APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004109-20.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: ANTONIO LAERCIO GUERRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: THAMMY CRISTINE BERTI DE ASSIS - MS19242-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANTONIO LAERCIO GUERRA
Advogado do(a) APELADO: THAMMY CRISTINE BERTI DE ASSIS - MS19242-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004109-20.2023.4.03.9999 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: ANTONIO LAERCIO GUERRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: THAMMY CRISTINE BERTI DE ASSIS - MS19242-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANTONIO LAERCIO GUERRA Advogado do(a) APELADO: THAMMY CRISTINE BERTI DE ASSIS - MS19242-A R E L A T Ó R I O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Antônio Laércio Guerra ajuizou a presente ação em face de Instituto Nacional do Seguro Social INSS, objetivando o restabelecimento de benefício previdenciário - Aposentadoria por idade rural alegando que lhe foi concedido administrativamente, em 19/11/2012 (NB n. 155.148.342-1), sendo posteriormente suspenso (em 30/09/2016) sob a alegação de irregularidades na sua concessão diante da não comprovação da imediatidade do exercício de atividade rural . Pediu o restabelecimento do benefício de aposentadoria por idade, com declaração de inexistência de débitos e indenização por danos morais e materiais. Processado o feito, sobreveio a r. sentença de fl. 3704/3717 que julgou parcialmente procedente, para declarar irrepetíveis os valores recebidos, verbis: “Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos da inicial a fim de declarar irrepetíveis os valores recebidos por Antônio Laércio Guerra em decorrência de aposentadoria rural por idade no período entre novembro de 2012 e outubro de 2016. Extingo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487,I, do CPC. Ante a sucumbência recíproca entre as partes, condeno a parte autora ao pagamento de 75% das custas processuais, cuja exigibilidade está suspensa (art. 98,§3º, do CPC). Condeno a parte ré ao pagamento de 25% das custas processuais, isenta na forma do art. nos termos do artigo 24, § 1º, da Lei n.º 3.779/09 (Regimento de Custas Judiciais do Estado de Mato Grosso do Sul). Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatício no importe de 10% sobre o proveito econômico obtido1 (art. 85,§3º, I, do CPC). Suspensa a exigibilidade na forma do art. 98, §3º do CPC. Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% sobre o proveito econômico obtido2 (art. 85,§3º,I, do CPC). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Tratando-se de matéria previdenciária, deixo de aplicar a súmula 490 do STJ, ante o decidido no Resp nº 1.735.097/ RS. Havendo interposição de recurso de apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazoar no prazo legal e, após, com ou sem resposta, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Transitada em julgado e não havendo mais requerimentos, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe” Inconformadas, as partes apelaram. O autor , em suas razões, pugna pela reforma parcial da sentença com o restabelecimento do benefício de aposentadoria por idade rural de NB 155.148.342-1, em apertada síntese, ao argumento de que foram satisfeitos os requisitos legais necessários à sua concessão, restando comprova a atividade rural em regime de economia familiar por ele exercida, bem como o pagamento das parcelas vencidas, a contar da data da cessação em 30/09/2016, além das vincendas, monetariamente corrigidas desde o respectivo vencimento e acrescidas de juros legais e moratórios, incidentes até a data do efetivo pagamento do benefício cassado, condenando-se também o apelado ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por dano moral à parte autora em decorrência da cassação indevida do seu benefício. O INSS, em suas razões, pede a reforma parcial da sentença ao argumento de que o ordenamento jurídico prevê a restituição do valor recebido indevidamente, independentemente de má-fé. Sustenta a necessidade, legalidade e constitucionalidade da cobrança dos valores indevidamente pagos pelo INSS a título de benefício previdenciário, independente de demonstração de má-fé da parte contrária e a necessidade, mesmo tendo recebido de boa-fé, do ressarcimento , sob pena de enriquecimento ilícito. Por fim, prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais. Processado o feito, os autos vieram a esta Eg. Corte Regional. É O RELATÓRIO. Obs: Todas as folhas mencionadas referem-se ao processo extraído em PDF pela ordem crescente de páginas.