APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5027171-83.2022.4.03.6100
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: JKFC COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA
Advogados do(a) APELADO: ANDREY FONTES FARIAS - DF67237-A, ARLI PINTO DA SILVA - PR20260-A, JORGE WADIH TAHECH - PR15823-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5027171-83.2022.4.03.6100 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: SR. SUPERINTENDENTE REGIONAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DA 8ª REGIÃO FISCAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO - DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA - DERAT,, SUPERINTENDENTE DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DA 8ª REGIÃO FISCAL (SRRF08/SPO), DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: JKFC COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA Advogados do(a) APELADO: ANDREY FONTES FARIAS - DF67237-A, ARLI PINTO DA SILVA - PR20260-A, JORGE WADIH TAHECH - PR15823-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de remessa necessária e de apelação interposta pela UNIÃO (Fazenda Nacional) contra sentença que concedeu a segurança, na forma do art. 487, I do CPC, para reconhecer o direito de a impetrante de: “i. usufruir dos benefícios do PERSE, quais sejam os de redução da alíquota a zero sobre PIS, COFINS, CSLL e IRPJ, durante o período de vigência da legislação. ii. efetuar, após o trânsito em julgado, a compensação dos valores indevidamente recolhidos a tal título, nos últimos cinco anos anteriores à propositura, e os vencidos inclusive durante o curso da presente ação, nos termos da legislação e da Instrução Normativa vigentes no momento do ajuizamento da ação, ressalvando-se o direito de o contribuinte aplicar a legislação posterior no caso de compensação pela via administrativa (desde que atendidos os requisitos próprios), nos termos da legislação aplicável, tudo devidamente atualizados pela taxa Selic ou qualquer outro índice que vier a substituí-la no ajuste dos débitos fiscais federais”. O writ foi impetrado por JKFC COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA, em 20.10.2022, contra ato do SUPERINTENDENTE REGIONAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL NO ESTADO DE SÃO PAULO (8ª REGIÃO FISCAL) e do DELEGADO DA DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA EM SÃO PAULO – DERAT. Informações prestadas pela autoridade apontada como coatora (ID 308808126). Pela sentença ID 308808130, a Magistrada sentenciante entendeu que a a Lei que instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), não trouxe a obrigatoriedade da limitação temporal, não cabendo às Portarias (seja do Ministério da Economia seja da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional), normas regulamentadoras infralegais, trazer requisitos não impostos legalmente. Considerando que a Portaria atacada não só teria desbordado da lei, infringindo o Princípio da Legalidade, como também infringiu o princípio da isonomia, impondo tratamento desigual ao impetrante, o qual, apesar de não estar cadastrado no Ministério do Turismo à época da publicação da lei de regência, possui código e descrição da atividade econômica principal que se enquadram na Portaria ME nº 7.163/2021, anexo II, qual seja, “56.11-2-03 – Lanchonete, casas de chá, de sucos e similares” (id 266306175), fazendo jus à benesse”. Embargos de declaração da União (ID 308808282) rejeitados, conforme sentença ID 308808285. Em suas razões de recorrer (ID 308808286), alega a União (Fazenda Nacional) preliminarmente, “ante a falta de interesse processual do contribuinte dada a ausência de utilidade do provimento final”, na medida em que a empresa não pode obter o benefício fiscal em questão em razão de não atender os requisitos exigidos pela lei. Quanto ao mérito, alega que: a) é regular a exigência de prévia inscrição no CADASTUR, pois “a Portaria ME 7.163/2021, ao cumprir a determinação do art. 2º, §2º da lei2, não criou requisito algum, apenas declarou quais códigos CNAE se enquadram na definição de setor de eventos e quais poderiam se qualificar como prestação de serviços turísticos e, portanto, parte do setor de eventos, desde que inscritas regularmente no CADASTUR”; b) referido registro não é mera formalidade, porque por meio dele “se comprova que o negócio mantido é regularizado e autorizado pelo órgão público competente”; c) “resta preservado, portanto, o princípio da isonomia, previsto nos arts. 5º, caput, I e 150, II do texto constitucional, já que não há tratamento tributário distinto a contribuintes que se encontram na mesma situação”; d) “agente público está vinculado ao princípio da legalidade, exercendo as atribuições que a lei lhe confere”; Ademais, “necessário preservar o princípio da independência entre os órgãos do Poder Soberano, de estatura constitucional (art. 2º da CF), cláusula inafastável do Texto Superior (art. 60, § 4º, inciso III)”. Pretende, por fim, o prequestionamento dos “arts. 2º; 5º, caput, I; 60, §4º, III e 150, II, §6º da CF; os arts. 97, inciso VI, 111 e 155-A do CTN; os arts. 2º, §2º e 3º, §2º, I da Lei 14.148/2021; os arts. 21, 22, 33, I, 34 e 36 da Lei 11.771/2008; art. 1º, caput e §4º da LINDB e o art. 1º, §2º da Portaria ME 7.163/2021”. Contrarrazões apresentadas (ID 308808289). Manifestação do Parquet Federal (ID 308881877) no sentido da desnecessidade de sua intervenção no feito. É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5027171-83.2022.4.03.6100 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: SR. SUPERINTENDENTE REGIONAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DA 8ª REGIÃO FISCAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO - DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA - DERAT,, SUPERINTENDENTE DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DA 8ª REGIÃO FISCAL (SRRF08/SPO), DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: JKFC COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA Advogados do(a) APELADO: ANDREY FONTES FARIAS - DF67237-A, ARLI PINTO DA SILVA - PR20260-A, JORGE WADIH TAHECH - PR15823-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Presentes os pressupostos de admissibilidade, devem ser conhecidas a remessa necessária e a apelação. Preliminarmente, não há como se reconhecer a ausência de interesse de interesse processual, em razão de a impetrante não atender os requisitos exigidos pela lei, na medida em que a União deixou de pontuar quais seriam os requisitos que não foram observados. Ademais, latente a utilidade e necessidade do presente writ, porquanto a autoridade fiscal defende a regularidade da exigência prévia do registro no CADASTUR. Quanto ao mérito, a sentença comporta retoques. Com efeito, dispõe a Lei n. 14.148/2021 ("Lei Perse" - Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos): Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. § 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente: I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos; II - hotelaria em geral; III - administração de salas de exibição cinematográfica; e IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008. § 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo. (...) Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei: I - Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep); II - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e IV - Imposto sobre a Renda das Pessoas Juridicas (IRPJ).” A Lei n. 14.148, de 3.5.2021 trouxe importantes benefícios fiscais ao setor de eventos como forma de mitigar os danos causados pela pandemia da COVID19, trazendo ações emergenciais e temporárias destinadas a essa área empresarial. O aludido diploma legal autorizou, por prazo limitado, a redução da alíquota dos tributos que elenca para zero. Registre-se que a hipótese não é de isenção ou não incidência, mas de incidência de alíquota zero, pelo prazo que fixa. A lei, ainda, delegou ao Ministério da Economia a publicação dos códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos. Em razão dessa delegação, foi editada a Portaria n. 7163/2021 que incluiu as atividades exercidas pela ora apelante como considerada prestadora de serviços turísticos, conforme art. 21 da Lei 11.771, de 17/09/2008. A referida portaria previu: “As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.” (art. 1º, § 2º). (grifos) A Lei n. 11.771/2008, que tratou da Política Nacional de Turismo, definiu as atribuições do Governo Federal no planejamento, desenvolvimento e estímulo ao setor turístico: Art. 21. Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo: I - meios de hospedagem; II - agências de turismo; III - transportadoras turísticas; IV - organizadoras de eventos; V - parques temáticos; e VI - acampamentos turísticos. Parágrafo único. Poderão ser cadastradas no Ministério do Turismo, atendidas as condições próprias, as sociedades empresárias que prestem os seguintes serviços: I - restaurantes, cafeterias, bares e similares; II - centros ou locais destinados a convenções e/ou a feiras e a exposições e similares; III - parques temáticos aquáticos e empreendimentos dotados de equipamentos de entretenimento e lazer; IV - marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou à pesca desportiva; V - casas de espetáculos e equipamentos de animação turística; VI - organizadores, promotores e prestadores de serviços de infra-estrutura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposições e eventos; VII - locadoras de veículos para turistas; e VIII - prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades. Art. 22. Os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação. § 1o As filiais são igualmente sujeitas ao cadastro no Ministério do Turismo, exceto no caso de estande de serviço de agências de turismo instalado em local destinado a abrigar evento de caráter temporário e cujo funcionamento se restrinja ao período de sua realização. § 2o O Ministério do Turismo expedirá certificado para cada cadastro deferido, inclusive de filiais, correspondente ao objeto das atividades turísticas a serem exercidas. § 3o Somente poderão prestar serviços de turismo a terceiros, ou intermediá-los, os prestadores de serviços turísticos referidos neste artigo quando devidamente cadastrados no Ministério do Turismo. § 4o O cadastro terá validade de 2 (dois) anos, contados da data de emissão do certificado. § 5o O disposto neste artigo não se aplica aos serviços de transporte aéreo. Logo, em que pese não desconhecer a existência de julgados desta Corte em sentido contrário, tenho que a imposição do cadastro (na hipótese, no Cadastur), para gozo da incidência da alíquota zero, decorreu de ato infralegal e não da lei estipuladora do benefício fiscal. Ademais, tornou faculdade em condição obrigatória para a concessão da benesse a partir da edição da portaria. Com a edição da Lei n. 14.592, de 30 de maio de 2023, lei de conversão da Medida Provisória nº 1.147/2022, passou-se a estabelecer a necessidade de prévio registro no CADASTUR como requisito prévio para inscrição no PERSE. Sendo assim, o requisito da inscrição prévia no CADASTUR somente pode ser exigido para os pedidos de inscrição no PERSE ocorridos após a edição da supracitada lei. Por outro lado, a Medida Provisória nº 1.147/2022, de 22.12.22, alterou o art. 4º da Lei nº 14.148/2021, restringindo o benefício da alíquota zero, de modo que apenas os resultados das atividades relacionadas no novo texto (a serem detalhadas em portaria editada pelo Ministério da Economia) poderiam ser alvo do benefício fiscal, senão vejamos: “Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos abrangendo as seguintes atividades econômicas, com os respectivos códigos da CNAE: hotéis (5510-8/01); apart-hotéis (5510-8/02); albergues, exceto assistenciais (5590-6/01); campings (5590-6/02), pensões (alojamento) (5590-6/03); outros alojamentos não especificados anteriormente (5590-6/99); serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê (5620-1/02); produtora de filmes para publicidade (5911-1/02); atividades de exibição cinematográfica (5914-6/00); criação de estandes para feiras e exposições (7319-0/01); atividades de produção de fotografias, exceto aérea e submarina (7420-0/01); filmagem de festas e eventos (7420-0/04); agenciamento de profissionais para atividades esportivas, culturais e artísticas (7490-1/05); aluguel de equipamentos recreativos e esportivos (7721-7/00); aluguel de palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário, exceto andaimes (7739-0/03); serviços de reservas e outros serviços de turismo não especificados anteriormente (7990-2/00); serviços de organização de feiras, congressos, exposições e festas (8230-0/01); casas de festas e eventos (8230-0/02); produção teatral (9001-9/01); produção musical (9001-9/02); produção de espetáculos de dança (9001-9/03); produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares (9001-9/04); atividades de sonorização e de iluminação (9001-9/06); artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificadas anteriormente (9001-9/99); gestão de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas (9003-5/00); produção e promoção de eventos esportivos (9319-1/01); discotecas, danceterias, salões de dança e similares (9329-8/01); serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00): (...)” A fim de regulamentar a nova redação do caput do art. 4º da Lei nº 14.148/2021, dada pela Redação dada pela Lei nº 14.592, de 2023), foi editada a Portaria ME nº 11.266/2022, em vigor a partir de 01/01/2023, a qual, ao definir os códigos CNAE abrangidos pela lei instituidora da benesse, não incluiu o CNAE da impetrante (56.11-2-03 - Lanchonetes, casas de chá, de sucos e similares – ID 308808109). Verifica-se, pois, que a impetrante se qualifica como prestador de serviço turístico, tanto é assim que é hoje registrada no CADASTUR, consoante documento ID 3088081150, o que, na redação original do art. 4º, caput, da Lei nº 14.148/2022, era suficiente para se beneficiar da alíquota zero. Todavia, desde a nova redação do art. 4º, caput, da Lei nº 14.148/2022, regulamentada pela Portaria ME nº 11.266/2022, somente as atividades expressamente ali elencadas podem fazer jus ao benefício, dentre as quais não se inclui a atividade econômica desenvolvida pela apelante. Por outro lado, considerando-se que a necessidade de observância do princípio da anterioridade – arts. 150 e 195 da CF -, haja vista a majoração indireta da carga tributária pela edição da Portaria ME nº 11.266/2022, tenho que a impetrante faz jus ao enquadramento no PERSE sem que se lhe exijada a comprovação de situação regular no Cadastur, findando-se a fruição do benefício após o decurso dos prazos, contados da publicação da Portaria ME n.º 11.266/2022, da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e da anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social. Nesse sentido, mutatis mutandis: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PERSE. EXIGÊNCIA DE REGULARIDADE NO CADASTUR. RESTAURANTES, CAFETERIAS, BARES E SIMILARES. ILEGALIDADE PORTARIA ME 7.163/2021. NECESSIDADE DE OBSERVÂNICAS DOS PRINCÍPIOS DA IRRETROATIVIDADE E ANTERIORIDADE QUANTO À LEI 14.592/2023. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Discute-se a legalidade da exigência prevista no §2º, do artigo 1º, da Portaria ME n.º 7.163/2021, do Ministério da Economia, que, em relação às pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como restaurantes, cafeterias, bares e similares, condicionou-as à situação regular no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos – Cadastur na data publicação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021, em 18.03.2022, para fins de enquadramento no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE. 2 - A Lei nº 14.148/2021 instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), criando benefícios ao setor com o objetivo de “compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da Covid-19”, conforme se extrai de sua própria ementa. 3 - Referida lei foi inicialmente publicada em 04/05/2021, sendo que o art. 4º, que previa o benefício de redução à alíquota zero, pelo prazo de 60 meses, do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), bem como das contribuições ao Programa de Integração Social (PIS) e Financiamento da Seguridade Social (COFINS), havia sido vetado pelo Presidente da República. Posteriormente, com a derrubada do veto pelo Congresso Nacional, a Lei foi republicada em 18/03/2022, sendo esta a data a ser considerada para fins de vigência do benefício de alíquota zero em comento. 4 - O art. 2º, § 1º, da Lei nº 14.148/2021, elenca em seus incisos as atividades econômicas que são consideradas como pertencentes ao setor de eventos para os fins da norma. O §2º desse mesmo art. 2º, por sua vez, estabelece que ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos. 5 - De acordo com a atual regulamentação infralegal (Portarias ME e Instrução Normativa RFB), o benefício do PERSE pode ser usufruído pelo impetrante somente se, em 18 de março de 2022, estivesse com inscrição em situação regular no CADASTUR. 6 - No entanto, não é possível que normas infralegais, a pretexto de regulamentarem determinado benefício fiscal, estabeleçam condição não prevista em lei, sob pena de violar o princípio da legalidade, previsto no art. 5º, II, e no art. 150, I, ambos da Constituição Federal. 7 - A exigência feita por ato infralegal de prévia inscrição da pessoa jurídica no CADASTUR como condição para que seja considerada empresa atuante no setor turístico e assim usufruir o benefício fiscal, é abusiva, prejudicando os contribuintes que – embora atuassem no segmento de turismo – não tivessem anteriormente realizado tal inscrição, que não era obrigatória. 8 - Verifica-se que tal previsão culminou por estabelecer um tratamento diferenciado, baseado em premissa não essencial ao exercício de atividade econômica, distinguindo empresas que passaram todas pelo mesmo infortúnio econômico (pandemia da COVID-19), em evidente quebra do princípio da isonomia, sem nenhuma previsão legal. 9 - Dessa forma, a condição prevista no §2º do art. 1º da Portaria ME nº 7.163/21, bem como no art. 4º, II, “b”, da IN RFB nº 2.114/22, e §2º do art. 1º da Portaria ME nº 12.266/22, não pode ser exigida do contribuinte como requisito para fruição do benefício previsto no art. 4º da Lei nº 14.148/21 10 - O poder constituinte originário conferiu ao Estado o poder de tributar os contribuintes, para obter recursos para financiar suas atividades. A fim de que o exercício desse poder estatal seja legítimo, contudo, deve-se observar não só os limites da competência atribuída pela Constituição Federal a cada ente da federação, como também as imunidades e as garantias individuais do contribuinte previstas principalmente no artigo 150 da Constituição Federal. 11 - Na seara tributária, isso se reflete na vedação do Estado de promover modificações legislativas repentinas, com efeitos concretos imediatos, que elevem a carga tributária. Assegura, ainda, ao contribuinte, um tempo mínimo para conhecer a modificação na legislação tributária e planejar a atividade econômica para suportar seus efeitos. É justamente para impedir tais “surpresas”, que o artigo 150, III, da Constituição Federal confere ao contribuinte a proteção dos princípios da anterioridade genérica e da anterioridade. Em sua modalidade genérica, o princípio da anterioridade veda que a lei que institua ou majore tributo produza efeitos no mesmo exercício financeiro em que ela foi publicada, nos termos do artigo 150, III, alínea ‘b’ da Constituição Federal. Já de acordo com o princípio da anterioridade nonagesimal, a lei que institui ou majora tributos só produz efeitos após 90 (noventa) dias da data de sua publicação. 12 - A matéria em questão, inicialmente, foi apenas tratada como limitação ao poder de tributar, consoante decorre explicitamente do texto constitucional. No entanto, passou-se também a questionar a aplicação principiológica para os benefícios fiscais concedidos. O debate faz sentido na medida em que a retirada de benesses fiscais - tal como a criação ou aumento dos tributos –, da mesma forma, é passível de gerar surpresa aos contribuintes, caracterizando, na realidade, espécie de majoração indireta de tributos. 13 - Não se questiona a possibilidade de eventual alteração legislativa ou mesmo da reedição de atos infralegais que tenham por consequência a supressão de benefícios, seja pela alteração do entendimento do Parlamento ou mesmo por diversa compreensão da Administração. A bem da verdade, compreende-se com naturalidade que se sucedam modificações normativas, inclusive, em curto espaço tempo, o que decorre de novos cenários e demandas. Todavia, preza-se, apenas, pela aplicação dos mesmos princípios constitucionais para situação equivalente, isto é, de exasperação da carga tributária. 14 - A Lei que estabelece restrição a benefício fiscal, que implique na sua redução ou revogação, está sujeita ao princípio da anterioridade, seja a anterioridade de exercício (artigo 150, III, b, da CF), seja a anterioridade nonagesimal (alínea c), de acordo com o respectivo tributo (§ 1º), entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte. Precedentes. 15 - Por seu turno, dispõe o artigo 178 do Código Tributário Nacional que “a isenção, salvo se concedida por prazo certo ou em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei a qualquer tempo, observado o disposto no inc. III do CTN, art. 104”. Exsurgem, portanto, duas modalidades de isenção: as simples e as onerosas. As isenções simples são passíveis de revogação a qualquer tempo, apenas sendo de rigor a observância dos princípios da anterioridade anual e nonagesimal, entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte. Já as isenções onerosas, por sua vez, são concedidas por um lapso temporal definido e, necessariamente, para a sua caracterização, devem vir acompanhadas de determinadas ações do seu beneficiário para que possam dela usufruir (“em função de determinadas condições”). Em razão de tais características, isto é, tempo determinado e contrapartida do contribuinte, não é possível se falar em revogação da isenção onerosa, devido à proteção conferida ao direito adquirido de seu beneficiário. Como elemento chave na caracterização das isenções onerosas e com conceito jurídico bem definido no ordenamento pátrio, as condições não são diferentes na esfera tributária e também se caracterizam como eventos futuros e incertos. 16 - Figura como requisito legal (e não condição) para a fruição das benesses fiscais a inscrição no Cadastur na data de publicação da Lei instituidora do PERSE. A rigor, não foi estabelecido na legislação discutida qualquer ônus às empresas para a fruição dos benefícios previstos, o que implica em reconhecer a ausência de violação do artigo 178 do CTN e de distinção da situação abrangida pela Súmula 544 do STF (“Isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas”). 