AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5020694-40.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. GISELLE FRANÇA
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
AGRAVADO: FUNDAÇÃO ANTÔNIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE
Advogados do(a) AGRAVADO: GABRIELA SILVA DE LEMOS - SP208452-A, PAULO CAMARGO TEDESCO - SP234916-A
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5020694-40.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. GISELLE FRANÇA AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL AGRAVADO: FUNDAÇÃO ANTÔNIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE Advogados do(a) AGRAVADO: GABRIELA SILVA DE LEMOS - SP208452-A, PAULO CAMARGO TEDESCO - SP234916-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Desembargadora Federal Giselle França: Trata-se de agravo de instrumento interposto contra r. decisão que, em mandado de segurança, deferiu a liminar para “afastar a exigência dos requisitos da Lei 12.101/2009, devendo o Secretário de Atenção Especializada à Saúde analisar o pedido de CEBAS da impetrante (Protocolo nº 25000.041202/2021-75) observando exclusivamente as contrapartidas previstas no Código Tributário Nacional e, enquanto não analisado, fica suspensa a exigibilidade das contribuições para a seguridade social previstas no art. 195, § 7º, da Constituição Federal, bem como das contribuições destinadas à terceiros, desde a data do protocolo do pedido”. A União, ora agravante, defende que os pedidos de certificação anteriores à LC nº. 187/2021 devem ser analisados à luz da Lei Federal nº. 12.101/09, cuja constitucionalidade foi apreciada e ratificada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI nº. 4.480. O pedido de efeito suspensivo foi deferido (ID 301181279). A agravada, FUNDAÇÃO ANTONIO PRUDENTE E FILIAIS, apresentou pedido de reconsideração (ID 302200226), recebido como agravo interno (ID 302411823), no qual defende que os requisitos para a análise do CEBAS devem observar a legislação vigente no momento da distribuição da ação de origem. Assim sendo, e considerado o entendimento do Supremo Tribunal Federal, à época, “os únicos requisitos materiais previstos em lei complementar eram os do artigo 14 do Código Tributário Nacional, cumpridos pela Agravada”. Frisa que “a autoridade coatora indeferiu a concessão do certificado tão somente com base em contrapartida prevista em legislação ordinária vigente à época do protocolo, na contramão do entendimento fixado pelo Supremo no sentido de que apenas a legislação complementar pode dispor sobre os requisitos para o gozo da imunidade”. Todavia, trata-se de exigência de cunho material prevista exclusivamente em legislação ordinária, que não pode prevalecer. Aqui, defende que “em nenhum dos citados julgados o STF atesta a constitucionalidade do dispositivo da legislação ordinária que exige prestação anual de serviços ao SUS no percentual mínimo de 60%, que foi o único utilizado para fundamentar a decisão que indeferiu o pedido de CEBAS da Agravada”. Afirma que “o Supremo assentou a constitucionalidade tão somente do art. 55, II, da Lei nº 8.212/91, que previa o requisito formal de exigência do CEBAS para fruição da imunidade pelas entidades beneficentes de assistência social (...) e tal dispositivo, por si só, não impõe a exigência de contrapartidas específicas, mas apenas exige que a entidade beneficente de assistência social seja portadora do CEBAS”. Aduz que no julgamento da ADI 4.480, “o Supremo analisou o tema da imunidade das contribuições à seguridade social, mas limitado aos requisitos previstos na legislação ordinária para entidades de educação” – hipótese diversa da agravada. E, na referida ação, o Supremo declarou inconstitucionais dispositivos da Lei Federal nº. 12.101/2009 que “dispunham sobre as contrapartidas materiais para a fruição da imunidade pelas entidades de educação, com destaque ao requisito de concessão de bolsas de estudo”. Pontua, aqui, que “o STF entendeu que tais dispositivos invadem a esfera de competência reserva à legislação complementar, inclusive na contramão do firmado pelo STJ na Súmula 612, já que o exercício da imunidade deve ter início assim que os requisitos exigidos pela lei complementar forem atendidos, dado o efeito declaratório do CEBAS”. Conclui, assim, pela irregularidade da exigência de contrapartidas como requisito para concessão de CEBAS, dado que a previsão consta, apenas, em legislação ordinária. A agravada também apresentou embargos de declaração (ID 302879971), anotando omissão na análise dos fundamentos do pedido de reconsideração, especialmente considerada a alegação de perigo na demora. Aduziu que formulou pedido subsidiário de recebimento como agravo interno, defendendo que