APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5054271-19.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROBERTO APARECIDO COLACO DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: EDISON LIMA ANDRADE JUNIOR - SP261602-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5054271-19.2023.4.03.9999 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ROBERTO APARECIDO COLACO DE SOUZA Advogado do(a) APELADO: EDISON LIMA ANDRADE JUNIOR - SP261602-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator): Trata-se de ação destinada a viabilizar a concessão do seguro desemprego do pescador artesanal. A r. sentença (ID 270163145) julgou o pedido inicial procedente, nos seguintes termos: “Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, e condeno o requerido INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL a implementar o benefício do seguro-desemprego pescador profissional em favor da parte autora, relativo às competências de 2019/2020 (requerimento nº 1734579095), incluindo o pagamento das prestações vencidas, bem como ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por cada período de defeso em que a verba deixou de ser paga, com atualização a partir desta data e juros de mora desde o evento danoso (aqui considerados o mês inicial de cada período de defeso em que a verba não foi paga), observada a norma do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97. As parcelas em atraso, antes da entrada em vigor da EC 113/2021, serão atualizadas na forma do art. 1.º - F, da Lei n.º 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, sendo a correção monetária feita por meio dos índices da tabela IPCA-E, e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme tema 810, do STF. Sobre as parcelas em atraso após a entrada em vigor da EC 113/2021 (09/12/2021), haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), acumulado mensalmente desde o vencimento (art. 3º, EC 113/2021). Condeno o réu, ainda, ao pagamento das custas processuais, das quais não seja isento, e honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o montante da condenação. Sem reexame necessário uma vez que a condenação, à toda evidência, não ultrapassará 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, §3º, I do Código de Processo Civil).” Apelação do INSS (ID 270163150), na qual sustenta a impossibilidade de concessão do benefício pleiteado. Argumenta que “considerando que o autor possui fonte de renda diversa, não há como enquadrá-lo na condição específica de pescador artesanal, motivo pelo qual não é devida a concessão de seguro defeso”. Insurge-se, ainda, em relação à condenação ao pagamento de danos morais em razão do indeferimento do benefício. Subsidiariamente, requer a modificação dos critérios de incidência da correção monetária e dos juros moratórios. Contrarrazões (ID 270163159). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5054271-19.2023.4.03.9999 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ROBERTO APARECIDO COLACO DE SOUZA Advogado do(a) APELADO: EDISON LIMA ANDRADE JUNIOR - SP261602-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator): O seguro defeso é benefício previdenciário, cuja habilitação e concessão incumbem ao INSS, pago ao pescador artesanal que fica proibido de exercer a atividade pesqueira durante o período de defeso de alguma espécie, pelo prazo de até 5 meses. A Lei nº 10.779/2003 disciplina o seguro defeso e garante ao pescador artesanal o direito ao benefício, desde que cumpridos os requisitos legais. O artigo 1º da referida norma estabelece que o pescador artesanal que exerce sua atividade de forma ininterrupta, seja individualmente ou em regime de economia familiar, fará jus ao seguro-desemprego durante o período de defeso, nos seguintes termos: Art. 1º O pescador artesanal de que tratam a alínea “b” do inciso VII do art. 12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, e a alínea “b” do inciso VII do art. 11 da Lei n o 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que exerça sua atividade profissional ininterruptamente, de forma artesanal e individualmente ou em regime de economia familiar, fará jus ao benefício do seguro-desemprego, no valor de 1 (um) salário-mínimo