Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5059108-54.2022.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: JOSE FORTUNATO TAVARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: ELEUSA BADIA DE ALMEIDA - SP204275-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE FORTUNATO TAVARES

Advogado do(a) APELADO: ELEUSA BADIA DE ALMEIDA - SP204275-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5059108-54.2022.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: JOSE FORTUNATO TAVARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: ELEUSA BADIA DE ALMEIDA - SP204275-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE FORTUNATO TAVARES

Advogado do(a) APELADO: ELEUSA BADIA DE ALMEIDA - SP204275-N

OUTROS PARTICIPANTES:

   

 

R E L A T Ó R I O

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de recursos interpostos pelo INSS e pela parte autora contra a sentença que JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para reconhecer o caráter especial das atividades exercidas pelo autor nos períodos de 9/04/95 (início da vigência da Lei 9.032/95) a 09/10/1996, 04/03/1997 a 10/06/1997, 14/05/1997 a 25/11/1997, 26/01/1998 a 30/11/1999, 04/05/2000 a 18/05/2000, 29/01/2001 a 13/12/2002, 15/04/2002 a 25/11/2003, 22/03/2004 a 03/05/2004, 06/05/2004 a 30/12/2004, 02/02/2005 a 22/12/2005, 02/05/2006 a 22/11/2006, 08/03/2007 a 26/12/2009, 12/04/2010 a 22/01/2011, 10/02/2011 a 04/09/2018, todos na condição de trabalhador rural, e determinou a conversão do período em tempo de trabalho comum, observado o fator de conversão de 1,4.

Confira-se, por oportuno, a parte dispositiva da sentença:

"Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos autorais para o fim de (i) reconhecer o  caráter especial das atividades exercidas pelo Requerente durante os períodos de 29/04/95 (início da vigência da Lei 9.032/95) a 09/10/1996, 04/03/1997 a 10/06/1997, 14/05/1997 a 25/11/1997, 26/01/1998 a 30/11/1999, 04/05/2000 a 18/05/2000, 29/01/2001 a 13/12/2002, 15/04/2002 a 25/11/2003, 22/03/2004 a 03/05/2004, 06/05/2004 a 30/12/2004, 02/02/2005 a 22/12/2005, 02/05/2006 a 22/11/2006, 08/03/2007 a 26/12/2009, 12/04/2010 a 22/01/2011, 10/02/2011 a 04/09/2018, todos na condição de trabalhador rural, e, por conseguinte, para (ii) determinar a conversão do período acima em tempo de trabalho comum, observado o fator de conversão de 1,4, conforme estabelecido no artigo 70, § 2º, do Decreto 3048/99. O tempo obtido após conversão deverá ser considerado para todos os fins, inclusive para fins de concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Outrossim, (iii) julgo procedente o pedido para condenar o INSS na obrigação de fazer consistente na averbação do período acima indicado, observados os critérios respectivos, devendo o INSS proceder ao recálculo do tempo de contribuição e, caso o somatório do tempo de recolhimento com o referido nos itens acima, implicarem existência de tempo mínimo relativo ao benefício, proceder a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (04/09/2018 fls. 44). Consigno, expressamente, que, se o caso, deverá ser observada a reafirmação da DER, facultando-se a concessão do benefício mais vantajoso para a parte, fixando-se a data do início do benefício para o momento do adimplemento dos requisitos legais do benefício previdenciário, observando-se a legislação e orientação jurisprudencial pertinente. Nos termos acima, julgo improcedentes os demais pedidos formulados. As parcelas atrasadas serão pagas de uma só vez, observada a prescrição quinquenal, corrigidas monetariamente pelo índice do INPC partir do momento em que se tornaram devidas, acrescidas de juros moratórios fixados segundo a remuneração da caderneta de poupança, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, contados da citação. Não há condenação em custas e despesas processuais em razão do disposto no artigo 6º da Lei Estadual n.º 11608/2003, que afasta a incidência da Súmula 178 do E. Superior Tribunal de Justiça. Os honorários advocatícios incidem apenas sobre as prestações vencidas até a data desta sentença, nos termos da Súmula 111 do Colendo Superior Tribunal de Justiça. Para definição do percentual dos honorários advocatícios, deverá ser observado o disposto no artigo 85, § 3º, do CPC. Arbitro os honorários advocatícios, incidentes tão somente sobre as prestações vencidas até a data da sentença, a serem calculados de forma escalonada, nos seguintes termos: (i) 10% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários mínimos; (i) 8% sobre o valor da condenação ou do proveito que exceder os 200 (duzentos) salários mínimos até 2.000 (dois mil) salários mínimos; (iii) 5% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico que exceder os 2.000 (dois mil) salários mínimos até 20.000 (vinte mil) salários mínimos; (iv) 3% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico da condenação que exceder o montante de 20.000 (vinte mil) salários mínimos até 100.000 (cem mil) salários mínimos e (v) 1% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico que exceder o montante de 100.000 (cem mil) salários mínimos. Nos termos artigo 496,§3, inciso I, do Código de Processo Civil, desnecessária a remessa de ofício para o duplo grau obrigatório, pois a condenação não atinge, em tese, o valor de 1.000 (mil) salários-mínimos, previsto no referido dispositivo legal. No vertente caso, conquanto a sentença seja ilíquida, resta evidente que a
condenação ou o proveito econômico obtido na causa não ultrapassa o limite legal previsto, o que impõe o afastamento do reexame necessário."

Em suas razões de recurso alega o INSS, em síntese:

- nulidade da sentença, por ser condicional, o que é vedado por nosso ordenamento jurídico pátrio;

- a necessidade de suspensão do processo nos casos em que se pleiteia cômputo, como tempo de atividade especial, do período em que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade, objeto do Tema 998 do STJ;

- a necessidade de suspensão do processo por ausência de apresentação, no processo administrativo, do formulário de atividade especial (PPP), objeto dos RESPs afetados pela Corte Superior que tratam do tema;

- ausência de interesse processual, ante a utilização de documentos não juntados no requerimento administrativo;

- a necessidade do conhecimento do reexame necessário, nos termos do artigo 496 do CPC e da Súmula 490/STJ, em vista de ser ilíquida a r. sentença;

- que o termo inicial dos efeitos financeiros seja fixado à data da citação;

- a impossibilidade de se condenar a autarquia previdenciária ao pagamento de honorários advocatícios a que não deu causa;

- nulidade da perícia judicial pela não apresentação dos formulários de atividade especial;

- incompetência da Justiça Federal para julgamento da ação com base em perícia cujos documentos não foram retificados pela Justiça Laboral;

- que o autor não comprovou o tempo de serviço rural alegado, pois não apresentou início de prova material;

-  que não é possível enquadrar os períodos de trabalho como especiais por categoria profissional, pois são posteriores a 28/04/1995;

- que o autor deveria ter comprovado a efetiva exposição a agentes nocivos por meio de PPPs ou formulários;

- que a metodologia de aferição do ruído informada no PPP não atende à legislação em vigor. Além disso, a intensidade do ruído informada é inferior ao limite de tolerância em alguns períodos;

-  que o PPP não informa o material que origina a poeira, impossibilitando a verificação de eventual nocividade;

- que a manipulação de álcalis cáusticos em produtos de limpeza não é nociva, pois os álcalis estão diluídos em concentrações próprias para uso doméstico;

- que o laudo judicial não comprova a insalubridade dos períodos reconhecidos, pois foi realizado de forma extemporânea, e a correção de eventuais erros ou a negativa no fornecimento do PPP são questões de competência da Justiça do Trabalho;

- que a data de início dos efeitos financeiros do benefício deve ser alterada para a data da sentença, vez que o laudo judicial, documento novo apresentado na ação, foi decisivo para a concessão do benefício;

- que deve ser aplicada a Selic a partir de janeiro de 2022 para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, com base na Emenda Constitucional 113/2021.

Por fim, prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais.