a análise do pedido subsidiário apenas pode ocorrer posteriormente ao enfrentamento do pedido principal. Resposta ao recurso, pela agravada (ID 302884343). A agravada atravessou pedido de tutela cautelar incidental (ID 302884951), no qual requer a atribuição de efeito suspensivo aos embargos de declaração e ao agravo interno, pelas mesmas razões expostas no pedido de reconsideração. Intimada, a União apresentou resposta ao agravo interno (ID 305775486) e ao pedido de tutela incidental (ID 305775486). Defendeu que “apenas os dispositivos de lei ordinária que definem o modo de atuação das entidades de assistência social poderiam, em tese, ser considerados formalmente inconstitucionais. Por outro lado, os dispositivos que exijam obtenção de certificação para o gozo da imunidade e definam os requisitos para essa obtenção, bem como todos os outros que não ditam o modo beneficente de atuação das entidades, apresentam conformidade formal com o texto constitucional”. Anotou, ainda, que eventual declaração da inconstitucionalidade exige a observância da cláusula de reserva de plenário conforme artigo 97 da Constituição e Súmula Vinculante nº. 10. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5020694-40.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. GISELLE FRANÇA AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL AGRAVADO: FUNDAÇÃO ANTÔNIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE Advogados do(a) AGRAVADO: GABRIELA SILVA DE LEMOS - SP208452-A, PAULO CAMARGO TEDESCO - SP234916-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Desembargadora Federal Giselle França: A matéria debatida nos embargos de declaração e no pedido de tutela incidental confunde-se com o mérito do recurso e com este será analisado. Trata-se de agravo de instrumento no qual se questiona a suspensão de exigibilidade de contribuições sociais em decorrência da imunidade tributária, afastando-se a exigência contrapartidas postas na Lei Federal nº. 12.101/09. Consoante entendimento repetitivo do Superior Tribunal de Justiça, “a mera discussão judicial da dívida, sem garantia idônea ou suspensão da exigibilidade do crédito, nos termos do art. 151 do CTN, não obsta a inclusão do nome do devedor no CADIN” (1ª Seção, REsp 1137497/CE, j. 14/04/2010, DJe 27/04/2010, Rel. Min. LUIZ FUX). De fato, a suspensão da exigibilidade do crédito só ocorre nas hipóteses previstas no artigo 151 do Código Tributário Nacional, das quais se destacam o depósito integral (inciso II) e a concessão de liminar em processo judicial (incisos IV e V). Cumpre, assim, verificar a plausibilidade jurídica das alegações do contribuinte. Pois bem. A imunidade assistencial das entidades assistenciais, referida nos artigos 150, inciso VI, “c” e 195, § 7º, da Constituição, foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal em mais de uma oportunidade. Num primeiro momento, o Supremo Tribunal Federal declarou que a imunidade constitucional dependeria do cumprimento cumulativo dos requisitos postos nos artigos 9º e 14, do Código Tributário Nacional, e 55, da Lei Federal nº. 8.212/91: Ementa: TRIBUTÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. REPERCUSSÃO GERAL CONEXA. RE 566.622. IMUNIDADE AOS IMPOSTOS. ART. 150, VI, C, CF/88. IMUNIDADE ÀS CONTRIBUIÇÕES. ART. 195, § 7º, CF/88. O PIS É CONTRIBUIÇÃO PARA A SEGURIDADE SOCIAL (ART. 239 C/C ART. 195, I, CF/88). A CONCEITUAÇÃO E O REGIME JURÍDICO DA EXPRESSÃO “INSTITUIÇÕES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E EDUCAÇÃO” (ART. 150, VI, C, CF/88) APLICA-SE POR ANALOGIA À EXPRESSÃO “ENTIDADES BENEFICENTES DE ASSITÊNCIA SOCIAL” (ART. 195, § 7º, CF/88). AS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR SÃO O CONJUNTO DE PRINCÍPIOS E IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS (ART. 146, II, CF/88). A EXPRESSÃO “ISENÇÃO” UTILIZADA NO ART. 195, § 7º, CF/88, TEM O CONTEÚDO DE VERDADEIRA IMUNIDADE. O ART. 195, § 7º, CF/88, REPORTA-SE À LEI Nº 8.212/91, EM SUA REDAÇÃO ORIGINAL (MI 616/SP, Rel. Min. Nélson Jobim, Pleno, DJ 25/10/2002). O ART. 1º, DA LEI Nº 9.738/98, FOI SUSPENSO PELA CORTE SUPREMA (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000). A SUPREMA CORTE INDICIA QUE SOMENTE SE EXIGE LEI COMPLEMENTAR PARA A DEFINIÇÃO DOS SEUS LIMITES OBJETIVOS (MATERIAIS), E NÃO PARA A FIXAÇÃO DAS NORMAS DE CONSTITUIÇÃO E DE FUNCIONAMENTO DAS ENTIDADES IMUNES (ASPECTOS FORMAIS OU SUBJETIVOS), OS QUAIS PODEM SER VEICULADOS POR LEI ORDINÁRIA (ART. 55, DA LEI Nº 8.212/91). AS ENTIDADES QUE PROMOVEM A ASSISTÊNCIA SOCIAL BENEFICENTE (ART. 195, § 7º, CF/88) SOMENTE FAZEM JUS À IMUNIDADE SE PREENCHEREM CUMULATIVAMENTE OS REQUISITOS DE QUE TRATA O ART. 55, DA LEI Nº 8.212/91, NA SUA REDAÇÃO ORIGINAL, E AQUELES PREVISTOS NOS ARTIGOS 9º E 14, DO CTN. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE CONTRIBUTIVA OU APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE SOCIAL DE FORMA INVERSA (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000). INAPLICABILIDADE DO ART. 2º, II, DA LEI Nº 9.715/98, E DO ART. 13, IV, DA MP Nº 2.158-35/2001, ÀS ENTIDADES QUE PREENCHEM OS REQUISITOS DO ART. 55 DA LEI Nº 8.212/91, E LEGISLAÇÃO SUPERVENIENTE, A QUAL NÃO DECORRE DO VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE DESTES DISPOSITIVOS LEGAIS, MAS DA IMUNIDADE EM RELAÇÃO À CONTRIBUIÇÃO AO PIS COMO TÉCNICA DE INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO. EX POSITIS, CONHEÇO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, MAS NEGO-LHE PROVIMENTO CONFERINDO EFICÁCIA ERGA OMNES E EX TUNC. 1. A imunidade aos impostos concedida às instituições de educação e de assistência social, em dispositivo comum, exsurgiu na CF/46, verbis: Art. 31, V, “b”: À União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios é vedado (...) lançar imposto sobre (...) templos de qualquer culto, bens e serviços de partidos políticos, instituições de educação e de assistência social, desde que as suas rendas sejam aplicadas integralmente no país para os respectivos fins. 2. As CF/67 e CF/69 (Emenda Constitucional nº 1/69) reiteraram a imunidade no disposto no art. 19, III, “c”, verbis: É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (...) instituir imposto sobre (...) o patrimônio, a renda ou os serviços dos partidos políticos e de instituições de educação ou de assistência social, observados os requisitos da lei. 3. A CF/88 traçou arquétipo com contornos ainda mais claros, verbis: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI. instituir impostos sobre: (...) c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;(...) § 4º. As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas; Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (...) § 7º. São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei. 4. O art. 195, § 7º, CF/88, ainda que não inserido no capítulo do Sistema Tributário Nacional, mas explicitamente incluído topograficamente na temática da seguridade social, trata, inequivocamente, de matéria tributária. Porquanto ubi eadem ratio ibi idem jus, podendo estender-se às instituições de assistência stricto sensu, de educação, de saúde e de previdência social, máxime na medida em que restou superada a tese de que este artigo só se aplica às entidades que tenham por objetivo tão somente as disposições do art. 203 da CF/88 (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000). 5. A seguridade social prevista no art. 194, CF/88, compreende a previdência, a saúde e a assistência social, destacando-se que as duas últimas não estão vinculadas a qualquer tipo de contraprestação por parte dos seus usuários, a teor dos artigos 196 e 203, ambos da CF/88. Característica esta que distingue a previdência social das demais subespécies da seguridade social, consoante a jurisprudência desta Suprema Corte no sentido de que seu caráter é contributivo e de filiação obrigatória, com espeque no art. 201, todos da CF/88. 6. O PIS, espécie tributária singular contemplada no art. 239, CF/88, não se subtrai da concomitante pertinência ao “gênero” (plural) do inciso I, art. 195, CF/88, verbis: Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) b) a receita ou o faturamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) c) o lucro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) III - sobre a receita de concursos de prognósticos. IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003). 7. O Sistema Tributário Nacional, encartado em capítulo próprio da Carta Federal, encampa a expressão “instituições de assistência social e educação” prescrita no art. 150, VI, “c”, cuja conceituação e regime jurídico aplica-se, por analogia, à expressão “entidades beneficentes de assistência social” contida no art. 195, § 7º, à luz da interpretação histórica dos textos das CF/46, CF/67 e CF/69, e das premissas fixadas no verbete da Súmula n° 730. É que até o advento da CF/88 ainda não havia sido cunhado o conceito de “seguridade social”, nos termos em que definidos pelo art. 203, inexistindo distinção clara entre previdência, assistência social e saúde, a partir dos critérios de generalidade e gratuidade. 8. As limitações constitucionais ao poder de tributar são o conjunto de princípios e demais regras disciplinadoras da definição e do exercício da competência tributária, bem como das imunidades. O art. 146, II, da CF/88, regula as limitações constitucionais ao poder de tributar reservadas à lei complementar, até então carente de formal edição. 