Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5010056-15.2023.4.03.6100

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: UNIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO

APELADO: PAO E TALHO SANDUICHERIA LTDA

Advogados do(a) APELADO: CAROLINA PEREIRA TOLOSA - SP450254-A, RICARDO HIROSHI AKAMINE - SP165388-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5010056-15.2023.4.03.6100

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: UNIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO

 

APELADO: PAO E TALHO SANDUICHERIA LTDA

Advogados do(a) APELADO: CAROLINA PEREIRA TOLOSA - SP450254-A, RICARDO HIROSHI AKAMINE - SP165388-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA RIBEIRO (RELATOR):

 

Trata-se de agravos internos interpostos pela UNIÃO FEDERAL e por PÃO E TALHO SANDUICHERIA LTDA., em face de decisão monocrática que deu parcial provimento à apelação e à remessa oficial, em mandado de segurança, impetrado com o objetivo de que seja assegurado à impetrante, o direito de usufruir do benefício de redução a zero das alíquotas de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL (isenção onerosa), conforme previsto no art. 4º da Lei nº 14.148/2021, afastando-se a exclusão determinada pela Portaria ME 11.266/2022. A impetrante pleiteou subsidiariamente que se reconheça que o desenquadramento dos CNAE’s imposto pela Portaria nº 11.266/2022 não produza efeitos imediatos, devendo-se respeitar a anterioridade nonagesimal para PIS, COFINS, CSLL e a anterioridade anual para IRPJ, haja vista a efetiva majoração da carga tributária desses tributos.

A União Federal requer a reforma da decisão, alegando que a tese do contribuinte não merece acolhimento, pois não houve qualquer desvio nas alterações do rol de beneficiários da alíquota zero de IRPJ/CSLL/PIS/COFINS, concedida pela Lei 14.148/2021, efetuadas pela Portaria ME 11.266/2022, com espeque na MP 1.147/2022, e pela nova redação do art. 4º da lei do PERSE, conferida pela Lei 14.592/2023.

A impetrante sustenta alegando, preliminarmente, a impossibilidade de prolação de decisão monocrática, pois inaplicável à hipótese o disposto no art. 932, V, do CPC/2015. Argumenta que, em se tratando, de concessão de isenção fiscal por prazo certo e sob determinadas condições, não é possível a sua revogação até o prazo final concedido, de modo que deve ser reconhecido o seu direito à manutenção do PERSE até o dia 17 de março de 2027.

As partes apresentaram as contraminutas.

Anteriormente, a impetrante havia oposto embargos de declaração, os quais foram rejeitados. Na sequência, a União Federal também opôs embargos de declaração, requerendo a apreciação de seu agravo interno.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5010056-15.2023.4.03.6100

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: UNIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO

 

APELADO: PAO E TALHO SANDUICHERIA LTDA

Advogados do(a) APELADO: CAROLINA PEREIRA TOLOSA - SP450254-A, RICARDO HIROSHI AKAMINE - SP165388-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA RIBEIRO (RELATOR):

De início, em face do julgamento dos agravos internos que ora se faz, julgo prejudicados os embargos de declaração opostos pela União Federal.

Especificamente, quanto à alegação de impossibilidade, no caso, de julgamento monocrático, cumpre explicitar que o art. 932, IV e V do CPC de 2015 confere poderes ao Relator para, monocraticamente, negar e dar provimento a recursos. Apesar de as alíneas dos referidos dispositivos elencarem hipóteses em que o Relator pode exercer esse poder, o entendimento da melhor doutrina é no sentido de que o mencionado rol é meramente exemplificativo.

Hermes Zaneti Jr. posiciona-se pela não taxatividade do elenco do art. 932, incisos IV e V (Poderes do Relator e Precedentes no CPC/2015: perfil analítico do art. 932, IV e V, in “A nova aplicação da jurisprudência e precedentes no CPC/2015: estudos em homenagem à professora Teresa Arruda Alvim”, Dierle José Coelho Nunes, São Paulo, RT, 2017, pp. 525-544).

Nessa linha, o E. STJ, antes mesmo da entrada em vigor do CPC/2015, aprovou a Súmula 568 com o seguinte teor: “O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema”. Veja-se que a expressão entendimento dominante aponta para a não taxatividade do rol em comento.

Além disso, uma vez que a decisão singular do relator é recorrível por meio de agravo interno (art. 1.021, caput, CPC/15), não fica prejudicado o princípio da colegialidade, pois a Turma pode ser provocada a se manifestar por meio do referido recurso.