Por sua vez, em seu recurso, sustenta o autor:

- que, ao contrário do que constou na sentença, há fundamento para caracterizar como especiais todos os períodos de trabalho listados na petição inicial, em que ele desenvolveu a função de trabalhador rural, vez que a exposição ao calor acima dos limites de tolerância também é considerada nociva pela legislação previdenciária em seus Decretos 3048/99, 2172/97, 83.080/79 e 53.831/64;

- que o Laudo Pericial foi conclusivo quanto a existência dos agentes agressores calor e agente químico hidrocarbonetos e outros compostos de carbono (produtos defensivos agrícolas) bem como deixou incontroverso que as atividades por ele desempenhadas eram “pesadas”; 

- que, independentemente do cargo lançado em CTPS (rurícola, trabalhador rural, ou cortador de cana-de-açúcar), a realidade é que ele se limitou a exercer o corte, carpa e plantio da cana de açúcar na maioria dos períodos em que trabalhou; 

- que é necessário considerar que em alguns períodos ele efetuou a aplicação de defensivos agrícolas nas lavouras, o que torna inconteste a natureza especial das atividades; 

- que, por haver trabalhado por mais de 25 anos sujeito a tais agentes, possui todas as condições de ter seu pedido concedido, vez que o Decreto 3.048/99, que aprovou o regulamento de previdência social acerca da Aposentadoria Especial, assim o faculta em seu artigo 62 e seguintes.

Pugna pelo provimento do presente recurso para reformar a decisão de primeiro grau e reconhecer, como especiais, também os períodos de 01/08/1979 a 13/12/1979, 02/01/1980 a 13/12/1980, 19/11/1981 a 15/12/1982, 16/12/1982 a 12/05/1983, 03/06/1983 a 09/12/1983, 19/01/1984 a 04/01/1985, 07/01/1985 a 20/02/1986, 3/05/1986 a 12/12/1986, 09/01/1987 a 07/02/1987, 8/03/1987 a 12/12/1987, 04/01/1988 a 19/03/1988, 02/04/1988 a 30/09/1988, 19/01/1989 a 25/11/1989, 02/02/1990 a 30/11/1990, 04/02/1991 a 06/12/1991, 06/01/1992 a 17/12/1992, 04/01/1993 a 14/08/1993, 19/03/1994 a 28/04/1995, e conceder ao apelante o beneficio previdenciário de aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo.

Processados os recursos, sem contrarrazões, vieram os autos a esta E. Corte.

É O RELATÓRIO.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5059108-54.2022.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: JOSE FORTUNATO TAVARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: ELEUSA BADIA DE ALMEIDA - SP204275-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOSE FORTUNATO TAVARES

Advogado do(a) APELADO: ELEUSA BADIA DE ALMEIDA - SP204275-N

OUTROS PARTICIPANTES: 

 

 

V O T O

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Em razão de sua regularidade formal, recebo o recurso, nos termos do artigo 1.011 do CPC/2015.

A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, o que afasta a submissão ao reexame necessário quando a condenação imposta contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/2015). 

Cumpre esclarecer que o sobrestamento determinado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, ao afetar os Recursos Especiais nºs 1.882.236/RS, 1.893.709/RS e 1.894.666/SC ao rito previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015 (Tema 1.081/STJ), se restringe apenas aos recursos especiais e agravos em recurso especial, o que não é o caso dos autos.

1) PRELIMINARES

Relativamente à alegação de sentença condicional, de fato, razão assiste ao INSS, uma vez que o juízo de primeiro grau julgou procedente o pedido deduzido na inicial, para condenar o INSS a "proceder ao recálculo do tempo de contribuição e, caso o somatório do tempo de recolhimento com o referido nos itens acima, implicarem existência de tempo mínimo relativo ao benefício, proceder a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição". Nesse ponto, diante da ofensa ao artigo 492 do CPC/2015, é de ser reconhecida a ocorrência de julgamento condicional a ensejar a nulidade parcial da sentença. Precedente desta C. Turma: TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5325031-14.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 09/05/2023, DJEN DATA: 12/05/2023.

Entretanto, estando o processo em condições de imediato julgamento, aplico a regra do artigo 1.013, § 3º, III, da norma processual e passo ao exame do mérito.

A propósito, acerca da possibilidade de ser flexibilizado o pedido, na interpretação sistêmica direcionada à proteção do risco vivido pelo autor, no âmbito do direito previdenciário, é firme o posicionamento do STJ de que em matéria previdenciária deve-se flexibilizar a análise do pedido contido na petição inicial, não se entendendo como julgamento extra ou ultra petita a concessão de benefício diverso do requerido na inicial. Nessa linha, o Enunciado 6537 da I Jornada do Direito da Seguridade Social do CJF.

Com relação à necessidade de suspensão do processo nos casos em que se pleiteia cômputo, como tempo de atividade especial, do período em que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade, objeto do Tema 998 do STJ, sem razão o INSS, porquanto referido Tema já foi objeto de julgamento definitivo no âmbito da Corte Superior, com trânsito em julgado em 04/05/2021, no sentido da possibilidade de contagem do período de incapacidade como tempo especial.

Quanto à necessidade de suspensão do processo por ausência de apresentação, no processo administrativo, do formulário de atividade especial (PPP), objeto dos RESPs afetados pela Corte Superior que tratam do tema, igualmente sem razão. Embora os recursos RESP's nº 1.904.567-SP; nº 1.894.637/ES e nº 1.904.561/SP tenham sido selecionados para admissão como representativos de controvérsia pelo C. STJ, não houve, até a presente data, determinação de sobrestamento das demandas judiciais em curso.

Sobre a utilização de documentos não juntados no requerimento administrativo, ou, quando  juntados, não corresponder àquele trazido em juízo, de molde a justificar a alegada discrepância de provas pelo INSS, não é circunstância a ser analisada à luz da falta de interesse de agir, mas, sob o viés do termo inicial dos efeitos financeiros.

A apresentação, somente em juízo, de prova do direito do autor, ao reverso dos reflexos sustentados pela entidade autárquica,  encontra guarida na consequência jurídica objeto do  tema 1124/STJ, que trata dos efeitos da condenação e não na extinção do feito sem julgamento do mérito, por falta de interesse de agir, como supõe a autarquia. Trata-se de feito devidamente instruído, cuja prova de mérito  foi adequadamente debatida nos autos, por ambas as partes, sendo, demais disso, objeto de apelação de mérito do próprio INSS. Sob este cenário, não se mostra razoável, a esta altura processual, com o caminhar processual aqui demonstrado, extinguir o feito sem julgamento do mérito. 

Não seria compatível, na singularidade do caso, portanto, acolher a alegação de ausência de interesse processual por falta de prévio requerimento administrativo, diante do cenário processual que ora se apresenta, porquanto tal  não se compatibiliza com os princípios da economia processual e da primazia da decisão de mérito.

No tocante à não apresentação dos formulários de atividade especial, de fato é circunstância que pode prejudicar o autor na obtenção da aposentadoria especial, mas não implica automaticamente na nulidade da perícia, eis que o juiz analisa cada caso individualmente, levando em conta todas as provas e argumentos apresentados.

A respeito da incompetência da Justiça Federal para julgamento da ação com base em perícia cujos documentos não foram retificados pela Justiça Laboral, essa insurgência não se sustenta, eis que a competência da Justiça do Trabalho se limita a questões relacionadas ao contrato de trabalho, como o reconhecimento de vínculo empregatício ou o pagamento de verbas trabalhistas, de forma que o reconhecimento de tempo de serviço especial para fins de aposentadoria é questão previdenciária e independe de retificação pela Justiça Obreira dos documentos utilizados na perícia.

Superadas essas questões, passo à análise das demais razões dos recursos.

2) MÉRITO

REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO/PROGRAMADA

Como é sabido, após a EC 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço cedeu lugar à aposentadoria por tempo de contribuição.

Em resumo, antes de 16/12/1998 (data da vigência da Emenda 20), bastava o segurado comprovar 30 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 35 anos, se homem, para concessão da aposentadoria integral; ou 25 anos, se mulher, e 30 anos, se homem, para concessão da aposentadoria proporcional.

