AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022127-79.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. AUDREY GASPARINI
AGRAVANTE: F RAMOS EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES LTDA
Advogado do(a) AGRAVANTE: FERNANDO RAMOS DE CAMARGO - SP153313-N
AGRAVADO: VALNI TRANSPORTES RODOVIARIOS LTDA, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
Advogado do(a) AGRAVADO: CARLOS EDUARDO ZULZKE DE TELLA - SP156754-A
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022127-79.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. AUDREY GASPARINI AGRAVANTE: F RAMOS EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES LTDA Advogado do(a) AGRAVANTE: FERNANDO RAMOS DE CAMARGO - SP153313-N AGRAVADO: VALNI TRANSPORTES RODOVIARIOS LTDA, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL Advogado do(a) AGRAVADO: CARLOS EDUARDO ZULZKE DE TELLA - SP156754-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto por F RAMOS EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES LTDA contra decisão do MM. Juízo da 5ª Vara Federal de Campinas/SP pela qual foi indeferido pedido de “compensação do valor pago em arrematação, com o valor das peças retiradas” do veículo arrematado. Alega a parte recorrente que tem o direito de compensar os valores das peças necessárias para reparo do veículo arrematado, com o valor depositado na arrematação. Aduz que não era possível tomar medidas preventivas para reduzir seu prejuízo, pois, o bem leiloado estava em circulação até a data imediatamente anterior à remoção, o que impossibilitava a visitação. Assevera que a executada caracteriza apropriação indébita e enriquecimento ilícito por ter, supostamente, removido peças e entregue em condição diversa da descrita no edital. Sustenta que tem direito à compensação por ter recebido bem em condições inferiores à descrita no edital. O recurso foi recebido sem atribuição de efeito suspensivo (ID. 302240987). O recurso foi respondido. É o relatório
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022127-79.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. AUDREY GASPARINI AGRAVANTE: F RAMOS EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES LTDA Advogado do(a) AGRAVANTE: FERNANDO RAMOS DE CAMARGO - SP153313-N AGRAVADO: VALNI TRANSPORTES RODOVIARIOS LTDA, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL Advogado do(a) AGRAVADO: CARLOS EDUARDO ZULZKE DE TELLA - SP156754-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Versa o recurso pretensão de compensação de valores com o pagamento pela arrematação. O MM. Juízo de primeiro grau proferiu decisão nos seguintes termos: “Trata-se de petição aviada pelo arrematante F RAMOS EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES EIREL no ID313065173, na qual requer a “compensação do valor pago em arrematação, com o valor das peças retiradas” do veículo arrematado, que estima em R$ 39.550,03. Aduz, em síntese, que o veículo placas DVS8915, arrematado no leilão judicial, lhe foi entregue “sucateado” e “depenado”, malgrado, ao tempo da constatação e avaliação do bem, tenha sido verificado que se encontrava em plenas condições de uso pelo Oficial de Justiça. Assevera que arrematou o bem de boa-fé e faz jus ao desconto dos valores das peças faltantes. Vieram-me os autos conclusos para decisão. Sumariados, decido. Compulsando os autos, verifico que, ao tempo da constatação e avaliação do bem arrematado, o Senhor Oficial de Justiça avaliou o veículo placas DVS8915 em 09/03/2023 (ID278181641) em R$ 116.081,00 (cento e dezesseis mil e oitenta e um reais), o que sinaliza que se encontrava em bom estado de conservação. Ocorre que, ao ser entregue ao arrematante, em 18/12/2023, foi constatada a falta de peças pelo Senhor Oficial de Justiça, conforme certidão de ID 310508032 (1. Cardan, 2. estepe, 3. 10 pneus, 4. Cuica de Freio, 5. Motor de partida, 6. Bomba de Alta, 7. Cano da Bomba de Alta, 8. Sensor de Flauta, 9. Radiador de Água, 10. “Interculer”, 11. Turbina, 12. Tubagem de Escapamento, 13. Mangueira de “Interculer”; 14. Mangueiras do radiador de água; 15. Módulo de Injeção; 16. Chicote do módulo; 17. Bomba de direção; 18. Alternador; 19. Correia serviço; 20. Bateria; 21. Escapamento; 22. Vareta de óleo; 23 Suporte do Radiador; 24. Bicos injetores; 25. Compressor de ar). Ressai claro que a executada, na qualidade de depositária do bem, não se desincumbiu do “munus” de sua conservação, permitindo que o bem se deteriorasse ou, quiçá, ela mesmo procedeu à retirada das peças. Todavia, considerando que entre a constatação e avaliação realizada pelo Senhor Oficial de