APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017459-14.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO CLAUDEMIRO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: MARCIO SALVADOR DE SOUZA - SP392314-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017459-14.2022.4.03.6183 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: FRANCISCO CLAUDEMIRO DA SILVA Advogado do(a) APELADO: MARCIO SALVADOR DE SOUZA - SP392314-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação do INSS e recurso adesivo interpostos contra sentença que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, para reconhecer como tempo de contribuição o período rural laborado de 10/11/1979 a 15/06/1989, condenando o INSS a averbá-los, e conceder o benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA LEVE, desde 30/03/2022 (DER), com a aplicação de juros de mora e correção monetária, e ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 20% do valor da condenação, antecipando, ainda, os efeitos da tutela para implantação do benefício. Em suas razões de recurso, sustenta o INSS: - que a sentença deve ser submetida ao reexame necessário; - que não há início de prova material, a embasar o período de labor rural reconhecido como tempo de contribuição; - que a parte autora não cumpriu o tempo mínimo exigido para a obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência; - que deve ser observada a prescrição quinquenal; - que os valores recebidos administrativamente e que não podem ser acumulados com o benefício concedido deverão ser descontados do montante devido; - que, para implantação do benefício, a parte autora deverá juntar autodeclaração prevista no Anexo I da Portaria INSS nº 450/2020, ou renunciar expressamente aos valores que excedam o teto de 60 salários mínimos na data da propositura da ação; - que, após a promulgação da Emenda Constitucional nº 113/2021, deve ser observada a taxa SELIC, como critério de juros de mora e correção monetária; - que está isento de custas; - que os honorários advocatícios foram fixados em valor exagerado. Por fim, prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais. Por sua vez, alega a parte autora, em seu recurso adesivo que, no período de 19/04/2000 a 30/03/2022, laborou exposto a agente químicos acima dos níveis de tolerância, conforme demonstrado no PPP. Requer, assim, a reforma do julgado, nesse ponto, com o reconhecimento do período como especial, para fins de concessão de aposentadoria especial ou a conversão do período em tempo comum, para ser computado no cálculo do tempo de contribuição.. Com as contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional. Nesta Corte, o D. Representante do Ministério Público Federal deixou de opinar, tendo em vista a ausência de interesse público que reclame a sua intervenção. É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017459-14.2022.4.03.6183 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: FRANCISCO CLAUDEMIRO DA SILVA Advogado do(a) APELADO: MARCIO SALVADOR DE SOUZA - SP392314-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Em razão de sua regularidade formal, recebo os recursos, nos termos do artigo 1.011 do CPC/2015. DO DESCABIMENTO DO REEXAME NECESSÁRIO A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, o qual afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (artigo 496, inciso I, c.c. parágrafo 3º, inciso I). In casu, considerando os elementos dos autos - o INSS foi condenado a averbar períodos considerados especiais e, por conseguinte, implantar e pagar a aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência desde o requerimento administrativo -, o montante da condenação não excederá a 1.000 (mil) salários mínimos, ainda que o valor do benefício seja igual ao teto previdenciário. A hipótese dos autos, portanto, não demanda reexame necessário. DA APOSENTADORIA ESPECIAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA Em obediência ao disposto no parágrafo 1º do artigo 201 da Constituição Federal, que autoriza a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadorias às pessoas com deficiência, a Lei Complementar nº 142/2013 instituiu a aposentadoria da pessoa com deficiência. Este benefício é destinado aos segurados que exerceram atividade na condição de pessoa com deficiência, assim entendido "aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas" (artigo 2º), podendo ser concedido com base (i) na idade, que é de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher, exigindo-se carência de 15 anos, integralmente cumprida na condição de pessoa com deficiência, ou (ii) no tempo de contribuição, que pode ser de 25, 29 e 33 anos para o homem e de 20, 24 e 28 anos para a mulher, a depender do grau de deficiência, que pode ser grave, moderada e leve, respectivamente. Como se vê, a avaliação da deficiência e seu grau, na forma prevista na lei complementar, não se restringe à deficiência física, mental, intelectual ou sensorial e ao grau dessa deficiência, que poderiam ser apurados exclusivamente por um médico, mas é mais ampla, pois considera também o conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social. Assim, estabelece a Lei Complementar nº 142/2013, que "a avaliação da deficiência será médica e funcional" (artigo 4º) e deverá ser realizada "por perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por meio de instrumentos desenvolvidos para esse fim" (artigo 5º). Nesse sentido, o Decreto nº 3.048/99, ao regulamentar o benefício em análise, dispõe que a deficiência do segurado será apurada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, através de avaliação biopsicossocial (artigo 70-B), ocasião em que serão fixados o início da deficiência e o seu grau, além de eventual variação, caso em que deverão ser indicados os respectivos períodos em cada grau (artigo 70-D). O instrumento destinado à avaliação do segurado e à identificação dos graus de deficiência foi aprovado pela Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU nº 01, de 27/01/2014, com base no conceito de funcionalidade adotado pela Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), da Organização Mundial da Saúde - OMS, e estabelece que a avaliação médica e funcional englobará perícia médica e serviço social e deverá ser realizada mediante a aplicação (i) do Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria (IFBrA), que, levando em conta as barreiras externas (urbanísticas, arquitetônicas, nos transportes, nas comunicações e a na informação, atitudinais e tecnológicas) e a dependência de terceiros, atribui níveis de pontuação (25, 50, 75 e 100 pontos) para cada uma das 41 atividades funcionais, agrupadas nos 7 domínios - (1) Sensorial, (2) Comunicação (3) Mobilidade, (4) Cuidados pessoais, (5) Vida doméstica, (6) Educação, trabalho e vida social e (7) Socialização e vida comunitária -, e (ii) do Método Linguístico Fuzzy, que atribui um peso maior aos domínios principais de cada tipo de deficiência, podendo reduzir a pontuação obtida inicialmente. Para a aplicação do Método Fuzzy, considera-se o tipo de impedimento (deficiência) e, para cada tipo, os domínios sensíveis e a questão emblemática, conforme tabela que segue: Assim, conforme o tipo de impedimento, SE positiva a questão emblemática, OU não dispondo o segurado de auxílio de terceiros, assim considerados familiar ou cuidador, OU se o segurado obteve pontuação 25 ou 50 para alguma das atividades de um dos dois domínios considerados sensíveis ou 75 para todas as atividades de um desses dois domínios, a menor pontuação obtida em cada um dos domínios sensíveis é imputada a todas as atividades do respectivo domínio. Portanto, de acordo com o instrumento aprovado pela Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU nº 01, de 27/01/2014, após a aplicação do IFBrA, os resultados obtidos pelas perícias médica e social deverão ser revalorados mediante a aplicação do Modelo Línguístico Fuzzy.Só então é possível somaras pontuações obtidas por cada uma dessas perícias para se aferir o grau de deficiência da parte autora - se grave (menor ou igual a 5.739), moderada (entre 5.740 e 6.354), leve (entre 6.355 e 7.584) ou insuficiente (maior ou igual a 7.585). Sem a adequada aplicação do IFBrM e do Modelo Fuzzy, não é possível a correta aferição do grau de deficiência, que é imprescindível para a análise do pedido de aposentadoria por tempo de contribuição de pessoa com deficiência. E, se houver variação do grau de deficiência, deverá ser tomado como parâmetro, para fins de contagem do tempo de contribuição, o grau preponderante, assim entendido aquele em que o segurado cumpriu maior tempo de contribuição, para o qual serão convertidos os períodos cumpridos em grau diverso e posteriormente somados aos completados no grau preponderante (artigo 70-E). No tocante à deficiência anterior à entrada em vigor da lei complementar que instituiu o benefício, poderá ser certificada por ocasião da primeira avaliação, quando serão apurados o seu grau e a data provável de início da deficiência, conforme estabelece o artigo 6º, parágrafo 1º, da Lei Complementar nº 142/2013. Conquanto o tempo de contribuição da pessoa com deficiência não possa ser convertido para fins de aposentadoria especial (Decreto nº 3.048/99, artigo 70-F, parágrafo 2º), admite-se a conversão do tempo de contribuição cumprido em condições especiais para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência (artigo 70-F, parágrafo 1º). A par disso, admite-se a conversão do tempo contribuição comum em tempo para a concessão da aposentadoria especial da pessoa com deficiência, devendo-se observar os fatores de conversão previstos no artigo 70-E do Decreto 3.048/1999. Precedente desta C. Turma:TRF3, ApCiv nº5003046-75.2019.4.03.6126, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, intimação via sistema em 03/12/2021. Não pode, contudo, ser acumulada a redução do tempo de contribuição da pessoa com deficiência com aquela assegurada aos casos de atividades exercidas em condições especiais (artigo 70-F, caput), cabendo ao segurado optar pela redução que lhe for mais favorável (artigo 70-F, parágrafo 1º). No ponto, cumpre esclarecer que a legislação de regência impede, apenas, a