Após a EC 20/98, o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, passando a ser necessário comprovar 35 anos de tempo contributivo, se homem, e 30 anos, se mulher, além da carência correspondente a 180 contribuições mensais (art. 25, inciso II, c/c art. 142, ambos da Lei 8.213/1991), deixando de existir a aposentadoria proporcional. Esta última, no entanto, foi assegurada aos já filiados antes do advento da Emenda, mediante os seguintes requisitos: 53 anos de idade e 30 anos de tempo de serviço, se homem; ou 48 anos de idade e 25 anos de tempo de serviço, se mulher; bem como o adicional de 40%  sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional.

A EC 103/2019, vigente a partir de 13/11/2019, por sua vez, extinguiu a aposentadoria por tempo de contribuição, estabelecendo a aposentadoria programada, com exigência de novos requisitos: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores rurais e segurados especiais (art.  201, § 7º, da Constituição Federal).

Restou assegurado, também, no artigo 3º da nova Emenda Constitucional,  o direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que tivessem preenchido as condições em data anterior a sua vigência (13/11/2019),  os quais podem pedir benefício a qualquer tempo (art. 3º da EC), garantindo-se cálculo e reajuste com base na legislação vigente à época em que foram cumpridos os requisitos (art. 3º, §§ 1º e 2º, da EC).

Além disso, restaram estabelecidas 04 (quatro) regras de transição para àqueles que já eram filiados ao RGPS e ainda não tinham implementado os requisitos até 13/11/2019, a saber (arts. 15, 16, 17 e 20 da EC 103/2019): a) sistema de pontos, idade e tempo de contribuição;  b)tempo de contribuição e idade mínima; c) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator previdenciário, sem o requisito da idade; d)  tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade mínima.

DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.

Em linhas gerais, até o advento da EC 103/2019, a aposentadoria especial era devida após 180 contribuições, para os trabalhadores expostos a condições prejudiciais à saúde por 15, 20 ou 25 anos.

Até 28.04.1995, a especialidade poderia ser reconhecida sem comprovação da exposição, desde que a atividade estivesse enquadrada nos decretos n° 53.831/64 ou n° 83.080/1979, sendo possível e desejável o uso de analogia, para considerar a inserção de determinada categoria profissional, aproximando os diversos grupos de trabalhadores que se enquadrem em atividades assemelhadas, a fim de evitar situações injustas, acarretando sua não aplicação.

Após 28.04.1995, com o advento da Lei 9.032/1995, o segurado passou a ter que comprovar a exposição permanente a agentes prejudiciais à saúde, de forma permanente, não ocasional nem intermitente; entendendo-se como permanente, o trabalho em que a exposição ao agente nocivo é indissociável da produção ou serviço.

As condições especiais de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico. Todavia, consoante entendimento já sufragado por esta Turma, por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.

O artigo 58 da Lei 8.213/91 dispõe que cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares consideradas exemplificativas (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC), de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Assim, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial.

A partir de 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário aos segurados expostos a agentes nocivos, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.

Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência reconhece como especial o trabalho que assim era considerado pela legislação em vigor na época (Recurso Especial nº 1.398.260/PR – Tema 694/STJ).

A conversão do tempo de trabalho deve seguir a legislação vigente no momento do requerimento administrativo (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).

Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela dos multiplicadores prevista no artigo 70, do Decreto 3.048/99.

A EC 103/2019, por sua vez, proibiu a conversão do tempo especial em comum para atividades após 13/11/2019, não sendo o art. 57, § 5º,  da lei 8.213/91, recepcionado pela reforma constitucional (art. 201, §14, da CF e art. 25, caput, e §2º da referida Emenda).

No tocante ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI,  o E. STF assentou a tese de que não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, situação que não se aplica ao agente nocivo ruído (ARE 664335).

DA APOSENTADORIA ESPECIAL APÓS A EC 103/2019

Nas hipóteses em que a  DER for posterior à 13/11/2019, o art. 19, §1º, da  EC 19/2019,  prevê a edição de Lei Complementar de que trata o art. 201, §1º, da CF, para regulamentação do tema da Aposentadoria Especial, que é atualmente regida por uma regra  provisória (transitória), na qual se estabelece os seguintes requisitos (art. 19, §1º, I, a, b, c):

IDADE MÍNIMA (AMBOS OS GÊNEROS)

55 anos, para 15 anos  de Atividade Especial;

58 anos, para 20 anos de Atividade Especial;

60 anos, para 25 anos de Atividade Especial

A atual previsão constitucional autoriza regras diferenciadas, regulamentadas  por lei complementar para servidores e segurados cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes (art. 40, § 4º-C e art. 201, §1º, inciso II, da CF), restando expressamente vedado o enquadramento por categoria profissional/ocupação. 

Por sua vez, a Regra de transição é aplicável  aos segurados que trabalharam com atividade especial antes de 13/11/2019, mas que, até essa data, não completaram o tempo mínimo para se aposentar. A partir de então é necessária uma pontuação mínima para que o segurado tenha direito à aposentadoria:

REGRA DE TRANSIÇÃO (art. 21 da EC 103/2019)

A regra de transição disposta na Reforma da Previdência, além dos tempos mínimos de contribuição com exposição a agentes nocivos (15,20,25 ANOS), exige o cumprimento de pontuação (idade + tempo de contribuição) da seguinte forma (computados os períodos de atividade sem exposição a agentes nocivos):

66 pontos para a atividade especial de 15 anos;

76 pontos para a atividade especial de 20 anos;

86 pontos para a atividade especial de 25 anos;

Importa salientar que as  novas regras não alcançam os que já recebiam o benefício na data de sua promulgação, ou aqueles que já haviam cumprido os requisitos para a sua percepção anteriormente, ainda que o requerimento tenha se dado posteriormente, na forma do § 4º do art. 167-A do Decreto 3.048/1999. 

DO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO - PPP 

O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre os agentes nocivos que autorizam o reconhecimento do labor especial, bem assim da comprovação à respectiva exposição.

A inteligência de tal dispositivo revela o seguinte: (i) a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita por meio do PPP; (ii) o PPP deve ser emitido pela empresa, na forma estabelecida pelo INSS, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho; (iii) o empregador deve manter atualizado o PPP abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a cópia desse documento; (iv) a empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista em lei.

Verifica-se que a legislação de regência estabelece que a empresa empregadora deve garantir a veracidade das declarações prestadas nos formulários de informações e laudos periciais, sob pena de sujeição à penalidade prevista no artigo 133 da referida lei, bem como de ser responsabilizada criminalmente, nos termos do artigo 299, do Código Penal. Além disso, o sistema jurídico confere ao Poder Público o poder de fiscalizar o empregador no que tange à elaboração, manutenção e atualização do PPP.

Por isso, presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário, seja porque ele não é responsável pela elaboração do documento, seja porque cabe ao Poder Público fiscalizar a elaboração do PPP pelas empresas.

O Egrégio STJ fixou tese repetitiva no sentido acima expendido, no julgamento da Petição nº 10.262/RS, de 08/02/2017.

DO EPI EFICAZ OU NEUTRALIZADOR 

Consoante já destacado, no julgamento do ARE 664335, pelo  E. STF, apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz de neutralizar a nocividade do ambiente laboral, a configurar uma dúvida razoável no particular, deve-se reconhecer o labor como especial.

Nesse ponto, convém observar que o fato de o PPP consignar que o EPI é eficaz não significa que ele seja capaz de neutralizar a nocividade, tal como exigido pelo E. STF para afastar a especialidade do labor.

Conforme se infere do Anexo XV, da Instrução Normativa 11/2006, do INSS, o campo 15.7 do PPP deve ser preenchido com "S - Sim; N - Não, considerando se houve ou não a atenuação, com base no informado nos itens 15.2 a 15.5, observado o disposto na NR-06 do TEM, observada a observância: [...]".