Portanto, não se antevê nulidade na apreciação do recurso interposto por esta relatoria, em decisão monocrática proferida.

No mais, mantenho a decisão ora agravada pelos seus próprios fundamentos. Eis o seu teor:

 

 Trata-se de apelação e remessa oficial em mandado de segurança, impetrado por PAO E TALHO SANDUICHERIA LTDA, com pedido de liminar, com o objetivo de que seja assegurado à impetrante, o direito de usufruir do benefício de redução a zero das alíquotas de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL (isenção onerosa), conforme previsto no art. 4º da Lei nº 14.148/2021, afastando-se a exclusão determinada pela Portaria ME 11.266/2022. A impetrante pleiteou subsidiariamente que se reconheça que o desenquadramento dos CNAE’s imposto pela Portaria nº 11.266/2022 não produza efeitos imediatos, devendo-se respeitar a anterioridade nonagesimal para PIS, COFINS, CSLL e a anterioridade anual para IRPJ, haja vista a efetiva majoração da carga tributária desses tributos.

A liminar foi deferida, para o fim de assegurar à impetrante a adoção da alíquota zero para o PIS, a COFINS, a CSLL e o IRPJ pelo prazo previsto na Lei nº 14.148/2021.

O r. Juízo a quo concedeu parcialmente a segurança, para afastar a exclusão promovida pela Portaria nº 11.266/2022 e garantir a aplicação da alíquota zero de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL pelo prazo previsto na Lei nº 14.148/2021 (até 17/03/2027).

Não houve a fixação de honorários advocatícios, nos termos do art. 25, da Lei n° 12.016/2009.

A sentença foi submetida ao reexame necessário.

Apelou a União Federal, requerendo a reforma da sentença. Sustenta, em resumo, que a supressão do CNAE da impetrante da lista de atividades enquadradas no programa não configura ilegalidade, tampouco configura majoração indireta de alíquotas ou de base de cálculo de tributo a se submeterem aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal. Alega ainda que a isenção e a alíquota zero são institutos diferentes, não sendo cabível receberem o mesmo tratamento jurídico.

Após a apresentação das contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.

O Ministério Público Federal opinou pelo regular prosseguimento do feito.

É o relatório.

Decido.

O presente caso comporta julgamento nos termos do art. 932 do CPC/2015, que confere ao Relator poderes para, monocraticamente, negar e dar provimento aos recursos. Na eventual mácula da decisão singular, não fica prejudicado o princípio da colegialidade, pois a Turma pode ser provocada a se manifestar por meio do recurso de agravo interno (STJ, AgInt no AREsp n. 1.524.177/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 9/12/2019, DJe de 12/12/2019).

A Lei nº 14.148/2021, dentre outras providências, criou o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o intuito de mitigar os prejuízos sofridos pelo setor de eventos, em decorrência do estado de calamidade pública reconhecido em face da pandemia da Covid-19.

A própria lei instituidora determinou que ato normativo do Ministério da Economia publicaria os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), assim abrangidos na definição de “setor de eventos”; bem como fixou a redução da alíquota a zero dos tributos IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, pelo prazo de 60 (sessenta) meses, sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas indicadas (arts. 2º e 4º da Lei nº 14.148/2021).

Assim, a Portaria ME nº 7.163/2021 definiu em seus Anexos os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas –CNAE que se consideram “setor de eventos”, para fins do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148/2021, fixando em seu art. 1º o seguinte:

 

Art. 1° Definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1° do art. 2° da Lei n° 14.148, de 3 de maio de 2021, na forma dos Anexos I e II.

§ 1° As pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, na data de publicação da Lei n° 14.148, de 2021, as atividades econômicas relacionadas no Anexo I a esta Portaria se enquadram no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - Perse.

§ 2° As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei n° 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei n° 11.771, de 17 de setembro de 2008. (grifo nosso)

 

Entretanto, foi editada a Portaria ME nº 11.266/2022, publicada em 02/01/2023, que reduziu em muito as atividades econômicas (CNAE’s) alcançadas pelo benefício da alíquota zero, conforme indicado em seus Anexos I e II.