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004109-20.2023.4.03.9999 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: ANTONIO LAERCIO GUERRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: THAMMY CRISTINE BERTI DE ASSIS - MS19242-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANTONIO LAERCIO GUERRA Advogado do(a) APELADO: THAMMY CRISTINE BERTI DE ASSIS - MS19242-A V O T O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo as apelações interpostas sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil. Segundo a inicial, Antônio Laércio Guerra teve aposentadoria por idade deferida em 19/11/2012 e, após a deflagração da Operação Lavoro, seu benefício previdenciário foi cassado por suspeita de irregularidade em 01/10/ 2016, razão pela qual, vem sendo cobrado quanto aos valores correspondentes aos salários de benefício previdenciário já percebidos Diante disso, o autor ajuizou a presente demanda objetivando o restabelecimento de benefício previdenciário com declaração de inexistência de débito e indenização por danos morais e materiais sob o argumento de que preenche os requisitos legais para tanto e que a suspensão foi indevida. Processado o feito, sobreveio a sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para declarar irrepetíveis os valores recebidos por Antônio Laércio Guerra em decorrência de aposentadoria rural por idade no período de novembro de 2012 a outubro de 2016 e extinguiu o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487,I, do CPC. Inconformadas, ambas as partes apelaram. Por questão de método, ingresso na análise conjunta dos recursos. A aposentadoria por idade rural está prevista no artigo 48, §§1º e 2º da Lei nº 8.213/91, verbis: "Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. § 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. § 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei." Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão. Em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício. Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais. Para a aposentadoria de trabalhadores e trabalhadoras rurais, estão mantidos o tempo de contribuição de 15 anos e as idades mínimas de aposentadoria de 55 anos para as mulheres e de 60 anos para os homens, após a EC 103/2019. A carência a ser cumprida deve levar em consideração a data em que foi implementado o requisito etário para a obtenção do benefício e não a data em que a pessoa formula o requerimento de aposentadoria por idade junto ao Instituto Nacional do Seguro Social. Portanto, caso cumprido o requisito etário, mas não a carência, o aferimento desta, relativamente à aposentadoria por idade, será realizado quando do implemento da idade esperada, ainda que, naquele momento a pessoa não tivesse completado a carência necessária. Anoto, ainda, que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou firmada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva. Sobre a questão, o CJF erigiu a Súmula 54, que porta o seguinte enunciado “para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural, o tempo de exercício de atividade equivalente à carência deve ser aferido no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima”. Assim, ao trabalhador rural exige-se a qualidade de segurado no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou implemento de idade, ressalvada a hipótese do direito adquirido, devendo essa exigência ser comprovada por meio de prova material e testemunhal, ou de recolhimentos vertidos ao INSS. COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ. Ademais, diante das precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal. Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013). Importante dizer que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva. CASO CONCRETO A idade mínima exigida para obtenção do benefício restou comprovada, tendo a parte autora nascido em 13/06/1952 e implementado o requisito etário em 13/06/2012. Logo, a parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior a 2012, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), ou seja, de 1997 a 2012. Cumpre, pois, perquirir se o autor faz jus, ou não ao benefício de aposentadoria por idade rural. Colho dos autos que o benefício de aposentadoria por idade rural do autor foi concedido em 19/11/2012 e foi cassado em 01/10/2016 (fl. 750) pela Auditoria do INSS em virtude de irregularidades na sua concessão, verificadas a partir da deflagração da Operação Lavoro, em que restou demonstrado que boa parte dessa