acumulação da redução do tempo de contribuição da pessoa com deficiência com a redução do tempo contributivo para fins de concessão de aposentadoria especial por exposição a agentes nocivos. Não há qualquer óbice para a conversão do tempo especial pela exposição a agentes nocivos para fins de concessão da aposentadoria especial da pessoa com deficiência. Pelo contrário, tal conversão – tempo de contribuição especial por exposição a agentes nocivos em tempo de contribuição especial da pessoa com deficiência - e respectivos fatores de conversão são expressamente previstos pelo artigo 70-F, §1°, do Decreto 3.048/1999, com redação dada pelo Decreto 8.145/2013: Art. 70-F. A redução do tempo de contribuição da pessoa com deficiência não poderá ser acumulada, no mesmo período contributivo, com a redução aplicada aos períodos de contribuição relativos a atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. § 1º. É garantida a conversão do tempo de contribuição cumprido em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física do segurado, inclusive da pessoa com deficiência, para fins da aposentadoria de que trata o art. 70-B, se resultar mais favorável ao segurado, conforme tabela abaixo: § 2º. É vedada a conversão do tempo de contribuição da pessoa com deficiência para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata a Subseção IV da Seção VI do Capítulo II. Nesse sentido, também a doutrina de Frederico Amado: É garantida a conversão do tempo de contribuição cumprido em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física do segurado, inclusive da pessoa com deficiência, para fins de aposentadoria especial do deficiente, se resultar mais favorável ao segurado, conforme tabela abaixo: [...] No entanto, é vedada a conversão do tempo de contribuição da pessoa com deficiência para fins de concessão da aposentadoria especial por exposição aos agentes nocivos à saúde. Assim sendo, tempo de contribuição especial por exposição a agentes nocivos à saúde converte-se em tempo de contribuição do deficiente. Todavia, a recíproca não é verdadeira. (AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário - 12. ed. rev., ampl. e atual - Salvador: Ed. Juspodivm, 2020, p. 735) Destaco que a Emenda Constitucional nº 103/2019 não alterou, de imediato, as regras de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência estabelecidas pela Lei Complementar nº 142/2013, esclarecendo, em seu artigo 22, que essas permanecem válidas, inclusive quanto aos critérios de cálculo do benefício, até a edição de lei que discipline o inciso I do parágrafo 1º do artigo 201 da Constituição Federal. DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL Nos termos do artigo 55, parágrafo 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início da vigência de mencionada lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência. Logo, é desnecessária a comprovação do recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios (24/07/1991), caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, sendo certo, no entanto, que tal período não será computado para efeito de carência (STJ, EDcl no AgRg no REsp nº 1537424/SC, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marque,DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, 3ª Seção, Relator Ministro Ericson Maranho, Desembargador Convocado do TJ/SP, DJe 04/12/2015; TRF3, ApCiv nº 2009.61.05.005277-2/SP, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; ApCiv nº 2007.61.26.001346-4/SP, 7ª Turma, Relato Desembargador Federal Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; ApCiv nº 2007.61.83.007818-2/SP, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, DJ 09/04/2018). No período posterior à entrada em vigorda Lei nº 8.213/91, no entanto, exige-se o recolhimento das contribuições, ainda que realizado a destempo, pois, nos termos do artigo 39 da referida lei, o segurado especial não é necessário o recolhimento das contribuições para a obtenção de vários benefícios, mas no valor de um salário mínimo (inciso I). Para o cômputo do período de labor rural como tempo de contribuição, bem como para a obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição, o segurado especial deve contribuir facultativamente, conforme estabelecido no inciso II. Portanto, é impossível o reconhecimento da atividade rural como tempo de contribuição após 31/10/1991 sem o devido recolhimento da contribuição previdenciária. DAS PROVASDO TEMPO DE ATIVIDADE RURAL A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, parágrafo 3º, da Lei nº 8.213/91, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149/STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário". Todavia, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça tem admitido, como início de prova material, desde que corroborado por prova testemunhal firme e coesa, (i) documentos diversos daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (Tema Repetitivo nº 642/STJ; REsp repetitivonº 1.354.908/SP, 1ª Seção, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 10/02/2016); e (ii) documentos que atestam a condição de