No mesmo passo, foi promulgada a Lei nº 14.592, de 30/05/2023, fruto da conversão da Medida Provisória nº 1.147/2022, que alterou o disposto na Lei nº 14.148/2021, assim fixando em seu art. 4º, § 1º, in verbis:

 

Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos abrangendo as seguintes atividades econômicas, com os respectivos códigos da CNAE: hotéis (5510-8/01); apart-hotéis (5510-8/02); albergues, exceto assistenciais (5590-6/01); campings (5590-6/02), pensões (alojamento) (5590-6/03); outros alojamentos não especificados anteriormente (5590-6/99); serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê (5620-1/02); produtora de filmes para publicidade (5911-1/02); atividades de exibição cinematográfica (5914-6/00); criação de estandes para feiras e exposições (7319-0/01); atividades de produção de fotografias, exceto aérea e submarina (7420-0/01); filmagem de festas e eventos (7420-0/04); agenciamento de profissionais para atividades esportivas, culturais e artísticas (7490-1/05); aluguel de equipamentos recreativos e esportivos (7721-7/00); aluguel de palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário, exceto andaimes (7739-0/03); serviços de reservas e outros serviços de turismo não especificados anteriormente (7990-2/00); serviços de organização de feiras, congressos, exposições e festas (8230-0/01); casas de festas e eventos (8230-0/02); produção teatral (9001-9/01); produção musical (9001-9/02); produção de espetáculos de dança (9001-9/03); produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares (9001-9/04); atividades de sonorização e de iluminação (9001-9/06); artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificadas anteriormente (9001-9/99); gestão de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas (9003-5/00); produção e promoção de eventos esportivos (9319-1/01); discotecas, danceterias, salões de dança e similares (9329-8/01); serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00):   

I - Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep);

II - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);

III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e

IV - Imposto sobre a Renda das Pessoas Juridicas (IRPJ).

§ 1º Para fins de fruição do benefício fiscal previsto no caput deste artigo, a alíquota de 0% (zero por cento) será aplicada sobre os resultados e as receitas obtidos diretamente das atividades do setor de eventos de que trata este artigo. (grifei)

 

No caso, inicialmente, a Lei nº 14.148/2021 consagrou a determinadas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos, a concessão da “alíquota zero” dos tributos (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), a incidir sobre os resultados e receitas por elas auferidos, a perdurar por prazo certo e determinado (60 meses), observados os requisitos estabelecidos.

Vê-se que a Portaria ME nº 11.266/2022 alterou substancialmente o benefício concedido, restringindo as atividades anteriormente contempladas (CNAE’s), em ofensa ao disposto no art. 178, do CTN, assim expresso:

 

Art. 178. A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104.

 

Pelos termos dessa disposição codificada, a isenção "concedida por prazo certo e em função de determinadas condições" dita “condicionada", não fica sujeita a revogação ou modificação a qualquer tempo, devendo ser respeitada por todo o período de sua concessão legal. As isenções "incondicionadas", por outro lado, podem ser revogadas ou modificadas a qualquer tempo, respeitado, porém, o princípio da anterioridade tributária (geral ou nonagesimal, conforme a espécie tributária, impostos ou contribuições sociais, respectivamente).  

Muito embora o art. 178 do CTN se refira expressamente à “isenção”, o E. Superior Tribunal de Justiça já sedimentou o entendimento de ser cabível a aplicação do disposto no art. 178 do CTN às hipóteses de fixação de “alíquota zero”, pois os contribuintes, tanto no caso de isenção, quanto no de alíquota zero, encontram-se em posição equivalente no que tange ao resultado prático do alívio fiscal, devendo ser prestigiado o princípio da proteção da confiança e da boa-fé do contribuinte, no âmbito tributário (STJ, PRIMEIRA  TURMA, REsp: 1941121/PE, Relatora Ministra REGINA HELENA COSTA, Data de Julgamento: 03/08/2021, DJe 09/08/2021)

Nesse sentido também o seguinte precedente:

 

TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. ALÍQUOTA ZERO. PRODUTOS DE INFORMÁTICA. NÃO SUJEIÇÃO DOS VAREJISTAS AOS EFEITOS DO ART. 9º DA MP N. 690/2015, CONVERTIDA NA LEI N. 13.241/2015. PRESENÇA DE ONEROSIDADE NO CONTEXTO DO INCENTIVO FISCAL DA LEI N. 11.196/2005 ("LEI DO BEM"). VIOLAÇÃO DO ART. 178 DO CTN.

1. Nos termos da jurisprudência do STJ, o gozo da alíquota zero pelos varejistas demandou contrapartidas, condições e foi onerosa, de modo que, em relação a suas atividades, não se consideram válidas as disposições contidas no art. 9º da Medida Provisória n. 690/2015, convertida na Lei n. 13.241/2015, que revogaram a previsão de alíquota zero da Contribuição ao PIS e da COFINS, estabelecida na Lei n. 11.196/2005.