mensal, durante o período de defeso de atividade pesqueira para a preservação da espécie. (...) § 1º Considera-se profissão habitual ou principal meio de vida a atividade exercida durante o período compreendido entre o defeso anterior e o em curso, ou nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do defeso em curso, o que for menor. (Redação dada pela Lei nº 13.134, de 2015) § 2º O período de defeso de atividade pesqueira é o fixado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em relação à espécie marinha, fluvial ou lacustre a cuja captura o pescador se dedique. § 3o Considera-se ininterrupta a atividade exercida durante o período compreendido entre o defeso anterior e o em curso, ou nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do defeso em curso, o que for menor. (Incluído dada pela Lei nº 13.134, de 2015) § 4o Somente terá direito ao seguro-desemprego o segurado especial pescador artesanal que não disponha de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira. (Incluído dada pela Lei nº 13.134, de 2015) § 5o O pescador profissional artesanal não fará jus, no mesmo ano, a mais de um benefício de seguro-desemprego decorrente de defesos relativos a espécies distintas. (Incluído dada pela Lei nº 13.134, de 2015) § 6o A concessão do benefício não será extensível às atividades de apoio à pesca nem aos familiares do pescador profissional que não satisfaçam os requisitos e as condições estabelecidos nesta Lei. (Incluído dada pela Lei nº 13.134, de 2015) § 7o O benefício do seguro-desemprego é pessoal e intransferível. (Incluído dada pela Lei nº 13.134, de 2015) § 8o O período de recebimento do benefício não poderá exceder o limite máximo variável de que trata o caput do art. 4o da Lei no 7.998, de 11 de janeiro de 1990, ressalvado o disposto nos §§ 4o e 5o do referido artigo. (Incluído dada pela Lei nº 13.134, de 2015) § 9º A concessão e a renovação do benefício de que trata o caput serão realizadas após checagem dos requisitos de elegibilidade em bases de dados dos órgãos e das entidades da administração pública federal, nos termos de ato do Poder Executivo. (Incluído pela Lei nº 14.973, de 2024) § 10. Ao requerente do benefício de que trata o caput será solicitado registro biométrico nos cadastros da Carteira de Identidade Nacional (CIN), do título eleitoral ou da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). (Incluído pela Lei nº 14.973, de 2024) Art. 2º Cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) receber e processar os requerimentos e habilitar os beneficiários, nos termos do regulamento. (...) § 1º Para fazer jus ao benefício, o pescador não poderá estar em gozo de nenhum benefício decorrente de benefício previdenciário ou assistencial de natureza continuada, exceto pensão por morte e auxílio -acidente. § 2º Para se habilitar ao benefício, o pescador deverá apresentar ao INSS os seguintes documentos: (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015) I - registro como pescador profissional, categoria artesanal, devidamente atualizado no Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura com antecedência mínima de 1 (um) ano, contado da data de requerimento do benefício; (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015) II - cópia do documento fiscal de venda do pescado a empresa adquirente, consumidora ou consignatária da produção, em que conste, além do registro da operação realizada, o valor da respectiva contribuição previdenciária de que trata o § 7º do art. 30 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, ou comprovante de recolhimento da contribuição previdenciária , caso tenha comercializado sua produção a pessoa física; e (…) 3º O INSS, no ato de habilitação ao benefício, deverá verificar a condição de segurado pescador artesanal e o pagamento da contribuição previdenciária , nos termos da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, nos últimos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício ou desde o último período de defeso até o requerimento do benefício , o que for menor, observado, quando for o caso, o disposto no inciso II do § 2º. Conforme regência do Decreto n. 3.048/99, o pescador ou pescadora artesanal segue a