9. A isenção prevista na Constituição Federal (art. 195, § 7º) tem o conteúdo de regra de supressão de competência tributária, encerrando verdadeira imunidade. As imunidades têm o teor de cláusulas pétreas, expressões de direitos fundamentais, na forma do art. 60, § 4º, da CF/88, tornando controversa a possibilidade de sua regulamentação através do poder constituinte derivado e/ou ainda mais, pelo legislador ordinário. 10. A expressão “isenção” equivocadamente utilizada pelo legislador constituinte decorre de circunstância histórica. O primeiro diploma legislativo a tratar da matéria foi a Lei nº 3.577/59, que isentou a taxa de contribuição de previdência dos Institutos e Caixas de Aposentadoria e Pensões às entidades de fins filantrópicos reconhecidas de utilidade pública, cujos membros de sua diretoria não percebessem remuneração. Destarte, como a imunidade às contribuições sociais somente foi inserida pelo § 7º, do art. 195, CF/88, a transposição acrítica do seu conteúdo, com o viés do legislador ordinário de isenção, gerou a controvérsia, hodiernamente superada pela jurisprudência da Suprema Corte no sentido de se tratar de imunidade. 11. A imunidade, sob a égide da CF/88, recebeu regulamentação específica em diversas leis ordinárias, a saber: Lei nº 9.532/97 (regulamentando a imunidade do art. 150, VI, “c”, referente aos impostos); Leis nº 8.212/91, nº 9.732/98 e nº 12.101/09 (regulamentando a imunidade do art. 195, § 7º, referente às contribuições), cujo exato sentido vem sendo delineado pelo Supremo Tribunal Federal. 12. A lei a que se reporta o dispositivo constitucional contido no § 7º, do art. 195, CF/88, segundo o Supremo Tribunal Federal, é a Lei nº 8.212/91 (MI 616/SP, Rel. Min. Nélson Jobim, Pleno, DJ 25/10/2002). 13. A imunidade frente às contribuições para a seguridade social, prevista no § 7º, do art. 195, CF/88, está regulamentada pelo art. 55, da Lei nº 8.212/91, em sua redação original, uma vez que as mudanças pretendidas pelo art. 1º, da Lei nº 9.738/98, a este artigo foram suspensas (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000). 14. A imunidade tributária e seus requisitos de legitimação, os quais poderiam restringir o seu alcance, estavam estabelecidos no art. 14, do CTN, e foram recepcionados pelo novo texto constitucional de 1988. Por isso que razoável se permitisse que outras declarações relacionadas com os aspectos intrínsecos das instituições imunes viessem regulados por lei ordinária, tanto mais que o direito tributário utiliza-se dos conceitos e categorias elaborados pelo ordenamento jurídico privado, expresso pela legislação infraconstitucional. 15. A Suprema Corte, guardiã da Constituição Federal, indicia que somente se exige lei complementar para a definição dos seus limites objetivos (materiais), e não para a fixação das normas de constituição e de funcionamento das entidades imunes (aspectos formais ou subjetivos), os quais podem ser veiculados por lei ordinária, como sois ocorrer com o art. 55, da Lei nº 8.212/91, que pode estabelecer requisitos formais para o gozo da imunidade sem caracterizar ofensa ao art. 146, II, da Constituição Federal, ex vi dos incisos I e II, verbis: Art. 55. Fica isenta das contribuições de que tratam os arts. 22 e 23 desta Lei a entidade beneficente de assistência social que atenda aos seguintes requisitos cumulativamente: (Revogado pela Lei nº 12.101, de 2009) I - seja reconhecida como de utilidade pública federal e estadual ou do Distrito Federal ou municipal; (Revogado pela Lei nº 12.101, de 2009); II - seja portadora do Certificado e do Registro de Entidade de Fins Filantrópicos, fornecido pelo Conselho Nacional de Assistência Social, renovado a cada três anos; (Redação dada pela Lei nº 9.429, de 26.12.1996).... 16. Os limites objetivos ou materiais e a definição quanto aos aspectos subjetivos ou formais atende aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, não implicando significativa restrição do alcance do dispositivo interpretado, ou seja, o conceito de imunidade, e de redução das garantias dos contribuintes. 17. As entidades que promovem a assistência social beneficente, inclusive educacional ou de saúde, somente fazem jus à concessão do benefício imunizante se preencherem cumulativamente os requisitos de que trata o art. 55, da Lei nº 8.212/91, na sua redação original, e aqueles prescritos nos artigos 9º e 14, do CTN. 18. Instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos são entidades privadas criadas com o propósito de servir à coletividade, colaborando com o Estado nessas áreas cuja atuação do Poder Público é deficiente. Consectariamente, et pour cause, a constituição determina que elas sejam desoneradas de alguns tributos, em especial, os impostos e as contribuições. 