17 - Importante ressaltar que a fruição dos benefícios fiscais previstos para as pessoas jurídicas que preenchem os requisitos legais independe de qualquer ato formal de adesão ao Programa. Enquadrada na hipótese legal do PERSE, nasce para o contribuinte, de imediato, o direito à redução a zero da alíquota tributária e, para o Fisco, exsurge a impossibilidade de exigir qualquer tributo em descompasso com a Lei. 18 - Ausente condição relativa à adesão ao PERSE, incabível a exigência de sua comprovação para fruição dos benefícios do Programa, bastando o cumprimento dos requisitos legais para que, desde a vigência do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021 (em 18.03.2022), as pessoas jurídicas façam jus à redução a zero da alíquota tributária. 19 – Porém, com a vigência da Lei n.º 14.592/2023, para fins de fruição dos benefícios do PERSE passou a se exigir a comprovação de situação regular no Cadastur, na data de 18.03.2022, o que implica revogação do benefícios fiscal para os contribuintes que não atendem a este requisito legal, observado o critério da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e à anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social. 20 - Desta sorte, de rigor o reconhecimento da ilegalidade do quanto disposto no § 2º, do artigo 1º, da Portaria ME n.º 7.163/2021 e, por consequência, o direito ao enquadramento no PERSE do contribuinte prestador de serviços qualificados como restaurantes, cafeterias, bares e similares, sem que se lhe exija a comprovação de situação regular no Cadastur na data publicação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021 (em 18.03.2022), observada a sujeição à anterioridade constitucional da restrição prevista na Lei n.º 14.592/2023. 21 – No caso concreto, acrescente-se que as atividades desenvolvidas pela impetrante (lanchonetes, casas de chás, sucos e similares, CNAE 5611-2/03) foram incluídas na Portaria ME nº 7.163/21 e, posteriormente, excluídas da Portaria ME subsequente, de nº 11.266/22.Assim, faz jus à fruição do benefício fiscal até que observado o critério da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e à anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social. 22 - Apelação do impetrante parcialmente provida. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000434-82.2023.4.03.6108, Rel. Desembargador Federal RUBENS ALEXANDRE ELIAS CALIXTO, julgado em 09/05/2024, Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO) TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PERSE. EXIGÊNCIA DE REGULARIDADE NO CADASTUR. ATIVIDADES CONSTANTES DO ANEXO I PORTARIA ME 7.163/2021. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. CONSULTORIA EM PUBLICIDADE. ILEGALIDADE PORTARIA ME 7.163/2021. POSTERIOR EXCLUSÃO DO CNAE. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO FISCAL. POSSIBILIDADE. ISENÇÃO SIMPLES. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA IRRETROATIVIDADE E ANTERIORIDADE. COMPENSAÇÃO. RESTITUIÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. A r. sentença foi devidamente motivada, constando expresso entendimento do juízo no sentido de que “conclui-se que a Lei do PERSE já elegeu, de forma objetiva, as empresas beneficiárias do programa (constantes no Anexo I), no entanto, para as demais, que se encontram no Anexo II da Portaria, há a dependência do reconhecimento e a regularidade prévia no CADASTUR ao tempo da sua publicação”. Afastada alegação de nulidade processual. 2. O regular desenvolvimento da relação jurídico-processual é formado pelo binômio utilidade-necessidade, ou seja, é preciso demonstrar tanto a necessidade da tutela jurisdicional, como a utilidade do provimento pretendido para solução da lide, inclusive por meio da adequação da via eleita para sua satisfação. Desse modo, a intervenção do Poder Judiciário apenas se revela necessária quando há resistência de uma parte em se submeter à pretensão requerida pela parte adversa. 3. No caso concreto, a parte impetrante exerce atividades que constavam listadas no Anexo I da Portaria ME n.º 7.163/2021, do Ministério da Economia. A exigência de situação regular no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos – Cadastur na data publicação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021 (em 18.03.2022) para fins de enquadramento no PERSE, prevista no § 2º, do artigo 1º, da Portaria ME n.º 7.163/2021, refere-se, única e exclusivamente, às atividades listadas em seu Anexo II. Além de não se exigir da parte impetrante a regularidade no Cadastur, seja na Lei do PERSE, seja na referida Portaria ME n.º 7.163/2021, tampouco há norma interna da Receita Federal do Brasil que o faça; ao contrário, há expresso entendimento fazendário consonante com o ora pleiteado no writ, nos termos da Solução de Consulta COSIT n.º 105/2023. 4. Assim, não há qualquer vedação, legal ou infralegal, que obstasse a impetrante de usufruir os benefícios do PERSE, enquanto atendidos os requisitos previstos na Lei n.º 14.148/2021. Da própria narrativa (Teoria da Asserção) constante da petição inicial não se revela, nem em tese, a existência de pretensão resistida ou de ameaça de ato coator no caso. Especificamente quanto ao pedido para reconhecimento, independentemente de regularidade no Cadastur, do direito ao gozo dos benefícios do PERSE quanto às atividades listas no Anexo I da Portaria ME n.º 7.163/2021, observa-se que a presente impetração carece de interesse processual, na modalidade necessidade do provimento jurisdicional. 5. Discute-se a legalidade da exigência prevista no § 2º, do artigo 1º, da Portaria ME n.º 7.163/2021, do Ministério da Economia, que, em relação às pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como “prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades”, condicionou-as à situação regular no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos – Cadastur na data publicação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021, em 18.03.2022, para fins de enquadramento no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE. 6. A Lei n.º 14.148/2021 instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE, com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos pudesse mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública. Dentre os benefícios do Programa foi prevista, inicialmente, a redução a zero 0% (zero por cento), pelo prazo de 60 (sessenta) meses, das alíquotas da tributação de PIS, COFINS, CSLL e IRPJ, incidentes sobre as receitas e o resultado auferido pelas pessoas jurídicas do setor de eventos. Ressalta-se que, posteriormente, com a vigência da Medida Provisória n.º 1.147/2022, convertida na Lei n.º 14.592/2023, referida redução a zero 0% (zero por cento) das alíquotas tributárias passou a incidir, restritivamente, sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos nas atividades relacionadas no ato do Ministério da Economia. 7. A fim de delimitar as pessoas jurídicas do denominado setor de eventos, a Lei n.º 14.148/2021 estabeleceu que se consideram pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem, direta ou indiretamente, dentre outras atividades econômicas aquela referente à “prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008”. Em relação à atividade econômica de “prestação de serviços turísticos”, remeteu-se à Lei n.