mesma regra do trabalhador rural, sendo segurado especial da previdência social, com a particularidade de exercer suas atividades em embarcações de pequeno porte ou desembarcado, tendo a pesca como sua profissão habitual ou principal meio de vida (art. 9º, §14, Decreto n. 3.048/99). De outro lado, nos termos do art. 2º, IV e V, do Decreto n. 8.424/2015, ficam excluídos aqueles que estejam em gozo de outro benefício decorrente de programa federal de transferência de renda com condicionalidades ou de benefício de prestação continuada da Assistência Social ou da Previdência Social (exceto auxílio-acidente ou pensão por morte) ou que possuam vínculo de emprego, ou outra relação de trabalho, ou outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira vedada pelo período de defeso. Não é extensível o benefício de seguro defeso, tampouco, ao assemelhado ao pescador artesanal, que realiza atividade de apoio à pesca artesanal, exercendo trabalhos de confecção e de reparos de artes e petrechos de pesca e de reparos em embarcações de pequeno porte ou atuando no processamento do produto da pesca artesanal (art. 1º, §6º, do Decreto n. 8.424/2015 c/c art. 9º, §14, Decreto n. 3.048/99). Quanto à prova do exercício da atividade, destaco o que vem entendendo a jurisprudência desta C. Corte: PREVIDENCIÁRIO. SEGURO-DESEMPREGO. PESCADOR ARTESANAL. RENDA PRÓPRIA. REQUISITOS NÃO SATISFEITOS. - Pedido de seguro-desemprego de pescador artesanal. - Não há nos autos provas suficientes que justifiquem o reconhecimento do restabelecimento do seguro-desemprego de pescador artesanal. - A autora e seu companheiro adquiriram um imóvel rural de três alqueires contendo benfeitorias, culturas permanentes, pastagens cultivadas e melhoradas, florestas plantadas no município de Itápolis e residem no centro da cidade. -A prova é frágil, não foi juntado documento suficiente em que se pudesse verificar a produção da propriedade rural. - Embora conste da escritura que não comercializam suas produções rurais, há um extrato de movimentação com saldo em 2016 de saída de gado e saldo anterior, bem como, cadastro de contribuinte de ICMS-Cadesp e inscrições que constam produtor rural/criação de bovinos. - O companheiro da autora é bancário aposentado e recebe aposentadoria por tempo de contribuição/bancário, no valor de R$ 3.627,21 (competência 06/2018), desde 16/09/1994. - Embora as testemunhas afirmem que a autora exerça somente a pesca, os elementos de prova trazidos aos autos demonstram que possui renda própria suficiente à sua manutenção e de sua família, o que obsta a concessão da benesse. - Não houve cumprimento dos requisitos exigidos pelos artigos 1º, 2º, 3º e 4º da Lei 10.779/03. - Apelação da Autarquia Federal provida. (TRF – 3, 9ª Turma, ApCiv 5050337-92.2019.4.03.9999, j. 02/02/2021, Rel. Des. Fed. JOAO BATISTA GONCALVES, grifei). DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE SEGURO DESEMPREGO DURANTE O PERÍODO DE DEFESO. LEI N. 10.779/2003. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. NATUREZA JURÍDICA DO SEGURO DEFESO. PRESENTES OS REQUISITOS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. - Nos termos do art. 2º da Lei n. 10.779/03, na redação conferida pela Lei 13.134/15, cabe ao INSS, e não mais ao Ministério do Trabalho e Emprego, receber e processar os requerimentos de seguro-defeso, bem como habilitar os respectivos beneficiários, pelo que o INSS é parte legítima para figurar no polo passivo da demanda. - Considerando que a proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário é da responsabilidade da Previdência Social, sendo o INSS o ente encarregado da análise dos requisitos autorizadores à concessão do benefício, tem-se que o seguro defeso é benefício de natureza previdenciária. Este foi entendimento reconhecido pelo próprio Ministério do Trabalho e Emprego, em parecer consultivo de n. 256/2010. - Preliminar de incompetência absoluta do juízo estadual rejeitada, em razão da natureza previdenciária do benefício discutido, da legitimidade passiva do INSS e da inexistência de Vara Federal na Comarca em que domiciliada a autora. Competência da Justiça Estadual delegada (art. 109, § 3º, CF). - Conforme previsto na Lei 10.779, de 25 