APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005358-70.2017.4.03.6000
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: PLATINA AGROPECUARIA LTDA.
Advogado do(a) APELANTE: NELSON MEDEIROS RAVANELLI - SP225021-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005358-70.2017.4.03.6000 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: PLATINA AGROPECUARIA LTDA. Advogado do(a) APELANTE: NELSON MEDEIROS RAVANELLI - SP225021-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de embargos de declaração opostos pela Platina Agropecuária em face do acórdão de ID 288134595, que negou provimento ao seu recurso de apelação. A embargante, em síntese, alega que a decisão padece de omissão, contradição e erro material. Sustenta que o acórdão não abordou adequadamente as disposições constitucionais e tributárias pertinentes, especialmente o artigo 5º, inciso XXIV, da Constituição Federal, que trata da desapropriação por interesse social, e o artigo 184, §5º, que regula a reforma agrária. Alega que a decisão adotou uma interpretação excessivamente restritiva do Decreto nº 433/1992, que regula a reforma agrária, sem considerar as condições em que a venda dos imóveis foi realizada ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), muitas vezes por coerção administrativa. Argumenta que a venda não ocorreu por vontade do proprietário, mas por pressão do INCRA, o que deveria afastar a tributação sobre a transação. Sustenta, ainda, que o acórdão contém contradições internas, pois, ao reconhecer que a venda foi realizada sob pressão administrativa, não considerou esse fato como relevante para afastar a tributação sobre o ganho de capital. Afirma que o acórdão não considerou as circunstâncias que envolveram a transação, configurando erro material e omissão na análise dos fatos. Aponta, também, que a decisão não observou a uniformidade da jurisprudência sobre a isenção tributária em casos de desapropriação, especialmente em situações envolvendo reforma agrária. Faz referência ao REsp 1.116.460/SP, que tratou da indenização por desapropriação, e sustenta que, no presente caso, a mesma lógica deveria ser aplicada, afastando a tributação sobre a venda realizada. Requer a integração e o esclarecimento da decisão proferida, com a devida análise dos pontos omitidos, e o acolhimento de suas pretensões, para que sejam corrigidas as omissões, contradições e erros materiais, com efeitos infringentes. Por fim, prequestiona as questões jurídicas discutidas e requer a suspensão da exigibilidade do débito. Regularmente intimada, a União apresentou suas contrarrazões, defendendo a rejeição dos embargos de declaração. Em petição de id 290852566 a parte embargante reitera o pedido de tutela de urgência. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005358-70.2017.4.03.6000 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: PLATINA AGROPECUARIA LTDA. Advogado do(a) APELANTE: NELSON MEDEIROS RAVANELLI - SP225021-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Conforme o disposto no artigo 300 do CPC, que trata da concessão da tutela de urgência, esta somente poderá ser deferida se estiverem presentes os requisitos da probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Anote-se que o acórdão de ID 288134595 negou provimento ao recurso de apelação interposto pela ora embargante e que não foi demonstrado nos autos fato novo. Os embargos de declaração são cabíveis em face de decisão judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material no julgado, conforme prescrito no art. 1.022, do CPC, não se prestando, via de regra, à reforma do julgamento proferido, nem substituem os recursos previstos na legislação processual para que a parte inconformada com o julgamento possa buscar sua revisão ou reforma. Quanto às alegações de que a decisão adotou interpretação restrita e não considerou a particularidade do caso, observa-se que a ora embargante pretende, na verdade, estender a imunidade tributária prevista no artigo 184, § 5º, da Constituição Federal ao seu contrato de compra e venda, alegando ter sido forçada a alienar suas terras em virtude de invasões. Contudo, referido dispositivo aplica-se exclusivamente a imóveis "desapropriados para fins de reforma agrária", não sendo a situação descrita nos autos passível de se enquadrar nesse conceito. A alegação de que o imóvel, em razão das ocupações promovidas por movimento social, tornou-se improdutivo e, portanto, foi objeto de desapropriação, carece de fundamento, pois não configura desapropriação, mas, sim, compra e venda, conforme regulamentado pelo Decreto nº 433/1992, com as alterações do Decreto nº 2.614/1998. O referido Decreto, em seu artigo 1º, autoriza o INCRA a adquirir imóveis rurais para implantação de projetos de reforma agrária, especialmente em áreas de manifesta tensão social, como a situação descrita nos autos. Aliás, a decisão de compra e venda é precedida pela manifestação do proprietário sobre o preço e as condições da transação, o que afasta qualquer semelhança com o procedimento de desapropriação, que ocorre de forma unilateral pelo Poder Público. A imunidade tributária prevista para imóveis desapropriados não pode ser estendida aos casos de compra e venda, uma vez que a alienação se dá por ato voluntário do proprietário, conforme a legislação em vigor. A imunidade tributária, ao ser interpretada de forma restrita, destina-se exclusivamente aos casos de perda da propriedade por iniciativa do poder público, não alcançando a alienação realizada por iniciativa do proprietário, ainda que destinada a fins de reforma agrária. O argumento de que o INCRA teria estabelecido unilateralmente o valor do negócio não é suficiente, nem possui respaldo legal, para caracterizar a