2. Não alcança o varejista a revogação prevista no art. 9º da Medida Provisória n. 690/2015, convertida na Lei n. 13.241/2015. Precedentes.

3. Adequada a aplicação do art. 178 do Código Tributário Nacional à hipótese de fixação, por prazo certo e em função de determinadas condições, de alíquota zero da Contribuição ao PIS e da Cofins, porquanto os contribuintes, tanto no caso de isenção quanto no de alíquota zero, encontram-se em posição equivalente no que tange ao resultado prático do alívio fiscal (REsp n. 1.928.635/SP, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 10/8/2021, DJe de 16/8/2021).

Agravo interno improvido. (grifos nossos)

(STJ, SEGUNDA TURMA, AgInt no REsp n. 1.848.221/RS, relator Ministro Humberto Martins, julgado em 17/4/2023, DJe de 19/4/2023)

 

Pode-se concluir, assim, que a revogação/redução das alíquotas estipuladas pela Lei nº 14.148/2021 pode ser equiparada à hipótese de isenção não condicionada, porquanto outorgada àqueles que pertencem ao “setor de eventos”, sem qualquer contrapartida ou condição onerosa. Dessa forma, a revogação ou alteração do benefício concedido deve obedecer à anterioridade anual ou nonagesimal, conforme explicitado pelo art. 178, do CTN.

No caso concreto, a parte agravante tem como atividade econômica principal: “56.20-1-02 - Serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê” (Doc. Num. 279918969), a qual consta no Anexo I da Portaria ME nº 7.163/2021, mas que deixou de ser contemplada nos Anexos da Portaria ME nº 11.266/2022, voltando a ser incluída posteriormente no art. 4º da Lei nº 14.592/2023.

Dessa forma, cabível a reforma parcial da sentença proferida, a fim de que, uma vez inicialmente assegurado o benefício à impetrante, e, após, revogado, seja observada a anterioridade tributária, conforme previsto no art. 150, III, “b” e “c” da CF, a contar da publicação da Portaria ME nº 11.266/2022, sem prejuízo do disposto no art. 4º da Lei nº 14.592/2023.

A propósito, cito julgado que explicita o entendimento exarado:

APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. REGIME DO PERSE (LEI 14.148/21). LEGALIDADE DA PORTARIA ME 11.266. LEGALIDADE DA IN-RFB 2.114/22.

1. A Lei Federal nº. 14.148/21 instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse). A ementa da lei explicita que o Perse é um conjunto de “ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos” (grifei).

2. A partir da análise da normação vigente, verifica-se que as empresas podem ser enquadradas no setor de eventos de duas formas: (1) eventos, hotelaria e exibição cinematográfica, referida no artigo 2º, § 1º, incisos I a III, da Lei Federal nº 14.148/21, com relação aos quais basta o enquadramento no Anexo I da Portaria ME nº. 7.163/21; (2) prestação de serviços turísticos, conforme artigo 2º, § 1º, inciso IV da Lei Federal nº 14.148/21 conjugado com a Lei Federal nº. 11.771/08 (Política Nacional de Turismos) e Anexo II da Portaria regulamentar.

3. O artigo 2º da IN-RFB nº 2.144/22 exige, para gozo do benefício fiscal, que as receitas ou resultados das atividades econômicas estejam relacionadas a realização de eventos, hotelaria em geral, administração de salas de exibição cinematográfica ou, ainda, prestação de serviços jurídicos.

4. Ao tratar do processo de elaboração de normas, a LC nº. 95/98 preceitua, em seu artigo 11, inciso III, que deverá se “expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida”.

5. É regular o reconhecimento da legalidade da IN RFB nº 2.114/22 na medida em que restringiu os benefícios do PERSE às receitas que foram prejudicadas pela crise sanitária.

6. Em decorrência das alterações da Lei Federal nº 14.148/21 pela MP nº. 1.147-228/2023, foi editada a Portaria ME nº. 11.266/22, que excluiu códigos CNAE dos Anexos, reduzindo, portanto, o alcance do benefício fiscal.

7. Da análise da Lei Federal nº 14.148/21, verifica-se que a redução da alíquota foi estabelecida por prazo certo e mediante cumprimento de condições, pelo contribuinte. Trata-se, portanto, de isenção condicionada, a qual pode ser modificada desde que respeitada a anterioridade anual ou nonagesimal nos estritos termos do artigo 178-A do Código Tributário Nacional.