19. A ratio da supressão da competência tributária funda-se na ausência de capacidade contributiva ou na aplicação do princípio da solidariedade de forma inversa, vale dizer: a ausência de tributação das contribuições sociais decorre da colaboração que estas entidades prestam ao Estado. 20. A Suprema Corte já decidiu que o artigo 195, § 7º, da Carta Magna, com relação às exigências a que devem atender as entidades beneficentes de assistência social para gozarem da imunidade aí prevista, determina apenas a existência de lei que as regule; o que implica dizer que a Carta Magna alude genericamente à “lei” para estabelecer princípio de reserva legal, expressão que compreende tanto a legislação ordinária, quanto a legislação complementar (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000). 21. É questão prejudicial, pendente na Suprema Corte, a decisão definitiva de controvérsias acerca do conceito de entidade de assistência social para o fim da declaração da imunidade discutida, como as relativas à exigência ou não da gratuidade dos serviços prestados ou à compreensão ou não das instituições beneficentes de clientelas restritas. 22. In casu, descabe negar esse direito a pretexto de ausência de regulamentação legal, mormente em face do acórdão recorrido que concluiu pelo cumprimento dos requisitos por parte da recorrida à luz do art. 55, da Lei nº 8.212/91, condicionado ao seu enquadramento no conceito de assistência social delimitado pelo STF, mercê de suposta alegação de que as prescrições dos artigos 9º e 14 do Código Tributário Nacional não regulamentam o § 7º, do art. 195, CF/88. 23. É insindicável na Suprema Corte o atendimento dos requisitos estabelecidos em lei (art. 55, da Lei nº 8.212/91), uma vez que, para tanto, seria necessária a análise de legislação infraconstitucional, situação em que a afronta à Constituição seria apenas indireta, ou, ainda, o revolvimento de provas, atraindo a aplicação do verbete da Súmula nº 279. Precedente. AI 409.981-AgR/RS, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 13/08/2004. 24. A pessoa jurídica para fazer jus à imunidade do § 7º, do art. 195, CF/88, com relação às contribuições sociais, deve atender aos requisitos previstos nos artigos 9º e 14, do CTN, bem como no art. 55, da Lei nº 8.212/91, alterada pelas Lei nº 9.732/98 e Lei nº 12.101/2009, nos pontos onde não tiveram sua vigência suspensa liminarmente pelo STF nos autos da ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000. 25. As entidades beneficentes de assistência social, como consequência, não se submetem ao regime tributário disposto no art. 2º, II, da Lei nº 9.715/98, e no art. 13, IV, da MP nº 2.158-35/2001, aplicáveis somente àquelas outras entidades (instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos) que não preenchem os requisitos do art. 55 da Lei nº 8.212/91, ou da legislação superveniente sobre a matéria, posto não abarcadas pela imunidade constitucional. 26. A inaplicabilidade do art. 2º, II, da Lei nº 9.715/98, e do art. 13, IV, da MP nº 2.158-35/2001, às entidades que preenchem os requisitos do art. 55 da Lei nº 8.212/91, e legislação superveniente, não decorre do vício da inconstitucionalidade desses dispositivos legais, mas da imunidade em relação à contribuição ao PIS como técnica de interpretação conforme à Constituição. 27. Ex positis, conheço do recurso extraordinário, mas nego-lhe provimento conferindo à tese assentada repercussão geral e eficácia erga omnes e ex tunc. Precedentes. RE 93.770/RJ, Rel. Min. Soares Muñoz, 1ª Turma, DJ 03/04/1981. RE 428.815-AgR/AM, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 24/06/2005. ADI 1.802-MC/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, DJ 13-02-2004. ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000. (STF, Tribunal Pleno, RE 636941, j. 13/02/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-067 DIVULG 03-04-2014 PUBLIC 04-04-2014, Rel. Min. LUIZ FUX). Após, em análise realizada sob o regime de repercussão geral (Tema nº. 32), o Supremo definiu que apenas a lei complementar poderia estabelecer limites para a aplicação da imunidade tributária: IMUNIDADE – DISCIPLINA – LEI COMPLEMENTAR. Ante a Constituição Federal, que a todos indistintamente submete, a regência de imunidade faz-se mediante lei complementar. (Tema 32 – STF, Tribunal Pleno, RE 566622, j. 23/02/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-186 DIVULG 22-08-2017 PUBLIC 23-08-2017, Rel. Min. MARCO AURÉLIO). Porém, o entendimento foi reformulado por ocasião do julgamento dos embargos de declaração, tendo então sido declarada a constitucionalidade da legislação ordinária regulamentar apenas no que diz respeito à certificação, fiscalização e controle administrativo. Veja-se: E M E N T A EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO SOB O RITO DA REPERCUSSÃO GERAL. TEMA Nº 32. EXAME CONJUNTO COM AS ADI’S 2.028, 2.036, 2.228 E 2.621. ENTIDADES BENEFICENTES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMUNIDADE. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. ARTS. 146, II, E 195, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. CARACTERIZAÇÃO DA IMUNIDADE RESERVADA À LEI COMPLEMENTAR. ASPECTOS PROCEDIMENTAIS DISPONÍVEIS À LEI ORDINÁRIA. OMISSÃO. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 55, II, DA LEI Nº 8.212/1991. ACOLHIMENTO PARCIAL. 1. Aspectos procedimentais referentes à certificação, fiscalização e controle administrativo são passíveis de definição em lei ordinária, somente exigível a lei complementar para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas no art. 195, § 7º, da Lei Maior, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas. 2. É constitucional o art. 55, II, da Lei nº 8.212/1991, na redação original e nas redações que lhe foram dadas pelo art. 5º da Lei 9.429/1996 e pelo art. 3º da Medida Provisória nº 2.187-13/2001. 3. Reformulada a tese relativa ao tema nº 32 da repercussão geral, nos seguintes termos: “A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas.” 4. Embargos de declaração acolhidos em parte, com efeito modificativo. (Tema 32 – STF, Tribunal Pleno, RE 566622 ED, j. 18-12-2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-114 DIVULG 08-05-2020 PUBLIC 11-05-2020, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Rel. p/Acórdão Min. ROSA WEBER). E foi nesse sentido que a Corte Constitucional analisou a constitucionalidade da Lei Federal nº. 12.101/09 na ADI nº. 4.480, na qual se questionou exclusivamente a constitucionalidade das contrapartidas exigidas com relação às entidades beneficentes no campo da educação. Veja-se: Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Direito Tributário. 3. Artigos 1º; 13, parágrafos e incisos; 14, §§ 1º e 2º; 18, §§ 1º, 2º e 3º; 29 e seus incisos; 30; 31 e 32, § 1º, da Lei 12.101/2009, com a nova redação dada pela Lei 12.868/2013, que dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de assistência social e regula os procedimentos de isenção de contribuições para a seguridade social. 4. Revogação do § 2º do art. 13 por legislação superveniente. Perda de objeto. 5. Regulamentação do § 7º do artigo 195 da Constituição Federal. 6. Entidades beneficentes de assistência social. Modo de atuação. Necessidade de lei complementar. Aspectos meramente procedimentais. Regramento por lei ordinária. 7. Precedentes. ADIs 2.028, 2.036, 2.621 e 2.228, bem como o RE-RG 566.622 (tema 32 da repercussão geral). 8. Ação direta de inconstitucionalidade parcialmente conhecida e, nessa parte, julgada parcialmente procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 13, III, § 1º, I e II, § 3º, § 4º, I e II, e §§ 5º, 6º e 7º; art. 14, §§ 1º e 2º; art. 18, caput; art. 31; e art. 32, § 1º, da Lei 12.101/2009, com a nova redação dada pela Lei 12.868/2013. (STF, Tribunal Pleno, ADI 4480, j. 27-03-2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 14-04-2020 PUBLIC 15-04-2020, Rel. Min. GILMAR MENDES). Importante consignar, neste ponto, que fora ajuizada ADI para questionamento específico das contrapartidas exigidas pela Lei Federal nº. 12.101/09 no que diz respeito às entidades na área da saúde: ADI nº. 4.891, que fora pautada conjuntamente com a ADI nº. 4.480, porém foi retirada de pauta e, a final, julgada prejudicada pelo Relator, Min. Gilmar Mendes. Essa peculiaridade possui relevância porque, à ausência de manifestação quanto à inconstitucionalidade das contrapartidas legais específicas para entidades beneficentes na área da saúde, surge o questionamento acerca da legislação aplicável. Para além disso, também é necessário destacar que a Lei Federal nº. 12.101/09 foi revogada pela LC nº. 187, de 16/12/2021 (artigo 47, inciso II), sendo que a novel legislação complementar especificou as contrapartidas necessárias para gozo da imunidade. Assim, com relação a requerimentos formulados a partir da vigência da LC nº. 187/21, já não há discussão acerca da constitucionalidade formal das contrapartidas, devendo ser cumpridas, de forma estrita, as exigências da legislação complementar. Nada obstante, remanesce discussão de direito intertemporal, no que diz respeito a requerimentos formulados antes do início da vigência da LC nº. 187/21. É o caso dos autos, na medida que a impetrante requereu Certificado de Entidade Beneficente em março/2021, com validade por 3 anos. Inclusive, na petição inicial do “mandamus”, distribuída em 23/01/2024, a impetrante/agravante teceu considerações acerca da demora na análise do pedido administrativo. A autoridade coatora, nas informações (ID 319851508 