rurícola do cônjuge, cuja qualificação pode estender-se à esposa (Súmula nº 6/TNU; AgInt no REsp nº 1.928.406/SP, 1ª Turma, Relatora Ministra Regina Costa, DJe 15/09/2021; AgRg no AResp nº 188.059/MG, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 11/09/2012). Nesse passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de labor que se pretende comprovar (Recurso Especial repetitivo nº 1.348.633/SP, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe 05/12/2014 e Súmula nº 577/STJ). No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do menor (ARE nº 1.045.867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, DJe 03/08/2017, RE nº 906.259, RelatorMinistro Luiz Fux, DJE 21/09/2015).E, sobrea questão, esta Colenda Turmaassentou o entendimento de que,em virtude das peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da década de 70, impõe-se admitir,para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade e, apartir da Constituição Federal de 1988, prevalece a idade nela estabelecida (AC 2003.61.25.001445-4, Relator Desembargador Federal Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Relator Desembargador FederalToru Yamamoto, DJe 13/03/2017). DO LABOR SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS Para o reconhecimento da atividade especial, exige-se, a partir de 28/04/1995, data da entrada em vigor da Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao parágrafo 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213/1991, a comprovação da exposição permanente a agentes prejudiciais à saúde, de forma permanente, não ocasional nem intermitente. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional do segurado, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente nocivo. A exposição do segurado a agentes nocivos de forma permanente, não ocasional nem intermitente, cuja comprovação passou a ser exigida a partir de 28/04/1995, não significa exposição à nocividade por toda a sua jornada, mas, sim, conforme estabelecido pelo artigo 65 do Decreto nº 3.048/1999, que a exposição aos agentes nocivos deve ser indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço. Assim, constando, do respectivo PPP, que o segurado ficava exposto a determinado agente nocivo, deve-se concluir que tal exposição era suficiente à configuração da especialidade, não se podendo exigir menção expressa, nesse sentido, já que, no modelo do referido formulário, concebido pelo INSS, não existe um campo específico para tanto, consoante jurisprudência desta C. Turma: ApCiv nº 5007303-40.2017.4.03.6183, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Carlos Delgado, DJEN 15/05/2023. Nessa linha, o Enunciado nº 6.729 da I Jornada do Direito da Seguridade Social do CJF. As condições especiais de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para os agentes ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico. Todavia, consoante entendimento já sufragado por esta Turma, por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997. Não se exige, portanto, para os períodos anteriores a 10/12/1997, exceto para os agentes ruído e calor, a indicação do responsável técnico pelas medições ou mesmo o laudo técnico que embasou a elaboração dos referidos formulários. A Lei nº 9.528/97, dando nova redação ao artigo 58 da Lei nº 8.213/91, dispõe que cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. E a relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida por normas regulamentares consideradas exemplificativas (Tema Repetitivo nº 534/STJ, REsp nº 1.306.113/SC), de que é exemplo o Decreto nº 2.172/97. Assim, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que não prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial. Infere-se, do artigo 58 da Lei nº 8.213/91, com os acréscimos introduzidos pela Lei nº 9.528/97, (i) que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita por meio do formulário; (ii) que esse formulário deve ser emitido pela empresa, na forma estabelecida pelo INSS, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho; (iii) que o empregador deve manter atualizado o formulário abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a cópia desse documento; e (iv) que a empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista em lei. A partir de 01/01/2004, o único formulário que passou a ser aceito pelo INSS é Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento fornecido pela empresa ao segurado e que retrata o seu histórico laboral, evidenciando os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados. Considerando que a empresa empregadora deve garantir a veracidade das declarações prestadas nos formulários de informações e laudos periciais (artigo 133 da Lei nº 8.213/91 e artigo 299, do Código Penal) e que cabe ao Poder Público fiscalizar o empregador no que tange à elaboração, manutenção e atualização do PPP, presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário, seja porque ele não é responsável pela elaboração do documento, seja porque cabe ao Poder Público fiscalizar a elaboração do PPP pelas empresas. Nesse sentido, Egrégio STJ fixou tese