compra e venda como desapropriação. O Decreto nº 433/1992, com as alterações promovidas pelo Decreto nº 2.614/1998, regulamentou a aquisição de imóveis rurais para fins de reforma agrária por meio de compra e venda. No caso, é fato incontroverso que a venda se operou nos termos do Decreto nº 433/1992, não podendo a venda do imóvel rural ser equiparada à desapropriação para fins de imunidade tributária. O reconhecimento de uma imunidade, assim como a isenção, por excluir a aplicação da regra tributária, deve ser interpretado de forma literal (art. 111 do CTN), não sendo possível expandi-lo para incluir situações que não estão previstas na norma isentiva. Nesse cenário, cabe transcrever trecho do v. acórdão que tratou sobre a questão: A transferência da propriedade só é válida, juridicamente, se registrada no respectivo cartório de imóveis, quando, então, passa a ser oponível a terceiros, não se tratando de mera formalidade o registro do título de alienação, mas parte da essência do ato. A suposta restituição do imóvel Fazenda Santa Mônica ao sócio Sérgio Carlos Godoy Hidalgo não foi averbada no registro de imóveis. Assim, a propriedade da Fazenda Santa Mônica permaneceu com a pessoa jurídica, razão pela qual o INCRA comprou o imóvel da pessoa jurídica. Portanto, a proprietária dos imóveis continuou sendo a ora recorrente, até o momento em que foram transferidos ao INCRA. Com relação à desapropriação para fins de reforma agrária, assim tratam os arts. 5º, 182, 184 e 185 da Constituição Federal: Art. 5º, XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição; Art. 182, § 3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária: Importante mencionar que o fato de estar no texto constitucional faz com que o benefício fiscal se trate de imunidade, não importando a denominação dada pelo constituinte, ora tratando como isenção ou não incidência. A desapropriação consiste na perda compulsória da propriedade mediante a contrapartida indenizatória por parte do Estado, passando o imóvel à categoria de bem público, visando atender a interesse público relevante. Observa-se que a imunidade do imposto de renda é restrita aos casos em que haja a perda da propriedade por ato do poder público, não se estendendo tal beneficio para os contribuintes que exerçam o direito de alienar seus bens, independentemente da motivação. Aduz a parte autora que se viu obrigada a vender o imóvel rural por não possuir a posse pacífica do bem, em razão de pressão constante de invasões da Fazenda por integrantes de movimentos sociais. Contudo, não consta nos autos provas de que a proprietária tenha se valido outros meios legais para preservar ou retomar a posse. O argumento de que o INCRA teria estabelecido unilateralmente o valor do negócio não é suficiente e nem encontra respaldo legal para transformar a compra e venda celebrada em desapropriação. O Decreto nº 433/1992, com as alterações promovidas pelo Decreto nº 2.614/1998, regulamentou a aquisição de imóveis rurais, para fins de reforma agrária, por meio da compra e venda. Confira-se: "Art. 1º. Observadas as normas deste Decreto, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INCRA fica autorizado a adquirir, mediante compra e venda, imóveis rurais destinados à implantação de projetos integrantes do programa de reforma agrária, nos termos das Leis nºs 4.504, de 30 de novembro de 1964, e 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. Art. 2º. A aquisição imobiliária de que trata este Decreto ocorrerá, preferencialmente, em áreas de manifesta tensão social para o assentamento de trabalhadores rurais, visando atender à função social da propriedade. Art. 4º Definidas as regiões do País que atendem ao disposto no art. 2º, o INCRA procederá à seleção dos imóveis rurais que pretende adquirir por compra e venda, a fim de neles implantar projetos integrantes do programa de reforma agrária, destinados a reduzir demandas de acesso à terra ou a aliviar tensões sociais ocorrentes na área."_destaquei No caso, é fato incontroverso que a venda se operou nos termos do Decreto nº 433/1992 e não se pode equiparar a venda do imóvel rural à desapropriação para fins de imunidade tributária. Confira-se os seguinte julgado desta e. Corte: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. IMUNIDADE. ART. 184, §5º, CRFB. COMPRA E VENDA PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. EQUIPARAÇÃO À DESAPROPRIAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. O contrato de compra e venda de imóvel celebrado entre particular e a Administração Pública, ainda que tenha como finalidade o assentamento de trabalhadores rurais, não possui, notadamente para fins tributários, identidade com a desapropriação para fins de reforma agrária. Inadmite-se a rediscussão de matéria já analisada quando do julgamento do recurso próprio, sobretudo quando não identificado qualquer vício no acórdão embargado. Conforme reiterado entendimento jurisprudencial, é inadequada a pretensão de novo julgamento da causa na via dos embargos de declaração. Não é necessário abordar expressamente os dispositivos legais ou constitucionais no julgado para fins de prequestionamento, sendo suficiente a análise da matéria relevante para fundamentar a decisão. Assim, os questionamentos abordados no acórdão proferido demonstram que o requisito da probabilidade do direito não está comprovado Indefiro, portanto, o pedido de concessão da tutela provisória por não estarem configurados os requisitos necessários à sua concessão. Por fim, cabe advertir que a reiteração de embargos de declaração com propósito manifestamente protelatório enseja na aplicação da penalidade prevista no art. 1.026, §2º, do CPC. Em face do exposto, rejeito os embargos de declaração. É como voto.
