Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0008169-38.2021.4.03.6331

RELATOR: 24º Juiz Federal da 8ª TR SP

RECORRENTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

RECORRIDO: MARIANA FERREIRA VIEIRA

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0008169-38.2021.4.03.6331

RELATOR: 24º Juiz Federal da 8ª TR SP

RECORRENTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

 

RECORRIDO: MARIANA FERREIRA VIEIRA

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

Cuida-se de recurso interposto da sentença prolatada nos autos em epígrafe que julgou parcialmente procedente o pedido “para o fim de condenar a UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ ao pagamento de indenização por danos materiais, no valor de R$ 619,61, atualizado monetariamente e acrescido de juros de mora a contar da data dos fatos (STJ, Sum. 54), bem como ao pagamento do valor de R$ 1.000,00, a título de danos morais, atualizado monetariamente a partir da prolação desta sentença (STJ, Sum. 362) e acrescido de juros de mora a contar da data do fato (STJ, Sum. 54)”.

Recorre a ré alegando, em síntese, não restar configurada a ocorrência de danos materiais ou morais.

É o breve relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0008169-38.2021.4.03.6331

RELATOR: 24º Juiz Federal da 8ª TR SP

RECORRENTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

 

RECORRIDO: MARIANA FERREIRA VIEIRA

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Não verifico nos autos nenhuma nulidade processual notadamente no que pertine à produção de provas e observância do pleno contraditório e da ampla defesa.

Passo ao exame do mérito.

No que concerne aos danos materiais, verifico que a sentença agiu com acerto, ao constatar a presença de danos decorrentes dos gastos com pagamento de transporte e hospedagem.

Considero oportuna a transcrição do seguinte excerto do julgado:

“Inicialmente, apesar de todas as justificativas que foram apresentadas pela parte ré, observo que o concurso foi agendado para o mês de fevereiro de 2021,  período em que o Brasil passava por uma das fases mais graves de disseminação da COVID-19, com imenso número de casos, interações e óbitos. Assim, o planejamento do concurso deveria ter levado em conta tal fato, a fim de planejar o certame com mais cuidado ainda, pensando antecipadamente nas medidas que deveriam ser adotadas para garantir que os candidatos pudessem realizar as provas com segurança.

 Não restam dúvidas que grande parte dos 100 mil candidatos eram provenientes de outras cidades e inclusive de outros Estados brasileiros -- tal como é o caso do autor – tiveram que se deslocar para a cidade de realização das provas e, com isso, de fato efetuaram gastos consideráveis com transporte/deslocamento, hospedagem, alimentação e outros. Fica evidente, assim, a existência de efetivos prejuízos materiais, que necessitam ser indenizados (danos materiais), bem como estão devidamente comprovados os imensos transtornos e dissabores experimentados pelos candidatos, aptos a gerar indenização por dano moral.

 Repiso, mais uma vez, que a falta de organização e/ou planejamento adequado, por parte da ré – atos tais como reservar a quantidade de escolas e salas de provas em quantidade suficiente para todos os candidatos, evitando superlotação; providenciar para que houvesse o distanciamento mínimo necessário entre os candidatos; adquirir os equipamentos e instrumentos necessários para efetivar as medidas de biossegurança, etc – são medidas que deveriam ter sido pensadas e planejadas com bastante antecedência, a fim de se evitar a consequência que de fato ocorreu, ou seja, o cancelamento da prova no dia previsto para sua realização, fato que, tal como já mencionado, causou efetivos transtornos para os candidatos do certame.

 De fato, a própria parte ré admite, em sua contestação, a falta de organização e planejamento do evento, asseverando expressamente que as provas estavam marcadas para o dia 21 de fevereiro de 2021, um domingo, e "apenas entre os dias 16 e 17 de fevereiro a relação das escolas cedidas pelo Governo do Estado do Paraná chegou ao Núcleo de Concursos, não permitindo que se realizasse, em tempo hábil, uma vistoria in loco das condições de todos os espaços".  

Assim, percebe-se que pelo menos cinco dias antes do evento (em 16 de fevereiro de 2021), já havia uma possibilidade muito clara e evidente de que as provas não poderiam acontecer, diante das dificuldades práticas e falta de instalações adequadas. Assim, a ré poderia ter desmarcado ou remarcado as datas das provas com mais antecedência, evitando assim que milhares de candidatos se deslocassem para a cidade de Curitiba, em vão.

 Diante de tudo que já foi exposto, não restam dúvidas de que estão presentes os requisitos/elementos caracterizadores da responsabilidade civil, sendo cabível as duas indenizações reclamadas pela parte autora (danos materiais e danos morais), já que houve clara omissão administrativa, evidenciada pelo fato de que a ré não adotou, a tempo e modo adequados, e diante da situação de calamidade na área de saúde, as medidas necessárias tendentes à suspensão da realização das provas.   Houve dano e nexo de causalidade entre a omissão e o dano. Não há, ainda, que se falar na ocorrência de caso fortuito ou força maior.

 Assim, no que diz respeito ao pedido de indenização por danos materiais, eles deverão ser indenizados; e nesse ponto, observo que devem ser reparadas todas as despesas que a autora comprovou documentalmente na inicial, quais  sejam: R$ 590,00 a título de gastos com transporte e hospedagem (vide recibo anexado no ID 78397537, fl. 27) e mais R$ 35,00 a título de gastos com alimentação (vide nota fiscal emitida pela Prefeitura Municipal de Curitiba,  ID 78397537, fl. 29). Desse modo, a indenização por danos materiais fica fixada em R$ 625,00, que deverão ser devidamente atualizados, na respectiva fase de liquidação de sentença.”