repetitiva quando do julgamento da Petição nº 10.262/RS, de 08/02/2017. Por essa razão, é suficiente, para conferir idoneidade ao PPP, a indicação do representante legal da pessoa jurídica e a respectiva firma, não se exigindo, por outro lado, a apresentação de procuração do representante legal ou o contrato social da empresa, que evidencie os poderes de que a subscreveu. Assim, também, a apresentação do PPP dispensa a apresentação do laudo que o subsidia. E o fato de esse laudo não ser contemporâneo ao labor não invalida as informações constantes do PPP a respeito do tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços (Súmula nº 68/TNU e precedentes desta Egrégia Corte Regional: ApelRemNec nº 5008396-32.2018.4.03.6109, 7ª Turma, Relatora Desembargadora Federal Inês Virgínia, DJEN 12/06/2023; ApCiv nº 5002962-34.2018.4.03.6183, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Carlos Delgado, intimação via sistema 11/05/2023; ApCiv nº 5002059-62.2019.4.03.6183, 10ª Turma, Relatora Desembargadora Federal Leila Paiva, intimação via sistema em 03/04/2023). No tocante ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, o Egrégio Supremo Tribunal Federal assentou a tese de que não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, o que não se aplica ao agente nocivo ruído (ARE nº 664.335). No entanto, o fato de o PPP consignar que o EPI é eficaz não significa que ele seja capaz de neutralizar a nocividade, como exigido pela Excelsa Corte para afastar a especialidade do labor. Tal eficácia diz respeito à sua aptidão de atenuar ou reduzir os efeitos do agente nocivo, mas isso não significa que o EPI era "realmente capaz de neutralizar a nocividade", sendo imprescindível, para tanto, a apresentação de prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo. A dúvida, nesse caso, beneficia o trabalhador. E não há como se sonegar o direito do segurado de averbação do labor em condições especiais sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (artigo 195, parágrafos, 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, parágrafos 6° e 7°, da Lei nº 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuído ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia. Ademais, o Egrégio Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, estabeleceu que a ausência de prévia fonte de custeio não prejudica o direito dos segurados à aposentadoria especial, em razão de não haver ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, eis que o artigo 195, parágrafo 5º, da Constituição Federal (que veda a criação, majoração ou a extensão de benefícios previdenciários sem a correspondente fonte de custeio) contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se trata de benefício criado diretamente pela própria constituição, como é o caso da aposentadoria especial (Tema nº 555/STF; ARE nº 664335). Por fim, quanto à conversão do tempo de trabalho, deve seguir a legislação vigente no momento do requerimento administrativo (Tese Repetitiva 546/STJ, REsp nº 1.310.034/PR). O artigo 57, parágrafo 5°, da Lei nº 8.213/91 admitia a conversão de tempo de atividade especial para comum, observando-se a tabela dos multiplicadores prevista no artigo 70do Decreto nº 3.048/99. Todavia, a conversão do tempo especial em comum só é possível até 13/11/2019, pois a Emenda Constitucional nº 103/2019, em seus artigos 10, parágrafo 3°, e 25, parágrafo 2°, vedou a conversão para períodos posteriores a tal data, não tendo sido a regra da conversão recepcionada pela reforma constitucional (artigo 201, parágrafo 14, da Constituição Federal e artigo 25, caput e parágrafo 2º da referida Emenda). DOS AGENTES QUÍMICOS O labor realizado pelo indivíduo que fica exposto, de forma habitual e permanente, a agentes químicos (hidrocarbonetos e derivados e outros tóxicos inorgânicos), é considerado especial, conforme estabelecido pelos itens 1.2.9 e 1.2.11, do Quadro do Decreto nº 53.831/64; e 1.2.10 e 1.2.11, do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e 1.0.17 e1.0.19 dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99. Cumpre destacar que a análise quantitativa do agente nocivo de natureza química é relevante na análise da especialidade apenas quando o agente consta do Anexo 11 da NR-15 do Ministério do Trabalho. No caso dos agentes incluídos no Anexo 13 da NR-15, a legislação de regência não estabelece limite de tolerância para a respectiva exposição, tal como ocorre em relação aos agentes previstos no Anexo 11 da NR-15, sendo a exposição ao agente medida a partir de análise qualitativa, bastando apenas o contato físico para a caracterização da especialidade (Precedente desta Turma: ApCiv nº 5000854-47.2021.4.03.6144, Relator Desembargador Federal Marcelo Vieira, DJEN 14/06/2023). E, independentemente da análise quantitativa constante do PPP - a qual se mostra relevante na análise da especialidade dos agentes nocivos previstos no Anexo 11 da NR-15 do Ministério do Trabalho -, o EPI não se mostra capaz de atenuar a nocividade desse agente. DO CASO CONCRETO No tocante à exposição ao agente químico, o PPP constante do ID294289986, págs. 