de novembro de 2003 e nos Decretos nº 8.424/15 e nº 8.425/15, aquele que exerce, individualmente ou em regime de economia familiar, a atividade profissional de pescador de forma exclusiva, artesanal e ininterrupta faz jus a um salário mínimo mensal durante o período de proibição da atividade pesqueira para a preservação de espécies aquáticas, a título de benefício de seguro desemprego durante o período de defeso. - O seguro defeso não é cumulável outro seguro decorrente de defeso relativo a espécie distinta, tampouco com outro benefício previdenciário ou assistencial, exceto pensão por morte e auxílio-acidente, a teor do que dispõe o §5º do art. 1º e §1º do art. 2º, ambos da Lei 10.779/03. - O valor do benefício equivale ao valor de um salário-mínimo e será pago enquanto ocorrer o defeso, até o limite de 05 (cinco) meses. - Para receber o benefício de seguro desemprego em razão de defeso o requerente deve provar: a) a atividade de pescador profissional artesanal exclusiva e ininterrupta; b) que trabalha individualmente ou em regime de economia familiar; c) que não dispõe de outra fonte de renda; que se dedicou à pesca das espécies indicadas e nas localidades atingidas pelo defeso; d) que houve recolhimento de contribuição previdenciária; e) licença de pesca na condição de pescador profissional artesanal. - Do cotejo dos documentos coligidos aos autos pela parte autora, tem-se que restou comprovado que exerce ela a atividade da pesca artesanal na forma da lei, sem outra fonte de rendimento, pelo que faz jus ao benefício pleiteado. - Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015. - Preliminar rejeitada e apelação do INSS, no mérito, desprovida. (TRF – 3, 9ª Turma, ApCiv 5260711-52.2020.4.03.9999, j. 04/12/2020, Rel. Des. Fed. GILBERTO RODRIGUES JORDAN, grifei). No caso concreto, o autor alega que labora como pescador artesanal e que solicitou a concessão do seguro defeso junto à autarquia ré, nos termos do artigo 1º da Lei nº 10.779/2003, para os períodos de afastamento de novembro de 2019 a fevereiro de 2020. O requerimento administrativo foi formulado em 19/12/2019 e indeferido pelo INSS, o que impossibilitou o requerente de obter o benefício necessário para sua subsistência. O exercício ininterrupto da atividade de pesca é incontroverso, tendo a parte autora comprovado o recolhimento das respectivas contribuições junto ao INSS. Além disso, o requerente apresentou cópia de sua carteira de pescador profissional e da carteira de identidade da colônia de pescadores, com vínculos datados de 2019 e 2020. Os depoimentos das testemunhas, com efetivo potencial para ampliar a eficácia probatória da prova documental, confirmaram a pretensão inicial (ID 270163145): “Somadas às provas documentais, vislumbra-se a prova testemunhal produzida em Juízo, que corroborou tais indícios, demonstrando a veracidade das alegações trazidas na petição inicial. Isso porque o sr. Ivan Mendonça informou que conhece o autor há 20 anos e que, desde que o conhece, este sempre exerceu atividade pesqueira; que a destinação da pesca é venda e consumo próprio; informou, ainda, que o autor não possui empregados. Por sua vez, o Sr. Maicon Silva Lopes, ouvido como informante, informou conhecer o autor há 11 anos, pois pescam juntos tainha, manjuba, robalo, que se destina a venda e o consumo.” Por fim, não procede o argumento de que o autor estava trabalhando e, por isso, não lhe seria devido o benefício, eis que nenhuma das atividades foi realizada em concomitância com a pesca, tendo seu último vínculo encerrado em dezembro de 2015. Nesse contexto, conclui-se que a autora preenche todos os requisitos legais, conforme comprovam os documentos acostados aos autos: (i) Registro como pescadora profissional artesanal no RGP, com antecedência superior a um ano ao requerimento do benefício, nos termos do artigo 2º, §2º, inciso I, da Lei nº 10.779/2003. (ii) Exercício ininterrupto da atividade pesqueira, conforme determina o artigo 1º, §3º, da Lei nº 10.779/2003, comprovado por meio de notas fiscais de venda do pescado e demais documentos anexados. (iii) Contribuição previdenciária regular, nos termos do artigo 2º, §3º, da Lei nº 10.779/2003. (iv) Ausência de qualquer benefício