No que concerne aos danos morais, verifico que a r. sentença laborou em consonância com o entendimento da TNU, definido por ocasião do julgamento do Tema 313:

Tema 313

A suspensão da prova de concurso público para provimento de cargos da Polícia Civil do Estado do Paraná, em meio à pandemia da Covid-19, pode levar à responsabilidade da Universidade Federal do Paraná - UFPR, organizadora do certame, à compensação de dano moral, se comprovada a grave exposição do candidato à contaminação, pela frequência a locais públicos, como aeroportos e rodoviárias, com grande quantidade de pessoas e ampla circulação do vírus.

(PEDILEF 0000436-65.2021.4.05.8400/RN, Juíza Federal Relatora Luciane Merlin Clève Kravetz, julg. 17/05/2023)

No caso dos autos, resta claro que a locomoção da parte autora se deu por meio de ônibus fretado, de forma que risco de exposição restou caracterizado.

 

Assim, diante de todo o exposto, nego provimento ao recurso da UFPR de modo a confirmar a sentença prolatada.

Condeno a parte recorrente no pagamento de honorários advocatícios que arbitro em 10% do valor atualizado da causa. Entendo inaplicável toda a ordenação dos honorários prevista no diploma processual aos Juizados Especiais, tendo em conta que o disposto na Lei nº 9.099/95, art. 55, prevê uma situação de condenação em honorários apenas do recorrente vencido em segunda instância, o que não se coaduna com a complexa sistemática do novo CPC acerca do tema. Fica suspensa a execução dos honorários ante o deferimento da justiça gratuita.

Transitada em julgado a presente decisão, dê-se baixa do feito ao juízo de origem.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. CANCELAMENTO DE PROVA DE CONCURSO PÚBLICO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. OMISSÃO ADMINISTRATIVA. EXPOSIÇÃO À COVID-19. INDEFERIMENTO DE RECURSO. SENTENÇA MANTIDA.

I. CASO EM EXAME

  1. Recurso inominado interposto pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) contra sentença que condenou a instituição ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 625,00, referentes a despesas com transporte, hospedagem e alimentação, e de R$ 1.000,00 a título de danos morais, em razão do cancelamento de prova de concurso público em meio à pandemia da COVID-19. A ré argumenta inexistência de danos materiais e morais.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

  1. Há duas questões em discussão: (i) verificar se os danos materiais decorrentes de despesas com transporte, hospedagem e alimentação estão comprovados e são passíveis de indenização; e (ii) apurar se o cancelamento do concurso público, realizado sem o devido planejamento e organização, configurou dano moral indenizável.

III. RAZÕES DE DECIDIR

  1. A comprovação dos danos materiais está evidenciada por documentos apresentados pela parte autora, que demonstram despesas efetivas realizadas com transporte, hospedagem e alimentação, totalizando R$ 625,00. Esses valores devem ser atualizados monetariamente.

  2. A organização inadequada do concurso, em período crítico da pandemia da COVID-19, caracteriza omissão administrativa, tendo a UFPR deixado de adotar medidas preventivas para evitar o cancelamento do certame, mesmo ciente, com antecedência mínima de cinco dias, da inviabilidade de realização das provas.

  3. A ausência de planejamento adequado gerou transtornos e prejuízos à parte autora, que precisou se deslocar até o local da prova, expondo-se a condições de risco sanitário em razão da necessidade de frequentar locais públicos, como aeroportos e rodoviárias, o que caracteriza dano moral indenizável.

  4. O entendimento da Turma Nacional de Uniformização (TNU), firmado no Tema 313, reconhece a responsabilidade civil da entidade organizadora de concurso público pelo cancelamento de provas em condições que exponham os candidatos a riscos graves, como os decorrentes da pandemia da COVID-19.

  5. Não há nos autos quaisquer elementos que afastem o nexo de causalidade entre a conduta omissiva da ré e os danos materiais e morais sofridos pela parte autora. Alegações de caso fortuito ou força maior não se aplicam ao caso, uma vez que a situação era previsível e controlável.

IV. DISPOSITIVO E TESE

  1. Recurso desprovido.
    Tese de julgamento:

  2. A ausência de planejamento e organização pela entidade responsável por concurso público, que leve ao cancelamento das provas e exponha os candidatos a riscos sanitários graves, caracteriza omissão administrativa geradora de responsabilidade civil.

  3. Os danos materiais relacionados a despesas comprovadas com transporte, hospedagem e alimentação, decorrentes de deslocamento para realização de prova cancelada, são indenizáveis.

  4. O cancelamento de concurso público em condições que exponham o candidato a grave risco de contaminação, como a pandemia da COVID-19, gera direito à indenização por danos morais.

Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; Lei nº 9.099/95, art. 55; STJ, Súmulas nº 54 e 362.

Jurisprudência relevante citada: TNU, Tema 313, PEDILEF 0000436-65.2021.4.05.8400/RN, Rel. Juíza Luciane Merlin Clève Kravetz, j. 17/05/2023; STJ, REsp 1413188/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 22/10/2013.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma Recursal de São Paulo, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso da parte ré, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RICARDO GERALDO REZENDE SILVEIRA
JUIZ FEDERAL