face do Instituto Nacional do Seguro Social — INSS, por meio da qual requer a REVISÃO da renda mensal de benefício por incapacidade que titulariza. Em síntese, narra a parte autora que recebeu benefício por incapacidade temporária (NB 631.486.420-1, DIB 05.11.2019), posteriormente convertido no benefício de aposentadoria por incapacidade permanente (NB 639.970.852-0, DIB em 29.09.2020), com a renda mensal calculada nos termos da EC 103/2019. No entanto, assevera que a forma de cálculo do benefício que titulariza deve respeitar as regras anteriores à EC 103/2019, uma vez que o início da incapacidade, para efeito da aposentadoria por incapacidade permanente, deveria ser o mesmo considerado para o benefício por incapacidade temporária. O pedido de antecipação de tutela foi indeferido (ID 333919451). Citado, o INSS apresentou contestação (ID 336322152). Vieram-me os autos conclusos para sentença. É o breve relatório. Passo a decidir. A controvérsia reside em estabelecer qual a legislação aplicável no cálculo do benefício por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez) objeto dos autos. Regra geral, os benefícios previdenciários devem ser calculados com base na legislação vigente na data de seu início (DIB), em obediência ao princípio tempus regit actum. Compulsando os autos, verifico que o benefício por incapacidade permanente (NB 636.970.852-0) teve sua DIB em 29.09.2020, na vigência da EC 103/2019 (ID 333088622). Especificamente com relação ao cálculo do valor dos benefícios por incapacidade, o art. 26 da EC 103/2019 assim dispõe: (...) Da leitura do supracitado dispositivo, verifica-se que o art. 26, §§ 2º e 5º, ambos da EC 103/2019, alterou a regra de cálculo da RMI da aposentadoria por invalidez (aposentadoria por incapacidade permanente), até que Lei discipline o cálculo dos benefícios do RGPS. A nova metodologia dos cálculos indica que o valor do benefício corresponderá a 60% da média aritmética simples dos salários de contribuição no PBC, limitada ao valor máximo do salário de contribuição do RGPS, com acréscimo de 2% para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 20 anos de contribuição para segurados homens ou 15 anos de contribuição para seguradas mulheres. O art. 26, § 3º, inciso II, traz a exceção para as aposentadorias decorrentes de acidente de trabalho, doença profissional ou doença do trabalho, sendo que nessas o valor da RMI permanece em 100% da média aritmética simples dos salários de contribuição no PBC, o que não é a hipótese dos autos. Entendo que a forma de cálculo da RMI da aposentadoria deverá seguir a norma constitucional vigente ao tempo da data de início deste benefício, e não do benefício anterior, já que não se trata de “prorrogação” de auxílio-doença/benefício por incapacidade temporária vigente, como sugere a parte autora na inicial, mas sim de concessão de novo benefício, de espécie distinta, que tem requisito distinto (a existência da incapacidade permanente). No ponto, não vislumbro qualquer inconstitucionalidade do art. 26 da EC 103/2019, tratando-se de resultado de escolha legislativa efetuado pelo Congresso Nacional ao determinar que, ao passo em que o valor do benefício temporário de auxílio doença substitutivo do salário corresponda a quantia equivalente à remuneração percebida pelo segurado/trabalhador, o valor do benefício permanente de aposentadoria por invalidez deva ser inferior e calculado conforme tempo contributivo já acumulado pelo filiado ao RGPS, não cabe ao Judiciário afastar a norma apenas por, em razão de critérios subjetivos do julgador, considerá-la inadequada, ruim ou até “injusta”. Por conseguinte, não há que se falar em restituição de valores que porventura tenham sido indevidamente descontados. A corroborar todo o exposto, a decisão proferida pela 8ª Turma Recursal de São Paulo: (...) Ante todo o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso interposto pela parte ré (INSS) para reformar parcialmente r. sentença, afastando a determinação de cálculo do benefício com base no benefício anterior de auxílio-doença, determinando seja observada a legislação vigente na data de início do benefício por incapacidade permanente concedido. (RECURSO INOMINADO CÍVEL. SIGLA_CLASSE: RecInoCiv 000190160.2019.4.03.6323..PROCESSO_ANTIGO:.PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATORC:, TRF3 - 8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, Intimação via sistema DATA: 26/12/2021). Por derradeiro, não pode ser acolhida a alegação de que a RMI do benefício por incapacidade permanente dever ser concedida conforme regras de cálculo não mais vigentes, por se tratar de aposentadoria precedida de benefício por incapacidade