previdenciário ou assistencial de natureza continuada que impeça a concessão do seguro defeso, conforme o artigo 2º, §1º, da Lei nº 10.779/2003. Tendo em vista a prova documental e testemunhal carreada aos autos, ratifico a conclusão do Juízo de primeiro grau, segundo o qual o autor efetivamente exerceu a atividade de pescador artesanal, de modo que o indeferimento do benefício pelo INSS é ilegal, devendo a autarquia ser condenada a conceder o benefício de seguro defeso referente ao período pleiteado, com renda mensal nos termos da lei. Registro, por oportuno, que a condenação do INSS ao pagamento de valores indevidamente não pagos, ainda que a parte autora estivesse trabalhando posteriormente para sustentar-se, não implica adimplemento em duplicidade, mas em simples pagamento de valor devido e inadimplido. Com relação à indenização arbitrada por danos ao patrimônio imaterial da parte autora, verifico a existência de violação a direitos da personalidade da recorrida em decorrência da ilegalidade constatada nos autos. De fato, comprovou-se que a conduta da requerida causou à parte autora a perda de direitos não somente financeiros, mas de mínima existência digna, em razão do não pagamento do benefício pleiteado por erro administrativo da autarquia federal a ensejar a condenação em danos morais. Portanto, restou comprovada a conduta do INSS consistente na negativa do benefício devido, que fez com que a parte autora deixasse de receber o benefício, além do dano indenizável e o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o resultado lesivo, configurando-se, portanto, a responsabilidade objetiva da Administração Pública no caso. O dever de indenizar em razão de danos morais decorre do preceito contido no art. 5º, X, da Constituição Federal, que, inclusive, considera inviolável a honra das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Como dano moral entende-se toda ofensa aos atributos físicos, valorativos, sociais, psíquicos e intelectuais da pessoa, capazes de provocar-lhe padecimentos sentimentais. No arbitramento da indenização advinda de danos morais, o aplicador do direito deve valer-se de bom senso, razoabilidade e proporcionalidade, atendendo às peculiaridades do caso, não estabelecendo importância que torne irrisória a condenação e nem valor vultoso que traduza enriquecimento sem causa. Anoto que a indenização deve ser suficiente para compensar a vítima pelo dano sofrido e, concomitantemente, sancionar o causador do prejuízo de maneira pedagógica, não possuindo vinculação com o prejuízo material. A teoria do desestímulo também encontra ressonância em posicionamento que, aliás, está consolidado no E. Superior Tribunal de Justiça: “O critério que vem sendo utilizado por essa Corte Superior na fixação do valor da indenização por danos morais, considera as condições pessoais e econômicas das partes, devendo o arbitramento operar-se com moderação e razoabilidade, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de forma a não haver o enriquecimento indevido do ofendido, bem como que sirva para desestimular o ofensor a repetir o ato ilícito” (STJ – QUARTA TURMA, AgRg no Ag 850273/BA Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 2006/0262377-1, DJe 24/08/2010). Para se determinar o valor da reparação deve-se atentar para o artigo 944 do Código Civil ao preconizar que “a indenização mede-se pela extensão do dano”. O enunciado n. 379 da IV Jornada de Direito Civil salienta que “O art. 944, caput, do Código Civil não afasta a possibilidade de se reconhecer a função punitiva ou pedagógica da responsabilidade civil”. Recomendável, para tanto, a adoção do método bifásico, consagrado na jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça, consistente na seguinte metodologia: primeiramente fixa-se um valor básico para indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes que apreciaram casos semelhantes; em um segundo momento, o juízo analisa as circunstâncias do caso, dentre as quais, a gravidade do fato e suas consequências, a intensidade do dolo ou grau de culpa do agente, a eventual participação culposa do ofendido, a condição econômica do ofensor e as condições pessoais da vítima (STJ, 3ª Turma, REsp 710.879/MG, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ 19/06/2006). No caso em tela, em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, entendo como justa a indenização fixada em primeiro grau, motivo por que não se faz necessária a reforma da sentença proferida. Quanto à fixação de juros de mora deve-se aplicar o disposto no Manual de Cálculos da Justiça Federal, que está em consonância com a súmula 54 do STJ (“Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual”), quando se trata de fixação de indenização por danos extrapatrimoniais. Ainda, sobre o valor da condenação a título de danos morais incidirá correção monetária desde a data deste acórdão, nos termos da súmula 362 do STJ (“A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”). Ante o exposto, nego provimento à apelação. De ofício, altero os critérios para o cálculo dos juros de mora e correção monetária. Considerado o trabalho adicional realizado pelos advogados, em decorrência da interposição de recurso, os honorários advocatícios, por ocasião da liquidação, deverão ser acrescidos de percentual de 1% (um por cento) sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos do artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil, observada a Súmula nº. 111 e de acordo com o decidido no Tema 1105, ambos do Superior Tribunal de Justiça. É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. SEGURO-DESEMPREGO DO PESCADOR ARTESANAL. SEGURO DEFESO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DANOS MORAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
Ação ajuizada para concessão do seguro-desemprego do pescador artesanal referente às competências de 2019 e 2020, com indenização por danos morais. Sentença de primeiro grau julgou o pedido procedente, condenando o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ao pagamento do benefício e da indenização.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
Há três questões em discussão: (i) verificar se o autor preenche os requisitos para a concessão do seguro-defeso; (ii) determinar a legalidade da condenação do INSS ao pagamento de danos morais; (iii) estabelecer os critérios de correção monetária e juros moratórios aplicáveis ao caso.
III. RAZÕES DE DECIDIR
O seguro defeso é devido ao pescador artesanal que exerce a atividade de forma ininterrupta e exclusiva, conforme o artigo 1º da Lei nº 10.779/2003.
O autor demonstrou, por meio de documentos e testemunhas, que exerceu a pesca artesanal como atividade principal, sem outra fonte de renda, e recolheu regularmente as contribuições previdenciárias.
O indeferimento administrativo do benefício pelo INSS foi ilegal, pois o autor cumpriu os requisitos exigidos pela legislação.
A condenação por danos morais é cabível, pois a negativa indevida do benefício privou o autor de recursos essenciais à sua subsistência, configurando violação a direitos da personalidade.
O valor da indenização deve ser proporcional ao dano sofrido, aplicando-se o método bifásico para fixação do quantum, em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
A correção monetária e os juros moratórios devem seguir os critérios estabelecidos pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no Tema 905, conforme as regras vigentes à época dos atrasos e da entrada em vigor da EC 113/2021.
IV. DISPOSITIVO E TESE
Recurso desprovido.
Tese de julgamento:
O seguro-defeso é devido ao pescador artesanal que comprovar a atividade de forma exclusiva, ininterrupta e sem outra fonte de renda, nos termos da Lei nº 10.779/2003.
A negativa indevida do benefício previdenciário pode ensejar indenização por danos morais quando demonstrada a violação a direitos fundamentais do segurado.
A correção monetária e os juros moratórios sobre valores devidos devem observar os parâmetros fixados pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no Tema 905, conforme o período de apuração e pagamento.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; Lei nº 10.779/2003, arts. 1º e 2º; EC nº 113/2021, art. 3º; CPC/2015, art. 85, §11.
Jurisprudência relevante citada: STF, Tema 810; STJ, Tema 905; STJ, AgRg no Ag 850273/BA; TRF-3, ApCiv 5050337-92.2019.4.03.9999; TRF-3, ApCiv 5260711-52.2020.4.03.9999.