Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5268431-70.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: AGOSTINHO BENTO DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: EDSON RENEE DE PAULA - SP222142-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, AGOSTINHO BENTO DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: EDSON RENEE DE PAULA - SP222142-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 

 

 

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5268431-70.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: AGOSTINHO BENTO DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: EDSON RENEE DE PAULA - SP222142-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, AGOSTINHO BENTO DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: EDSON RENEE DE PAULA - SP222142-N

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): 

 

Trata-se de apelações interpostas em face de sentença proferida nos seguintes termos:

 

Pelo exposto, com relação ao pedido de reconhecimento de trabalho rural com registro em CTPS no período de 1.11.1985 a 9.4.1988, julgo extinto o feito sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil e, quanto aos demais pedidos, julgo parcialmente procedentes para declarar comprovado o tempo trabalhado pelo autor em condições especiais nos períodos de 29.4.1995 a 21.11.1996 e 2.1.1997 a 5.3.1997, que deverá ser convertido em tempo comum, determinando a sua averbação perante o RGPS, procedendo à revisão da RMI do benefício do autor, se for o caso e, tendo em vista o reconhecimento, pelo réu, do período de 1.11.1985 a 9.4.1988, condeno-o a pagar ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do primeiro requerimento administrativo (30.8.2016), com a aplicação de atualização monetária e juros.

As parcelas atrasadas deverão ser pagas de uma única vez. No caso em comento, como a condenação imposta ao ente estatal não é de natureza tributária, os juros moratórios devem ser calculados com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos da regra do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação da Lei nº 11.960/09, a partir da data da citação. Já a correção monetária, por força da declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º, da Lei nº 11.960/09, e com base nas teses firmadas no julgamento do RE nº 870.947, deverá ser calculada com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC, de acordo com o estabelecido no artigo 41-A, da Lei nº 8.213/91, desde o vencimento de cada parcela.

Em consequência, declaro extinta a fase cognitiva do feito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Ante a sucumbência recíproca, nos termos artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil, fixo os honorários em 10% sobre o valor da condenação para o advogado de cada parte, devendo incidir apenas sobre as prestações vencidas até a data da prolação desta sentença (Súmula 111 do STJ).

Com relação ao autor, observem-se as disposições contidas no § 3º do artigo 98, do Código de Processo Civil. Com o trânsito em julgado da sentença, encaminhem-se os autos o INSS para que cumpra a presente decisão.

Embora ilíquida a sentença, de pronto já se constata que não ultrapassa o limite legal, de modo que não é o caso de reexame necessário, nos termos do artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil.

 

Sustenta a parte autora Agostinho Bento dos Santos, em síntese, que o juízo de primeiro grau deveria ter condenado o INSS a contabilizar o período de 01.11.1985 a 09.04.1988, pois a decisão, da forma como proferida, limitaria o poder executório do título; que o caso é de reconhecimento tácito do pedido e não de perda do objeto com extinção sem julgamento do mérito. Aduz, quanto aos períodos não reconhecidos como especiais, que deveria ser adotada a técnica de inversão do ônus da prova; falta de contemporaneidade das informações constantes no PPRA que fundamenta o PPP; ausência de lisura das informações prestadas pelas empresas empregadoras no PPP. Alega ainda enquadramento por categoria profissional da atividade de tratorista exercida no período de 20.01.1982 a 30.09.1985; que o laudo de perícia técnica judicial concluiu pela exposição a agentes físicos e químicos. Quanto ao período de 03.01.1997 a 30.08.2016, requer que o documento “Manual do Operador e Certificado de Garantia do Trator Valtra BM 110 do ano 2016”, ora juntado em sede recursal, seja “tomado como paradigma para valoração do formulário PPP e do Laudo Pericial constituído em Juízo, resguardando sua juntada posterior, a total boa-fé processual”. Aduz inafastabilidade do laudo pericial em razão da garantia ao direito de contraditório e de ampla defesa; alega que o laudo pericial constituído nos autos é hábil a desconstituir os formulários PPP fornecidos pelas empresas. Sustenta que a vigência do limite de tolerância de 90 dB(A) estabelecido para o agente ruído no Código 2.0.1 do Anexo IV ao Decreto 2.172/97 deve ser validada apenas para o intervalo de 06.03.1997 a 10.12.1998, véspera da entrada em vigor da Lei n. 9.732/98; por fim aduzindo que o uso de EPI não descaracteriza labor sob condições especiais com sujeição a ruído.