na origem), noticiou o indeferimento do CEBAS conforme Portaria nº. 1.520/SAES/MS de 01/03/2024, a qual tem por motivação o Parecer Técnico nº. 54/2024-CGCER/DCEBAS/SAES/MS, no qual o indeferimento administrativo está fundamentado no descumprimento das contrapartidas postas no artigo 4º, incisos I a III, da Lei Federal nº. 12.101/09, bem como no artigo 3º do Decreto nº. 8.242/14 (fls. 13, ID 319851509 na origem), verbis: “BLOCO - CONCLUSAO 1. A entidade FUNDACAO ANTONIO PRUDENTE, inscrita no CNPJ n°.60.961.968/0001-06, com sede no municipio de SAO PAULO/SP, não atendeu cumulativamente os requisitos legais contidos na Lei n. 12.101/2009 e seus regulamentos. Diante do exposto, recomenda-se 0 INDEFERIMENTO do REQUERIMENTO DE CONCESSAO do CEBAS, com os seguintes fundamentos: » RELATORIO DE ATIVIDADES - NAO CUMPRE O DISPOSTO NO INCISO IV DO ART. 169 DA PORTARIA DE CONSOLIDACAO GM/MS N° 1, DE 2017, C/C O INCISO IV DO ART. 3° DO DECRETO N° 8.242, DE 2014. » OFERTA DE PRESTACAO DE SERVICOS AOS SUS - NAO CUMPRE O DISPOSTO NO INCISO II DO ART. 4° DA LEI N° 12.101, DE 2009, C/C O INCISO II DO ART. 19 DO DECRETO N° 8.242, DE 2014, C/C O INCISO X DO ART. 169 DA PORTARIA DE CONSOLIDACAO GM/MS N° 1, DE 2017. > COPIA DA PROPOSTA DE OFERTA DA PRESTACAO DE SERVICOS AO SUS NO PERCENTUAL MINIMO DE 60% (SESSENTA POR CENTO), EFETUADA PELO RESPONSAVEL LEGAL DA ENTIDADE AO GESTOR LOCAL DO SUS, PROTOCOLADA JUNTO A SECRETARIA DE SAUDE RESPECTIVA: (NAO) » CONTRATO, CONVENIO, INSTRUMENTO CONGENERE OU TERMO DE PACTUACAO - NAO CUMPRE O DISPOSTO NO INCISO I DO ART. 4° DA LEI N° 12.101, DE 2009, C/C O INCISO III DO ART. 19 DO DECRETO N° 8.242, DE 2014, C/C O INCISO XI DO ART. 169 DA PORTARIA DE CONSOLIDACAO GM/MS N° 1, DE 2017. » DA PRESTACAO DE SERVICOS AO SUS - NAO CUMPRE O DISPOSTO NO INCISO III DO ART. 4° DA LEI N° 12.101, DE 2009. > A ENTIDADE COMPROVA A PRESTACAO ANUAL DE SERVICOS AO SUS NO PERCENTUAL MINIMO DE SESSENTA POR CENTO, POR MEIO DOS REGISTROS DAS INTERNACOES HOSPITALARES, MEDIDOS POR PACIENTE DIA E ATENDIMENTOS AMBULATORIAIS, MEDIDOS POR ATENDIMENTO/PROCEDIMENTOS, VERIFICADOS NOS SISTEMAS DE INFORMACOES DO MINISTERIO DA SAUDE.: (NAO)”. Portanto, no caso em análise, o requerimento deve ser analisado à luz da Lei Federal nº. 12.101/09 naquilo que não conflitar com a jurisprudência vinculante. Diante da existência da tese vinculante (tema nº. 32-STF), é imperativa a sua aplicação aos casos em andamento nos estritos termos do artigo 1.040 do Código de Processo Civil. E, uma vez que se trata de aplicação de entendimento da Corte Constitucional, fica dispensada a observância da cláusula de reserva de plenário nos estritos termos do artigo 949, parágrafo único, do Código de Processo Civil, verbis: Art. 949. (...) Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão especial a arguição de inconstitucionalidade quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão. Cito, nesse sentido, precedentes do Supremo Tribunal Federal: Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. INTERPOSIÇÃO EM 11.10.2023. MANDADO DE SEGURANÇA. DEFINIÇÕES DAS ATRIBUIÇÕES DE CARGO PÚBLICO DO GRUPO OCUPACIONAL DA POLÍCIA CIVIL. DECRETO ESTADUAL REGULAMENTAR. ART. 6º DA LEI COMPLEMENTAR 137/2008. DECRETOS 39.921/2013 E 44.469/2017. SÚMULAS 279 E 280. ALEGADA VIOLAÇÃO À SÚMULA VINCULANTE 10 E À CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. IMPROCEDÊNCIA. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO APELO EXTREMO. SÚMULA 284 DO STF. 1. O acórdão recorrido, ao decidir a causa, realizou interpretação da legislação infraconstitucional local (LCE 137/2008 e Decretos 39.921/2013 e 44.469/2017), além de se apoiar nos fatos e provas dos autos (Súmulas 279 e 280 do STF), sem que houvesse qualquer declaração de sua incompatibilidade com a Constituição Federal. 2. No entanto, faz-se necessário acrescentar ao fundamento da decisão agravada, no que tange à alegada ofensa à Súmula Vinculante 10 e ao art. 97 da Constituição Federal, que incide, no caso, o óbice da Súmula 284 do STF, uma vez que o acórdão recorrido foi proferido pelo próprio Órgão Especial do TJ/PE, enquanto nas razões do apelo extremo, a Recorrente ressalta que, ao afastar o art. 6º da LCE 137/2008, não poderia o Tribunal de origem decidir a questão no seu órgão fracionário. 3. Além disso, ainda que assim não fosse, não há que se falar em ofensa à cláusula de reserva do plenário, pois a Corte a quo decidiu a questão dos autos com fundamento em precedente do Plenário desta Corte (MS 26.955, de relatoria da Min. Cármen Lúcia). 