Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5007050-30.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

AGRAVANTE: ASSOCIACAO SANTA CASA DE MISERICORDIA E MATERNIDADE D. JULIETA LYRA

Advogado do(a) AGRAVANTE: DANIELA DE FAVERE - SP424375-N

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5007050-30.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

AGRAVANTE: ASSOCIACAO SANTA CASA DE MISERICORDIA E MATERNIDADE D. JULIETA LYRA

Advogado do(a) AGRAVANTE: DANIELA DE FAVERE - SP424375-N

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

 R E L A T Ó R I O

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RENATO BECHO, RELATOR:

Trata-se de agravo de instrumento interposto pela União objetivando a reforma da decisão proferida pelo juízo da 1º Vara Federal de Araraquara/SP, nos autos da Execução Fiscal de n° 0009759-77.2016.4.03.6120, que determinou a liberação das penhoras existentes sobre os imóveis de matrículas nºs 31273 e 27047, mantendo a penhora sobre o imóvel de matrícula nº 31272.

Em suas razões o agravante alega, em síntese, que ao imóvel de matrícula nº 31272, se faz imperiosa a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o reconhecimento de sua impenhorabilidade (art. 833, V, do CPC), bem como de seus equipamentos e materiais hospitalares, todos imprescindíveis ao exercício da atividade-fim da Entidade Hospitalar, único na cidade que atende à população carente local, aliado às demais das cidades vizinhas da microrregião, não podendo todas essas pessoas serem colocadas à margem do direito à saúde e vida se a medida persistir.

Por fim, pugna pela concessão de efeito suspensivo, de modo a suspender de imediato a penhora determinada pelo juízo “a quo”, em visível prejuízo a toda uma sociedade e, ao final, que seja dado provimento integral ao presente recurso.

Por meio de decisão de ID 289896709, foi indeferida concessão de antecipação da tutela recursal.

Contraminuta da agravada (ID 289223248).

É o relatório.

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5007050-30.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

AGRAVANTE: ASSOCIACAO SANTA CASA DE MISERICORDIA E MATERNIDADE D. JULIETA LYRA

Advogado do(a) AGRAVANTE: DANIELA DE FAVERE - SP424375-N

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RENATO BECHO, RELATOR:

A controvérsia trata sobre a possibilidade de ser penhorado imóvel pertencente à Santa Casa de Misericórdia.

De início, necessário apontar que as Santas Casas de Misericórdia, na condição de entidades filantrópicas e de utilidade pública destinadas ao atendimento da população de baixa renda, via de regra, devem ter seus bens protegidos, de modo a resguardar a sua finalidade de interesse público, qual seja, os serviços de saúde e assistência social à população carente.

Dentro desse propósito foi publicada a Lei nº 14.334/2022, com o ímpeto de declarar a impenhorabilidade de bens pertencentes a hospitais filantrópicos e Santas Casas de Misericórdia que são mantidos por entidades beneficentes certificadas nos termos da Lei Complementar 187/2021.

Eis o disposto na mencionada Lei nº 14.334/2022:

"Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a impenhorabilidade de bens de hospitais filantrópicos e Santas Casas de Misericórdia mantidos por entidades beneficentes certificadas nos termos da Lei Complementar nº 187, de 16 de dezembro de 2021.

Art. 2º Os bens de hospitais filantrópicos e Santas Casas de Misericórdia mantidos por entidades beneficentes certificadas nos termos da Lei Complementar nº 187, de 16 de dezembro de 2021, são impenhoráveis e não responderão por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei.

Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende os imóveis sobre os quais se assentam as construções, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem o bem, desde que quitados. (grifo nosso)

Art. 3º Excluem-se da impenhorabilidade referida no art. 2º desta Lei as obras de arte e os adornos suntuosos.

Parágrafo único. No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que o guarneçam e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto no caput deste artigo.

Art. 4º A impenhorabilidade referida no art. 2º desta Lei é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, salvo se movido:

I - para cobrança de dívida relativa ao próprio bem, inclusive daquela contraída para sua aquisição;

II - para execução de garantia real;

III - em razão dos créditos de trabalhadores e das respectivas contribuições previdenciárias.

(...) "

Como se pode observar, de acordo com o parágrafo único do artigo 2º, da Lei nº 14.334/22, a impenhorabilidade compreende os imóveis sobre os quais se assentam as construções e as benfeitorias de qualquer natureza, desde que a cobrança não esteja vinculada a uma das hipóteses previstas nos incisos do artigo 4º da mencionada Lei nº 14.334/202, que caracteriza a exceção à impenhorabilidade.

Pois bem. No caso dos autos, os valores exigidos do executado não se encontram em quaisquer das hipóteses de exceção à regra de impenhorabilidade.

Ademais, é indiscutível que o complexo hospitalar da Santa Casa de Misericórdia e Maternidade D. Julieta Lyra, foi construído sobre os terrenos matriculados sob nºs 31.272, 31.273 e 27047.

Assim, não se justifica a liberação da penhora que recaiu sobre os imóveis de matricula 31.273 e 27.047 e a manutenção da constrição do imóvel de matrícula 31.272.

Portanto, sendo indiscutível a importância das atividades da agravante para a sociedade, associado ao fato de que a lei nº 14.334/2022 proíbe a penhora dos imóveis pertencentes a Santa Casa de Misericórdia e que a manutenção da constrição poderá resultar na arrematação do bem em leilão, o que implicaria de forma direta na prestação de serviços à população atendida pela entidade, de rigor a reforma da decisão proferida pelo juízo da 1ª Vara Federal de Araraquara para reconhecer a impenhorabilidade do imóvel de matrícula 31.272.

Nesse sentido é o entendimento deste E. Tribunal:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO FISCAL - HOSPITAL FILANTRÓPICO E SANTA CASA DE MISERICÓRDIA - IMPENHORABILIDADE DE BENS - LEI N° 14.334/2022 - RECURSO NÃO PROVIDO.

1. Insurge-se a agravante contra a decisão que, em execução fiscal, indeferiu o pedido de penhora dos imóveis da agravada, em razão da impenhorabilidade dos bens nos termos do art. 2° da Lei n° 14.334/2022.

2. Sobre a impenhorabilidade dos bens de hospitais filantrópicos e Santas Casas de Misericórdia, a Lei n° 14.334/2022 dispõe que a restrição compreende os imóveis sobre os quais se assentam as construções, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem o bem, desde que quitados. Todavia, a impenhorabilidade não é absoluta, contendo exceções em seu art. 3º e 4°.

3. No entanto, conforme se observa dos autos, a presente execução não traz hipótese de exceção à regra supracitada, impondo-se a manutenção da decisão de primeiro grau.

4. No mesmo sentido há decisões deste E. Tribunal.

5. Agravo de Instrumento não provido.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5010158-67.2024.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR, julgado em 27/09/2024, DJEN DATA: 08/10/2024)

Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento para reconhecer a impenhorabilidade do imóvel de matricula 31.272, de propriedade da Santa Casa de Misericórdia e Maternidade D. Julieta Lyra, na forma da fundamentação.

É como voto. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

Direito Processual Civil. Agravo de Instrumento. Impenhorabilidade de Imóvel de Santa Casa de Misericórdia. Lei nº 14.334/2022. Provimento do Recurso.

I. Caso em exame

1. Agravo de instrumento interposto contra decisão de primeiro grau que manteve a penhora sobre imóvel de matrícula nº 31.272, pertencente à Santa Casa de Misericórdia e Maternidade D. Julieta Lyra, em execução fiscal. O imóvel é utilizado para atividades filantrópicas e de assistência social à população carente.

II. Questão em discussão
2. A questão em discussão consiste em definir se o imóvel pertencente à Santa Casa de Misericórdia pode ser penhorado, à luz da proteção conferida pela Lei nº 14.334/2022, que declara impenhoráveis os bens de hospitais filantrópicos e Santas Casas mantidos por entidades beneficentes certificadas, salvo em hipóteses específicas.

III. Razões de decidir
3. Nos termos do art. 2º da Lei nº 14.334/2022, a impenhorabilidade abrange os imóveis que servem às atividades dos hospitais filantrópicos e das Santas Casas de Misericórdia, exceto nas situações previstas no art. 4º, que incluem dívidas relativas ao próprio bem, execuções de garantias reais e créditos trabalhistas e previdenciários.
4. O débito em questão não se enquadra nas exceções previstas na referida Lei. O imóvel matriculado sob o nº 31.272 é destinado à atividade hospitalar e beneficente da Santa Casa, sendo essencial à continuidade de seus serviços.

IV. Dispositivo e tese
5. Recurso provido. Reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel de matrícula nº 31.272, pertencente à Santa Casa de Misericórdia e Maternidade D. Julieta Lyra, conforme previsto na Lei nº 14.334/2022.

Tese de julgamento: "1. É impenhorável o imóvel pertencente a hospital filantrópico ou Santa Casa de Misericórdia, mantido por entidade beneficente certificada, salvo se a dívida recair sobre o próprio bem ou nos casos expressamente previstos na Lei nº 14.334/2022."


Dispositivos relevantes citados: Lei nº 14.334/2022, arts. 2º e 4º.

Jurisprudência relevante citada: TRF 3ª Região, AI - 5010158-67.2024.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal Mairan Gonçalves Maia Junior, julgado em 27.09.2024, DJEN 08.10.2024.]

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RENATO BECHO
DESEMBARGADOR FEDERAL