temporária. Ora, se o benefício anteriormente recebido era um benefício por incapacidade temporária, e não um benefício por incapacidade permanente, resta claro que no ato de sua concessão e durante todo o período de sua manutenção não havia incapacidade permanente, mas somente temporária, tendo a incapacidade permanente surgido, como resultante da evolução de seu quadro clínico, somente posteriormente, ocasionando a conversão do benefício por incapacidade temporária no benefício por incapacidade permanente. Assim, por tudo o que foi dito, são improcedentes os pedidos contidos na inicial. Diante do exposto, resolvo o mérito da controvérsia na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS formulados na inicial. (...) Concedo os benefícios da justiça gratuita” (grifei). A parte autora interpôs recurso inominado tempestivamente. Da mesma forma que fiz em relação à sentença, transcrevo os excertos que considero principais: “A r. sentença de Primeiro Grau julgou improcedente a ação, sob o entendimento de que a aposentadoria por invalidez não é uma prorrogação do auxílio-doença (quando concedida na sequência da mesma), mas sim um novo benefício, o que obrigaria que o seu cálculo obedecesse a regra vigente na data do seu início. Entretanto, esse não é exatamente o entendimento dos nossos tribunais, os quais consideram o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez como benefícios complementares; entendem que a data da eclosão da incapacidade temporária (que se transformou em permanente), é a data que deve ser considerada para o cálculo da aposentadoria por invalidez; e que nesses casos em que a causa eficiente decorre do mesmo fato, a data a ser considerada para o cálculo é a do início da incapacidade. (...) Note-se que a obediência ao princípio tempus regit actum foi utilizada na r. sentença, para justificar porque a regra da EC/2019 é que deveria ser aplicada aos casos de aposentadoria por invalidez com concessão na vigência dessa emenda. Entretanto, a obediência ao princípio tempus regit actum também foi utilizada em vários dos acórdãos acima, como fundamentação do porquê o cálculo deve ser realizado seguindo as regras anteriores à Emenda EC/2019, nos casos em que a concessão da aposentadoria por invalidez foi concedia na vigência dessa emenda, mas precedida de auxílio-doença, concedido anterior à vigência. Sendo assim, resta claro que, nos casos como o do segurado, a aplicação da regra contida no momento da eclosão da moléstia, significaria o respeito ao tempus regit actum, e não o contrário. Outrossim, cabe ressaltar que o único v. acórdão citado na r. sentença, proferido em 2021 pela 8ª. Turma Recursal de São Paulo, é isolado e está ultrapassado, não podendo ser considerado. (...) Isto posto, aguarda a reforma da r. sentença nos termos acima expostos, requerendo seja dado provimento ao presente recurso, condenando a autarquia à implantação da aposentadoria revisada (afastando a regra da EC 103/19 e adotando 100% do salário de benefício), bem como a providenciar o pagamento da diferença entre o novo valor e o efetivamente pago, desde a data de início da aposentadoria, com as cominações de praxe, inclusive a condenação na verba sucumbencial”. Sem contrarrazões da autarquia previdenciária. É o extenso relatório. Da leitura integral dos autos para elaboração do presente Voto, chamou minha atenção a seguinte informação disponível nos laudos SABI acostados pela parte autora à inicial que foi ignorada pela sentença: “Considerações: Laudo devido ação judicial de concessão ou de reativação”. ID 306635656 Desde logo, antes que se alegue indevidamente decisão surpresa, repita-se, estou a analisar os documentos juntados pela própria parte autora. Pois bem. Aparentou-se, assim, que a parte autora pode estar a buscar, por via transversa, a rescisão de uma decisão judicial prévia sem assim o dizer, pois não foi escrita em petição inicial ou recurso uma única palavra a respeito da existência de ações judiciais anteriores. Dizer que a aposentadoria por invalidez deve ter RMI obedecendo as regras legais existentes quando da eclosão da incapacidade que levou à concessão do benefício de auxílio-doença significa dizer que, quando de tal fato, já havia motivos para a concessão de aposentadoria por invalidez, pois se os motivos para a aposentação permanente surgiram somente depois, a parte autora estaria, invariavelmente, a concordar com a sentença (remeto o leitor ao trecho por mim grifado em sentença). Respeitosamente, não vejo outra forma de encarar o fenômeno jurídico. Procedendo à pesquisa de ofício pelo CPF da parte autora no sistema PJE1g da JF3R – e lembre-se, coisa julgada é tema cognoscícel de ofício - localizei três processos (um deles é o presente ora em julgamento): Compulsei-os. O mais antigo, 0034394-59.2019.4.03.6301, autuado em 08.08.2019, é justamente um pedido de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. Houve perícia judicial médica nesse processo, ID 233394884, que assim concluiu: “11. Caso seja constatada incapacidade total, esta é temporária ou permanente? R. Temporária. 