4. Agravo regimental a que se nega provimento. Sem honorários, por se tratar de mandado de segurança (Súmula 512/STF e art. 25 da Lei 12.016/2009). (STF, 2ª Turma, ARE 1452473 AgR, j. 29-04-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 07-05-2024 PUBLIC 08-05-2024, Rel. Min. EDSON FACHIN). EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. EMBARGOS RECEBIDOS COMO AGRAVO INTERNO. ARTIGO 1.024, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DECISÃO PROFERIDA PELO RELATOR. SÚMULA VINCULANTE 10. INAPLICABILIDADE. VIOLAÇÃO À CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. INOCORRÊNCIA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 914.045. TEMA 856 DA REPERCUSSÃO GERAL. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 949, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LEI 4.659/2019 DO ESTADO DE RONDÔNIA. EMPRESAS DE ENERGIA ELÉTRICA. TROCA DE MEDIDORES. OBRIGAÇÃO DE PRÉVIA NOTIFICAÇÃO AO CONSUMIDOR. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. ARTIGO 22, INCISO IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE ENERGIA. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.703 E 5.610. RESOLUÇÕES 414/2010 E 1.000/2021 DA ANEEL. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (STF, Tribunal Pleno, ARE 1464398 ED, j. 29-04-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 17-05-2024 PUBLIC 20-05-2024, Rel. Min. LUIZ FUX). Há, portanto, plausibilidade jurídica nas arguições, a justificar a manutenção da r. decisão agravada com fundamento na jurisprudência vinculante (Tema nº. 32-STF). Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento da União. Julgo prejudicados os embargos de declaração e o agravo interno do contribuinte. É o voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - TRIBUTÁRIO - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DE ENTIDADES BENEFICENTES - ÁREA DA SAÚDE - CONTRAPARTIDAS POSTAS NA LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA - INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM JULGAMENTO VINCULANTE.
1- A matéria debatida nos embargos de declaração e no pedido de tutela incidental confunde-se com o mérito do recurso e com este será analisado.
2- A imunidade assistencial das entidades assistenciais, referida nos artigos 150, inciso VI, “c” e 195, § 7º, da Constituição, foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal em mais de uma oportunidade. No Tema nº. 32-STF, após julgamento de embargos de declaração, a tese vinculante foi assim explicitada pela Corte Constitucional: “A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas”.
3- A partir da orientação vinculante (Tema nº. 32), o Supremo Tribunal Federal declarou na ADI 4480 a regularidade da exigência de certificado e de registro de entidade filantrópica por parte das entidades de assistência social na área da educação, nos termos das Leis Federais nº. 8.212/91 e 12.101/09. De outra parte, com relação às entidades de assistência social na área da educação, declarou a inconstitucionalidade da exigência da oferta de número certo de bolsa de estudos (artigo 13, inciso III e §§ da Lei Federal nº. 12.101/09), por se tratar da forma de atuação da entidade beneficente, para a qual se aplica a exigência de reserva de lei complementar conforme Tema nº. 32. Importante consignar, neste ponto, que fora ajuizada ADI para questionamento específico das contrapartidas exigidas pela Lei Federal nº. 12.101/09 no que diz respeito às entidades na área da saúde: ADI nº. 4.891, que fora pautada conjuntamente com a ADI nº. 4.480, porém foi retirada de pauta e, a final, julgada prejudicada pelo Relator, Min. Gilmar Mendes.
4- Para além disso, também é necessário destacar que a Lei Federal nº. 12.101/09 foi revogada pela LC nº. 187, de 16/12/2021 (artigo 47, inciso II), sendo que a novel legislação complementar especificou as contrapartidas necessárias para gozo da imunidade. Assim, com relação a requerimentos formulados a partir da vigência da LC nº. 187/21, já não há discussão acerca da constitucionalidade formal das contrapartidas, devendo ser cumpridas, de forma estrita, as exigências da legislação complementar. Nada obstante, remanesce discussão de direito intertemporal, no que diz respeito a requerimentos formulados antes do início da vigência da LC nº. 187/21.
5- No caso concreto, a discussão diz com requerimento formulado por entidade beneficente atuante na área da saúde antes do início da vigência da LC nº. 187/21.
6- Diante da existência da tese vinculante, é imperativa a sua aplicação aos casos em andamento nos estritos termos do artigo 1.040 do Código de Processo Civil. E, uma vez que se trata de aplicação de entendimento da Corte Constitucional, fica dispensada a observância da cláusula de reserva de plenário nos estritos termos do artigo 949, parágrafo único, do Código de Processo Civil.
7- Agravo de instrumento da União desprovido. Embargos de declaração e o agravo interno do contribuinte prejudicados.