º 11.771/2008, que, dentre as disposições sobre a Política Nacional de Turismo, disciplinou a prestação de serviços turísticos, seu cadastro, classificação e fiscalização. 8. Editada para o fim de definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram inclusos no denominado setor de eventos, a Portaria ME n.º 7.163/2021, do Ministério da Economia, restou expresso no § 2º, de seu artigo 1º, a exigência de situação regular no Cadastur na data publicação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021 (em 18.03.2022), para que as pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como restaurantes, cafeterias, bares e similares, pudessem ser enquadradas no PERSE. 9. Diante da modificação do artigo 4º da Lei do PERSE pelo advento da Medida Provisória nº 1.147/22 – delimitando o benefício para “as receitas e os resultados das atividades do setor de eventos” -, em 02/01/2023, por orientação do §4º do mesmo dispositivo, em substituição à Portaria ME nº 7.163/21, foi publicada nova Portaria do Ministério da Economia, de nº 11.266/22, que excluiu alguns códigos CNAEs do benefício fiscal previsto. 10. Posteriormente, a Lei n.º 14.592/2023, publicada em 30.05.2023, alterando em parte as disposições da Lei n.º 14.148/2021, passou a exigir, para o enquadramento no PERSE, a regularidade, em 18 de março de 2022, da situação no Cadastur quanto às pessoas jurídicas prestadoras de serviços qualificadas, dentre outros, como restaurantes, cafeterias, bares e similares. 11. Após, foi editada a Medida Provisória n.ª 1.202/2023, publicada em 29.12.2023, que, submetida aos princípios da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e da anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social, revogou expressamente o benefício fiscal relativo à redução a zero das alíquotas dos tributos previstos no PERSE (artigo 6º, I). 12. Contudo, referido inciso I, do artigo 6º, da Medida Provisória n.º 1.202/2023 foi expressamente revogado pelo artigo 5º da Lei n.º 14.859/2024, publicada em 23.05.2024, a qual, em seu artigo 1º, modificou a redação do artigo 4º da Lei n.º 14.148/2021, listando novo rol de atividades inclusas no Programa, além de dispor, em relação à parte dessas atividades, a necessidade de regularidade da situação no Cadastur, seja na data de 18 de março de 2022, seja por meio de regularização naquele cadastro até 30 de maio de 2023. 13. É importante frisar que a Lei n.º 11.771/2008, indicada nos atos normativos para fins da exigência de regularidade no Cadastur, não estabelecia, e permanece não estabelecendo, qualquer obrigatoriedade para que se cadastrem no Ministério do Turismo as pessoas jurídicas “prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades”; tal medida, nos estritos termos do parágrafo único de seu artigo 21, consiste numa faculdade. O artigo 22 da Lei n.º 11.771/2008 obriga ao cadastro no Ministério do Turismo, apenas e tão somente, os prestadores de serviços turísticos, os quais, por seu turno, encontram-se elencados nos incisos I a VI, do caput, do artigo 21 do referido ato legal. 14. Na medida em que a exploração da atividade própria aos “prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades” não se insere, obrigatoriamente, no setor de eventos, tampouco no setor de turismo, não foge à razoabilidade e proporcionalidade a exigência, prevista em ato emanado pelo Poder Legislativo, de regularidade no Cadastur para fins de fruição do benefício fiscal previsto no PERSE, haja vista que referido Programa visou à recuperação de determinados setores da economia, especialmente afetados pela pandemia da Covid-19, e que, justamente, visou ao princípio da isonomia. De sorte que, sob pena de ofensa à separação dos Poderes, não cabe ao Judiciário substituir os demais Poderes no âmbito da discricionariedade que lhes é própria. 15. Uma vez que, em sua redação original, a Lei n.º 14.148/2021 não previa a exigência da situação de regularidade no Cadastur, requisito que se passou a exigir em ato do Legislativo com a edição da Lei n.º 14.592/2023, a qual não poderia atingir os fatos geradores que lhe precederam, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade (artigo 150, III, a, da CF), cabe um aprofundamento sobre a possibilidade de revogação ou alteração de benefício fiscal, bem como sobre o tipo de benefício concedido no âmbito do Programa, inclusive para fixação dos termos inicial e final de fruição do benefício fiscal do PERSE. 16. O poder constituinte originário conferiu ao Estado o poder de tributar os contribuintes, para obter recursos para financiar suas atividades. A fim de que o exercício desse poder estatal seja legítimo, contudo, deve-se observar não só os limites da competência atribuída pela Constituição Federal a cada ente da federação, como também as imunidades e as garantias individuais do contribuinte previstas principalmente no artigo 150 da Constituição Federal. 17. Na seara tributária, isso se reflete na vedação do Estado de promover modificações legislativas repentinas, com efeitos concretos imediatos, que elevem a carga tributária. Assegura, ainda, ao contribuinte, um tempo mínimo para conhecer a modificação na legislação tributária e planejar a atividade econômica para suportar seus efeitos. É justamente para impedir tais “surpresas”, que o artigo 150, III, da Constituição Federal confere ao contribuinte a proteção dos princípios da anterioridade genérica e da anterioridade. Em sua modalidade genérica, o princípio da anterioridade veda que a lei que institua ou majore tributo produza efeitos no mesmo exercício financeiro em que ela foi publicada, nos termos do artigo 150, III, alínea ‘b’ da Constituição Federal. Já de acordo com o princípio da anterioridade nonagesimal, a lei que institui ou majora tributos só produz efeitos após 90 (noventa) dias da data de sua publicação. 18. A matéria em questão, inicialmente, foi apenas tratada como limitação ao poder de tributar, consoante decorre explicitamente do texto constitucional. No entanto, passou-se também a questionar a aplicação principiológica para os benefícios fiscais concedidos. O debate faz sentido na medida em que a retirada de benesses fiscais - tal como a criação ou aumento dos tributos –, da mesma forma, é passível de gerar surpresa aos contribuintes, caracterizando, na realidade, espécie de majoração indireta de tributos. 19. Não se questiona a possibilidade de eventual alteração legislativa ou mesmo da reedição de atos infralegais que tenham por consequência a supressão de benefícios, seja pela alteração do entendimento do Parlamento ou mesmo por diversa compreensão da Administração. A bem da verdade, compreende-se com naturalidade que se sucedam modificações normativas, inclusive, em curto espaço tempo, o que decorre de novos cenários e demandas. Todavia, preza-se, apenas, pela aplicação dos mesmos princípios constitucionais para situação equivalente, isto é, de exasperação da carga tributária. 20. A Lei que estabelece restrição a benefício fiscal, que implique na sua redução ou revogação, está sujeita ao princípio da anterioridade, seja a anterioridade de exercício (artigo 150, III, b, da CF), seja a anterioridade nonagesimal (alínea c), de acordo com o respectivo tributo (§ 1º), entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte. Precedentes. 