12. É possível estimar qual é o tempo necessário para que o periciando se recupere e tenha condições de voltar a exercer seu trabalho ou atividade habitual? Justifique. Em caso positivo, qual é a data estimada? R. 04 meses, tempo necessário para ajuste do tratamento e recuperação”. Prolatada, então, sentença homologatória de acordo, tendo a parte autora aceitado as seguintes condições oferecidas pela autarquia previdenciária: “1.DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO: O INSS concederá o benefício de AUXÍLIO-DOENÇA nos seguintes termos: DIB: 05/11/2019 (DII) DIP: 1º dia do Mês em que for efetivada a IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. Manutenção do benefício até 05/03/2020 (DCB)” (ID 233395340). Esta sentença homologatória de acordo transitou em julgado (ID 233396014). DIB em 05.11.2019 é justamente o benefício de auxílio-doença que dá amparo à tese autoral. Não é possível considerar que em 05.11.2019 eclodira incapacidade total, pois o Judiciário já disse, com base em laudo médico, CONCORDÂNCIA formal da parte autora e TRÂNSITO EM JULGADO, que naquele momento, havia incapacidade TEMPORÁRIA, que daria ensejo à auxílio-doença. A segunda ação judicial, autos n. 5002710-26.2021.4.03.6183, discutiu exatamente a mesma patologia e o direito ao benefício por incapacidade, se permanente ou temporário. E assim se concluiu na r. sentença daqueles autos: “III - DISPOSITIVO Com estas considerações, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados por DANILO SÉRGIO PEREIRO, inscrito no CPF/MF sob nº 055.077.028-37, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS. Extingo o processo com julgamento do mérito, a teor do que preceitua o inciso I, do artigo 487, do Código de Processo Civil. Condeno a autarquia previdenciária a conceder o benefício previdenciário por incapacidade permanente desde a cessação do benefício NB 31/631.486.420-1, que se verificou em 28-09-2020, bem como pagar os valores em atraso desde a mesma data” (ID 98254546). Esta sentença também transitou em julgado (ID 150474617). A consolidação do direito à aposentadoria por invalidez, portanto, somente ocorreu depois do final do auxílio-doença, já na vigência das novas regras da EC 103, justamente como corretamente dito pela r. sentença, embora não pelos fundamentos mais individualizados e detalhados observados somente por este colegiado. Sem o dizer, a parte autora/recorrente, em verdade, está buscando reescrever o passado transitado em julgado em duas demandas judiciais, após inclusive o prazo de ação rescisória. O que há, de mediana clareza, é COISA JULGADA em duas demandas judiciais diversas sobre o mesmo tema, quanto aos termos iniciais do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez, que a parte autora busca desconstituir. É direito da parte autora pensar e defender o contrário, mas o nome dado ao fenômeno jurídico pela parte interessada na causa não altera a realidade dos fatos. A meu ver, e sempre respeitando o entendimento contrário, a autora litigou de má-fé. Sendo assim, considerando o valor da causa e a gravidade da conduta, com fundamento no art. 80 e 81 do CPC, atribuo em desfavor da parte autora multa por litigância de má-fé de 2% do valor da causa. Quantia a ser atualizada desde o ajuizamento da demanda nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, sob pena de inscrição em dívida ativa em favor do INSS (art. 96, CPC). Lembrando, por fim, que nos termos do art. 98, 4º, CPC, “A concessão de gratuidade não afasta o dever de o beneficiário pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas”. É o suficiente. CONCLUSÃO Ante o exposto, EXTINGO O PRESENTE PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, em razão da ocorrência de coisa julgada. Prejudicado o recurso autoral. Condeno a parte autora: Ao pagamento de honorários advocatícios em favor do INSS, em 10% sobre o valor da causa, com exigibilidade suspensa em razão da gratuidade; e Ao pagamento de multa por litigância de má-fé em favor do INSS, com exigibilidade ativa (art. 98, § 4º, CPC), sob pena de inscrição em dívida ativa caso não haja adimplemento no prazo de 15 dias úteis do trânsito em julgado, competindo ao Juizado responsável pelo cumprimento da sentença o encaminhamento pertinente. É como voto.