Por sua vez, recorre o INSS, alegando, em síntese, que a atividade profissional sujeita a ruído deve ser comprovada através de laudo pericial contemporâneo, o que não teria ocorrido na hipótese dos autos; que há indicação de existência de EPI eficaz e que a prévia existência de uma fonte de custeio é requisito indispensável para a previsão de qualquer benefício, inclusive da aposentadoria especial. Aduz, por fim, que a parte autora não preenche os requisitos legais para concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.

Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos.

É o relatório.

 

 

 

 


 

 

 

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5268431-70.2020.4.03.9999

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V O T O

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): 

REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO/PROGRAMADA

Como é sabido, após a EC 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço cedeu lugar à aposentadoria por tempo de contribuição.

Em resumo, antes de 16/12/1998 (data da vigência da Emenda 20), bastava o segurado comprovar 30 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 35 anos, se homem, para concessão da aposentadoria integral; ou 25 anos, se mulher, e 30 anos, se homem, para concessão da aposentadoria proporcional.

Após a EC 20/98, o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como tempo de contribuição, passando a ser necessário comprovar 35 anos de tempo contributivo, se homem, e 30 anos, se mulher, além da carência correspondente a 180 contribuições mensais (art. 25, inciso II, c/c art. 142, ambos da Lei 8.213/1991), deixando de existir a aposentadoria proporcional. Esta última, no entanto, foi assegurada aos já filiados antes do advento da Emenda, mediante os seguintes requisitos: 53 anos de idade e 30 anos de tempo de serviço, se homem; ou 48 anos de idade e 25 anos de tempo de serviço, se mulher; bem como o adicional de 40%  sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional.

A EC 103/2019, vigente a partir de 13/11/2019, por sua vez, extinguiu a aposentadoria por tempo de contribuição, estabelecendo a aposentadoria programada, com exigência de novos requisitos: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores rurais e segurados especiais (art.  201, § 7º, da Constituição Federal).

Restou assegurado, também, no artigo 3º da nova Emenda Constitucional,  o direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que tivessem preenchido as condições em data anterior a sua vigência (13/11/2019),  os quais podem pedir benefício a qualquer tempo (art. 3º da EC), garantindo-se cálculo e reajuste com base na legislação vigente à época em que foram cumpridos os requisitos (art. 3º, §§ 1º e 2º, da EC).

Além disso, restaram estabelecidas 04 (quatro) regras de transição para àqueles que já eram filiados ao RGPS e ainda não tinham implementado os requisitos até 13/11/2019, a saber (arts. 15, 16, 17 e 20 da EC 103/2019): a) sistema de pontos, idade e tempo de contribuição;  b)tempo de contribuição e idade mínima; c) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator previdenciário, sem o requisito da idade; d)  tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade mínima.

 

DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.

Em linhas gerais, até o advento da EC 103/2019, a aposentadoria especial era devida após 180 contribuições, para os trabalhadores expostos a condições prejudiciais à saúde por 15, 20 ou 25 anos.

Até 28.04.1995, a especialidade poderia ser reconhecida sem comprovação da exposição, desde que a atividade estivesse enquadrada nos decretos n° 53.831/64 ou n° 83.080/1979, sendo possível e desejável o uso de analogia, para considerar a inserção de determinada categoria profissional, aproximando os diversos grupos de trabalhadores que se enquadrem em atividades assemelhadas, a fim de evitar situações injustas, acarretando sua não aplicação.

Após 28.04.1995, com o advento da Lei 9.032/1995, o segurado passou a ter que comprovar a exposição permanente a agentes prejudiciais à saúde, de forma permanente, não ocasional nem intermitente; entendendo-se como permanente, o trabalho em que a exposição ao agente nocivo é indissociável da produção ou serviço.

As condições especiais de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico. Todavia, consoante entendimento já sufragado por esta Turma, por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.

O artigo 58 da Lei 8.213/91 dispõe que cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares consideradas exemplificativas (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC), de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Assim, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial.

A partir de 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário aos segurados expostos a agentes nocivos, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.

Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência reconhece como especial o trabalho que assim era considerado pela legislação em vigor na época (Recurso Especial nº 1.398.260/PR – Tema 694/STJ).

A conversão do tempo de trabalho deve seguir a legislação vigente no momento do requerimento administrativo (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).

Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela dos multiplicadores prevista no artigo 70, do Decreto 3.048/99.

A EC 103/2019, por sua vez, proibiu a conversão do tempo especial em comum para atividades após 13/11/2019, não sendo o art. 57, § 5º,  da lei 8.213/91, recepcionado pela reforma constitucional (art. 201, §14, da CF e art. 25, caput, e §2º da referida Emenda).

No tocante ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI,  o E. STF assentou a tese de que não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, situação que não se aplica ao agente nocivo ruído (ARE 664335).

 

 

DO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO - PPP

O artigo 58, da Lei nº 8.213/91, dispõe sobre os agentes nocivos que autorizam o reconhecimento do labor especial, bem assim da comprovação à respectiva exposição.

A inteligência de tal dispositivo revela o seguinte: (i) a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita por meio do PPP; (ii) o PPP deve ser emitido pela empresa, na forma estabelecida pelo INSS, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho; (iii) o empregador deve manter atualizado o PPP abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a cópia desse documento; (iv) a empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista em lei.

Verifica-se que a legislação de regência estabelece que a empresa empregadora deve garantir a veracidade das declarações prestadas nos formulários de informações e laudos periciais, sob pena de sujeição à penalidade prevista no artigo 133 da referida lei, bem como de ser responsabilizada criminalmente, nos termos do artigo 299, do Código Penal. Além disso, o sistema jurídico confere ao Poder Público o poder de fiscalizar o empregador no que tange à elaboração, manutenção e atualização do PPP.

Por isso, presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário, seja porque ele não é responsável pela elaboração do documento, seja porque cabe ao Poder Público fiscalizar a elaboração do PPP pelas empresas.

O Egrégio STJ fixou tese repetitiva no sentido acima expendido no julgamento da Petição nº 10.262/RS, de 08/02/2017.

 

DO EPI EFICAZ OU NEUTRALIZADOR

Consoante já destacado, no julgamento do ARE 664335, pelo  E. STF, apresentando o segurado um PPP que indique sua exposição a um agente nocivo, e inexistindo prova de que o EPI eventualmente fornecido ao trabalhador era efetivamente capaz de neutralizar a nocividade do ambiente laborativo, a configurar uma dúvida razoável no particular, deve-se reconhecer o labor como especial.

Nesse ponto, convém observar que o fato de o PPP consignar que o EPI é eficaz não significa que ele seja capaz de neutralizar a nocividade, tal como exigido pelo E. STF para afastar a especialidade do labor.

Conforme se infere do Anexo XV, da Instrução Normativa 11/2006, do INSS, o campo 15.7 do PPP deve ser preenchido com "S - Sim; N - Não, considerando se houve ou não a atenuação, com base no informado nos itens 15.2 a 15.5, observado o disposto na NR-06 do TEM, observada a observância: [...]".

Portanto, quando o PPP consigna que o EPI era eficaz, tal eficácia diz respeito à sua aptidão de atenuar ou reduzir os efeitos do agente nocivo. Isso não significa, contudo, que o EPI era "realmente capaz de neutralizar a nocividade". A dúvida, nesse caso, beneficia o trabalhador.

Noutras palavras, o fato de o PPP consignar que o EPI era "eficaz" (para atenuar os efeitos do agente nocivo) não significa que tal equipamento era capaz de "neutralizar a nocividade". Logo, não se pode, com base nisso, afastar a especialidade do labor, até porque, nos termos do artigo 264 § 5º, do RPS, "sempre que julgar necessário, o INSS poderá solicitar documentos para confirmar ou complementar as informações contidas no PPP, de acordo com § 7º do art. 68 e inciso III do art. 225, ambos do RPS".  (Precedente: (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5009711-60.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 28/06/2023, Intimação via sistema DATA: 29/06/2023)

 

DO AGENTE NOCIVO RUÍDO

A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas alterações.

Até a edição do Decreto 2.171/1997 (06.03.1997), considerava-se especial a atividade exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis.

Considerando tal evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -, reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.

O C. STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).

O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".

A Corte Suprema assim decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares.

Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.

 

DO CASO CONCRETO

Na petição inicial, postula a parte autora o cômputo de trabalho rural com anotação em CTPS no período de 1.11.1985 a 9.4.1988, o reconhecimento de exercício de atividade especial nos períodos de 20.1.1982 a 30.9.1985, 29.4.1995 a 21.11.1996 e de 2.1.1997 a 30.8.2016, com a respectiva conversão para o tempo comum, assim como a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER, em 30.08.2016.