21. Por seu turno, dispõe o artigo 178 do Código Tributário Nacional que “a isenção, salvo se concedida por prazo certo ou em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei a qualquer tempo, observado o disposto no inc. III do CTN, art. 104”. Exsurgem, portanto, duas modalidades de isenção: as simples e as onerosas. As isenções simples são passíveis de revogação a qualquer tempo, apenas sendo de rigor a observância dos princípios da anterioridade anual e nonagesimal, entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte. Já as isenções onerosas, por sua vez, são concedidas por um lapso temporal definido e, necessariamente, para a sua caracterização, devem vir acompanhadas de determinadas ações do seu beneficiário para que possam dela usufruir (“em função de determinadas condições”). Em razão de tais características, isto é, tempo determinado e contrapartida do contribuinte, não é possível se falar em revogação da isenção onerosa, devido à proteção conferida ao direito adquirido de seu beneficiário. Como elemento chave na caracterização das isenções onerosas e com conceito jurídico bem definido no ordenamento pátrio, as condições não são diferentes na esfera tributária e também se caracterizam como eventos futuros e incertos. 22. Figura como requisito legal (e não condição) para a fruição das benesses fiscais a inscrição no Cadastur na data de publicação da Lei instituidora do PERSE (18.03.2022), ou até 30.05.2023. A rigor, não foi estabelecido na legislação discutida qualquer ônus às empresas para a fruição dos benefícios previstos, o que implica reconhecer a ausência de violação do artigo 178 do CTN e de distinção da situação abrangida pela Súmula 544 do STF (“Isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas”). 23. Importante ressaltar que a fruição dos benefícios fiscais previstos para as pessoas jurídicas que preenchem os requisitos legais independe de qualquer ato formal de adesão ao Programa. Enquadrada na hipótese legal do PERSE, nasce para o contribuinte, de imediato, o direito à redução a zero da alíquota tributária e, para o Fisco, exsurge a impossibilidade de exigir qualquer tributo em descompasso com a Lei. Ausente condição relativa à adesão ao PERSE, incabível a exigência de sua comprovação para fruição dos benefícios do Programa, bastando o cumprimento dos requisitos legais para que as pessoas jurídicas façam jus à redução a zero da alíquota tributária. 24. Porém, com a vigência da Lei n.º 14.859/2024, para fins de fruição dos benefícios do PERSE passou a se exigir a comprovação de situação regular no Cadastur, na data de 18.03.2022 ou até a data de 30.05.2023. 25. Para os contribuintes que não atendem ao referido requisito legal, tem-se que a alteração legislativa promovida já pela Lei n.º 14.592/2023 implicou a revogação do benefício fiscal, observado o critério da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e à anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social, contado da data de sua publicação, em 30.05.2023. 26. No caso concreto, a parte impetrante presta atividade CNAE 7319-0/04 (consultoria em publicidade), englobada como “prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades”. Referida atividade, embora constasse do Anexo II da Portaria ME n.º 7.163/2021, foi excluída do rol de atividades da Portaria ME n.º 11.266/2022, não constando dos róis posteriormente contemplados nas Leis n.ºs 14.592/2023 e 14.854/2024. 27. De rigor o reconhecimento da ilegalidade do quanto disposto no § 2º, do artigo 1º, da Portaria ME n.º 7.163/2021 e, por consequência, o direito ao enquadramento no PERSE do contribuinte como “prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades”, sem que se lhe exija a comprovação de situação regular no Cadastur na data de 18.03.2022 ou até a data de 30.05.2023, findando-se a fruição do benefício após o decurso dos prazos, contados da publicação da Portaria ME n.º 11.266/2022, da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e da anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social. 28. Observado o prazo quinquenal de prescrição disposto no artigo 168, I, do CTN, contado da data do ajuizamento desta ação, fica reconhecido o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente relativamente aos tributos inclusos no PERSE e objeto de redução da alíquota a zero por cento. 29. O reconhecimento do direito à compensação não é de cunho de meramente declaratório, mas, sim, condenatório, uma vez que obriga a União a suportar a compensação daquilo cuja conclusão, em regra, implicaria execução nos próprios autos. 30. Na forma dos artigos 39, § 4º, da Lei n.º 9.250/95 e 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021, bem como das teses fixadas nos Temas n.º 810/TSF e 905/STJ, os créditos serão atualizados pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic (composta de taxa de juros moratórios e correção monetária), calculada a partir do recolhimento indevido (Súmula STJ n.º 162) até o mês anterior ao da repetição, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices. 31. Após o trânsito em julgado (artigo 170-A do CTN), poderá ser requerida a compensação do indébito administrativamente junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil, observando-se o disposto nos artigo 74 da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A da Lei n.º 11.457/2007, vigentes na data da propositura da ação, ressalvando-se o direito de proceder à compensação em conformidade com normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios, nos termos da tese firmada pelo c. STJ no julgamento do Tema Repetitivo n.º 265 (REsp n.º 1.137.738/SP). 32. Ressalta-se que compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil disciplinar os procedimentos necessários para o requerimento administrativo da compensação (artigo 74, § 14, da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A, § 2º, da Lei n.º 11.457/2007). 33. O e. Supremo Tribunal Federal, em 08.08.2015, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 831, delimitado como “obrigatoriedade de pagamento, mediante o regime de precatórios, dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva”, reafirmou sua jurisprudência e firmou tese no sentido de que “o pagamento dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva deve observar o regime de precatórios previsto no artigo 100 da Constituição Federal”. Em 13.09.2019, a Corte Suprema julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 250/DF para estabelecer a necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor). Ainda, em 10.02.2010, no julgamento pelo c. Superior Tribunal de Justiça do Tema Repetitivo n.º 228 (REsp n.ºs 1.114.404/MG e 937.890/SP), delimitado como “questiona-se se é facultado ao contribuinte que detém crédito contra a Fazenda Pública por tributo indevidamente pago optar pela restituição via precatório ou compensação, conforme previsão legal do ente tributante”, e assim analisado, fixou-se a tese no sentido de que “o contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”, posteriormente convertida na Súmula STJ n.º 461. Sedimentando a questão, o Tribunal Pleno do e. Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral à matéria (Tema n.º 1.262 – RE 1.420.691) e, reafirmando sua jurisprudência, firmou tese no sentido de que “não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal”. 34. Em consonância com o entendimento da Corte Suprema, a quem compete assegurar o devido atendimento dos preceitos da Carta, entende-se ser incabível a restituição, em espécie, na via administrativa. Assim, uma vez reconhecida judicialmente a existência de valores de tributos recolhidos indevidamente ou a maior, cabe ao contribuinte optar pela sua compensação, na via administrativa, ou por sua restituição, por meio de precatório. 35. Adota-se o entendimento firmado por esta 3ª Turma no sentido de que a restituição do indébito tributário é cabível, inclusive, por meio de cumprimento de sentença nos próprios autos do mandado de segurança. 