33-36, informa que a parte autora laborou como zelador e que, nesse período, esteve exposto a cloro granulado, algicida choque e manutenção, limpa bordas e floculador de piscina, nos períodos de 08/05/2001 a 06/05/2003, de 01/11/2004 a 01/11/2005, 28/11/2005 a 28/11/2006 e 230/07/2021 a 23/07/2022. Assim, considerando que tais produtos químicos são utilizados na limpeza e manutenção de piscinas e não havendo prova de que a parte autora se dedicava exclusivamente a essas atividades, não está caracterizada a exposição ao agente químico nocivo de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a justificar o reconhecimento desses períodos como especiais. Relativamente à atividade rural, constam, dos autos principais, os seguintes documentos, contemporâneos ao período em que se pretende comprovar a atividade rural, necessária à obtenção do benefício: - ID294289987, págs. 09-11: Autodeclaração do Segurado Especial - Rural, em que a parte autora declara ter trabalhado em regime de economia familiar no Sítio Geraldo do São Joaquim, de propriedade de João Paulo Sobrinho, localizado no Município de Santa Cruz em Rio Grande do Norte, onde se dedicou ao cultivo de milho, feijão e mandioca para subsistência, no período de 20/11/1979 a 15/06/1989, integrando o grupo familiar João Paulo Sobrinho (tio), Manoel Pedro Neto (tio), Francisca Josefa da Conceição (avó) e Francisca Cleoneide da Silva; - ID294289986, pág. 49: Carteira de identidade de Francisca Josefa da Conceição, avó do autor; - ID294289986, pág. 46: Certidão de nascimento do autor, a qual comprova ser ele neto de Francisca Josefa da Conceição e Manoel Pedro Filho; - ID294289986, pág. 47: Carteira de identidade de João Paulo Sobrinho, filho de Maria Josefa da Conceição e tio do autor; - ID294289986, pág. 50: Carteira de identidade de Manoel Pedro Neto, filho e Manoel Pedro Filho e tio do autor; - ID294289986, pág. 48: Escritura de compra e venda de imóvel rural com 31 ha, lavrada em 07/10/1977, no qual consta como comprador João Paulo Sobrinho; - ID294289986, págs. 41-42: Declaração do ITR, exercício 2021, no qual consta que o Sítio Gerao do São Joaquim, com área total de 31 ha, é de propriedade de João Paulo Sobrinho - ID294289987, pág. 08: Certificado emitido pelo Centro Cultural Tequinha Farias, da Prefeitura de Santa Cruz, em Rio Grande do Norte, atestando que a parte autora cursou, no ano letivo de 1980, a 4ª série em escola rural (Unidade Nossa Senhora Aparecida, no Sítio Angicos); - ID294289987, págs. 12-45: cópia da CTPS, onde consta seu primeiro vínculo empregatício urbano, com início em 01/08/1989, como servente na construção civil. E tais documentos foram corroborados pelas testemunhas ouvidas, as quais conhecem o autor desde que eram crianças e atestaram, de forma inequívoca, que ela exerceu atividade rural, no período em análise, na condição de segurado especial, em propriedade do tio, no Rio Grande do Norte, onde cultivavam feijão, milho e mandioca, para subsistência. Como se vê, de acordo com o conjunto probatório dos autos, o autor exerceu atividade rural, desde a idade de 12 anos, completados em 02/09/1981, na propriedade do seu tio, João Paulo Sobrinho, no Rio Grande do Norte, em regime de economia familiar, até 15/06/1989, quando mudou-se para Ribeirão Preto, em São Paulo, e passou a exercer atividade urbana com vínculo empregatício. Assim, merece reparo a sentença apelada, para restringir o período de labor rural reconhecido como tempo de contribuição para o intervalo de 02/09/1981 a 31/07/1989. Por outro lado, a perícia administrativa atestou que a parte autora é portadora de deficiência de grau leve, com início em 24/03/2019 (ID294289987, pág. 55), não havendo, nesse ponto, inconformismo da parte do INSS. E, considerando o período de labor rural reconhecido nestes autos e aqueles já reconhecidos na esfera administrativa, com aplicação (i) o fator 0,94 (de 35 para 33 anos) para o período de atividade comum antes da deficiência, e (ii) do fator 1 (de 33 para 33 anos) para o período de atividade comum após a deficiência, a parte autora, em 30/03/2022, somou 38 anos e 4 dias de labor proporcional àquele exigido, do segurado homem, para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência leve (33 anos), conforme tabela que segue: Logo, deve ser mantida a sentença no que tange à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência leve. Não há que se falar em prescrição, pois a presente ação foi ajuizada dentro do quinquênio legal, contado do requerimento administrativo. Não consta, dos autos, prova de que, após o termo inicial do benefício, houve pagamentos administrativos de benefício inacumulável ou por força de antecipação dos efeitos da tutela, não sendo o caso de se determinar o desconto de valores do montante devido. Esclareço que a exigência de apresentação de autodeclaração prevista no Anexo I da Portaria INSS nº 450/2020 é um procedimento da entidade autárquica no âmbito administrativo, que dispensa determinação judicial. DOS CRITÉRIOS DE JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices e critérios