A r. sentença julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 485, IV, do CPC, com relação ao pedido de reconhecimento de trabalho rural com registro em CTPS no período de 1.11.1985 a 9.4.1988; e, quanto aos demais pedidos, julgou parcialmente procedentes para declarar comprovado o tempo trabalhado pelo autor em condições especiais nos períodos de 29.4.1995 a 21.11.1996 e 2.1.1997 a 5.3.1997, determinando sua conversão em tempo comum, sua averbação perante o RGPS, e revisão da RMI do benefício do autor, se for o caso e, tendo em vista o reconhecimento, pelo réu, do período de 1.11.1985 a 9.4.1988, condenou o réu a pagar ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do primeiro requerimento administrativo (30.8.2016), com a aplicação de atualização monetária e juros.

Pois bem.

No curso da presente ação, o INSS reconheceu administrativamente o período de labor rural pleiteado pelo autor, referente ao intervalo de 1.11.1985 a 9.4.1988. Esse reconhecimento administrativo configura reconhecimento tácito do pedido, nos termos do art. 487, III, "a", do CPC.

O autor possui interesse jurídico na obtenção de decisão judicial que consolide o direito ao referido período, garantindo-lhe segurança jurídica e estabilidade pela coisa julgada. Ademais, não cabe a extinção sem julgamento de mérito por perda de objeto, visto que a hipótese é de reconhecimento do pedido, o que exige julgamento de procedência com resolução de mérito.

Assim, a controvérsia quanto ao período de labor rural já reconhecido administrativamente deve ser resolvida mediante julgamento de procedência do pedido em questão, declarando o direito do autor à averbação do período para fins previdenciários.

 

Quanto ao período de 20.1.1982 a 30.9.1985, consta na cópia da CTPS (fl. 47) vínculo rural no cargo de tratorista.

A atividade de motorista de caminhão de cargas e de motorista de ônibus era enquadrada nos Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79. Existia a presunção absoluta de exposição aos agentes nocivos relacionadas nos mencionados anexos. Contudo, a presunção de insalubridade só perduraria até a edição da Lei nº 9.032/95, que passou a exigir a comprovação do exercício da atividade por meio dos formulários de informações sobre atividades com exposição a agentes nocivos ou outros meios de provas. No mais, no caso de motorista de veículos leves, não fica configurado o tempo especial, por ausência de presunção legal.

Dessa forma, até 28/04/1995 também era possível reconhecer a atividade de tratorista como especial por enquadramento profissional, tendo em vista a equiparação com a função de motorista de caminhão, nos Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79.

Isso estabelecido, reformo a sentença para reconhecer labor sob condições especiais no período de 20.1.1982 a 30.9.1985.

 

Quanto aos períodos de 29.4.1995 a 21.11.1996 e de 2.1.1997 a 30.8.2016, extrai-se da cópia da CTPS vínculo com a empresa Santa Luiza Agropecuária Ltda (fl. 100).

A fim de comprovar pretendida especialidade, foi apresentado o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), que indicou intensidade de ruído superior a 90 dB(A), no período de 29.4.1995 a 21.11.1996, e ruído de 82,6 dB(A), no período de 02.01.1997 a “atual”, com base no Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA).

Contudo, o PPP carece de assinatura do representante legal da empresa e data de emissão, o que compromete sua autenticidade, nos termos do art. 272 da IN INSS/PRES nº 128/2022. Além disso, o PPRA, base do PPP, possui natureza preventiva e não é destinado à caracterização de condições para fins previdenciários, o que enfraquece a confiabilidade do documento para fins de comprovação técnica da exposição ao agente nocivo.

Por outro lado, o laudo técnico pericial judicial (fls. 180-200) constatou que as atividades do autor na função de operador de máquina (trator) implicavam exposição a ruído em intensidade de 91,2 dB (A) - superior àquela indicada no PPP - e confirmou que as condições atuais do local de trabalho refletem aquelas existentes à época do vínculo empregatício do segurado. Trata-se de prova robusta, imparcial e tecnicamente fundamentada, que prevalece sobre o PPP, especialmente diante de suas falhas formais e materiais.

Diante disso, reconheço como prevalente o laudo técnico pericial judicial, com manutenção do reconhecimento da especialidade do período de 29.4.1995 a 21.11.1996 e determinação de averbação, como labor especial, também do intervalo de 2.1.1997 a 30.8.2016.