36. Custas na forma da lei. Sem condenação em honorários advocatícios, conforme disposição do artigo 25 da Lei n.º 12.016/09. 37. Apelação parcialmente provida. Segurança parcialmente concedida. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5028662-28.2022.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 24/09/2024, Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO) TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PROGRAMA DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS - PERSE. LEI Nº 14.148/2021. REGULAMENTAÇÃO PELA PORTARIA ME Nº 7.163/2021, DEPOIS TAMBÉM PELA PORTARIA ME Nº 11.266/2022. EXIGÊNCIA DE PRÉVIA INSCRIÇÃO NO CADASTUR. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. CNAE DA ATIVIDADE PRINCIPAL (LANCHONETE) NÃO ELENCADO NA PORTARIA Nº 11.266/2022. ATIVIDADE NÃO MAIS BENEFICIADA COM O PROGRAMA. MAJORAÇÃO INDIRETA DE TRIBUTO. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE. SEGURANÇA PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. Apelação interposta pelas empresas impetrantes em face de sentença que, considerando que não cabe mandado de segurança contra lei em tese, extinguiu o feito sem resolução de mérito (art. 485, VI, do CPC). 2. No presente mandado de segurança, as impetrantes, que exercem a atividade de lanchonete como principal (CNAE 56.11-02.03), objetivam o reconhecimento do direito de: i) usufruir do benefício de redução a zero das alíquotas de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL, previsto no art. 4º da Lei nº 14.148/2021, a partir da competência 01/01/2023, para todos os seus estabelecimentos, independentemente da data de inscrição no CADASTUR e do fato de seu CNAE (lanchonete) ter sido excluído da lista constante na Portaria ME nº 11.266/2022; subsidiariamente, que seja respeitado o princípio da anterioridade; ii) repetir o respectivo indébito tributário, desde 01/01/2023, via compensação ou restituição em espécie. 3. O caso não é de aplicação do entendimento firmado na Súmula nº 266/STF ("Não cabe mandado de segurança contra lei em tese"), uma vez que é cabível o mandado de segurança na hipótese presente, a fim de prevenir a ameaça ao direito da impetrante de ver acabar o benefício fiscal trazido pelo PERSE, pois o ato normativo em debate (Portaria ME nº 11.266/2022) se consubstancia em ato administrativo de efeitos concretos, com operatividade imediata. Assim, o receio das impetrantes de que a mencionada portaria venha a violar seu alegado direito líquido e certo é suficiente para ensejar a impetração. 4. A fim de regulamentar a nova redação do caput do art. 4º da Lei nº 14.148/2021 (que institui o PERSE), a Portaria ME nº 11.266/2022, em vigor a partir de 01/01/2023, além de vincular a fruição do benefício fiscal dos prestadores de serviços turísticos à inscrição no CADASTUR, definiu os códigos CNAE abrangidos pela alíquota zero, o que, desta feita, não incluiu o CNAE das impetrantes (lanchonete - CNAE 56.11-2-03). 5. Quanto à necessidade de inscrição no CADASTUR, é incontroverso nos autos que a empresa impetrante se inscreveu apenas após 18/03/2022 (data de republicação da Lei nº 14.148/2021). Nesse tocante, contudo, esta 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região tem decidido que a exigência quanto ao registro prévio no CADASTUR, criada pelo § 2º do art. 1º da Portaria ME nº 7.163/2021, reafirmada pelo parágrafo único do art. 2º da Portaria ME nº 11.266/2022, exorbita o poder regulamentar, porque instituído apenas em normas infralegais, isto é, extrapolando as determinações da Lei nº 14.148/2021, que não tratou da referida questão ou criou tal exigência. A inscrição no CADASTUR após a entrada em vigor da Lei nº 14.148/2021, portanto, não obsta o gozo do benefício fiscal pelas impetrantes. Ressalva do entendimento pessoal do Relator. 6. Como a atividade principal desempenhada pelas impetrantes não está elencada na Portaria ME nº 11.266/2022, que passou a regulamentar o caput do art. 4º da Lei nº 14.148/2021, deixam de ser beneficiar da alíquota zero. Apesar de o CNAE das recorrentes continuar elencado na Portaria ME nº 7.163/2021, ou seja, as impetrantes se qualificam como prestadores de serviços turísticos, o que, na redação original do art. 4º, caput, da Lei nº 14.148/2022, era suficiente para se beneficiar da alíquota zero prevista, tem-se que, desde a nova redação do art. 4º, caput, da Lei nº 14.148/2022, regulamentada pela Portaria ME nº 11.266/2022, não são todas as atividades turísticas beneficiadas, mas apenas aquelas expressamente elencadas no novo ato infralegal, que excluiu a atividade de lanchonetes. 7. A Portaria ME nº 11.266/2022 majorou, indiretamente, a carga tributária do contribuinte. Logo, em atenção ao princípio da segurança jurídica, e consoante interpretação sedimentada recentemente pelo Supremo Tribunal Federal, deve ser respeitado o princípio da anterioridade, previsto na Constituição Federal, nos arts. 150 e 195. 8. No que se refere ao PIS, à COFINS, e à CSLL, as impetrantes têm direito à manutenção da alíquota zero relativamente aos fatos geradores até 02/04/2023, ou seja, até noventa dias da publicação da Portaria ME nº 11.266/2022, face ao princípio da anterioridade nonagesimal. Em relação ao IRPJ, incide a alíquota zero no que toca aos fatos geradores até 31/12/2023, face do princípio da anterioridade de exercício. Precedentes do TRF5. 9. Reconhecido o direito líquido e certo das impetrantes de se beneficiarem do PERSE, nos limites temporais explicitados. 10. Sobre a possibilidade de compensação dos valores recolhidos indevidamente, considerando que a parte impetrante objetiva, neste writ, a declaração do direito de compensação do indébito tributário, tem-se que tal pedido encontra amparo no decidido pelo STJ no Tema 118, facultando à administração a fiscalização e a verificação do procedimento adotado, respeitada a prescrição quinquenal (Tema 04/STF). 11. A opção pelo recebimento do indébito via precatório deve se restringir aos valores indevidamente recolhidos após o ajuizamento da ação mandamental, haja vista a vedação de produção de efeitos pretéritos imediatos nessa sede, ante os termos das Súmulas nos 269 e 271, ambas do STF. 12. Apelação parcialmente provida, para anular a sentença recorrida e, no exame do mérito, conceder em parte a segurança pleiteada, garantindo à impetrante o benefício do PERSE quanto às atividades econômicas do CNAE 56.11-2-03 (lanchonete), no período explicitado, garantida, ainda, a repetição do indébito tributário, nos termos da fundamentação supra. (TRF5, PROCESSO: 08024123320234058100, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ CARVALHO MONTEIRO, 4ª TURMA, JULGAMENTO: 14/05/2024) Os valores indevidamente recolhidos deverão ser corrigidos pela SELIC, nos termos do art. 39, § 4º da Lei nº. 9.250/95, sendo que a compensação deverá ocorrer por iniciativa do contribuinte, entre quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, observadas as ressalvas do art. 26-A, da Lei nº 11.457/07, bem o disposto no art. 74 da Lei nº 9.430/96 e da IN 1.717/2017 e somente após o trânsito em julgado da decisão, consoante determina o art. 170-A do CTN. Ante o exposto, dou provimento parcial à remessa necessária e ao recurso de apelação para, reformando a sentença, conceder parcialmente a segurança, para determinar que a autoridade coatora se abstenha de exigir inscrição regular no CADASTUR para fins de inscrição no PERSE apenas quanto ao período no período explicitado, sujeitando-se, pois à anterioridade constitucional. É como voto.
EXMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA:
Com a devida vênia, divirjo do Senhor Relator para dar provimento à apelação e à remessa oficial.
Por exigência do § 2º, do art. 2º da Lei 14.148/2021, o Ministério da Economia editou a Portaria ME nº 7.163/2021, trazendo os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE considerados do setor de eventos, definindo no Anexo I as atividades econômicas que estão enquadradas no PERSE, e no Anexo II as atividades cujo enquadramento é permitido, desde que na data da publicação da Lei nº 14.148/2021, estivessem registradas no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos - CADASTUR.
Verifica-se que a exigência de inscrição prévia no CADASTUR para usufruir dos benefícios do PERSE não se mostra desarrazoada, na medida em que as atividades descritas nos incisos do parágrafo único do art. 21 da Lei 11.771/2008 (como restaurantes e bares, por exemplo) não são, necessariamente, qualificadas como pertencentes ao setor turístico. Tanto é que a apelante não está registrada no CADASTUR, embora o cadastro já fosse obrigatório aos prestadores de serviços tipicamente turísticos e efetivamente atuantes (art. 22).
A Portaria ME 7.163/2021 não extrapola as disposições das Leis 14.148/2021 e 11.771/2008, apenas possibilita a adesão ao PERSE de pessoas jurídicas que exercem atividades que não são típicas do setor de eventos, mas podem nele atuar, para o que se exige o registro no CADASTUR.
Não se identifica, portanto, que a norma regulamentar apresente ilegalidade ou abuso a atrair a interferência do Poder Judiciário.
Em face do exposto, pedindo vênia ao Sr. Relator, dou provimento à apelação e à remessa oficial.
Autos: | APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5027171-83.2022.4.03.6100 |
Requerente: | SR. SUPERINTENDENTE REGIONAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DA 8ª REGIÃO FISCAL e outros |
Requerido: | JKFC COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA |
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS. PERSE. LEI 14.148/2021. INSCRIÇÃO PRÉVIA NO CADASTUR. EXIGÊNCIA NÃO PREVISTA EM LEI. ATIVIDADE PRINCIPAL EXCLUÍDA DA PORTARIA Nº 11.266/2022. MAJORAÇÃO INDIRETA DE TRIBUTO. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDOS.
I. CASO EM EXAME
1. Remessa necessária e recurso de apelação da União interposto contra sentença concessiva da segurança.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO.
2. A questão consiste acerca da legalidade da imposição de prévia inscrição no Cadastur, como requisito prévio para inscrição no PERSE, bem como acerca da possibilidade da manutenção do benefício após a PORTARIA Nº 11.266/2022.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A Lei n. 14.148/2021 trouxe importantes benefícios fiscais ao setor de eventos como forma de mitigar os danos causados pela pandemia da COVID19, trazendo ações emergenciais e temporárias destinadas a essa área empresarial. Tal diploma legal autorizou, por prazo limitado, a redução da alíquota dos tributos que elenca para zero.
4. Foi editada a Portaria n. 7163/2021 que incluiu as atividades exercidas pela autora como considerada prestadora de serviços turísticos, conforme art. 21 da Lei 11.771, de 17.09.2008. Referida portaria previu, ainda, que “As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148/2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.” (art. 1º, § 2º)”.
5. A imposição de prévia inscrição no Cadastur, para gozo da incidência da alíquota zero, decorreu de ato infralegal e não da lei estipuladora do benefício fiscal, tornando, assim, faculdade em condição obrigatória para a concessão da benesse.
6. Com a edição da Lei n. 14.592/2023, de 30.05.2023, lei de conversão da Medida Provisória nº 1.147/2022, passou-se a estabelecer a necessidade de prévio registro no CADASTUR como requisito prévio para inscrição no PERSE.
7. A fim de regulamentar a nova redação do caput do art. 4º da Lei nº 14.148/2021, dada pela Lei nº 14.592, de 2023), foi editada a Portaria ME nº 11.266/2022, em vigor a partir de 01/01/2023, a qual, ao definir os códigos CNAE abrangidos pela lei instituidora da benesse, não incluiu o CNAE da impetrante (56.11-2-03 - Lanchonetes, casas de chá, de sucos e similares).
8. A impetrante se qualifica como prestadora de serviço turístico, tanto é assim que é hoje registrada no CADASTUR, o que, na redação original do art. 4º, caput, da Lei nº 14.148/2022, era suficiente para se beneficiar da alíquota zero.
9. Desde a nova redação do art. 4º, caput, da Lei nº 14.148/2022, regulamentada pela Portaria ME nº 11.266/2022, somente as atividades expressamente ali elencadas podem fazer jus ao benefício, dentre as quais não se inclui a atividade econômica desenvolvida pela apelante.
10. Considerando-se que a necessidade de observância do princípio da anterioridade – arts. 150 e 195 da CF -, haja vista a majoração indireta da carga tributária pela edição da Portaria ME nº 11.266/2022, tenho que a impetrante faz jus ao enquadramento no PERSE sem que se lhe exijada a comprovação de situação regular no Cadastur, findando-se a fruição do benefício após o decurso dos prazos, contados da publicação da Portaria ME n.º 11.266/2022, da anterioridade de exercício em relação ao IRPJ e da anterioridade nonagesimal quanto às contribuições à seguridade social.
11. Necessidade de reforma da sentença, a fim de conceder, em parte, a segurança pretendida, de modo a determinar que a autoridade coatora se abstenha de exigir inscrição regular no CADASTUR para fins de inscrição no PERSE apenas quanto ao período no período explicitado, sujeitando-se, pois à anterioridade constitucional.
IV. DISPOSITIVO
12. Remessa necessária e recurso de apelação parcialmente providos.
___________
Dispositivos relevantes citados: arts. 2º e 4º, Lei n. 14.148/2021; art. 21 da Lei 11.771/2008; art. 1º, Lei n. 14.592/2023
Jurisprudência relevante citada: TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000434-82.2023.4.03.6108, Rel. Desembargador Federal RUBENS ALEXANDRE ELIAS CALIXTO, julgado em 09/05/2024, Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO e TRF5, 08024123320234058100, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ CARVALHO MONTEIRO, 4ª TURMA, JULGAMENTO: 14/05/2024.