previstos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução. Vale ressaltar que o referido manual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores. DA TUTELA ANTECIPADA Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto nesta decisão, e o perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela anteriormente concedida. DOS ENCARGOS DE SUCUMBÊNCIA Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10%, mas restringindo a sua base de cálculo ao valor das prestações vencidas até a datada sentença, para adequá-los aos termos da Súmula nº 111/STJ, cujo conteúdo continua eficaz e aplicável mesmo após a vigência do CPC/2015, conforme decidiu o Egrégio STJ, no julgamento do Tema nº 1.105. No tocante à isenção de custas processuais, ausente o interesse em recorrer, vez que tais encargos não foram objeto da condenação. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei. Assim, provido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente, descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais. Por outro lado, desprovido o apelo do autor, mas não tendo sido ele, em primeira instância, condenado em honorários advocatícios, não há que se falar, em relação a ele, em majoração da verba honorária de sucumbência. DA PARTE DISPOSITIVA Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser discutido ou acrescentado aos autos. Ante o exposto, (i) REJEITO a preliminar, (ii) NEGO PROVIMENTO ao recurso adesivo, (iii) DOU PARCIAL PROVIMENTO ao apelo, (a) para restringir o período de labor rural reconhecido como tempo de contribuição para o intervalo de 02/09/1981 a 31/07/1989 e (b) para limitar a base de cálculo dos honorários advocatícios ao valor das prestações vencidas até a data da sentença, e (iv) DETERMINO, DE OFÍCIO, a alteração dos juros de mora e correção monetária, nos termos expendidos no voto. Mantenho, quanto ao mais, a sentença apelada. É COMO VOTO. /gabiv/asato
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. REEXAME NECESSÁRIO: DESCABIMENTO. PRELIMINAR REJEITADA. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA LEVE. RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL E ESPECIAL. LIMITAÇÃO DO PERÍODO RURAL RECONHECIDO COMO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL ANTERIOR À IDADE MÍNIMA: DESCABIMENTO. AGENTES QUÍMICOS: AUSÊNCIA DE EXPOSIÇÃO HABITUAL E PERMANENTE. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. ENCARGOS DE SUCUMBÊNCIA. APELO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO ADESIVO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação interposta pelo INSS e recurso adesivo contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer o período rural laborado de 10/11/1979 a 15/06/1989 como tempo de contribuição, conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência leve desde 30/03/2022 (DER), com aplicação de juros de mora e correção monetária, fixar honorários advocatícios em 20% do valor da condenação, e antecipar os efeitos da tutela para implantação do benefício.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há cinco questões em discussão: (i) se é cabível o reexame necessário (preliminar); (ii) se está caracterizada a exposição habitual e permanente a agentes químicos no período de 19/04/2000 a 30/03/2022, para reconhecimento do tempo como especial; (iii) se o período rural de 10/11/1979 a 15/06/1989 deve ser integralmente reconhecido como tempo de contribuição, considerando as provas apresentadas; (iv) se a parte autora cumpriu o tempo mínimo exigido para a obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência leve; e (v) se é o caso de aplicar a prescrição quinquenal, exigir a autodeclaração, descontar eventuais valores já recebidos, isentar de custas, reduzir os honorários e aplicar a Súmula nº 111/STJ.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A sentença não se submete ao reexame necessário, pois a condenação imposta ao INSS é inferior a mil salários mínimos, nos termos do artigo 496, § 3º, inciso I, do CPC/2015.
4. A Lei Complementar nº 142/2013 regulamenta a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência, estabelecendo critérios diferenciados baseados no grau de deficiência (grave, moderada ou leve) e no tempo de contribuição exigido, que pode ser de 25, 29 e 33 anos para homens e de 20, 24 e 28 anos para mulheres.
5. A avaliação do grau e da data de início da deficiência deve ser realizada por meio de perícia médica e social, conforme prevê a Lei Complementar nº 142/2013, o Decreto nº 3.048/1999 e a Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU nº 01/2014, considerando fatores biopsicossociais.
6. Para o reconhecimento da atividade especial, exige-se, a partir de 28/04/1995, data da entrada em vigor da Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao parágrafo 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213/1991, a comprovação da exposição permanente a agentes nocivos à saúde, de forma não ocasional nem intermitente. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional do segurado, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias estavam expostas a ambiente nocivo.
7. O labor realizado pelo segurado que fica exposto, de forma habitual e permanente, a agentes químicos (hidrocarbonetos e derivados e outros tóxicos inorgânicos) é considerado especial, conforme estabelecido nos Decretos nºs 53.831/64, 83.080/79, 2.172/97 e 3.048/99.
8. A comprovação de tempo de serviço rural antes da Lei nº 8.213/91 dispensa recolhimento de contribuições, sendo suficiente o início de prova material corroborado por prova testemunhal. No tocante ao labor do menor de idade, esta Colenda Turma assentou o entendimento de que, em virtude das peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da década de 70, admite-se, para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, desde os 12 anos de idade e, a partir da Constituição Federal de 1988, prevalece a idade nela estabelecida.
9. No caso, ainda que estivesse demonstrada a nocividade do agente químico, não ficou demonstrada a exposição habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, motivo pelo qual não é possível o reconhecimento da especialidade do labor no período de 19/04/2000 a 30/03/2022. Por outro lado, os documentos apresentados e os depoimentos das testemunhas comprovam o labor rural da parte autora no período de 02/09/1981 a 31/07/1989, não podendo ser computado, como tempo de contribuição, período anterior, pois ela ainda não havia completado a idade de doze anos. E, mesmo com exclusão do labor rural anterior a 01/09/1981, deve ser mantida a sentença no que tange à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência de grau leve, a partir de 30/03/2022 (DER), pois a parte autora cumpriu o tempo mínimo exigido para a obtenção desse benefício.
10. Os critérios de juros e correção monetária devem ser aplicados conforme o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, vigente na data da execução, sendo cabível a alteração de ofício para adequar a sentença ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.
11. Não há que se falar em prescrição, pois a presente ação foi ajuizada dentro do quinquênio legal, contado do requerimento administrativo. A exigência de autodeclaração é um procedimento administrativo do INSS, dispensando determinação judicial. Não há comprovação de pagamentos de benefícios administrativos acumuláveis após o termo inicial do benefício, sendo indevido o desconto de quaisquer valores. A sentença, como requerido pelo INSS, não o condenou em custas processuais.
12. A base de cálculo dos honorários advocatícios deve ser limitada ao valor das prestações vencidas até a data da sentença, conforme a Súmula nº 111/STJ, devendo o seu patamar, por outro lado, ser reduzido para 10%. Não é o caso de majoração da verba honorária, em razão do provimento do apelo do INSS, ainda que parcialmente.
IV. DISPOSITIVO E TESE
13. Preliminar rejeitada. Apelo do INSS parcialmente provido. Recurso adesivo desprovido. Critérios de juros de mora e correção monetária alterados, de ofício.
Tese de julgamento:
1. O reexame necessário é incabível quando o valor da condenação não ultrapassa 1.000 salários mínimos, nos termos do artigo 496, § 3º, inciso I, do CPC/2015.
2. A comprovação do tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213/91 exige início de prova material corroborado por prova testemunhal, sendo desnecessário o recolhimento de contribuições.
3. Durante a vigência da Constituição Federal de 1967, não se admite, como tempo de contribuição, o labor rural exercido por menor de doze anos.
4. Para reconhecimento de atividade especial, exige-se comprovação de exposição habitual e permanente, não ocasional nem intermitente.
5. A aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência deve observar o grau de deficiência e seu início, na forma estabelecida na Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU nº 01/2014, com aplicação, no cálculo do tempo de contribuição, dos fatores de conversão previstos no artigo 70-E do Decreto nº 3.048/1999.
6. Os honorários advocatícios devem ser limitados ao valor das prestações vencidas até a data da sentença, conforme a Súmula nº 111/STJ.
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Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 201, § 1º; CPC/2015, arts. 85, § 11, e 496, § 3º, I; LC nº 142/2013, arts. 2º, 4º e 5º; Decreto nº 3.048/1999, arts. 70-B, 70-D e 70-F; Lei nº 8.213/1991, arts. 55, §§ 2º e 3º, e 58.
Jurisprudência relevante citada: STF, ARE nº 664.335; STJ, REsp nº 1.310.034/PR (Tema 546); STJ, REsp nº 1.306.113/SC (Tema 534); STJ, EDcl no AgRg no REsp nº 1.537.424/SC; TRF3, ApCiv nº 5007303-40.2017.4.03.6183, Rel. Des. Fed. Carlos Delgado, DJEN 15/05/2023.