espécie de benefício deferido pela Agência do INSS em Naviraí/MS, a partir do segundo semestre de 2008 “foi concedida indevidamente, seja por que os pedidos estavam instruídos com documentos falsos, seja por conveniência do Órgão Previdenciário”. Consta do Relatório individual emitido pela COORDENAÇÃO DE MONITORAMENTO OPERACIONAL DE BENEFÍCIOS (fl. 764/772) que o benefício do autor foi suspenso sob os seguintes fundamentos: "4.1 Da irregularidade: pelas peças que compõem o processo, principalmente na fase de apuração, concluímos que a concessão da aposentadoria por idade de trabalhador rural, especialmente a comprovação do requisito carência está em desacordo com os artigos 39 inciso I; 48 §2º; 55 §3º; 106; 142 e 143 todos da Lei nº 8.213/91 e artigos 51; 62 e 183 do Regulamento da Previdência Social aprovado pelo Decreto nº 3.048/99, tendo em vista a inexistência de início de prova material contemporânea para o período de empregado de 2002 a 2009, bem como a descaracterização das declarações dos STR conforme relatado no item 2. 4.2 Quanto à recomendação objeto da revisão, o benefício em pauta presume-se pelos fatos apurados que a concessão indevida ocorreu devido a inexistência do número de meses necessários à carência de atividade rural e cômputo de períodos de atividade rural indevidos e sem documentos de início de provas materiais contemporâneos válidos em nome do titular para homologação das declarações dos STR, para efeitos de comprovação de filiação, carência e qualidade de segurado no INSS." Pois bem. Haure-se da leitura do Relatório que a cassação do benefício do autor está lastreada em dois fundamentos: a) inexistência de início de prova material contemporânea para o período de empregado de 2002 a 2009; e b) descaracterização das declarações dos STR. Para comprovar suas alegações, o autor apresentou os seguintes documentos: certidão de nascimento de seu irmão, em 04/03/1959, onde o genitor está qualificado como lavrador (fl. 21); certidão de casamento do autor, em 21/09/1974, onde ele, seu pai e seu sogro estão qualificados como lavradores (fl. 23); Carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Naviraí, em nome de sua companheira Rita Costa de Oliveira, emitida em 2004 (fl. 22); Carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaquirí, em nome de sua companheira Rita Costa de Oliveira , emitida em 2007; carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Pres. Adelcio Rodrigues e certidão onde consta que o autor foi nomeado para o Conselho Fiscal da ASSOCIAÇÃO DOS TRABALHADORES DO ACAMPAMENTO NOSSA SENHORA DE GUADALUPE (fl. 726); Declaração de exercício de atividade rural (fl. 31/33); Certidão do INCRA de que Rita Costa Oliveira é assentada no Projeto PA ITAQUIRAÍ , na gleba 235, desde 21/11/2009 (fl. 34); contrato de concessão de uso sob condição resolutiva entre o INCRA e Rita Costa Oliveira, onde consta o nome do autor como familiar beneficiário (fl. 35); Nota fiscal emitida em 19/07/2012 em nome do autor de venda de mandioca (fl. 36); Documento de arrecadação estadual referente a 07/2012, em nome do autor (fl. 37); Recibos do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaquiraí em nome de Rita Costa de Oliveira – anos de 2002, 2005 , 2007 , 2008 (fl. 38/40); Recibo em nome do autor emitido pela ASSOCIAÇÃO DOS EX-FUNCIONÁRIOS DA FAZENDA STO ANTONIO, ASSENTAMENTO ITAQUIRAÍ – referente ao lote 235, de 07/2012 (fl. 40); Certificado de dispensa de incorporação, no ano de 1975 , onde o autor está qualificado como lavrador (fl. 42/43); Entrevista rural (fl. 54/55); Termo de Homologação da Atividade Rural ( fl. 59); Termo de declarações (fl. 682/684); Declaração de rendimento do pai - ano base 1971 (fl. 716); Contrato particular de compromisso de compra e venda datado de 1974 onde seu pai está qualificado como lavrador (fl. 718/719); Certificado de isenção de alistamento eleitoral em nome de seu pai, lavrador, datado de 1982 (fl. 720); Documento de fl. 724 referente ao lote 235, em nome de Rita; Certidão do INCRA de que o autor é assentado no Projeto de Assentamento PA ITAQUIRAÍ, onde desenvolve atividades rurais em regime de economia familiar no lote 235, desde 21/11/2009 (fl. 728). A declaração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaquiraí (fls. 76/77) não pode ser aceita pois foi assinada por pessoa não autorizada (tesoureiro e não o presidente). De igual sorte, a declaração do Sindicato de Naviraí (f. 57) não serve como início de prova material porque não houve homologação da declaração pelo INSS, requisito exigido para que o documento seja utilizado como início de prova material para fins previdenciários. Os demais documentos colacionados pelo autor constituem início razoável de prova material de que ele trabalhava nas lides campesinas tendo exercido atividade urbana entre 01/05/1979 a 06/03/2001, como se vê de sua defesa administrativa (fls. 698/702) e tendo retornado ao exercício da atividade rural , que exerce até os dias de hoje. Importante destacar que, segundo determina o artigo 142 da Lei 8.213/91, o autor deve demonstrar o exercício do labor rural no momento do implemento da idade necessária, pela carência exigida, ainda que de forma descontínua, de sorte que os períodos remotos, nos idos da década de 1970/1980 servem para demonstrar a predominância do labor rural ao longo de sua trajetória laboral. A despeito de o decisum entender que, com relação ao período de 2002 a 2007, não há nos autos qualquer início de prova material a indicar o exercício de atividade rural, tal fato não encontra amparo nos autos, pois o autor trouxe a certidão de fls. 726, expedida em 30/11/2005, que demonstra que ele era trabalhador rural em novembro de 2005, ao compor a diretoria da Associação dos Trabalhadores do Acampamento Nossa Senhora de Guadalupe na condição de Conselheiro Fiscal. Tais fatos foram corroborados pela prova testemunhal produzida nos autos e não impugnada pelas partes. A testemunha José Fernandes Alencar confirmou que conhece o autor há mais de 35 anos, e que permaneceu acampado com ele no Assentamento Santo Antonio desde 2002 até 2008 quanto de fato conquistaram o lote pelo INCRA e desde então passaram a ser assentados. Antes dessas datas a testemunha confirma que chegou a trabalhar com o autor na condição de diarista na fazenda Caiuá, nos idos de 1985. Por outro lado, em suas declarações apresentadas na seara administrativa em 27/05/2015, o autor asseverou que: fl. 682 ""se desquitou há mais de 15 anos e que mora com a companheira Rita há mais ou menos 07 ou 08 anos; desde que foram assentados; que foram assentados em 2008 mais ou menos e antes disso a companheira ficou acampada na saída para o Paraná, em frente a fazenda Euclides Fabris (falecido); que na época que a esposa estava acampada, o depoente trabalhava na fazenda entre rios e na fazenda coiote na região de Naviraí; que foi trabalhar na fazenda entre rios entre 2002 a 2005; que depois foi para a fazenda coiote onde ficou de 2006 e 2007; que nessas fazendas fazia de tudo, serviços gerais de plantio de soja, milho, arrumação de cerca; que morava na fazenda num cômodo; que ali tinha cozinheira pois tinham outros empregados; que vinha para a cidade de 15 em 15 dias, quando recebia o pagamento por dia trabalhado; que quando saiu o lote do INCRA saiu da fazenda coiote e foi ficar com a companheira no assentamento; que a carteira de fiscal do acampamento Nossa Senhora Guadalupe é de membro do assentamento santo antônio onde estão morando, pois no acampamento existem diversos grupos que são divididos e designados com nomes específicos, que se refere a associação que fica dentro do acampamento santo antonio (...)" Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal, desde que idônea, possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ. Como é cediço, para a caracterização da condição de rurícola, deve-se levar em consideração o histórico laboral do trabalhador perquirindo-se qual atividade foi preponderantemente desempenhada durante toda a vida laborativa do segurado. Isso porque, a condição de trabalhador rural exige verdadeira vinculação do trabalhador à terra, a denotar que ele elegeu o labor campesino como meio de vida. Assim, o exercício de atividade urbana, no caso concreto, é circunstância que não impede, isoladamente, o reconhecimento de eventual direito à percepção de benefício previdenciário de trabalhador rural, sendo certo que para fazer jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, o segurado deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao implemento da idade, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), o que se verificou no caso em exame. Demonstrado pelo conjunto probatório que o autor preenche os requisitos legais para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, desde a postulação administrativa em 19/11/2012, faz jus ao restabelecimento do benefício desde a sua cessação indevida, não subsistindo a cobrança levada a efeito pelo réu, devendo abster-se de qualquer ato para a sua execução. Nesse sentido, confira-se precedente desta Eg. Turma em processo relacionado à Operação Lavoro: "PREVIDENCIÁRIO: RESTABELECIMENTO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL INDEVIDAMENTE CANCELADA. ARTIGO 48, §§1º E 2º DA LEI Nº 8.213/91. REQUISITOS SATISFEITOS. COMPROVAÇÃO. Portanto, deve o réu restabelecer o benefício de aposentadoria por idade rural em favor do autor, desde a sua cessação em 01/10/2016, e pagar as prestações vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios adotados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução, o qual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual. Inverto o ônus da sucumbência e, revendo meu posicionamento anterior, em consonância com o entendimento dominante esposado pelas Turmas componentes da 3ª Seção deste E. Tribunal - no sentido de que, nos casos em que o benefício previdenciário não é concedido em sentença, mas apenas em sede recursal, a base de cálculos da verba honorária compreende as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício -, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor das parcelas vencidas até a data do presente julgado. No que se refere às custas processuais, no âmbito da Justiça Federal, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto no artigo 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96. Tal isenção, decorrente de lei, não se aplica no âmbito da Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, nos termos artigo 27 da Lei Estadual nº 3.779/2009, cujo artigo 24, §1º prevê que a isenção do recolhimento da taxa judiciária não se aplica ao INSS, estando em consonância com o disposto na Súmula nº 178/STJ ("O INSS não goza de isenção de pagamento de custas e emolumentos, nas ações acidentárias e de benefícios, propostas na Justiça Estadual"). Ante o exposto, dou provimento à apelação do autor para restabelecer o benefício de aposentadoria por idade rural de n. 155.148.342-1, bem como o pagamento das parcelas vencidas, a contar da data da cessação em 01/10/2016, nos termos do expendido, ficando prejudicado o recurso do INSS. É COMO VOTO. *******/gabiv/soliveir...
I - No caso concreto, a idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação trazida aos autos, onde consta que a parte autora nasceu em 26/03/1952, implementando o requisito etário em 26/03/2007 (fl. 17).
II - Os indícios de irregularidades no ato concessório do benefício surgiram como desdobramento da denominada "Operação Lavoro", deflagrada pela Policia Federal em Navirai/MS (fls. 82 e 89/90) e que culminaram com a cessação do benefício da autora em virtude da irregularidade na Declaração fornecida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaquiraí/MS.
III - No caso sub examen, a autora afirma que Aparecido da Silva, seu marido, sempre trabalhou com maquinários em atividades rurais, desde 1974, conforme documentos de fls. 34/35 (cópia da CTPS), 46/48 (extrato do CNIS) e 31 (certidão de casamento), os quais consubstanciam início de prova material, pois a qualificação do marido como trabalhador rural é extensível à esposa.
IV - Considerando que o ato concessório se reveste de presunção de legitimidade, cabe ao INSS provar que o benefício foi concedido indevidamente e, por consequência, corretamente cancelado.
V - No caso concreto, o benefício foi cancelado em virtude da constatação das seguintes irregularidades observadas posteriormente pelo INSS: a) "a declaração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaquiraí/MS (fls. 28/29), não foi assinada pelo presidente da entidade, nem consta justificativa de ter sido assinada pelo diretor tesoureiro, não contendo os dados dos proprietários/fazendas onde foi exercida atividade rural, contendo a citação de diversos e considerando como documentos de base para emissão CPF, RG, certidão de casamento e declaração de testemunhas, contudo, não consta as respectivas declarações; b) "(...) o cônjuge da beneficiária, em conformidade informações constantes no CNIS, e cópia da CTPS (fls. 08 a 13 e 22/23) exerceu atividade urbana no lapso de tempo de 1984 a 2012, não podendo considerar a certidão de casamento que portam evento ocorridos em 1979, documentos subsidiários ou probatórios que a requerente tenha inequivocamente exercido atividade rural na condição de contribuinte individual, pelo tempo mínimo exigido a título de carência pela legislação previdenciária; c) "(...) a beneficiária não apresentou posteriormente ao período de atividade urbana do cônjuge, nenhum documento que evidencia a condição de trabalhadora rural, pois, a certidão da justiça eleitoral, não tem valor probatório, sendo meramente declaratório, inclusive sem constar a data do cadastramento, onde pode ser declarada a ocupação" (fls. 76/77).