§ 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.
§ 2º O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação.
§ 3º Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de desapropriação.
§ 4º O orçamento fixará anualmente o volume total de títulos da dívida agrária, assim como o montante de recursos para atender ao programa de reforma agrária no exercício.
§ 5º São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária.
I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;
II - a propriedade produtiva.
Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social.
§ 1º. A compra e venda autorizada por este Decreto realizar-se-á ad mensuram, na forma estabelecida pela legislação civil.
§ 2º. É vedada a aquisição de imóveis rurais, que, pelas suas características, não sejam adequados à implantação de projetos integrantes do programa de reforma agrária. (NR) (Redação dada ao artigo pelo Decreto nº 2.614, de 03.06.1998)
Parágrafo único. Compete ao INCRA definir e priorizar as regiões do País consideradas preferenciais para os fins do disposto neste artigo. (NR) (Redação dada ao artigo pelo Decreto nº 2.614, de 03.06.1998)
[...]
- A indenização recebida em virtude de desapropriação para fins de reforma agrária não entra no cômputo do rendimento bruto da pessoa física ou do lucro real da pessoa jurídica, mesmo se for apurado nessa transferência ganho de capital, consoante o art. 22, parágrafo único, da Lei 7.713/1988 e o art. 184, § 5º, da CF/1988.
- A imunidade concedida pelo artigo 184, §5º, da Constituição Federal aos valores recebidos pelo particular no procedimento de desapropriação decorre do direito à justa indenização - artigo 5º, XXIV, uma vez que a incidência do imposto de renda sobre a quantia fixada implicaria redução e violaria a supracitada garantia constitucional e indiretamente o direito fundamental à propriedade privada.
- O caso dos autos não é, ou sequer se confunde com desapropriação, que é medida de intervenção drástica do Estado na propriedade privada e configura ato de império, exercido de forma unilateral pelo poder público, em decorrência de seu domínio eminente, a fim de promover a função social da propriedade e fundamentada em motivos de necessidade ou utilidade pública, ou interesse social, inclusive para fins de reforma agrária. O contrato de compra e venda de imóvel celebrado entre particular e a administração pública, ainda que seja destinado ao assentamento de colonos, não guarda, especialmente para fins tributários, nenhuma identidade com a desapropriação para fins de reforma agrária, o que se evidencia pela natureza contratual, bilateral daquela relação jurídica, regida por normas de direito privado.
- Ademais, verifica-se que a extensão da imunidade tributária pretendida geraria violação à isonomia, pois distinguiria indevidamente contribuintes em idêntica situação, de modo a beneficiar aqueles que venham a celebrar compra e venda com o ente público.
- A turbação da posse, consubstanciada em acampamento ao longo das cercas da fazenda, e as invasões na propriedade rural dos impetrantes por parte de grupos de 'sem terras', poderiam ser tuteladas por meio das vias próprias cabíveis. Além disso, os argumentos dos apelados de que o INCRA teria estabelecido o unilateralmente o valor do negócio ou de que consta na avaliação, realizada pelo ente público, a expressão "justo valor de indenização" não são suficientes, nem encontram fundamentação legal, para transformar a 'compra e venda' celebrada em uma desapropriação.
- Recuso provido.
(TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 318597 - 0000165-80.2008.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE, julgado em 03/10/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/11/2018)
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. REDISCUSSÃO. VIA INADEQUADA. EMBARGOS REJEITADOS.