8. No caso concreto, a atividade principal da agravante é cadastrada pelo CNAE nº. 8111-7/00 (serviços combinados para apoio a edifícios, exceto condomínios prediais) (280640535).

9. Tal CNAE constava do Anexo I da Portaria ME nº. 7.163/21 porém não consta do Anexo I da Portaria ME nº. 11.266/22.

10. É regular a pretensão de observância das anterioridades anual e nonagesimal. 11. Apelação e recurso adesivo desprovidos. Reexame necessário desprovido.

(TRF-3, 6ª Turma - ApCiv: 5000141-52.2023.4.03.6128 SP, Relator: GISELLE DE AMARO E FRANCA, Data de Julgamento: 11/12/2023, Data de Publicação: Intimação via sistema: 13/12/2023)

Diante do exposto, com fundamento no art. 932, V, do CPC/2015, dou parcial provimento à apelação e à remessa oficial.

Decorrido o prazo recursal, baixem os autos ao Juízo de origem.

Publique-se. Intimem-se.

 

Por fim, ressalto que a vedação insculpida no art. 1.021, § 3º do CPC/2015 contrapõe-se ao dever processual estabelecido no § 1º do mesmo dispositivo, que determina:

 

Art. 1.021.

(...)

§ 1º Na petição de agravo interno, o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada.

 

Assim, se a parte agravante apenas reitera os argumentos ofertados na peça anterior, sem atacar com objetividade e clareza os pontos trazidos na decisão que ora se objurga, com fundamentos novos e capazes de infirmar a conclusão ali manifestada, decerto não há que se falar em dever do julgador de trazer novéis razões para rebater alegações genéricas ou repetidas, que já foram amplamente discutidas.

Diante do exposto, nego provimento aos agravos internos, julgando prejudicados os embargos de declaração opostos pela União Federal.

É como voto.

 

 



E M E N T A

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVOS INTERNOS. APELAÇÃO. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE TRIBUTÁRIO. ADESÃO AO PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS (PERSE). LEI Nº 14.148/2021. PORTARIAS ME NºS. 7.163/2021 E 11.266/2022. DEFINIÇÃO DOS CÓDIGOS DA CLASSIFICAÇÃO NACIONAL DE ATIVIDADES ECONÔMICAS – CNAE. ALTERAÇÃO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO POR PRAZO CERTO. ART. 178, CTN. PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE ANUAL E NONAGESIMAL. OBEDIÊNCIA.

1. Ausência de nulidade no julgamento monocrático do recurso de agravo de instrumento interposto (art. 932 e incisos, do CPC/2015) considerando-se que não fica prejudicado o princípio da colegialidade, pois a Turma pode ser provocada a se manifestar por meio do recurso de agravo interno.

2. A Lei nº 14.148/2021 consagrou a determinadas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos, a concessão da “alíquota zero” dos tributos (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), pelo prazo de 60 (sessenta) meses, determinando que ato normativo do Ministério da Economia publicaria os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), assim abrangidos na definição de “setor de eventos”.

3. A Portaria ME nº 7.163/2021 definiu em seus Anexos os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas –CNAE que se consideram “setor de eventos”, para fins do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148/2021. Entretanto, a Portaria ME nº 11.266/2022 alterou substancialmente o benefício concedido, restringindo as atividades anteriormente contempladas (CNAE’s), em ofensa ao disposto no art. 178, do CTN.

4. No caso concreto, a impetrante tem como atividade econômica principal: “56.20-1-02 - Serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê”, a qual consta no Anexo I da Portaria ME nº 7.163/2021, mas que deixou de ser contemplada nos Anexos da Portaria ME nº 11.266/2022.

5. Pode-se concluir, assim, que a revogação das alíquotas estipuladas pela Lei nº 14.148/2021 pode ser equiparada à hipótese de isenção não condicionada, porquanto outorgada àqueles que pertencem ao “setor de eventos”, sem qualquer contrapartida ou condição onerosa. Dessa forma, a revogação ou alteração do benefício concedido deve obedecer à anterioridade anual (IRPJ) e nonagesimal (PIS, COFINS, CSLL), conforme explicitado pelo art. 178, do CTN.

6. Agravos internos improvidos. Embargos de declaração da União Federal prejudicados.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento aos agravos internos, julgando prejudicados os embargos de declaração opostos pela União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
SOUZA RIBEIRO
DESEMBARGADOR FEDERAL