Justiça em 09/03/2023 e a realização do leilão em 16/10/2023 transcorreram 7 (sete) meses, competia ao arrematante verificar o estado em que o bem se encontrava ao tempo do leilão. Consoante dispõe o item 7.1 do Edital de Leilão (ID301791423): “7.1) Os bens serão vendidos no estado de conservação em que se encontrarem, sendo exclusiva atribuição dos arrematantes a verificação destes, não cabendo à Justiça Federal ou ao leiloeiro oficial responsável pela hasta, quaisquer responsabilidades quanto a consertos e reparos, ou mesmo providências referentes à retirada, embalagem e transporte daqueles arrematados.” Desse modo, ao arrematante cabe a verificação das condições do bem antes das datas designadas para o leilão. Tal providência ou cautela não se encontra devidamente comprovada nos autos, inclusive para se demonstrar que a depredação ocorreu entre o leilão e a entrega do bem. Ademais, o bem foi arrematado pela metade do valor da avaliação inicial (R$ 58.040,50), conforme auto de arrematação de ID304490621. Desse modo, não pode o arrematante reclamar a “compensação” do valor das peças. Vale ressaltar, no ponto, que a jurisprudência é pacífica no sentido de que, constando do edital que os bens serão arrematados no estado em que se encontram, cabe ao arrematante a verificação das condições do bem no ato do leilão, não havendo que reclamar a compensação de eventuais prejuízos se não foi cauteloso o suficiente. Nesse sentido: Veículo adquirido em leilão extrajudicial – Ação indenizatória de dano material consistente no conserto do automóvel – Vício redibitório – Sentença de improcedência – Apelo do autor – Legitimidade da leiloeira afirmada – Mérito – Improvimento – Ação improcedente – Veículo adquirido em leilão extrajudicial no estado em que se encontrava, sem garantia de funcionamento ou de conserto de peças – Edital que vincula as partes – Automóvel leiloado a preço inferior ao da média do mercado – Sentença mantida – Apelo improvido. (TJSP; Apelação Cível 1008906-03.2022.8.26.0127; Relator (a): Mário Daccache; Órgão Julgador: 29ª Câmara de Direito Privado; Foro de Carapicuíba - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 29/05/2024; Data de Registro: 29/05/2024) APELAÇÃO. Compra de veículo usado em leilão e que apresentou defeitos após a compra. Ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por perdas e danos. Sentença de improcedência. Insurgência do autor. Compra de veículo usado. Aceitação do veículo pelo comprador no estado em que se encontrava, com ciência dos riscos de eventual existência de defeitos. Falta de cautela do autor por ocasião da compra ao deixar de verificar as condições técnicas do veículo. Ausente comprovação de conduta ilícita da ré na venda do veículo. Nota de venda e termos e condições que informavam que a venda do veículo seria realizada "no estado em que a coisa se encontrava". Automóvel que foi adquirido por preço abaixo do valor de mercado. Falha no dever de informação não configurada. Sentença mantida. RECURSO IMPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1005571-70.2022.8.26.0322; Relator (a): Luis Roberto Reuter Torro; Órgão Julgador: 27ª Câmara de Direito Privado; Foro de Lins - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 22/11/2023; Data de Registro: 22/11/2023) APELAÇÃO. Ação de rescisão contratual com pedido de indenização por danos materiais e morais. Compra de veículo em leilão extrajudicial. Sentença de improcedência. Recurso apresentado pela autora. EXAME: cerceamento de defesa não caracterizado. Nota de venda e termos e condições que informavam que a venda do veículo seria realizada "no estado em que a coisa se encontrava". Automóvel que foi adquirido por preço abaixo do valor de mercado. Falha no dever de informação não configurada. Sentença mantida. RECURSO IMPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1072460-30.2021.8.26.0002; Relator (a): Celina Dietrich Trigueiros; Órgão Julgador: 27ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II - Santo Amaro - 15ª Vara Cível; Data do Julgamento: 26/09/2023; Data de Registro: 26/09/2023) Assim sendo, indefiro o pedido formulado pelo arrematante. Ciência às partes da informação de ID 327318464, a fim de que requeiram o que de direito, no prazo de 5 (cinco) dias. Intimem-se. Cumpra-se.” De rigor, a manutenção da decisão recorrida. Dispõe o parágrafo 4º do art. 903 do CPC: “Art. 903. Qualquer que seja a modalidade de leilão, assinado o auto pelo juiz, pelo arrematante e pelo leiloeiro, a arrematação será considerada perfeita, acabada e irretratável, ainda que venham a ser julgados procedentes os