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5027044-56.2024.4.03.6301
RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: DANILO SERGIO PEREIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: CARLOS CESAR SPOSITO DE CAMARGO BRAGA - SP135396-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO DIVERGENTE
Peço vênia ao eminente Relator para apresentar divergência, pois entendo que a questão merece análise sob perspectiva distinta, especialmente considerando a natureza própria do Direito Previdenciário e suas implicações processuais.
De fato, o caso em análise apresenta uma sequência cronológica que merece destaque para a adequada compreensão da controvérsia: em 05.11.2019, foi concedido ao autor benefício por incapacidade temporária (NB 631.486.420-1). Oito dias depois, em 13.11.2019, entrou em vigor a EC 103/2019, que alterou significativamente as regras de cálculo dos benefícios previdenciários.
Posteriormente, em 29.09.2020, o benefício foi convertido em aposentadoria por incapacidade permanente (NB 636.970.852-0), ocasião em que foram aplicadas as novas regras de cálculo introduzidas pela reforma constitucional.
Em seu minucioso voto, o eminente Relator propõe a extinção do processo sem resolução de mérito em razão de coisa julgada, com aplicação de multa por litigância de má-fé.
Contudo, essa solução, com todo respeito, não me parece a mais adequada à luz dos princípios que regem o Direito Previdenciário e da própria natureza jurídica da coisa julgada nesta seara.
Isso porque, notei que a parte autora, já na petição inicial, apresentou documentação completa demonstrando a sequência cronológica dos benefícios, incluindo as cartas de concessão tanto do auxílio-doença quanto da aposentadoria por invalidez, bem como a declaração de benefícios que comprova a conversão direta, sem interrupção. Esta transparência processual afasta, a meu juízo, qualquer sugestão de má-fé, máxime porque as ações anteriores tramitaram na Justiça Federal e houve, no caso, prévio controle de prevenção.
No ponto, de se ver que o d. Juízo de Primeiro Grau decidiu pela não constatação de litispendência ou coisa julgada, conforme decisão id 306635667:
D E S P A C H O D E P R E V E N Ç Ã O
Não constato a ocorrência de litispendência ou coisa julgada em relação ao(s) processo(s) apontado(s) na aba “associados”, bem como quanto àquele(s) eventualmente indicado(s) na pesquisa manual de prevenção por CPF, pois as partes não são as mesmas e/ou são distintas as causas de pedir, tendo em vista que os fundamentos são diversos e/ou os pedidos são diferentes.
Dê-se baixa na prevenção.
Após, venham os autos conclusos para apreciação do pedido de antecipação dos efeitos da tutela.
Por outro lado, como bem assentado pelo Superior Tribunal de Justiça no AgInt no REsp n. 1.736.045/RJ, a coisa julgada em matéria previdenciária possui natureza rebus sic stantibus. Isso significa que seus efeitos permanecem imutáveis apenas enquanto mantida a situação fática que lhe deu origem.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. MILITAR. AUXÍLIO-INVALIDEZ. REVISÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO CONCEDIDO NA VIA JUDICIAL. POSSIBILIDADE. COISA JULGADA REBUS SIC STANTIBUS. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Cinge-se a controvérsia a definir se o benefício de auxílio-invalidez concedido ao recorrente, por meio de decisão judicial transitada em julgado, pode ser revisado na via administrativa ou somente poderia ser na via judicial.
2. Primeiramente, porque as normas legais e regulamentares que regem o benefício preveem a possibilidade de a administração militar suspender o pagamento do auxílio-invalidez, caso o inativo deixe de preencher os requisitos legais.
3. De outro lado, a coisa julgada formada em favor do recorrido possui natureza rebus sic stantibus, pois a imutabilidade dos efeitos da decisão transitada em julgado só persiste enquanto mantida a mesma situação fática.
4. "O que a jurisprudência desta Corte exige não é a aplicação do princípio do paralelismo das formas, é a concessão do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sempre que houver necessidade de revisão do benefício previdenciário, por meio do processo administrativo previdenciário, impedindo com isso, o cancelamento unilateral por parte da autarquia, sem oportunizar apresentação de provas que entenderem necessárias" (REsp 1.429.976/CE, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/2/2014, DJe 24/2/2014).
5. Assim, como a legislação permite à administração a inspeção do militar para averiguar a persistência dos motivos que deram ensejo à concessão do benefício, não há necessidade de a agravada buscar a via judicial para suspender o auxílio-invalidez, uma vez constatada em perícia médica a cessação da necessidade de internação especializada ou assistência ou cuidados permanentes de enfermagem.
6. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no REsp n. 1.736.045/RJ, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 24/8/2020, DJe de 27/8/2020.)