Portanto, quando o PPP consigna que o EPI era eficaz, tal eficácia diz respeito à sua aptidão de atenuar ou reduzir os efeitos do agente nocivo. Isso não significa, contudo, que o EPI era "realmente capaz de neutralizar a nocividade". A dúvida, nesse caso, beneficia o trabalhador.

Noutras palavras, o fato de o PPP consignar que o EPI era "eficaz" (para atenuar os efeitos do agente nocivo) não significa que tal equipamento era capaz de "neutralizar a nocividade". Logo, não se pode, com base nisso, afastar a especialidade do labor, até porque, nos termos do artigo 264 § 5º, do RPS, "sempre que julgar necessário, o INSS poderá solicitar documentos para confirmar ou complementar as informações contidas no PPP, de acordo com § 7º do art. 68 e inciso III do art. 225, ambos do RPS".  (Precedente: TRF 3ª Região, NONA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2228745 - 0001993-28.2015.4.03.6113, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado em 07/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/03/2018)

Não nos escapa a análise, em complemento às observações aqui lançadas que o momento atual de pandemia por COVID/19, considerando as medidas preventivas, sanitárias e pessoais, difundidas mundialmente apenas corrobora e lança luzes sobre a natureza meramente atenuadora dos EPI’s na prevenção de doenças, inclusive as ocupacionais.

Não se pode, diante de tais elementos perder de vista que, a despeito do manejo de EPI’s de barreiras físicas pelos trabalhadores em suas jornadas,  a reflexão sobre a neutralização dos efeitos deletérios se impõe no Poder Judiciário de maneira pungente, que deve estar atento na correspondente entrega da efetiva prestação jurisdicional para quem o procura.

HABITUALIDADE DA EXPOSIÇÃO 

Constando do PPP que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples presença do agente no ambiente, ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.

De fato, não se pode exigir menção expressa, no formulário, a habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, já que no modelo de PPP concebido pelo INSS não existe campo específico para tanto.

Ademais, é do entendimento da Corte Superior que o requisito de habitualidade e permanência para fins de reconhecimento de atividade especial não pressupõe a exposição contínua e ininterrupta ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. (RESP 1578404; 17/09/2019; NAPOLEÃO NUNES; PRIMEIRA TURMA)

Por tais razões, não há como acolher  eventual assertiva de que não seria possível reconhecer a especialidade do labor pelo fato de o PPP não consignar expressamente que a exposição era habitual. Nesse sentido, a jurisprudência desta C. Turma: APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1773938 - 0008160-27.2011.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em 12/03/2018.

DO LAUDO EXTEMPORÂNEO 

O laudo técnico não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços. (Precedentes desta Corte: AC 0012334-39.2011.4.03.6183, 8ª Turma, Desembargador Federal Luiz Stefanini, DE 19/03/2018;  AC/ReO 0027585-63.2013.4.03.6301, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento e AC/ReO 0012008-74.2014.4.03.6183, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Fausto de Sanctis, DE 17/10/2017).

Na mesma linha, temos a Súmula nº 68, da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, publicada no dia Diário Oficial da União aos 24/09/2012, cujo enunciado é o seguinte: "O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado." 

DA AUSÊNCIA DA PRÉVIA FONTE DE CUSTEIO 

Não há como se sonegar o direito do segurado de averbação do labor em condições especiais sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuído ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
Ademais, nesse particular, restou consignado no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, em sede de Repercussão Geral, que a ausência de prévia fonte de custeio não prejudica o direito dos segurados à aposentadoria especial, em razão de não haver ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, eis que o art. 195, § 5º, da Constituição Federal (que veda a criação, majoração ou a extensão de benefícios previdenciários sem a correspondente fonte de custeio), contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se trata de benefício criado diretamente pela própria constituição, como é o caso da aposentadoria especial.

DA CONVERSÃO DO TEMPO DE TRABALHO 

Quanto à conversão do tempo de trabalho, deve-se obedecer à legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, o que também já foi objeto de decisão proferida pelo C. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (art. 543-C, do CPC/73), no qual se firmou a seguinte tese: "A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).

Nesse ponto, até o advento da Lei 9.032/95, era possível a conversão de tempo comum em especial, devendo ser respeitado este regramento para o tempo de serviço prestado até a sua vigência em respeito ao princípio do tempus regit actum. (Precedente do E. STJ: AgRg nos EDcl no REsp 1509189/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/05/2015, DJe 13/05/2015)

DO AGENTE NOCIVO RUÍDO

A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações. Até a edição do Decreto nº 2.171/1997 (06/03/1997), considerava-se especial a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto nº 4.882, em 18/11/2003, o limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis.

Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.

O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto nº 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).

O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".

A Corte Suprema assim decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares.

Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (artigo 195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei nº 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.

METODOLOGIA DE AFERIÇÃO DO RUÍDO

Importa registrar que não merece acolhida a alegação no sentido de que não se poderia reconhecer como especial o período trabalhado em função da técnica utilizada na aferição do ruído não ter observado a Instrução Normativa 77/2015.

Ora, é evidente que tal norma (IN 77/2015), que estabelece uma técnica procedimental, não pode ser aplicada retroativamente - até porque é materialmente impossível que o empregador proceda a uma medição com base numa norma futura.

De todo modo, vale registrar que o segurado não pode ser prejudicado por eventual equívoco da empresa no particular.

Ressalte-se que, em função do quanto estabelecido no artigo 58 da Lei nº 8.213/91, presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário, eis que ele não é responsável pela elaboração do documento e porque cabe ao Poder Público fiscalizar a elaboração do PPP e dos laudos técnicos que o embasam.

Não só. A legislação de regência não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica (Nível de Exposição Normalizado - NEN), não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia. (Precedente:TRF2 SEGUNDA TURMA RECURSAL Recursos 05100017820164058300).

Por tais razões, deve ser rejeitada qualquer alegação no sentido de que o labor não poderia ser reconhecido como especial em razão da metodologia incorreta na medição do ruído.

Destaco que, conforme ressaltado anteriormente e consoante restou pacificado pelo E. STF, a utilização de EPI não desnatura a qualidade especial do tempo, mesmo que eficaz, no caso do agente ruído.

 

DO CASO CONCRETO – ATIVIDADE ESPECIAL 

JOSE FORTUNATO TAVARES ajuizou a presente demanda em face do INSS, com vistas ao reconhecimento e cômputo do tempo de serviço que considera especial pelos períodos de 01/08/1979 a 13/12/1979, 02/01/1980 a 13/12/1980, 19/11/1981 a 15/12/1982, 16/12/1982 a 12/05/1983, 03/06/1983 a 09/12/1983, 19/01/1984 a 04/01/1985, 07/01/1985 a 20/02/1986, 3/05/1986 a 12/12/1986, 09/01/1987 a 07/02/1987, 8/03/1987 a 12/12/1987, 04/01/1988 a 19/03/1988, 02/04/1988 a 30/09/1988, 19/01/1989 a 25/11/1989, 02/02/1990 a 30/11/1990, 04/02/1991 a 06/12/1991, 06/01/1992 a 17/12/1992, 04/01/1993 a 14/08/1993, 19/03/1994 a 09/10/1996, 04/03/1997 a 10/06/1997, 14/05/1997 a 25/11/1997, 26/01/1998 a 30/11/1999, 04/05/2000 a 18/05/2000, 29/01/2001 a 13/12/2002, 15/04/2002 a 25/11/2003, 22/03/2004 a 03/05/2004, 06/05/2004 a 30/12/2004, 02/02/2005 a 22/12/2005, 02/05/2006 a 22/11/2006, 08/03/2007 a 26/12/2009, 12/04/2010 a 22/01/2011, 10/02/2011 a 04/09/2018, devidamente comprovados pelas anotações da CTPS, PPPs e Laudo Técnico Pericial, com a concessão do benefício de aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo, ou, subsidiariamente, a conversão em tempo de serviço comum e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.

Após a análise dos documentos trazidos com a inicial, bem como da conclusão da perícia judicial, foi proferida sentença de procedência, com o reconhecimento em parte do pedido do autor, sobrevindo recursos do INSS e do autor.

O INSS requer o afastamento de todos os períodos reconhecidos. O autor, por sua vez, requer o reconhecimento da especialidade dos períodos não conhecidos pelo juízo, de 01/08/1979 a 13/12/1979, 02/01/1980 a 13/12/1980, 19/11/1981 a 15/12/1982, 16/12/1982 a 12/05/1983, 03/06/1983 a 09/12/1983, 19/01/1984 a 04/01/1985, 07/01/1985 a 20/02/1986, 3/05/1986 a 12/12/1986, 09/01/1987 a 07/02/1987, 8/03/1987 a 12/12/1987, 04/01/1988 a 19/03/1988, 02/04/1988 a 30/09/1988, 19/01/1989 a 25/11/1989, 02/02/1990 a 30/11/1990, 04/02/1991 a 06/12/1991, 06/01/1992 a 17/12/1992, 04/01/1993 a 14/08/1993, 19/03/1994 a 28/04/1995.

Foram juntados aos autos CARTEIRA DE TRABALHO com anotações referentes a contratos de trabalho com as empresas Cia. Agrícola Sertaozinho; Magnal - Empreitadas Rurais Ltda.; Tiné Empreitadas Rurais S/C Ltda.; Coutinho Transporte De Carga E Empretadas Rurais S/C Ltda.; Case - Comercial E Agricola Sertaozinho Ltda.; Agropecuaria Piratininga S/A; Novaera Serviços Agrícolas Industriais e Transportes Ltda.;  Andrade Açúcar e Álcool S/A; Biosev Bionergia S/A; Agropecuária CFM Ltda.; Terreos Açúcar e Energia (ID 260153832 e 260153832), bem como PPPs relativos ao período em que o autor manteve vínculo empregatício com as empresas Biosev Bionergia S/A,  Agropecuária CFM Ltda, Terreos Açúcar e Energianas quais tinha como função habitual a de cortador de cana de açúcar (IDs 260153837, 260153838 e 260153902).

Consigne-se os ppps juntados estão formalmente preenchidos, datados e assinados pelos respectivos técnicos, tendo como datas respectivas  31/01/2018, 20/10/2016 e 19/02/2018.

A atividade de trabalhador em lavouras de cana-de-açúcar era reconhecida como especial com base na equiparação à categoria dos trabalhadores na agropecuária (item 2.2.1 do Anexo II do Decreto nº 53.831/64). Todavia, o E. STJ, no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei autuado sob nº 452/PE, firmou entendimento no sentido de não ser possível equiparar a categoria profissional de agropecuária, constante no item 2.2.1 do Anexo ao Decreto nº 53.831/1964, à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar, de forma que não cabe mais o reconhecimento da atividade especial do trabalhador da lavoura de cana com base exclusivamente na categoria profissional.

Não obstante, essa atividade pode ser enquadrada como especial com base nos códigos 1.2.11 do Anexo III do Decreto nº 53.831/64, 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, 1.0.17 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, já que suas funções envolvem a exposição excessiva a produtos químicos nocivos, incluindo hidrocarbonetos presentes na fuligem da palha da cana queimada, além de inseticidas, pesticidas e defensivos agrícolas, entre outros riscos à saúde do trabalhador. 

O trabalhador braçal rural que exerce suas atividades na lavoura da cana de açúcar está em permanente contato com poeiras de terra e do bagaço da cana. A queima incompleta das palhas da cana de açúcar forma fuligens, os chamados hidrocarbonetos aromáticos, além de outros compostos de carbono existentes, e o trabalhador se expõe a estes agentes químicos através das mucosas da boca, narinas e pulmões. 

Ressalte-se, também, que o corte de cana obriga o trabalhador a expor-se ao agente físico calor, que, no caso dos canaviais, ainda tem a dissipação dificultada pela rama da planta, fazendo com que a temperatura ultrapasse em muitos graus os limites considerados razoáveis para o ser humano. 

A atividade manual do cortador de cana classifica-se como pesada e contínua, cujo descanso, costumeiramente, é realizado no próprio local de trabalho. Os serviços realizados no canavial, além de extenuantes, geram riscos ergonômicos relacionados a cortar, levantar e empilhar fardos de cana, em uma média de dez toneladas por dia. As ferramentas utilizadas nos serviços de corte da cana nem sempre são as mais apropriadas, em muitos casos, utilizadas de forma inadequada, acarretando risco de lesões. Ademais, nos serviços de corte de cana, principalmente na cana não queimada, é comum o contato com animais nocivos à saúde, escorpiões, aranha, cobras e abelhas. 

A propósito, sobre a atividade manual do cortador de cana, oportuna é a descrição feita pelo pesquisador Francisco Alves, professor da Universidade de São Carlos, no artigo “Por que morrem os trabalhadores da cana?”. Confira-se:

“Um trabalhador que corta hoje 12 toneladas de cana em média por dia de trabalho realiza as seguintes atividades no dia: Caminha 8.800 metros; Despende 366.300 golpes de podão; Carrega 12 toneladas de cana em montes de 15 K em média cada um, portanto ele faz 800 trajetos levando 15 k nos braços por uma distância de 1,5 a 3 metros; Faz aproximadamente 36.630 flexões de perna para golpear a cana; Perde, em média, 8 litros de água por dia, por realizar toda essa atividade sob sol forte do interior de São Paulo, sob os efeitos da poeira, da fuligem expelida pela cana queimada, trajando uma indumentária que o protege, da cana, mas aumenta a temperatura corporal. Com todo esse detalhamento pormenorizado da atividade do corte da cana, fica fácil entendermos porque morrem os trabalhadores rurais cortadores de cana em São Paulo: por causa do excesso de trabalho.” (ALVES, Francisco. “Por que morrem os cortadores de cana?”, 2006, Revista Saúde e Sociedade v. 15, n. 3, p. 90-98, set/dez 2006).


E sobre a possibilidade do reconhecimento da especialidade da atividade na lavoura da cana-de-açúcar em razão da insalubridade do trabalho no canavial, pacífico o entendimento no âmbito desta 7ª Turma, a teor do julgado que traga à colação: 

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO CONFORME O ESTADO. DESNECESSIDADE DE MAIS PROVAS. REVISÃO DA RMI DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. TRABALHADOR RURAL EM LAVOURA DE CANA-DE AÇÚCAR. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DA PARTE AUTORA.

1. Agravo retido não conhecido, nos termos do artigo 523, § 1º, do CPC/73, vigente à época da interposição. 2. Alegação de cerceamento de defesa afastada. Documentos hábeis à comprovação das condições de trabalho. 3. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo de contribuição, a teor do seu art. 4º. 4. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração. 5. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97). 6.A atividade do trabalhador rural na cultura de cana-de-açúcar encontra enquadramento no código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64. É do senso comum que o plantio e a colheita de cana-de-açúcar, assim como o trato posterior, requerem intensa atividade física do rurícola, que está associada a riscos ergonômicos e a riscos de acidentes na operação de equipamentos, bem como na manipulação de insumos, além da factível exposição habitual e permanente a agentes químicos (pesticidas, herbicidas e inseticidas).7. Reconhecidas as atividades especiais, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício da parte autora. 8. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. 9. Sucumbência mínima da parte autora. Condenação do INSS ao pagamento de honorários. Aplicação da regra do parágrafo único do artigo 21 do Código de Processo Civil/73. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50. 10. Agravo retido não conhecido. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação da parte autora parcialmente provida. (ApCiv 0033407-89.2016.4.03.9999, Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES, TRF3 - 7ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/02/2020). 

Nesse cenário, considerando que há prova nos autos de que o autor efetivamente desenvolveu atividade laboral na lavoura de cana-de-açúcar, forçoso é concluir, nos termos delineados, que ele ficou exposto a agentes nocivos de natureza química e física, o que é suficiente para o reconhecimento da especialidade dos lapsos temporais seguintes:

1) BIOSEV Bioenergia S.A - ID 260153837 (01/08/1979 a 13/12/1979, 02/01/1980 a 13/12/1980, 19/11/1981 a 15/12/1982, 16/12/1982 a 12/05/1983, 03/06/1983 a 09/12/1983, 19/01/1984 a 04/01/1985, 07/01/1985 a 20/02/1986, 3/05/1986 a 12/12/1986, 09/01/1987 a 07/02/1987, 8/03/1987 a 12/12/1987, 04/01/1988 a 19/03/1988, 02/04/1988 a 30/09/1988, 19/01/1989 a 25/11/1989, 02/02/1990 a 30/11/1990, 04/02/1991 a 06/12/1991, 06/01/1992 a 17/12/1992, 04/01/1993 a 14/08/1993, 19/03/1994 a 09/10/1996)Cargo/função: LavradorDescrição das atividades: Executar diversos serviços na lavoura de cana de açúcar, carpindo, plantando, cortando ou colhendo a produção, dispensando tratos culturais adequados a cada plantação, a fim de assegurar o desenvolvimento das culturas.

2) TEREOS AÇÚCAR E ENERGIA ANDRADE S/A - ID 260153839 (26/01/1998 a 31/12/1998, 01/01/1999 a 30/11/199930/11/1999, 04/05/2000 a 18/05/2000, 29/01/2001 a 13/12/2001, 15/04/2002 a 25/11/2003, 22/03/2004 a 03/05/2004, 06/05/2004 a 30/12/2004, 02/02/2005 a 22/12/2005, 02/05/2006 a 22/11/2006, 08/03/2007 a 26/12/2009). Cargo/função: Serviços Gerais/Corte de Cana/Serviços Gerais AgrícolasDescrição das atividades: Consiste no corte da cana através de mão de obra braçal, isto é, cortada manualmente com auxílio de facão, formando leiras de cana, que posteriormente são carregadas e transportadas para serem processadas.

Relativamente à função de SERVIÇOS GERAIS, como aparece no ppp relativo aos períodos de 26/01/1998 a 31/12/1998, 01/01/1999 a 30/11/1999 e 29/01/2001 a 13/12/2001, tal anotação não descaracteriza a função de cortador de cana de açúcar, eis que a empresa TEREOS AÇÚCAR E ENERGIA ANDRADE S/A é empresa cuja atividade é do cultivo da cana de açúcar, sendo possível extrair, da descrição das atividades, setor, cargo e CBO, que em todos os períodos o segurado desempenhava atividades da lavoura canavieira. Da mesma forma, os períodos do item 14.1 do PP não preenchidos podem ser interpretados por mera irregularidade, que não podem prejudicar  o trabalhador, mesmo porque se trata de documento preenchido unilateralmente pelo empregador, cuja fiscalização deve ser feita pelo INSS. Em reforço, são as observações constantes do referido documento.

3) AGROPECUÁRIA CFM LTDA - ID 260153838 (10/02/2011 a 20/08/2016). Cargo/função: Trabalhador rural; Setor CanaDescrição das atividades: Consiste no corte da cana através de mão de obra braçal, isto é, cortada manualmente com auxílio de facão, formando leiras de cana, que posteriormente são carregadas e transportadas para serem processadas.

Relativamente aos períodos de 04/03/1997 a 10/06/1997 (WALDEMAR TONIELO); de 14/05/1997 a 25/11/1997 (AGROPECÁRIO ANEL VIÁRIO S/A)de 12/04/2010 a 22/01/2011 (PEDRO TOMÉ FRANCISCO), não devem ser reconhecidos como especial. Isto porque a a perícia foi feita por similaridade e não consta nenhuma informação de que tais empresas não estejam ativas. Ademais, para o empregador PEDRO, a atividade do autor constante da CTPS era de CASEIRO, e a ANEL ainda está ativa.

Logo, em vista do quanto discutido, comprovada está a especialidade dos períodos de atividade laboral trazidos com a inicial, à exceção dos períodos de 04/03/1997 a 10/06/1997; de 14/05/1997 a 25/11/1997; de 12/04/2010 a 22/01/2011 e de 10/02/2011 a 04/09/2018, devendo ser reformada a sentença recorrida nos pontos mencionados, cujo resumo se dá da seguinte forma:

a) Períodos reconhecidos como especiais neste momento processual01/08/1979 a 13/12/1979, 02/01/1980 a 13/12/1980, 19/11/1981 a 15/12/1982, 16/12/1982 a 12/05/1983, 03/06/1983 a 09/12/1983, 19/01/1984 a 04/01/1985, 07/01/1985 a 20/02/1986, 3/05/1986 a 12/12/1986, 09/01/1987 a 07/02/1987, 8/03/1987 a 12/12/1987, 04/01/1988 a 19/03/1988, 02/04/1988 a 30/09/1988, 19/01/1989 a 25/11/1989, 02/02/1990 a 30/11/1990, 04/02/1991 a 06/12/1991, 06/01/1992 a 17/12/1992, 04/01/1993 a 14/08/1993, 19/03/1994 a 28/04/1995.

b) Períodos especiais reconhecidos pelo juízo de primeiro grau9/04/95 a 09/10/1996, 04/03/1997 a 10/06/1997, 14/05/1997 a 25/11/1997, 26/01/1998 a 30/11/1999, 04/05/2000 a 18/05/2000, 29/01/2001 a 13/12/2002, 15/04/2002 a 25/11/2003, 22/03/2004 a 03/05/2004, 06/05/2004 a 30/12/2004, 02/02/2005 a 22/12/2005, 02/05/2006 a 22/11/2006, 08/03/2007 a 26/12/2009, 12/04/2010 a 22/01/2011, 10/02/2011 a 04/09/2018.

c) Períodos reconhecidos pelo juízo, mas afastados neste momento processual04/03/1997 a 10/06/1997; 14/05/1997 a 25/11/1997; 12/04/2010 a 22/01/2011.

 

QUADRO CONTRIBUTIVO

Data de Nascimento 22/08/1963
Sexo Masculino
DER 04/09/2018

Tempo especial

 

Nome / Anotações Início Fim Fator Tempo Carência
1 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. (AVRC-DEF) 01/08/1979 13/12/1979 Especial 25 anos 0 anos, 4 meses e 13 dias 5
2 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. 02/01/1980 13/12/1980 Especial 25 anos 0 anos, 11 meses e 12 dias 12
5 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. 19/11/1981 15/12/1982 Especial 25 anos 1 ano, 0 meses e 27 dias 14
6 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. 16/12/1982 12/05/1983 Especial 25 anos 0 anos, 4 meses e 27 dias 5
7 MAGNAL EMPREITADAS RURAIS LTDA (AVRC-DEF) 03/06/1983 09/12/1983 Especial 25 anos 0 anos, 6 meses e 7 dias 7
8 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. 19/01/1984 04/01/1985 Especial 25 anos 0 anos, 11 meses e 16 dias 13
9 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. 07/01/1985 20/02/1986 Especial 25 anos 1 ano, 1 mês e 14 dias 13
10 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. (AVRC-DEF) 03/05/1986 12/12/1986 Especial 25 anos 0 anos, 7 meses e 10 dias 8
11 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. (AVRC-DEF) 09/01/1987 07/02/1987 Especial 25 anos 0 anos, 0 meses e 29 dias 2
12 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. 18/03/1987 12/12/1987 Especial 25 anos 0 anos, 8 meses e 25 dias 10
13 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. (AVRC-DEF) 04/01/1988 19/03/1988 Especial 25 anos 0 anos, 2 meses e 16 dias 3
14 TINE-TRANSPORTE E SERVICOS RURAIS LTDA. 02/04/1988 30/09/1988 Especial 25 anos 0 anos, 5 meses e 29 dias 6
15 NIT:CPF:JOSE FORTUNATO TAVARES OLIMPIA FERNANDES TAVARES CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. (16/01/2025 17:36:39) 19/01/1989 25/11/1989 Especial 25 anos 0 anos, 10 meses e 7 dias 11
16 COUTINHO TRANSP DE CARGAS E EMP RURAIS S/C LTDA 02/02/1990 30/11/1990 Especial 25 anos 0 anos, 9 meses e 29 dias 10
17 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. 04/02/1991 06/12/1991 Especial 25 anos 0 anos, 10 meses e 3 dias 11
18 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. 06/01/1992 17/12/1992 Especial 25 anos 0 anos, 11 meses e 12 dias 12
19 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. (AEXT-VT) 04/01/1993 14/08/1993 Especial 25 anos 0 anos, 7 meses e 11 dias 8
20 CASE - COMERCIAL AGROINDUSTRIAL SERTAOZINHO LTDA. (AVRC-DEF) 19/03/1994 09/10/1996 Especial 25 anos 2 anos, 6 meses e 21 dias 32
23 AGROPECUARIA PIRATININGA S/A 26/01/1998 30/11/1999 Especial 25 anos 1 ano, 10 meses e 5 dias 23
24 AGROPECUARIA PIRATININGA S/A 04/05/2000 18/05/2000 Especial 25 anos 0 anos, 0 meses e 15 dias 1
25 AGROPECUARIA PIRATININGA S/A (AVRC-DEF) 29/01/2001 13/12/2001 Especial 25 anos 0 anos, 10 meses e 15 dias 12
27 TEREOS ACUCAR E ENERGIA ANDRADE S.A. 15/04/2002 25/11/2003 Especial 25 anos 1 ano, 7 meses e 11 dias 20
28 NOVAERA SERVICOS AGRICOLAS, INDUSTRIAIS E TRANSPORTES LTDA 22/03/2004 03/05/2004 Especial 25 anos 0 anos, 1 mês e 12 dias 3
29 TEREOS ACUCAR E ENERGIA ANDRADE S.A. 06/05/2004 30/12/2004 Especial 25 anos 0 anos, 7 meses e 25 dias 7
30 TEREOS ACUCAR E ENERGIA ANDRADE S.A. (AVRC-DEF) 02/02/2005 22/12/2005 Especial 25 anos 0 anos, 10 meses e 21 dias 11
31 TEREOS ACUCAR E ENERGIA ANDRADE S.A. 02/05/2006 22/11/2006 Especial 25 anos 0 anos, 6 meses e 21 dias 7
32 TEREOS ACUCAR E ENERGIA ANDRADE S.A. 08/03/2007 26/12/2009 Especial 25 anos 2 anos, 9 meses e 19 dias 34
34 NIT:CPF:JOSE FORTUNATO TAVARES OLIMPIA FERNANDES TAVARES CFM CANA LTDA. (16/01/2025 17:36:39IVIN-PROC-TRAB,IREM-INDPEND) 10/02/2011 04/09/2018 Especial 25 anos 7 anos, 6 meses e 25 dias 92
35 AGROPECUÁRIA CFM LTDA 10/02/2011 28/08/2016 Especial 25 anos 0 anos, 0 meses e 0 dias
Ajustada concomitância
0

Tempo comum

 

Nome / Anotações Início Fim Fator Tempo Carência
3 AGRO PECUARIA CFM LTDA (AVRC-DEF) 27/01/1981 30/04/1981 1.00 0 anos, 3 meses e 4 dias 4
4 COUTINHO TRANSP DE CARGAS E EMP RURAIS S/C LTDA (AVRC-DEF) 26/05/1981 06/10/1981 1.00 0 anos, 4 meses e 11 dias 6
21 WALDEMAR TONIELLO 04/03/1997 10/06/1997 1.00 0 anos, 3 meses e 7 dias 4
22 AGROPECUARIA ANEL VIARIO LTDA 14/05/1997 25/11/1997 1.00 0 anos, 5 meses e 15 dias
Ajustada concomitância
5
26 AGROPECUARIA PIRATININGA S/A 15/04/2002 31/12/2002 1.00 0 anos, 0 meses e 0 dias
Ajustada concomitância
0
33 PEDRO THOME FRANCISCO DOS REIS (AEXT-VT IREM-INDPEND) 12/04/2010 22/01/2011 1.00 0 anos, 9 meses e 11 dias 10
36 NIT:CPF:JOSE FORTUNATO TAVARES OLIMPIA FERNANDES TAVARES CFM CANA LTDA. (16/01/2025 17:36:39IVIN-PROC-TRAB,IREM-INDPEND) 05/09/2018 31/01/2021 1.00 2 anos, 4 meses e 26 dias
Período posterior à DER
28
37 USINA BELA VISTA S/A (IREM-INDPEND) 01/02/2021 13/11/2024 1.00 3 anos, 10 meses e 0 dias
Período posterior à DER
46

 

Marco Temporal Tempo especial Tempo total (especial + comum s/ conversão) para fins de pontos Carência Idade Pontos (art. 21 da EC nº 103/19)
Até a DER (04/09/2018) 31 anos, 1 mês e 27 dias Inaplicável 421 55 anos, 0 meses e 12 dias Inaplicável
Até a data da Reforma - EC nº 103/19 (13/11/2019) 31 anos, 1 mês e 27 dias Inaplicável 435 56 anos, 2 meses e 21 dias Inaplicável
Até Lei nº 14.331/2022 (04/05/2022) 31 anos, 1 mês e 27 dias 36 anos, 11 meses e 15 dias 465 58 anos, 8 meses e 12 dias 95.6583
Até a data de hoje (30/01/2025) 31 anos, 1 mês e 27 dias 39 anos, 6 meses e 11 dias 495 61 anos, 5 meses e 8 dias 100.9694

- Aposentadoria especial

Em 04/09/2018 (DER), o segurado tem direito à aposentadoria especial (Lei 8.213/91, art. 57), porque cumpre o tempo mínimo de 25 anos sujeito a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com o art. 29, II, da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.876/99 (média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, sem incidência do fator previdenciário, e multiplicado pelo coeficiente de 100%).

Em 13/11/2019 (data da Reforma - EC nº 103/19), o segurado tem direito à aposentadoria especial (Lei 8.213/91, art. 57), porque cumpre o tempo mínimo de 25 anos sujeito a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com o art. 29, II, da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.876/99 (média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, sem incidência do fator previdenciário, e multiplicado pelo coeficiente de 100%).

Em 04/05/2022 (Lei nº 14.331/2022), o segurado tem direito à aposentadoria especial conforme art. 21 das regras de transição da EC 103/19, porque cumpre a carência de 180 contribuições (Lei 8.213/91, art. 25, II), o tempo mínimo de efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde (25 anos) e a pontuação mínima (86 pontos, cf. art. 21 da EC nº 103/19). O cálculo do benefício deve ser feito conforme art. 26, §§ 2º e 5º da mesma Emenda Constitucional.

Em 30/01/2025 (data de hoje), o segurado tem direito à aposentadoria especial conforme art. 21 das regras de transição da EC 103/19, porque cumpre a carência de 180 contribuições (Lei 8.213/91, art. 25, II), o tempo mínimo de efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde (25 anos) e a pontuação mínima (86 pontos, cf. art. 21 da EC nº 103/19). O cálculo do benefício deve ser feito conforme art. 26, §§ 2º e 5º da mesma Emenda Constitucional.

Considerando o tempo reconhecido pelo INSS e o tempo de atividade especial reconhecido judicialmente, verifica-se, de plano, que o autor  atingiu o limite mínimo necessário para aposentadoria por especial, consoante planilha ora elaborada, e contabilizou 31 anos, 1 mês e 27 dias, devendo o benefício previdenciário pretendido ser deferido neste momento processual.

DO TERMO INICIAL

Fixo o termo inicial do benefício em 04/09/2018, data de entrada do requerimento administrativo.

JUROS E CORREÇÃO

Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios adotados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução. Vale ressaltar que o referido manual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual.

Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor das prestações vencidas até a data deste julgamento, nos termos do entendimento das Turmas componentes da 3ª Seção desta Corte.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso do INSS para afastar da condenação a especialidade dos períodos reconhecidos pelo juízo, de 04/03/1997 a 10/06/1997, de 14/05/1997 a 25/11/1997, e de 12/04/2010 a 22/01/2011; e dou provimento ao recurso do autor para reconhecer a natureza especial das atividades desempenhadas nos períodos de 01/08/1979 a 13/12/1979, 02/01/1980 a 13/12/1980, 19/11/1981 a 15/12/1982, 16/12/1982 a 12/05/1983, 03/06/1983 a 09/12/1983, 19/01/1984 a 04/01/1985, 07/01/1985 a 20/02/1986, 3/05/1986 a 12/12/1986, 09/01/1987 a 07/02/1987, 8/03/1987 a 12/12/1987, 04/01/1988 a 19/03/1988, 02/04/1988 a 30/09/1988, 19/01/1989 a 25/11/1989, 02/02/1990 a 30/11/1990, 04/02/1991 a 06/12/1991, 06/01/1992 a 17/12/1992, 04/01/1993 a 14/08/1993, 19/03/1994 a 28/04/1995, os quais, juntamente com os períodos reconhecidos pelo juízo de primeiro grau, 9/04/95 a 09/10/1996, 26/01/1998 a 30/11/1999, 04/05/2000 a 18/05/2000, 29/01/2001 a 13/12/2002, 15/04/2002 a 25/11/2003, 22/03/2004 a 03/05/2004, 06/05/2004 a 30/12/2004, 02/02/2005 a 22/12/2005, 02/05/2006 a 22/11/2006, 08/03/2007 a 26/12/2009, 10/02/2011 a 04/09/2018, deverão ser anotados nos registros previdenciários competentes, e conceder o benefício de aposentadoria especial, a contar de 04/09/2018, data de entrada do requerimento administrativo, tudo acrescido de correção monetária e juros de mora, bem como de honorários advocatícios.

É O VOTO.

 

 

 

 



E M E N T A

PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. ATIVIDADE CANAVIEIRA. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

I. CASO EM EXAME

Recursos interpostos pelo INSS e pelo segurado contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecimento da especialidade das atividades exercidas pelo autor como trabalhador rural em diversos períodos e determinou a conversão do tempo especial em comum. O INSS sustenta, dentre outros pontos, a nulidade da sentença por julgamento condicional, a ausência de interesse processual, a necessidade de suspensão do processo em razão de temas afetados ao STJ e a impossibilidade de reconhecimento da especialidade por falta de prova documental. O segurado pleiteia o reconhecimento da especialidade de períodos não reconhecidos na sentença, argumentando que sua exposição ao calor e a agentes químicos nocivos comprova a natureza especial do trabalho desempenhado.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

Há duas questões em discussão: (i) verificar a regularidade da sentença e a necessidade de suspensão do processo diante dos temas afetados ao STJ; (ii) definir se os períodos laborais indicados pelo autor podem ser reconhecidos como especiais para fins de concessão de aposentadoria especial.

III. RAZÕES DE DECIDIR

A sentença é nula em parte por configurar julgamento condicional ao determinar a concessão do benefício apenas caso o somatório do tempo de contribuição atingisse o mínimo exigido, em afronta ao art. 492 do CPC. No entanto, estando o processo em condições de julgamento, aplica-se o art. 1.013, § 3º, III, do CPC, para análise do mérito.

A suspensão do processo em razão do Tema 998/STJ é desnecessária, pois já houve trânsito em julgado reconhecendo a possibilidade de cômputo do período de incapacidade como tempo especial.

A ausência de formulário PPP no processo administrativo não impede o reconhecimento da atividade especial se há outros elementos probatórios nos autos, conforme entendimento consolidado pelo STJ.

A jurisprudência do STJ admite a flexibilização da análise do pedido previdenciário, permitindo a concessão de benefício diverso do requerido, desde que respeitados os limites do conjunto probatório.

A atividade do trabalhador na lavoura de cana-de-açúcar pode ser reconhecida como especial pela exposição habitual e permanente a agentes químicos (defensivos agrícolas, fuligem da queima da cana) e físicos (calor excessivo), conforme os Decretos nº 53.831/64, nº 83.080/79 e nº 3.048/99.

O tempo de serviço especial deve ser reconhecido para os períodos de 01/08/1979 a 28/04/1995, bem como para os períodos já reconhecidos na sentença de primeiro grau, pois há comprovação suficiente da exposição a agentes nocivos.

O benefício de aposentadoria especial é devido desde 04/09/2018, data do requerimento administrativo, com incidência de correção monetária e juros de mora conforme os critérios do Manual de Cálculos da Justiça Federal.

Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS, fixados em 10% sobre as prestações vencidas até a data do julgamento, nos termos do entendimento da Terceira Seção do TRF da 3ª Região.

IV. DISPOSITIVO E TESE

Recurso do INSS parcialmente provido para afastar a especialidade dos períodos de 04/03/1997 a 10/06/1997, 14/05/1997 a 25/11/1997 e 12/04/2010 a 22/01/2011. Recurso do autor provido para reconhecer a especialidade dos períodos de 01/08/1979 a 28/04/1995 e conceder o benefício de aposentadoria especial desde 04/09/2018.

Tese de julgamento:

A atividade na lavoura de cana-de-açúcar pode ser reconhecida como especial pela exposição habitual e permanente a agentes químicos e físicos nocivos, conforme legislação previdenciária.

A ausência de formulário PPP no processo administrativo não impede o reconhecimento da atividade especial se há outros meios de prova nos autos.

O reconhecimento de tempo especial deve considerar a legislação vigente à época da prestação do serviço, observando-se os decretos regulamentares aplicáveis.

O benefício de aposentadoria especial deve ser concedido desde a data do requerimento administrativo, se cumpridos os requisitos na DER.

* * * 

Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 201, §1º; Lei 8.213/91, arts. 57 e 58; CPC/2015, arts. 492 e 1.013, § 3º; Decreto 3.048/99, arts. 70 e 264; Decretos nº 53.831/64, nº 83.080/79 e nº 2.172/97.

Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 664.335; STJ, Tema 998, REsp 1.398.260/PR (Tema 694); TRF3, ApCiv 0033407-89.2016.4.03.9999, Rel. Des. Paulo Sergio Domingues, j. 04/02/2020.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso do INSS para afastar da condenação a especialidade dos períodos reconhecidos pelo juízo, de 04/03/1997 a 10/06/1997, de 14/05/1997 a 25/11/1997, e de 12/04/2010 a 22/01/2011; e dar provimento ao recurso do autor para reconhecer a natureza especial das atividades desempenhadas nos períodos de 01/08/1979 a 13/12/1979, 02/01/1980 a 13/12/1980, 19/11/1981 a 15/12/1982, 16/12/1982 a 12/05/1983, 03/06/1983 a 09/12/1983, 19/01/1984 a 04/01/1985, 07/01/1985 a 20/02/1986, 3/05/1986 a 12/12/1986, 09/01/1987 a 07/02/1987, 8/03/1987 a 12/12/1987, 04/01/1988 a 19/03/1988, 02/04/1988 a 30/09/1988, 19/01/1989 a 25/11/1989, 02/02/1990 a 30/11/1990, 04/02/1991 a 06/12/1991, 06/01/1992 a 17/12/1992, 04/01/1993 a 14/08/1993, 19/03/1994 a 28/04/1995, os quais, juntamente com os períodos reconhecidos pelo juízo de primeiro grau, 9/04/95 a 09/10/1996, 26/01/1998 a 30/11/1999, 04/05/2000 a 18/05/2000, 29/01/2001 a 13/12/2002, 15/04/2002 a 25/11/2003, 22/03/2004 a 03/05/2004, 06/05/2004 a 30/12/2004, 02/02/2005 a 22/12/2005, 02/05/2006 a 22/11/2006, 08/03/2007 a 26/12/2009, 10/02/2011 a 04/09/2018, deverão ser anotados nos registros previdenciários competentes, e conceder o benefício de aposentadoria especial, a contar de 04/09/2018, data de entrada do requerimento administrativo, tudo acrescido de correção monetária e juros de mora, bem como de honorários advocatícios, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
INES VIRGINIA
DESEMBARGADORA FEDERAL