embargos do executado ou a ação autônoma de que trata o § 4º deste artigo, assegurada a possibilidade de reparação pelos prejuízos sofridos. § 1º Ressalvadas outras situações previstas neste Código, a arrematação poderá, no entanto, ser: I - invalidada, quando realizada por preço vil ou com outro vício; II - considerada ineficaz, se não observado o disposto no art. 804 ; III - resolvida, se não for pago o preço ou se não for prestada a caução. § 2º O juiz decidirá acerca das situações referidas no § 1º, se for provocado em até 10 (dez) dias após o aperfeiçoamento da arrematação. § 3º Passado o prazo previsto no § 2º sem que tenha havido alegação de qualquer das situações previstas no § 1º, será expedida a carta de arrematação e, conforme o caso, a ordem de entrega ou mandado de imissão na posse. § 4º Após a expedição da carta de arrematação ou da ordem de entrega, a invalidação da arrematação poderá ser pleiteada por ação autônoma, em cujo processo o arrematante figurará como litisconsorte necessário. § 5º O arrematante poderá desistir da arrematação, sendo-lhe imediatamente devolvido o depósito que tiver feito: I - se provar, nos 10 (dez) dias seguintes, a existência de ônus real ou gravame não mencionado no edital; II - se, antes de expedida a carta de arrematação ou a ordem de entrega, o executado alegar alguma das situações previstas no § 1º ; III - uma vez citado para responder a ação autônoma de que trata o § 4º deste artigo, desde que apresente a desistência no prazo de que dispõe para responder a essa ação. § 6º Considera-se ato atentatório à dignidade da justiça a suscitação infundada de vício com o objetivo de ensejar a desistência do arrematante, devendo o suscitante ser condenado, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos, ao pagamento de multa, a ser fixada pelo juiz e devida ao exequente, em montante não superior a vinte por cento do valor atualizado do bem.” A expedição da carta de arrematação ou da ordem de entrega, impede a discussão da arrematação nos próprios autos da execução, podendo ser invalidada em sede de ação autônoma, na qual a parte poderá produzir provas de suas alegações e postular seus direitos. A extensão do risco assumido pelo arrematante, a responsabilidade do depositário pela conservação do bem, a suposta apropriação indébita, o enriquecimento ilícito do executado, a responsabilidade da União pela compensação do valor dos prejuízos com o valor pago pelo arrematante, são todas questões que só podem ser discutidas por meio de ação autônoma, tanto pela competência do juízo de execuções fiscais não abrangê-las, quanto para evitar a conversão do célere procedimento de execução fiscal, em uma ação de conhecimento. Nos autos da própria ação de execução só seria permitido ao arrematante formular pedido de desistência da arrematação nas hipóteses previstas no parágrafo 5º do art. 903 do CPC. Todavia, inexiste pedido de desistência da arrematação nos autos. Ademais, o bem foi arrematado por metade do valor da avaliação, verificando-se que a diferença entre o valor da avaliação e o da arrematação é superior ao valor do alegado custo para reparar o bem. Entendendo que o pedido cabível na execução é de desfazimento, anoto o seguinte julgado: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. ARREMATAÇÃO. DESFAZIMENTO. 1 - Veículo arrematado e dado como em estado perfeito de conservação à época do edital de leilão, encontrava-se deteriorado sem motor por ocasião da entrega do bem ao arrematante. 2- Pode ser efetuado o desfazimento da arrematação quando o bem arrematado encontra-se deteriorado, como no caso em tela. 3 -Agravo de instrumento improvido. (TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 872 - 0032766-49.1989.4.03.9999, Rel. JUIZ CONVOCADO RUBENS CALIXTO, julgado em 10/09/2002, DJU DATA:10/12/2002 PÁGINA: 366)” Por estes fundamentos, nego provimento ao recurso. É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. ARREMATAÇÃO. COMPENSAÇÃO DO VALOR PAGO COM REPARO DO BEM. IMPOSSIBILIDADE.
I – Expedição da carta de arrematação ou da ordem de entrega que impede a discussão da arrematação nos próprios autos da execução, sendo imprescindível o ajuizamento de ação autônoma. CPC, art. 905.
II – Caso dos autos em que a extensão do risco assumido pelo arrematante, a responsabilidade do depositário pela conservação do bem, a suposta apropriação indébita, o enriquecimento ilícito do executado, a responsabilidade da União pela compensação do valor dos prejuízos com o valor pago pelo arrematante, são questões que só podem ser discutidas por meio de ação autônoma.
III – Recurso desprovido.