VI - Para comprovar o labor rural, a autora trouxe os seguintes documentos: (a) cópia de sua certidão de casamento, celebrado em 30.06.1979, em que seu marido, Aparecido da Silva, foi qualificado como "lavrador" (fl. 31); (b) cópia da CTPS do marido da autora em que consta o registro de vínculos empregatícios rurais como operador de máquina (esteira) nos períodos de 01.02.1984 a 28.02.1985 (Agropecuária Novo Horizonte Ltda), de 01.09.1985 a 30.08.1986 (Fazenda Capão Bonito), de 01.09.1986 a 01.02.1994 (Agropecuária Santa Mariana S/A) e de 01.09.1994 a 27.04.2012 (Agropecuária Santa Mariana S/A) - fls. 32/35; (c) Certidão emitida pela 2ª Zona Eleitoral de Naviraí em 18.03.2010 (fl. 38); (d) Declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaquiraí, referente ao período de 01.09.1994 a 2012, emitida em 05.05.2012 (fls. 52/54); (e) Termo de Homologação da atividade rural pelo INSS no período de 01.09.1994 a 31.12.2010 (fl. 55).
VII - A aferição do labor rural da mulher, quando não houver documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, deverá levar em consideração todo o acervo probatório.
VIII - Dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), especialmente quando houver documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, caso em que se deve considerar todo o acervo probatório.
IX - No caso concreto, a existência de documento comprobatório da condição de rurícola apenas em nome do marido pode ser aceita como início de prova material do exercício da atividade rural pela mulher porquanto restou evidenciado que a autora viveu em ambiente rural e trabalhava nas lides campesinas nos mesmos lugares que o seu marido, fato que, foi reconhecido pelo próprio INSS, quando da concessão inicial do benefício.
X - O labor urbano exercido por seu marido por curtos períodos, especialmente na entressafra, quando o trabalhador campesino precisa se valer de trabalhos esporádicos que lhe assegurem a sobrevivência, não constitui óbice, por si só, ao reconhecimento do labor rural.
XI - Presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.
XII - O termo inicial do benefício foi corretamente fixado a partir do seu indevido cancelamento.
XIII - Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
XIV - Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado.
XV - E, apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
XVI - Se a sentença determinou a aplicação de critérios de correção monetária diversos daqueles adotados quando do julgamento do RE nº 870.947/SE, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
XVII - Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, portanto, aplicam-se, (1) até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, (2) na vigência da Lei nº 11.960/2009, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo Egrégio STF, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam, (2.1) os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e (2.2) a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
XVIII - Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque moderadamente arbitrados pela decisão apelada.
XIX - No tocante à isenção de custas e despesas processuais, ausente o interesse em recorrer, vez que tais encargos não foram objeto da condenação.
XX - Recurso desprovido. De ofício, alterados os critérios de correção monetária." (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2292129 - 0000032-82.2015.4.03.6006, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA, julgado em 10/12/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/12/2018 )
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO. OPERAÇÃO LAVORO. REQUISITOS LEGAIS DE IDADE E CARÊNCIA. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO. PAGAMENTO DAS PARCELAS VENCIDAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
Tese de julgamento:
Dispositivos relevantes citados: Lei 8.213/91, arts. 48, §§ 1º e 2º, 55, § 3º, 106, 142, 143; Decreto 3.048/99, arts. 51, 62, 183; EC 103/2019; CPC, art. 487, I.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.354.908/SP, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014; STJ, REsp 1.321.493/PR, rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 19/12/2012; STJ, Súmulas 149 e 577; TRF 3ª Região, AC 0000032-82.2015.4.03.6006, rel. Des. Fed. Inês Virgínia, j. 10/12/2018.