 

DO LAUDO EXTEMPORÂNEO

Nesse passo, anoto que o laudo técnico não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços. ( Precedentes desta Corte: 7ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5008396-32.2018.4.03.6109, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 06/06/2023, DJEN DATA: 12/06/2023; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002962-34.2018.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 09/05/2023, Intimação via sistema DATA: 11/05/2023; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002059-62.2019.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 30/03/2023, Intimação via sistema DATA: 03/04/2023)

Na mesma linha, temos a Súmula nº 68, da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, publicada no dia Diário Oficial da União aos 24/09/2012, cujo enunciado é o seguinte:

"O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado."

 

DA AUSÊNCIA DA PRÉVIA FONTE DE CUSTEIO

Não há como se sonegar o direito do segurado de averbação do labor em condições especiais sob o argumento de ausência de prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuído ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.

Ademais, nesse particular, restou consignado no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, em sede de Repercussão Geral, que a ausência de prévia fonte de custeio não prejudica o direito dos segurados à aposentadoria especial, em razão de não haver ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, eis que o art. 195, § 5º, da Constituição Federal (que veda a criação, majoração ou a extensão de benefícios previdenciários sem a correspondente fonte de custeio), contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se trata de benefício criado diretamente pela própria constituição, como é o caso da aposentadoria especial.

 

CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

TEMPO DE SERVIÇO COMUM (com conversões)

 

Considerando os períodos especiais reconhecidos administrativamente pelo INSS e nesta demanda, verifico que a parte autora, na data do requerimento administrativo do benefício, em 30.08.2016, possuía 45 anos, 8 meses e 8 dias de tempo de serviço comum, consoante tabela abaixo, fazendo jus, assim, à concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição:

 

 

Data de Nascimento

03/05/1959

Sexo

Masculino

DER

30/08/2016

 

Nome / Anotações

Início

Fim

Fator

Tempo

Carência

1

João Bessame

20/01/1982

30/09/1985

1.40
Especial

3 anos, 8 meses e 11 dias
+ 1 ano, 5 meses e 22 dias
= 5 anos, 2 meses e 3 dias

45

2

João Bessame

01/11/1985

09/04/1988

1.00

2 anos, 5 meses e 9 dias

30

3

EMPRESÁRIO / EMPREGADOR

01/02/1988

31/05/1989

1.00

1 ano, 1 mês e 21 dias
Ajustada concomitância

13

4

USINA CATANDUVA S.A. ACUCAR E ALCOOL EM RECUPERACAO JUDICIAL

20/06/1988

29/10/1988

1.00

0 anos, 0 meses e 0 dias
Ajustada concomitância

0

5

EMPRESÁRIO / EMPREGADOR

01/07/1989

30/11/1989

1.00

0 anos, 5 meses e 0 dias

5

6

CITROSUCO AGRICOLA LIMITADA

21/08/1989

31/12/1989

1.00

0 anos, 1 mês e 0 dias
Ajustada concomitância

1

7

EMPRESÁRIO / EMPREGADOR

01/01/1990

31/05/1990

1.00

0 anos, 5 meses e 0 dias

5

8

EMPRESÁRIO / EMPREGADOR

01/07/1990

30/04/1992

1.00

1 ano, 1 mês e 24 dias
Ajustada concomitância

13

9

(INSS)SANTA LUIZA AGRO PECUARIA LTDA

01/09/1990

11/01/1991

1.40
Especial

0 anos, 4 meses e 11 dias
+ 0 anos, 1 mês e 22 dias
= 0 anos, 6 meses e 3 dias

5

10

SANTA LUIZA AGRO PECUARIA LTDA

01/07/1991

25/12/1991

1.00

0 anos, 0 meses e 0 dias
Ajustada concomitância

0

11

(INSS)SANTA LUIZA AGRO PECUARIA LTDA

06/01/1992

28/04/1995

1.40
Especial

3 anos, 3 meses e 23 dias
+ 1 ano, 3 meses e 27 dias
= 4 anos, 7 meses e 20 dias

40

12

(sentença)SANTA LUIZA AGRO PECUARIA LTDA

29/04/1995

21/11/1996

1.40
Especial

1 ano, 6 meses e 23 dias
+ 0 anos, 7 meses e 15 dias
= 2 anos, 2 meses e 8 dias

19

13

(TRF3)SANTA LUIZA AGRO PECUARIA LTDA

02/01/1997

30/08/2016

1.40
Especial

19 anos, 7 meses e 29 dias
+ 7 anos, 10 meses e 11 dias
= 27 anos, 6 meses e 10 dias

236

14

SANTA LUIZA AGRO PECUARIA LTDA

31/08/2016

05/12/2018

1.00

2 anos, 3 meses e 5 dias
Período posterior à DER

28

15

31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO (NB 1098124232)

02/06/1998

15/08/2000

1.00

0 anos, 0 meses e 0 dias
Ajustada concomitância

0

16

31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO (NB 6051326530)

15/02/2014

31/03/2014

1.00

0 anos, 0 meses e 0 dias
Ajustada concomitância

0

17

31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO (NB 6087297840)

27/11/2014

14/12/2014

1.00

0 anos, 0 meses e 0 dias
Ajustada concomitância

0

18

91 - AUXILIO DOENCA POR ACIDENTE DO TRABALHO (NB 6138658624)

02/04/2016

31/07/2016

1.00

0 anos, 0 meses e 0 dias
Ajustada concomitância

0

 

Marco Temporal

Tempo de contribuição

Carência

Idade

Pontos (Lei 13.183/2015)

Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998)

20 anos, 10 meses e 25 dias

200

39 anos, 7 meses e 13 dias

inaplicável

Pedágio (EC 20/98)

3 anos, 7 meses e 20 dias

Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999)

22 anos, 2 meses e 23 dias

211

40 anos, 6 meses e 25 dias

inaplicável

Até a DER (30/08/2016)

45 anos, 8 meses e 8 dias

412

57 anos, 3 meses e 27 dias

103.0139

- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição

Em 16/12/1998 (EC 20/98), o segurado não tem direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não cumpre o tempo mínimo de serviço de 30 anos.

Em 28/11/1999 (Lei 9.876/99), o segurado não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional (regras de transição da EC 20/98), porque não preenche o tempo mínimo de contribuição de 30 anos, o pedágio de 3 anos, 7 meses e 20 dias (EC 20/98, art. 9°, § 1°, inc. I) e nem a idade mínima de 53 anos.

Em 30/08/2016 (DER), o segurado tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, garantido o direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, uma vez que a pontuação totalizada é superior a 95 pontos e o tempo mínimo de contribuição foi observado (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).

 

DO TERMO INICIAL

Considerando que a documentação necessária ao reconhecimento do direito ao benefício não foi apresentada no âmbito administrativo, mas apenas nesta demanda judicial, o termo inicial dos efeitos financeiros do benefício deverá ser fixado na fase de cumprimento de sentença, conforme entendimento que vier a ser consolidado pelo C. STJ no exame do tema 1.124.

 

JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA

Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios previstos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução.

Vale ressaltar que o referido manual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual.

Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.

 

DA VERBA HONORÁRIA

Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).

 

CONCLUSÃO

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso do INSS e DOU PROVIMENTO ao recurso da parte autora para declarar, com fundamento no art. 487, III, "a", do CPC, o direito do autor ao reconhecimento do período de labor rural compreendido entre 1.11.1985 a 9.4.1988, conforme já reconhecido administrativamente pelo INSS, com determinação de averbação do referido período para fins de cômputo na concessão do benefício pleiteado; reconhecer a especialidade dos períodos de 20.1.1982 a 30.9.1985 e de 2.1.1997 a 30.8.2016, devendo ser concedido ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição com termo inicial dos efeitos financeiros a ser fixado na fase de cumprimento de sentença, conforme entendimento que vier a ser consolidado pelo C. STJ no exame do tema 1.124, acrescidas as parcelas vencidas de juros e de correção monetária ora alterados DE OFÍCIO, ainda devendo o INSS arcar com o pagamento da verba honorária, nos termos expendidos no voto.

É o voto.

 

 /gabiv/...



E M E N T A

 

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL E ESPECIAL. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. APLICAÇÃO DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RECURSO DO INSS DESPROVIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1.    Apelações interpostas contra sentença que: (i) julgou extinto sem resolução de mérito o pedido de reconhecimento de tempo de serviço rural no período de 1.11.1985 a 9.4.1988, nos termos do artigo 485, IV, do CPC; (ii) julgou parcialmente procedentes os demais pedidos, reconhecendo como especial os períodos de 29.4.1995 a 21.11.1996 e de 2.1.1997 a 5.3.1997, com conversão para tempo comum e averbação junto ao RGPS; (iii) condenou o INSS ao pagamento de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER (30.8.2016), com atualização monetária e juros.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2.    Há cinco questões em discussão:

(i) verificar se o reconhecimento administrativo do tempo rural (1.11.1985 a 9.4.1988) configura reconhecimento tácito do pedido;

(ii) determinar se o período de 20.1.1982 a 30.9.1985 pode ser reconhecido como tempo especial por enquadramento profissional;

(iii) avaliar a validade de laudo técnico não contemporâneo para reconhecimento de tempo especial;

(iv) avaliar se o período de 2.1.1997 a 30.8.2016 deve ser reconhecido como especial considerando a exposição a ruído e a divergência entre o PPP e o laudo de perícia técnica judicial;

(v) determinar os critérios de correção monetária, juros de mora e verba honorária aplicáveis.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.    O reconhecimento administrativo do período de trabalho rural entre 1.11.1985 e 9.4.1988 caracteriza reconhecimento tácito do pedido, conforme o art. 487, III, "a", do CPC. Há interesse jurídico do autor em obter decisão judicial para consolidação do direito à averbação desse período, garantindo a coisa julgada e a segurança jurídica.

4.    O período de 20.1.1982 a 30.9.1985 deve ser reconhecido como tempo especial por enquadramento profissional da atividade de tratorista, equiparada à função de motorista de caminhão, conforme os Códigos 2.4.4 do Decreto nº 53.831/64 e 2.4.2 do Decreto nº 83.080/79.

5.    Hipótese em que o PPP juntado carece de assinatura do representante legal da empresa e data de emissão, o que compromete sua autenticidade, nos termos do art. 272 da IN INSS/PRES nº 128/2022. Além disso, o PPRA, base do PPP, possui natureza preventiva e não é destinado à caracterização de condições para fins previdenciários, o que enfraquece a confiabilidade do documento para fins de comprovação técnica da exposição ao agente nocivo.

6.    Por outro lado, o laudo técnico pericial judicial (fls. 180-200) constatou que as atividades do autor na função de operador de máquina (trator) implicavam exposição a ruído em intensidade de 91,2 dB (A) - superior àquela indicada no PPP - e confirmou que as condições atuais do local de trabalho refletem aquelas existentes à época do vínculo empregatício do segurado. Trata-se de prova robusta, imparcial e tecnicamente fundamentada, que prevalece sobre o PPP, especialmente diante de suas falhas formais e materiais. Especialidade do período de 2.1.1997 a 30.8.2016 reconhecida.

7.    O laudo técnico judicial, ainda que não contemporâneo ao período laborado, possui validade para comprovar exposição a agentes nocivos, pois reflete as condições do trabalho à época e é corroborado por precedentes desta Corte e pela Súmula nº 68 da TNU.

8.    A ausência de prévia fonte de custeio não pode ser imputada ao trabalhador, sendo este direito garantido por entendimento consolidado no STF (ARE nº 664.335/SC).

9.    Os juros de mora e a correção monetária devem ser calculados com base nos índices definidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, vigente à época da execução, garantindo uniformidade e conformidade com a jurisprudência.

10. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre as prestações vencidas até a data da sentença, conforme Súmula nº 111/STJ, com vencimento integral do INSS.

IV. DISPOSITIVO E TESE

9.    Recurso do INSS desprovido. Recurso da parte autora provido.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO ao recurso do INSS e DAR PROVIMENTO ao recurso da parte autora para declarar, com fundamento no art. 487, III, "a", do CPC, o direito do autor ao reconhecimento do período de labor rural compreendido entre 1.11.1985 a 9.4.1988, conforme já reconhecido administrativamente pelo INSS, com determinação de averbação do referido período para fins de cômputo na concessão do benefício pleiteado; reconhecer a especialidade dos períodos de 20.1.1982 a 30.9.1985 e de 2.1.1997 a 30.8.2016, devendo ser concedido ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição com termo inicial dos efeitos financeiros a ser fixado na fase de cumprimento de sentença, conforme entendimento que vier a ser consolidado pelo C. STJ no exame do tema 1.124, acrescidas as parcelas vencidas de juros e de correção monetária ora alterados DE OFÍCIO, ainda devendo o INSS arcar com o pagamento da verba honorária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
INES VIRGINIA
DESEMBARGADORA FEDERAL