Além disso, a tese jurídica defendida pelo Autor encontra precedente específico no TRF3, em que a Desembargadora Federal Inês Virginia Prado Soares, no AI/SP 5016856-94.2021.4.03.0000, reconheceu expressamente que:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE PRECEDIDO DE BENEFÍCIO DE INCAPACIDADE TEMPORÁRIO. CÁLCULO DA RMI. REGRAS DA EC 103/2019 AFASTADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
- A controvérsia recursal restringe-se à aplicação das regras previstas na EC nº 103/2019 para o cálculo da renda mensal inicial do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente/aposentadoria por invalidez, precedido de auxílio por incapacidade temporária/auxílio-doença, concedido em data anterior à vigência da EC 103/2019.
- No caso, não há dúvida de que o início da incapacidade, para efeito da aposentadoria por invalidez, é o mesmo considerado para o auxílio-doença, eis que não houve interrupção entre os benefícios por incapacidade ou qualquer fato novo de agravamento, que não a evolução natural da própria doença.
- Assim, demonstrado que a data do início da incapacidade permanente é anterior à Reforma da Previdência nº 103/2019 (13/11/2019), a forma de cálculo desse benefício deve respeitar as regras anteriores à referida reforma.
- Não poderia ser diferente, eis que, no caso, trata-se de benefícios complementares, sendo a causa da impossibilidade de exercício do labor decorrente do mesmo fato. Ademais, o direito do segurado à percepção de benefício previdenciário ingressou na sua esfera jurídica no momento do início da incapacidade e não no da constatação ou confirmação da impossibilidade de recuperação ou reabilitação.
- Recurso parcialmente provido para que sejam afastadas as regras da EC 103/2019 para o cálculo da RMI do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente. (TRF 3ª Região, 7ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5016856-94.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 02/03/2023, Intimação via sistema DATA: 07/03/2023) (grifei)
No caso que ora julgamos, entendo que houve alteração substancial da situação fática: a incapacidade, inicialmente reconhecida como temporária, evoluiu para permanente. Esta modificação foi inclusive reconhecida judicialmente, razão pela qual entendo que não há que se falar em tentativa de rediscussão da matéria transitada em julgado.
A pretensão deduzida nestes autos - definição do marco temporal para aplicação das regras de cálculo do benefício - é juridicamente distinta daquela decidida nas ações anteriores. De fato, aqui não se busca rediscutir a natureza ou o momento da incapacidade, mas sim estabelecer qual regramento deve ser aplicado quando há conversão de benefício por incapacidade temporária em permanente.
A omissão quanto à existência das ações anteriores, embora não recomendável do ponto de vista da boa-fé processual, não me parece suficiente para caracterizar litigância de má-fé, considerando que, em meu entendimento, não houve tentativa de rediscutir matéria transitada em julgado; o objeto da presente ação é distinto da anterior; as ações anteriores são facilmente localizáveis no Sistema Processual da Justiça Federal, tanto assim que que o d. Juízo de Primeiro Grau decidiu, antes mesmo de determinar a citação, pela não ocorrência de litispendência ou coisa julgada.
Verifico, ainda, que a matéria central desta demanda - a aplicabilidade do art. 26, §2º, III, da EC 103/2019 aos casos de conversão de benefício por incapacidade temporária em permanente - encontra-se atualmente submetida a julgamento qualificado perante a TNU (Tema 318), que busca Definir se os benefícios de aposentadoria por incapacidade permanente, sob a vigência da EC nº 103/2019, devem ser concedidos ou revistos, de forma a se afastar a forma de cálculo prevista no art. 26, §2º, III, da EC nº 103/2019.
Ademais, a constitucionalidade do dispositivo está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal através das ADIs 6.254, 6.255, 6.256, 6.258, 6.271, 6.279, 6.289, 6.361, 6.367, 6.384, 6.385 e 6.916.
A identidade entre o objeto desta ação e a matéria submetida à análise da TNU e do STF recomenda, em nome da segurança jurídica e da isonomia, a suspensão do processo até a definição da questão em sede de precedente qualificado.
Assim, VOTO pela confirmação da inexistência de coisa julgada e de litigância de má-fé.
Quanto ao mérito, VOTO pela suspensão do processo até o julgamento definitivo do Tema 318 pela TNU o julgamento final das ADIs em trâmite no STF que discutem a matéria.
É como voto.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5027044-56.2024.4.03.6301
RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: DANILO SERGIO PEREIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: CARLOS CESAR SPOSITO DE CAMARGO BRAGA - SP135396-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
EMENTA
Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei.