APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003001-24.2011.4.03.6002
RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: VALDIR PERIUS, LUIZ CARLOS BONELLI, CLEITO VINICIO INEIA, ANDRE BENDER, CLEITO VINICIO INEIA - ME
Advogados do(a) APELANTE: CARLOS EDUARDO DA MOTTA LAMEIRA - MS14182-A, LUIZ OTAVIO MARGUTTI RAMOS - MS17956-A, MAURICIO SILVA MUNHOZ - MS15351-A
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO FERREIRA JUNIOR - MS7862-A, GUSTAVO MARQUES FERREIRA - MS7863-A, JOSE WANDERLEY BEZERRA ALVES - MS3291-A, WAGNER DA SILVA FREITAS - MS15492-A
APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA, FEDERACAO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS ASSALARIADOS RURAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL, GERALDO TEIXEIRA DE ALMEIDA, ARI JOSE INEIA
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: TATIANI MOSSINI DE LUCENA - MS25806-A
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: JOAO GONCALVES DA SILVA - MS8357-A
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: MARISA DOS SANTOS ALMEIDA PEREIRA LIMA - MS5225-A
REPRESENTANTE do(a) INTERESSADO: CLEITO VINICIO INEIA
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: JOSE ANTONIO VIEIRA - MS3828-A
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003001-24.2011.4.03.6002 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: VALDIR PERIUS, LUIZ CARLOS BONELLI, CLEITO VINICIO INEIA, ANDRE BENDER, CLEITO VINICIO INEIA - ME Advogados do(a) APELANTE: CARLOS EDUARDO DA MOTTA LAMEIRA - MS14182-A, LUIZ OTAVIO MARGUTTI RAMOS - MS17956-A, MAURICIO SILVA MUNHOZ - MS15351-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA, FEDERACAO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS ASSALARIADOS RURAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL, GERALDO TEIXEIRA DE ALMEIDA, ARI JOSE INEIA R E L A T Ó R I O Trata-se de remessa necessária e de apelações interpostas pelos corréus LUIZ CARLOS BONELLI, VALDIR PERIUS, ANDRÉ BENDER, CLEITO VINICIO INÉIA e CLEITO VINICIO INÉIA - ME., nos autos da ação civil pública por atos de improbidade administrativa movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, objetivando o Parquet, em síntese, a condenação dos supra elencados, nos termos da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa - LIA) em decorrência de ilícitos, em prejuízo ao Erário, derivados de transferência e posse de bens da União em proveito particular, sem o atendimento às formalidades legais pertinentes. Sobreveio r. sentença de primeiro grau, julgando o feito parcialmente procedente, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC - para: "a) acolhendo o pedido demolitório, ordenar a demolição do prédio em que instalada a Churrascaria e Restaurante Gabrielly (CLEITO VINICIO INÉIA – ME), a ser operacionalizada pelo INCRA e, na impossibilidade material de fazê-lo, subsidiariamente pela União, que, neste caso, passa a titularizar o direito de ser ressarcida, nos termos do item “a.3” abaixo. Para tanto: a.1) expeça-se o competente mandado de demolição de imóvel. a.2) caberá ao INCRA providenciar os meios materiais necessários para a prévia desocupação forçada, caso se faça necessária. a.3) condeno os réus, solidariamente, a ressarcirem ao INCRA os custos necessários para a demolição e limpeza do terreno, em sua totalidade (os custos serão devidamente documentados e comprovados nos autos de cumprimento de sentença). A demolição deverá ser providenciada/operacionalizada no prazo de 120 (cento e vinte) dias, contado do recebimento do mandado de demolição pelo INCRA. O prazo constará do mandado. b) condenar os réus, solidariamente, ao ressarcimento integral do dano, equivalente a R$ 8.000,00 (oito mil reais) mensais, desde o início da construção (março de 2007), até a data da efetiva devolução do bem, após desocupação para fins de demolição, descontando-se o que já fora pago, conforme decisão de ID 15996720 - Pág. 104-112 (0,5% - meio por cento ao mês), a ser apurado em cumprimento de sentença. Quanto ao Espólio de Ari José Inéia, a condenação fica adstrita ao limite do valor da herança; c) condenar cada um dos réus ao pagamento de multa civil equivalente a 10% (dez por cento) do valor do dano referido na alínea “b”, sendo este valor quadruplicado (40%) para a sociedade empresária, maior beneficiária dos frutos econômicos advindos da ação conjunta ímproba: Cleito Vinicio Inéia-ME. A distinção se justifica pelo fato de ter sido ela a beneficiária da capacidade de geração de receita, mediante exploração com exclusividade de área estrategicamente localizada para execução de seu objeto social. Aliás, este foi o objetivo final da ilegalidade qualificada pela desonestidade perfectibilizada e descrita nestes autos. Quanto ao Espólio de Ari José Inéia, a condenação fica adstrita ao limite do valor da herança; d) condenar GERALDO TEIXEIRA DE ALMEIDA, VALDIR PERIUS e LUIZ CARLOS BONELLI a perda da função pública que eventualmente ocupar e a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (oito) anos – estipulação no máximo, tendo em vista os atos ímprobos por eles praticados implicarem a não utilização adequada de terras destinadas à reforma agrária, prejudicando a higidez da política pública respectiva. Ademais, a cominação também é adequada, haja vista a função política, de gestão e/ou de direção por eles exercidas no momento dos fatos; e) aplicar a todos os réus a pena de proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 05 (cinco) anos." Sem condenação em custas processuais e honorários advocatícios, nos termos da legislação em vigor. Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição. Irresignados, vieram os réus supramencionados a apelarem, nos seguintes termos: a-) LUIZ CARLOS BONELLI e VALDIR PERIUS primeiramente, em sede de preliminares recursais, aduziram que: I. são partes ilegítimas, in casu, para figurarem no polo passivo da presente demanda, visto que não teriam autorizado a construção do empreendimento em questão; II. teria havido, também, manifesta violação à lei federal (nulidade processual) em razão de juntada, nestes autos, de documentos intempestivos, bem como que não teria sido dada oportunidade à defesa para manifestação a respeito de tais meios de prova; III. outra nulidade se consistiria no fato de que, segundo afirmam, a condenação teria sido dada em decorrência de provas sem que fosse oportunizado o Contraditório judicial; IV. ilícita (e nula), ademais, a "inversão do ônus da prova" nos autos praticada pelo MM. Juízo a quo; V. a r. sentença monocrática também seria extra petita, eis que a conduta dolosa ora objeto de condenação não teria sido alegada pelo Parquet, na exordial; VI. ainda a r. sentença seria ultra et extra petita, devido ao fato de ter havido a condenação solidária de todos os corréus pelos custos da demolição, uma vez que teria a r. decisão "ultrapassado os pedidos do autor"; e VII. o r. decisum a quo também seria nulo de pleno direito, visto ter sido aproveitada confissão de terceiro como prova contra todos os demais apelantes, estendendo ilegalmente seus efeitos para além do corréu confesso. No mérito, afirmam que não houve qualquer ato de improbidade administrativa de sua parte, bem como que não seria aplicável, in casu, a Norma de Execução 33/2003, além de não ter ocorrido a devida apreciação de provas - a demonstrarem, segundo dizem, a ausência de participação ilícita dos ora recorrentes. Tampouco haveria nexo de causalidade demonstrado entre os atos dos respectivos corréus e os danos experimentados pela União, bem como ausência de conluio entre os mesmos e os então beneficiários do ilícito apontado. Demais disso, inocorrera o dolo ou prejuízos ao Erário. Subsidiariamente, ainda, aduzem que houve equívoco quanto à fixação do valor do dano supostamente existente, assim como pelo custeio da demolição. As penas aplicadas em seu desfavor também teriam sido excessivamente severas e desproporcionais. Pedem, por consequência, por derradeiro, a liberação de seus bens. b-) ANDRÉ BENDER, CLEITO VINICIO INÉIA e CLEITO VINICIO INÉIA - ME., por sua vez, apelaram somente quanto ao mérito, aduzindo, em síntese, que não haveria, na hipótese, qualquer prática de ato de improbidade administrativa - sobretudo pela não aplicação, no caso concreto, da Norma de Execução 33/2003 - bem como que não teria sido demonstrado qualquer conluio entre os corréus, condutas dolosas ou experimentação de prejuízo ao Erário. Ainda houve - segundo afirmam - equívoco acerca da quantificação do suposto dano sofrido pela União, bem como desproporcionalidade na fixação das sanções impostas. Tratou-se de "mera irregularidade sanável", com eventual convalidação administrativa. Além disso, pugnam pelo afastamento das penas (que entendem desproporcionais), em caráter subsidiário - sobretudo no que tange à proibição de contratarem com o Poder Público e imposição de multa civil. Contrarrazões apresentadas, subiram os autos a este Tribunal. Parecer da Procuradoria Regional da República, pelo desprovimento do apelo de LUIZ CARLOS BONELLI e de VALDIR PERIUS, e pelo parcial provimento da apelação de ANDRÉ BENDER, CLEITO VINICIO INEIA e CLEITO VINICIO INEIA - ME., somente no que concerne à possibilidade de acolhimento do pedido alternativo referente à conversão da cessão em arrendamento em favor da União, desde a data em que foi finalizada a construção do prédio em questão. No mais, pela manutenção do r. decisum a quo. Petição incidental do requerido VALDIR PERIUS, juntando sentença penal absolutória em seu favor, para que seja considerada também nos presentes autos da ação civil pública por atos de improbidade administrativa. Petitório, em idêntico sentido do anteriormente descrito - juntando sentença penal absolutória em seu favor - por parte de ANDRÉ BENDER e CLEITO VINÍCIO INÉIA, pelas suas absolvições, também, no âmbito desta ação civil pública. Manifestações da Procuradoria Regional da República pela não vinculação de referidas decisões do MM. Juízo criminal, tendo em vista que nos termos da legislação vigente - por ter sido mera hipótese de absolvição por atipicidade, em função do princípio da independência entre as instâncias penal e cível - não haveria como tal sentença influir no julgamento da presente demanda. É o relatório.
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO FERREIRA JUNIOR - MS7862-A, GUSTAVO MARQUES FERREIRA - MS7863-A, JOSE WANDERLEY BEZERRA ALVES - MS3291-A, WAGNER DA SILVA FREITAS - MS15492-A
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: TATIANI MOSSINI DE LUCENA - MS25806-A
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: JOAO GONCALVES DA SILVA - MS8357-A
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: MARISA DOS SANTOS ALMEIDA PEREIRA LIMA - MS5225-A
REPRESENTANTE do(a) INTERESSADO: CLEITO VINICIO INEIA
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: JOSE ANTONIO VIEIRA - MS3828-A
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003001-24.2011.4.03.6002 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: VALDIR PERIUS, LUIZ CARLOS BONELLI, CLEITO VINICIO INEIA, ANDRE BENDER, CLEITO VINICIO INEIA - ME Advogados do(a) APELANTE: CARLOS EDUARDO DA MOTTA LAMEIRA - MS14182-A, LUIZ OTAVIO MARGUTTI RAMOS - MS17956-A, MAURICIO SILVA MUNHOZ - MS15351-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA, FEDERACAO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS ASSALARIADOS RURAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL, GERALDO TEIXEIRA DE ALMEIDA, ARI JOSE INEIA V O T O I. Por primeiro, acerca dos petitórios de VALDIR PERIUS, ANDRÉ BENDER e CLEITO VINÍCIO INÉIA, de a r. sentença penal absolutória influir no resultado da presente ação civil pública de improbidade administrativa, de se recordar - como muito precisamente pontuado pelos Procuradores Regionais da República oficiantes neste feito - uma vez que a r. sentença absolvera os ora corréus sob o fundamento da atipicidade das condutas descritas na peça inicial acusatória - nos moldes do artigo 386, III, do Código de Processo Penal (absolvição sumária) - neste caso, dado o princípio processual-constitucional da independência entre as instâncias cível e criminal, por não se tratar de reconhecimento da inexistência dos fatos ora em análise nem tampouco de negativa categórica da autoria dos mesmos, não tem a referida decisão absolutória o condão de afetar obrigatoriamente o desfecho dos autos processuais cíveis. Tanto é que, quando da prolação do r. decisum absolutório, oportunamente o MM. Juízo sentenciante ressalva, verbis: "Vale ressaltar que o fato de se afastar a tipicidade penal da conduta narrada na denúncia, não significa refutar a ilicitude civil e administrativa dela decorrentes, cujas providências cabíveis podem e devem ser tomadas nas demais esferas do direito, a fim de preservar o patrimônio do ente federal." Desta forma, o julgamento da presente ação civil pública deve se pautar no conjunto fático-probatório dos respectivos autos, ora em análise. Isto sempre, sem olvidar, sob o crivo do Contraditório e da Ampla Defesa - estes expressos na Constituição da República. Isto posto, indefiro os pedidos incidentais em referência. II. Quanto às preliminares recursais apresentadas pelos corréus LUIZ CARLOS BONELLI e VALDIR PERIUS, passa-se à análise: a-) Acerca de sua suposta ilegitimidade ad causam passiva, de se destacar que tanto VALDIR PERIUS - ex-Superintendente Substituto do INCRA/MS - quanto LUIZ CARLOS BONELLI - à época dos fatos Superintendente Regional do INCRA no Estado do Mato Grosso do Sul - autorizaram - dolosamente e sem a observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie - o uso e ocupação do núcleo urbano do "Projeto de Assentamento Teijin", de modo que, por isso, não faz qualquer sentido a alegação preliminar de que jamais deveriam ter figurado no polo passivo da presente ação civil pública, haja vista sua pessoal participação nos fatos apontados como ilícitos administrativos. Preliminar, pois, afastada. b-) Tampouco procede a tese de que os documentos carreados pelo Ministério Público Federal seriam intempestivos; isto porque o relatório de diligência (ID 15997773, fls. 119/127) atende aos requisitos estabelecidos no artigo 435 do Código de Processo Civil. Ou seja: por se tratar de documento novo, admite-se sua juntada após a inicial ou a contestação, em momento oportuno, desde que justificada a razão para tanto. Ora. Por se tratar, neste caso, de documento notoriamente produzido após o protocolo da peça inicial, justificável sua juntada a posteriori. No mais, quanto ao documento ID 16000280 (fl. 114), que trata de imagem colhida em sistema de georreferenciamento do sistema Google Maps, tal imagem fora colhida - conforme expressamente nela datado - em período próximo às alegações finais ministeriais, em 20/07/2018. Portanto, tal documento também é novo, segundo a legislação processual, tendo sido assim juntado em momento processual oportuno, de forma tempestiva e justificada. Nesta senda, pois, importante por ora reafirmar que foram oportunizadas vistas às partes requeridas para a devida manifestação acerca dos documentos em questão, de modo que não ocorrera cerceamento de defesa, na hipótese. Mais uma vez, portanto, de se rejeitar a preliminar em tela. c-) Mais além, já na terceira alegação preliminar - de que as condenações teriam se baseado em provas produzidas sem o crivo do contraditório e da ampla defesa - esta tampouco procede. Como muito bem colocado pelo órgão ministerial, em sede de contrarrazões, verbis: "Como se sabe, no presente caso, o procedimento preparatório objetivou colher elementos comprobatórios sobre os fatos aos quais os apelantes são processados. No presente caso, além das provas anexadas à inicial, foram produzidas outras em outras oportunidades, como no caso de oitiva de testemunhas. Todos esses elementos corroboraram para a cognição aprofundada do juízo sobre o caso concreto, de modo que acabou por determinar a convicção do magistrado a fim de condenar os réus quanto às penas previstas no art. 12 da Lei 8.429/92. Mais uma vez é importante ressaltar que as provas carreadas aos autos passaram pelo crivo do contraditório e ampla defesa, sendo permitido aos apelantes analisar, e eventualmente refutar, os documentos carreados pelo autor desta ação. Nesta toada, é inadmissível o argumento de que a sentença teria se pautado única e exclusivamente em elementos produzidos em fase pré processual. Pelo contrário, o juízo a quo formidavelmente estudou as provas dos autos e concluiu pela ilicitude dos atos perpetrados pelos réus." Nesta senda, de se repisar aqui que se trata de mera afirmação solta, sem qualquer ponderação ou cotejamento com a r. sentença guerreada, visto que toda a fundamentação expressa no r. decisum a quo - pela parcial procedência da presente ação civil pública - se dá tendo por base os elementos probatórios devidamente produzidos, articulados e debatidos - tudo sob o crivo do Contraditório e da Ampla Defesa - não se constatando, em nenhum momento, qualquer nulidade - ou mesmo irregularidade - processual. Preliminar também afastada. d-) Quanto à apontada "inversão do ônus da prova", não passa de um mero sofisma, beirando a temeridade. Com efeito, o que houve na hipótese fora o reconhecimento da debilidade da prova oral produzida pelos corréus. Isto em nada se confunde com a inversão do ônus probatório. No caso, o MM. Juízo a quo apenas destacara, em sua fundamentação, que o Parquet, este sim, conseguira comprovar a veracidade dos fatos alegados em sua peça inicial. De se transcrever, por ora, neste trecho, excerto da r. sentença de primeiro grau em sede de embargos de declaração, verbis: “...a menção à imprestabilidade das provas orais produzidas nada se relaciona à inversão do ônus da prova, mas ao fato de que o alegado pelo autor fora devidamente comprovado, não havendo nada no conteúdo daquelas provas que tivesse o condão de conduzir o juízo a decidir de modo diverso. A roupagem interpretativa que pretendem os embargantes, de que o juízo teria invertido em sentença o ônus da prova, de modo implícito, é desarrazoada e inverídica. O que houve foi o reconhecimento da debilidade da prova oral produzida.” Preliminar, mais uma vez, portanto, rejeitada. e-) Quanto à alegação de que a r. sentença a quo seria extra petita - em razão de o MM. Juízo de primeiro grau ter considerado a conduta dolosa dos requeridos e isto, segundo afirmado, não teria constado das alegações ministeriais - tampouco procede. Como é cediço, aqui nos cumpre por ora destacar que o Magistrado não fica vinculado à tipificação proposta pelo Ministério Público na peça exordial, o que em nada prejudica o exercício do direito de defesa do réu. Afinal, o réu se defende de fatos, sendo que cabe ao juiz, com amparo na lei, a fundamentação jurídica (iuria novit curia e mihi factum, dabo tibi ius). Em tendo havido, no decurso de todo o deslinde jurídico-processual, a nítida oportunização aos acusados do pleno exercício do Contraditório e da Ampla Defesa, aqui tampouco há que se falar em qualquer nulidade processual. Preliminar também afastada. f-) Acerca, ainda, de a r. sentença monocrática ser, mais uma vez, extra et ultra petita - por supostamente ter condenado os ora apelantes ao pagamento dos custos da demolição do restaurante - mais uma vez tais argumentos não devem ser acolhidos. Afinal, conforme consta nos autos desde a exordial, os fatos foram exaustivamente narrados pelo autor da demanda em referência, sendo os respectivos atos de improbidade administrativa então descritos. A condenação, portanto, dos corréus Valdir e Luiz Carlos no pagamento (solidário) das custas de demolição decorrem logicamente de regra positivada no Código Civil - mais precisamente em seu artigo 942, que expressamente preleciona que: "se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação." Isto posto, por terem concorrido para o ilícito, respondem na qualidade de devedores solidários quanto à obrigação de promover a devida reparação ao status quo ante. Rejeito. g-) Por derradeiro - ao menos no que diz respeito às preliminares recursais - não houve "aproveitamento de confissão de terceiro em desfavor dos demais requeridos", como maliciosamente alegam as partes interessadas, mas sim uma estimativa (em um valor mínimo, reafirme-se) do dano a ser ressarcido pelos corréus solidários. E aqui, mais uma vez, cumpre transcrever excerto da peça ministerial (contrarrazões), verbis: "Considerando que o início das atividades da Churrascaria e Restaurante Gabrielly data de junho de 2008, tem-se exatos 37 (trinta e sete) meses de uso comercial da área da União. O Parquet Federal, então, realiza o seguinte cálculo: – aplicando-se a taxa mensal de 1% (um por cento) sobre o valor da construção confessado por ANDRÉ BENDER (f. 49-52) – R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais), chega-se ao valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de valor do eventual arrendamento à ser transferido à União. – Em seguida, multiplicando-se tal valor pelo número de meses de utilização da área (até o momento), ou seja, 37 (trinta e sete) meses, tem-se como resultado o montante de R$ 296.000,00 (duzentos e noventa e seis mil reais). Insta ressaltar que o percentual acima citado se mostra bastante adequado ao caso em tela, dado que no cálculo foi desprezada, por exemplo, a localização do imóvel da União, com a consequente capacidade de geração de receitas provindas da movimentação de consumidores no local. Igualmente, deve-se considerar que, fosse o caso da União ceder a área para exploração particular, tal deveria ser feito mediante licitação, certamente com inúmeros interessados e com primazia a princípios como o da impessoalidade e legalidade. Ademais, considerando o relatório da Secretaria do Patrimônio da União (f. 1425-1450) que avalia o imóvel em questão em R$ 3.820.000,00 (três milhões oitocentos e vinte mil reais), bem como a manifestação deste Parquet de f. 1680-1681, no qual evidencia a natureza urbana do mesmo, reiteramos foi reiterado o pedido feito às f. 1422, para que fosse majorado o arrendamento pago em favor da União para R$ 19.100,00 (dezenove mil e cem reais, correspondente a 0,5% de R$ 3.820.000,00)." Em assim sendo, fica por ora claro e inequívoco que, em nenhum momento processual, aproveitara o Magistrado de origem confissão de terceiro contra os demais corréus para embasar suas respectivas condenações. Afinal, como se verá no capítulo seguinte, provas a fundamentar as condenações aqui não faltam. Apenas foi feita uma estimativa - conservadora, aliás, de novamente se ressaltar - acerca do quantum debeatur, que nem se trata de "confissão" propriamente dita, repise-se. Preliminar, pois, afastada. III. DO MÉRITO Uma vez superadas todas as alegações preliminares, devemos prosseguir agora quanto ao mérito das apelações e da remessa necessária. Nesta senda, pois, a r. sentença a quo deve ser mantida em seus próprios e escorreitos fundamentos, devendo a remessa necessária e as apelações serem desprovidas. Tudo nos termos a seguir: Em primeiro lugar, de se atentar que muito do já esclarecido supra - no capítulo anterior, das preliminares recursais - acaba por se relacionar com o seu mérito propriamente dito. Deste modo, para que não sejamos redundantes, prosseguiremos em relação apenas às alegações de mérito ainda não enfrentadas nesta decisão. Aqui, por ora, mais uma vez cumpre destacar que todos os recorrentes repetiram - em suas respectivas razões - todos aqueles argumentos já fartamente enfrentados nos autos - tanto pelo Ministério Público quanto pelo MM. Juízo de origem - confirmados em sentença, não trazendo quase nada de novo ao debate. Deste modo, insistem em sustentar a ausência de atos ímprobos nas atividades aqui descritas. Contudo, não se trata - como defendem - de meras irregularidades sanáveis. Mas sim de flagrantes ilegalidades e improbidades dolosas, que acarretaram em sérios prejuízos ao Erário. Pois bem. O primeiro argumento de mérito trazido pelos apelantes consiste no fato de que a r. sentença de primeiro grau trata, de maneira equivocada, uma autorização de uso como se fosse espécie diversa de ato administrativo, sendo que as formalidades então invocadas somente seriam aplicáveis em casos de cessão ou doação. Todavia, da detida análise de todo o conjunto fático-probatório produzido nestes autos, vislumbra-se, de forma clara e cristalina, se tratar, in casu, de verdadeira cessão de terras por parte do INCRA - terras estas que são destinadas ao assentamento Teijin - à FETAGRI - cessão que foi formalizada (de maneira ilegal, contrária às normas jurídicas em vigor, em especial à Norma de Execução 33, de 14/07/2003) por meio de simples Ofício - no que se baseou o Ministério Público Federal para propor a presente demanda. Ainda aqui cumpre destacar que o INCRA, no caso em tela, não autorizou simplesmente o uso da área destinada ao Projeto de Assentamento Teijin pela FETAGRI, mormente a título provisório, mas sim de fato cedera em caráter definitivo as terras públicas para a referida federação - já que inclusive consta do respectivo termo que haveria a "transferência definitiva" do imóvel à FETAGRI. Além disso, nos "Termos de Autorização e Cedência" em questão, a FETAGRI é identificada como "autorizante cedente" - o que denota que não houve apenas uma simples autorização de uso das terras pelo INCRA, mas sim uma verdadeira CESSÃO DE USO - a qual, portanto, repita-se, demanda um procedimento formal e complexo para ser corretamente viabilizada - não podendo, outrossim, ser concretizada por um único ofício. Tanto assim é que o Relatório Final da Comissão de Cunho Investigatório, instaurada pela Portaria/INCRA/SR-16/MS/Nº 76/2009, fora conclusivo no sentido de que "houve um erro de procedimento, uma vez que o pedido de cessão não foi formalizado pela FETAGRI junto à Superintendência Regional do INCRA SR-16/MS e, tampouco, foi instaurado procedimento administrativo objetivando a cessão da área pela Superintendência Regional do INCRA SR-16/MS em benefício da FETAGRI." (doc. ID 147748814). Ainda, nesse sentido, continua o supracitado relatório - apontando para algo muito mais grave que um mero "erro de procedimento" - em sua conclusão: "4. Que a Transferência de Autorização e Cedência celebrada entre a FETAGRI e os Srs. André Bender e Cleito Inéia nunca foram reconhecidas pela Superintendência Regional do INCRA SR-16/MS e, devem ter sua validade jurídica questionada pelo mesmo, cabendo aos órgãos competentes avaliar se tal ato está embasado de legalidade; 5. Que a Superintendência Regional do INCRA SR-16/MS jamais autorizou qualquer empresa particular a se instalar em parte do núcleo urbano do PA Teijin, bem como jamais autorizou a FETAGRI a repassar tal área a terceiros, que não os próprios trabalhadores rurais organizados e instalados no projeto de assentamento; 6. Que cabe aos órgãos competentes averiguar se houve irregularidade na relação entre a FETAGRI e a empresa hoje instalada no núcleo urbano e, em que circunstâncias ocorreu o acordo por eles firmado, uma vez que é sabido que a área pública não pode ser ocupada por empresa privada." Desta forma, não é minimamente verossímil que o réu VALDIR PERIUS (ex-Superintendente Regional Substituto do INCRA, à época dos fatos), ao determinar a cessão de terras públicas em questão sem a observância das formalidades devidas desconhecesse procedimentos a serem rotineiramente observados - especialmente por se tratar de cessão de terras, em grande extensão, a entidade privada (no caso, a FETAGRI). Na verdade, a conduta dolosa desse réu é evidente, pela própria condição pública que exercia no INCRA, tendo deliberadamente dado destinação ilegal às terras públicas, não apenas desatendendo procedimento formal, mas também dando destinação contrária ao interesse público que a vinculava nos termos da lei. Demais disso, verifica-se que consta do supramencionado Ofício (INCRA/SR-16/DDA/GAB/Nº 150/2007 que: "o uso e ocupação do núcleo urbano e construção de demais serviços" foi autorizado "em benefícios à comunidade, no Plano de Desenvolvimento da Comunidade Rural no Projeto de Assentamento Teijin" - o que de fato demonstra que o gestor, corréu, estava plenamente ciente da necessidade de que fosse observada a finalidade a que se destinava o imóvel. Assim, comprovado que a autorização de uso por VALDIR PERIUS é dolosa e ilícita - em discordância com os procedimentos legais e normativos pertinentes à hipótese - o que configura ato de improbidade administrativa em prejuízo ao Erário - já que se tratou de uso gratuito de terras da União, sem qualquer formalidade e contraprestação - o que obviamente ensejou enriquecimento sem causa dos corréus ora apelantes em prejuízo ao Erário. Tampouco é verossímil que o apelante LUIZ CARLOS BONELLI não tenha participado - dolosamente - das tratativas em que se estabeleceu a avença ilícita visando à cessão das terras públicas, ora descrita nestes autos. O próprio presidente da FETAGRI, Geraldo Teixeira de Almeida, bem esclareceu, em seu depoimento, que foi procurado por Ari José Inéia, visando a obtenção de autorização para a construção de um restaurante. Segundo o depoente, naquela reunião o Superintendente do INCRA, LUIZ CARLOS BONELLI assentiu com tal possibilidade de que, após a cessão das terras ora em referência à FETAGRI, que esta poderia, após, repassá-la ao empresário para a construção do empreendimento. E, de fato, assim aconteceu: após somente 13 dias (ID 147749697) - o que demonstra que a FETAGRI servira como mera "ponte" para possibilitar - de fato - o acesso do empresário - ilegalmente - às terras do INCRA, em notório desvio de finalidade. Portanto, o referido "acerto" entre as partes ora requeridas - com a nítida inobservância das formalidades legais, quanto à cessão de terras por parte do INCRA - se concretizara por mero "ofício" - o que não deixa dúvidas de que tudo fora engendrado, dolosamente, com o exclusivo fim de possibilitar a construção açodada do "empreendimento", de interesse particular dos empresários corréus. Tudo em desrespeito ao interesse público e ao Erário. Portanto, LUIZ CARLOS BONELLI também cometera ato doloso de improbidade administrativa. Neste sentido ainda merece destaque excerto das contrarrazões ministeriais, verbis: "A atividade do administrador da res publica deve ser exercida com atenção e zelo redobrados. Não é permitida tamanha falta de diligência e cuidado com o patrimônio púbico. Pelo contrário, o agente deve pautar sua atuação pela responsabilidade e probidade. Enfim, deve ser exemplo a ser seguido. Mais do que isso, não bastasse a falta de cuidado na atuação como agente público, há que se ressaltar o conhecimento acerca da irregularidade levada a efeito. Infere-se tal fato por meio da celeridade em que ocorreu a transferência do INCRA para a FETAGRI e desta para ARI JOSÉ INÉIA, denotando a colusão entre as partes para a cessão da área pública." Estas conclusões, ademais, cumpre destacar, são logicamente obtidas da apreciação do conjunto fático-probatório produzido nestes autos, sempre sob o crivo do Contraditório e da Ampla Defesa. Mais além: a prova oral colhida em juízo, ao contrário do alegado pelos recorrentes, não afastou o corroborado pelas demais, mas sim o contrário. Também à exaustão está comprovado nestes autos que, uma vez não observada a forma procedimental para a concessão de uso das terras públicas - em manifesto desvio de finalidade para a qual se destinavam - que isto se dera em razão de conluio entre todas as partes ora recorrentes, envolvidas a fim de se beneficiarem mutuamente e em conjunto, na promoção de seus interesses econômicos particulares. Portanto, os empresários - ora também apelantes - ANDRÉ BENDER, CLEITO VINÍCIO INÉIA e CLEITO VINÍCIO INÉIA - ME. foram ao final nítida, injusta e ilegalmente beneficiados com a cessão irregular da área, aproveitando-se economicamente de tal fato, em detrimento do Erário, onde por fim acabaram por edificar empreendimento lucrativo, cuja contraprestação foi quase nula em favor da FETAGRI - visto que reduzida à construção de um galpão e à aposição de um cercado de arame, bens estes, de qualquer forma, sem conexão e utilidade para a destinação finalística daquelas terras - e inexistente em benefício da União, verdadeira titular dos direitos sobre aquelas terras. A respeito da data de construção do restaurante, tampouco trouxeram quaisquer dos recorrentes elementos que infirmem a data reportada - e devidamente demonstrada - pelo corréu ANDRÉ BENDER (ID 1477488813), de que a "Churrascaria e Restaurante Gabrielly" começou a ser construída em março de 2007 e concluída em junho de 2008 - tendo sido inaugurada em 05/06/2008 - razão pela qual também deve ser afastada esta alegação recursal. De se reiterar, ainda, que está demonstrado - ao contrário do defendido - o nexo de causalidade entre os atos de LUIZ CARLOS BONELLI e VALDIR PERIUS e o referido dano experimentado pelo Erário e pelo interesse público, in casu. Com efeito, não teriam ocorrido as ilicitudes aqui descritas sem que VALDIR PERIUS houvesse assinado e autorizado, mediante simples ofício, cessão irregular de terras públicas. O mesmo a se dizer da definitiva participação de LUIZ CARLOS BONELLI, que, valendo-se de sua posição de Superintendente do INCRA, atuou em conluio com os demais corréus para - em tempo recorde - proceder à liberação administrativa das terras e construção do respectivo "empreendimento" ilícito. E aqui convém destacar excerto do d. parecer ministerial, verbis: "90. Até mesmo a forma como ocorreu a cessão das terras do INCRA, por meio de simples Ofício, sem qualquer projeto, planejamento ou detalhamento do que seria feito na área, demonstra a maior reprovabilidade dos gestores públicos demandados, justamente porque são eles que possuem o dever constitucional e legal de zelar pelo patrimônio público. 91. A ação em comento visa assegurar não só a observância das formalidades legais, mas, principalmente, que os princípios fundamentais constitucionais que permeiam a administração pública sejam respeitados, quais sejam, impessoalidade, legalidade, publicidade, eficiência e moralidade. 92. No caso, os atos perpetrados pelos réus desgarram-se de tal modo dos parâmetros mínimos de probidade administrativa, que não há como se negar a presença do elemento subjetivo. 93. Assim, por toda a forma como se veja a quaestio iuris, verifica-se que os réus cederam as terras públicas da forma como melhor lhes convinha, a fim de viabilizar, exclusivamente, interesses de particulares." Portanto, demonstrados os nexos de causalidade entre os atos dos corréus e o dano experimentado pelo Erário - seja em termos econômicos, seja no que se refere à lesão ao interesse público - em prol de interesses particulares espúrios. Os corréus servidores públicos, Luiz Carlos Bonelli e Valdir Perius, pois, em conluio doloso e voluntário com os demais, particulares, beneficiários - todos estes em concurso voluntário e consciente - procederam à cessão e/ou uso das referidas terras públicas de forma absolutamente ilícita, em detrimento do estabelecido em lei e da finalidade ínsita a este tipo de ato administrativo: cessão de terras públicas, com o objetivo de estabelecimento de assentamento, com o escopo social de colonização e reforma agrária. Nesse diapasão, pois, oportuno por ora refrisar que os corréus particulares, enfim, ao receberem ilicitamente o livre uso de imóvel público ilegalmente e ao construírem encima de imóvel público e dali exercerem atividade empresarial lucrativa de exclusivo interesse particular, obtiveram vantagem ilícita, em razão de não o terem adquirido onerosamente, nem sequer ao menos pago qualquer valor a título de arrendamento do mesmo em favor da União. Configurado, portanto, tanto o nexo de causalidade quanto o dolo nos atos de improbidade de todos os corréus, apelantes, e a concretização do efetivo dano ao Erário e ao interesse público. Ainda vale a pena por ora ressaltar, mais uma vez, o caráter público das terras ora em litígio, questão esta decidida há tempos por esta E. Corte Regional, que converteu a ação de reintegração de posse em desapropriação indireta e determinou que a área do Assentamento Teijin é de domínio da União (AC 0004675-81.2004.03.0000/MS - Relator Desembargador Federal HENRIQUE HERKENHOFF, j. 17/06/2010). Prosseguindo, argumentam também os recorrentes que o ato administrativo que autorizou a cessão das terras seria "mera irregularidade sanável", portanto passível de convalidação, haja vista que, com a instalação da lanchonete e restaurante, estaria sendo "atendido o interesse público". No entanto, tendo por base o artigo 55, da Lei nº 9.784/99, somente podem ser convalidados os atos que não tenham acarretado lesão ao interesse público e que, portanto, apresentem defeitos sanáveis. Desta forma, não é possível convalidação de ato ilícito praticado dolosamente com manifesta má-fé - em que houve nitidamente um conluio entre todos os corréus, ora apelantes - visando burlar as normas jurídicas pertinentes ao caso em pleno vigor, que impediu o INCRA, de fato, ao final, em promover a reforma agrária, objetivo principal do assentamento rural. Além disso, conforme já exaustivamente exposto aqui: houve manifesto prejuízo ao Erário, por anos a fio, tendo os corréus empresários logrado vultosos proveitos econômicos em atividade econômica lucrativa, fazendo uso de patrimônio da União, sem qualquer contraprestação. Como muito bem colocado pelo d. Procurador Regional da República oficiante no presente feito, em parecer, inclusive: "no caso de que se trata, o vício maculou a finalidade e a motivação do ato, o que é insuperável até mesmo para a Administração, justamente porque a convalidação opera efeitos ex nunc." Neste diapasão, imperioso por ora ressaltar o indeferimento do pedido recursal subsidiário dos corréus ANDRÉ BENDER, CLEITO VINÍCIO INÉIA e CLEITO VINÍCIO INÉIA - ME, consistente na conversão da pena de demolição em arrendamento, já que tal providência pressupõe a convalidação do ato administrativo, o que, como já verificado, é, in casu, impraticável por nunca poder atender à finalidade das terras públicas definidas em lei. Pelo que se apurou, é bem verdade que a FETAGRI somente atuou como "ponte" a título de beneficiária das terras para, logo após, repassá-las - em manifesto ato jurídico simulado - aos verdadeiros beneficiários de fato do conluio ora descrito, quais sejam, ao falecido Ari José Inéia, ao seu herdeiro e sucessor, Cleito Vinício Inéia, e André Bender, bem como à empresa Cleito Vinício Inéia - Me. Neste exato sentido é a r. sentença a quo, cujo excerto ora se repete, e que se aproveita para fundamentação do presente decisum: "A existência da manobra ilícita pode ser extraída do depoimento de GERALDO TEIXEIRA DE ALMEIDA à fl. 125 do Inquérito Civil Público e transcrito duas vezes na peça exordial do MPF, dada sua importância: “O Sr. Ari José Inéia procurou a Fetagri, solicitando uma Audiência junto ao INCRA, visando obter autorização do mesmo para ocupação de parte da área com a finalidade de construir um restaurante, pois o mesmo alegava que o prazo para desocupação do prédio que ocupava no Posto Casa Verde estava vencendo e ele precisava de um outro lugar, não querendo se afastar da região. Marcamos a reunião com o Superintendente que se negou a ceder a área para o empresário, mas que poderia cedê-lo à FETAGRI, que posteriormente poderia repassá-la ao empresário para a construção do referido restaurante.”. A Lei n. 9.636/1998, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, permite, a critério do Poder Executivo, a cessão, gratuita ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei n. 9.760, de 1946, de imóveis da União a pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse nacional (art. 18, II) - grifei. Em seu §5º, ainda há previsão de que na hipótese de destinação à execução de empreendimento de fim lucrativo, a cessão será onerosa e, sempre que houver condições de competitividade, serão observados os procedimentos licitatórios previstos em lei e o disposto no art. 18-B desta Lei (grifei). Não bastasse, no próprio Termo de Autorização e Cedência consta que a área em questão foi cedida “por tempo indeterminado, aguardando apenas a transferência definitiva pelo INCRA, a favor da FETRAGRI-MS”, sendo que a autorizante cedente ficou encarregada, ainda, após a transferência definitiva, “de repassar o imóvel aos autorizados cessionários”, o que culminou na edificação do empreendimento Churrascaria e Lanchonete Gabrielly (ID 15996251 - Pág. 15-18). Na mesma esteira do que foi acima fundamentado, a transferência da posse e utilização de parte da área do Núcleo Urbano do Projeto de Assentamento Teijin, da FETAGRI-MS para particular, jamais poderia ser efetivada, ainda mais de forma gratuita (ou com contrapartida ínfima), mediante autorização de uso de bem público e à revelia do INCRA. Ora, a simplicidade do processo e a acentuada precariedade da outorga do uso do bem público nesta modalidade não se coaduna com a magnitude do empreendimento realizado, inicialmente estimado em R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais). A participação dos demais réus envolvidos na posterior transferência do bem para construção do empreendimento particular, GERALDO TEIXEIRA DE ALMEIDA, ARI JOSE INÉIA (representado pelo espólio), CLEITO VINICIO INÉIA e ANDRE BENDER, subscritores dos contratos de cessão da autorização de uso e cessão, está clarividente. Assim como a responsabilidade da CHURRASCARIA E LANCHONETE GABRIELLY (CLEITO VINICIO INÉIA ME), pessoa jurídica que aufere lucro de elevada monta, o que somente se tornou possível por meio da cessão/autorização irregular de uso de bem público para fins particulares. A ré FETAGRI, por sua vez, se beneficiou com o cercamento da área ocupada pela federação e a construção de um escritório para seu uso, realizados pelos donos do empreendimento em contrapartida à cessão de área no núcleo urbano do assentamento. Ou seja: pessoa jurídica beneficiária consciente de ato ímprobo. Caracterizada a nítida troca de favores. (...) Pelo narrado, é certo que todos os envolvidos tinham o intuito (dolo) de que a área fosse repassada, mediante burla aos normativos de regência, ao senhor Ari José Inéia, de modo a possibilitar a construção de seu empreendimento naquela área. Segundo bem apontado pelo INCRA, em suas alegações finais (Id 16000280 – p. 122), a transferência para Ari José Inéia se perfectibilizou em meros 12 dias após a precária autorização concedida pelos representantes da Autarquia. Destarte, imperioso concluir pelo prévio ajuste (conluio) a fim de possibilitar a transferência. Conluio, este, caracterizador da desonestidade no agir ou má-fé (intenção de fraudar a lei); condição subjetiva necessária para a configuração do ato de improbidade." Quanto à responsabilidade solidária pelo pagamento dos custos da demolição - bem como demais valores a serem despendidos para a efetiva recomposição do status quo ante - embora já tenhamos, no capítulo das preliminares, enfrentado a questão, nunca é demais relembrar que agira com acerto o MM. Juízo de primeiro grau. Com efeito, é expresso no artigo 942 do Código Civil que a responsabilidade civil por ato ilícito é solidária entre seus coautores e partícipes. Afinal, repita-se também que tais despesas não se caracterizam, a rigor, como uma mera sanção, mas sim são o ônus para a devida recomposição da situação ao estado em que se encontrava anterior à prática dos atos ilícitos aqui analisados. Ainda deve-se consignar, por ora, quanto a todas as sanções impostas aos corréus - ora apelantes - em primeiro grau de jurisdição - inclusive o montante praticado a título de multa civil - que estas foram estabelecidas em conformidade com os parâmetros previstos na LIA - bem como da razoabilidade e proporcionalidade - sendo fixadas no mínimo legal ou muito próximo disso, de forma plenamente fundamentada, não havendo, pois, qualquer razão suficientemente demonstrada para a reforma do já decidido, neste aspecto. Acerca da obrigação solidária de reparação do dano, de se retomar novamente a fundamentação constante no item II, letra g, ressaltando que a estimativa realizada pelo Parquet e pelo MM. Juízo a quo, in casu, é muito razoável, verossímil e fundamentada, tendo por escopo a apuração de um valor mínimo de reparação à União - em importância notoriamente muito abaixo do praticado pelo mercado imobiliário, dada a extensão da área envolvida e às benfeitorias confessadamente ocorridas na região onde se encontra a edificação irregular. Por derradeiro, quanto ao pedido de indenização pelas benfeitorias efetuadas na região do empreendimento pelos ora apelantes, de se salientar que, em se tratando de bem público, não há que se falar, na hipótese, em posse, mas sim de mera detenção - e a título precário e decorrente de ato ilícito -, o que definitivamente inviabiliza a pretensão indenizatória dos recorrentes. Nesse sentido é a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, verbis: "O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que a ocupação de bem público não gera direitos possessórios, e sim mera detenção de natureza precária e afasta o pagamento de indenização pelas benfeitorias, bem como o reconhecimento do direito de retenção, nos termos do art. 1.219 do CC." (STJ - 2ª Turma - AREsp 1725385/SP - Relator Ministro HERMAN BENJAMIN - DJe 09/04/2021). Com efeito, não se tratando de "posse", mas mera "detenção decorrente de ato ilícito", não incidem no caso as regras dos artigos 1.219 e 1.220 do Código Civil, que pressupõem "posse". Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis. Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias. E mesmo que fosse possível falar de "posse" - o que não é, como frisado -, no caso se trataria de posse de má-fé (em razão da origem ilícita comprovada), pelo que somente as benfeitorias necessárias seriam passiveis de ressarcimento, mas, no caso, nada do que ali se edificou pode ser enquadrado como "benfeitoria necessária", posto que construído em manifesta violação à destinação legal das terras, obras que deverão, por isso mesmo, serem demolidas. Destarte, mais uma vez, de se entender pela manutenção da r. sentença de origem, pelos seus próprios e escorreitos fundamentos, que ora são integrados às presentes razões de decidir. Quanto ao pedido de liberação dos bens dos recorrentes, por lógico de se entender que este se encontra prejudicado, em função da manutenção integral da r. sentença condenatória de primeiro grau. Anoto ainda que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos. IV. Pelo exposto, nego provimento à remessa necessária e às apelações dos corréus, mantendo-se, pois, hígida a r. sentença de primeiro grau, pelos seus próprios e escorreitos fundamentos. De se ressaltar, por último, que devem ser excluídas e/ou anuladas quaisquer averbações ou títulos de propriedade particular das presentes terras públicas porventura existentes, oficiando-se o Registro de Imóveis competente neste sentido. É como voto.
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO FERREIRA JUNIOR - MS7862-A, GUSTAVO MARQUES FERREIRA - MS7863-A, JOSE WANDERLEY BEZERRA ALVES - MS3291-A, WAGNER DA SILVA FREITAS - MS15492-A
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: TATIANI MOSSINI DE LUCENA - MS25806-A
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: JOAO GONCALVES DA SILVA - MS8357-A
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: MARISA DOS SANTOS ALMEIDA PEREIRA LIMA - MS5225-A
REPRESENTANTE do(a) INTERESSADO: CLEITO VINICIO INEIA
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: JOSE ANTONIO VIEIRA - MS3828-A
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CESSÃO DE TERRAS PÚBLICAS POR MERO OFÍCIO, DESTITUÍDA DAS FORMALIDADES LEGAIS. CONLUIO DOLOSO ENTRE OS RÉUS, A FIM DE POSSIBILITAR A IRREGULAR CESSÃO DE TERRAS PÚBLICAS DESTINADAS À REFORMA AGRÁRIA, PARA FINS PARTICULARES, SEM QUALQUER CONTRAPRESTAÇÃO À UNIÃO, EM FLAGRANTE PREJUÍZO AO ERÁRIO E ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DE PARTICULARES. CONDENAÇÃO PELAS CONDUTAS TÍPICAS PREVISTAS NA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LIA). PEDIDO INCIDENTAL DAS PARTES, PELA VINCULAÇÃO DA SENTENÇA PENAL ABSOLUTÓRIA NO DESLINDE DA PRESENTE DEMANDA. INOCORRÊNCIA DE RECONHECIMENTO DA INEXISTÊNCIA DO FATO OU DE NEGATIVA CATEGÓRICA DA AUTORIA. INDEFERIMENTO. PRELIMINARES, TODAS AFASTADAS: ILEGITIMIDADE AD CAUSAM PASSIVA. JUNTADA INTEMPESTIVA DE DOCUMENTOS. NULIDADE POR CONDENAÇÃO SUPOSTAMENTE BASEADA APENAS EM PROVAS PRODUZIDAS SEM OBSERVÂNCIA AO CONTRADITÓRIO JUDICIAL. ALEGADA "INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA". CONDENAÇÃO EXTRA PETITA, SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU ALEGADAMENTE "SEM CONGRUÊNCIA" COM O REQUERIDO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, EM EXORDIAL. CONDENAÇÃO EXTRA ET ULTRA PETITA, POR CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA NOS CUSTOS DE DEMOLIÇÃO E DE REPOSIÇÃO DO BEM AO STATUS QUO ANTE. NULIDADE DA SENTENÇA, POR SUPOSTO APROVEITAMENTO, CONTRA OS DEMAIS CORRÉUS, DE CONFISSÃO DE UM DELES. MÉRITO: IMPOSSIBILIDADE DE CONVALIDAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO ILEGAL, NÃO SE TRATANDO DE "MERA IRREGULARIDADE" SANÁVEL. RAZOÁVEL FIXAÇÃO DO VALOR DO DANO (QUANTUM DEBEATUR), EM SEU PATAMAR MÍNIMO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE NA FIXAÇÃO DAS SANÇÕES PELOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PRATICADOS. APELAÇÕES E REEXAME NECESSÁRIO DESPROVIDOS. SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU MANTIDA EM SUA INTEGRALIDADE.
Dado o princípio processual-constitucional da independência entre as instâncias cível e criminal - por não se tratar de reconhecimento da inexistência dos fatos ora em análise nem tampouco de negativa categórica da autoria dos mesmos - não tem a referida sentença criminal absolutória o condão de afetar o desfecho dos autos processuais cíveis. Desta forma, o julgamento da presente ação civil pública deve se pautar no conjunto fático-probatório dos respectivos autos, ora em análise. Isto sempre, sem olvidar, sob o crivo do Contraditório e da Ampla Defesa - estes expressos na Constituição da República. Pedidos incidentais indeferidos.
Acerca das preliminares recursais: quanto à suposta ilegitimidade ad causam passiva, de se destacar que tanto o ex-Superintendente Substituto do INCRA/MS - quanto o corréu à época dos fatos, Superintendente Regional do INCRA no Estado do Mato Grosso do Sul - autorizaram - dolosamente e sem a observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie - o uso e ocupação do núcleo urbano do "Projeto de Assentamento Teijin", de modo que, por isso, não faz qualquer sentido a alegação preliminar de que jamais deveriam ter figurado no polo passivo da presente ação civil pública. Preliminar, pois, afastada.
Tampouco procede a tese de que os documentos carreados pelo Ministério Público Federal seriam intempestivos, isto porque atendem aos requisitos estabelecidos no artigo 435 do Código de Processo Civil. Ou seja: por se tratarem de documento novo, admite-se sua juntada após a inicial ou a contestação, em momento oportuno, desde que justificada a razão para tanto. Nesta senda, pois, importante por ora reafirmar que foram oportunizadas vistas às partes requeridas para a devida manifestação acerca dos documentos em questão, de modo que não ocorrera cerceamento de defesa, na hipótese. Mais uma vez, portanto, de se rejeitar a preliminar em tela.
Mais além, já na terceira alegação preliminar - de que as condenações teriam se baseado em provas produzidas sem o crivo do contraditório e da ampla defesa - esta tampouco procede. Nesta senda, de se repisar aqui que se trata de mera afirmação solta, sem qualquer ponderação ou cotejamento com a r. sentença guerreada, visto que toda a fundamentação expressa no r. decisum a quo - pela parcial procedência da presente ação civil pública - se dá tendo por base os elementos probatórios devidamente produzidos, articulados e debatidos - tudo sob o crivo do Contraditório e da Ampla Defesa - não se constatando, em nenhum momento, qualquer nulidade - ou mesmo irregularidade - processual. Afasta-se.
Quanto à apontada "inversão do ônus da prova", não passa de um mero sofisma, beirando a temeridade. Com efeito, o que houve na hipótese fora o reconhecimento da debilidade da prova oral produzida pelos corréus. Isto em nada se confunde com a inversão do ônus probatório. No caso, o MM. Juízo a quo apenas destacara, em sua fundamentação, que o Parquet, este sim, conseguira comprovar a veracidade dos fatos alegados em sua peça inicial. Rejeita-se.
Tampouco o Magistrado fica vinculado à tipificação proposta pelo Ministério Público na peça exordial, o que em nada prejudica o exercício do direito de defesa do réu. Afinal, o réu se defende de fatos, sendo que cabe ao juiz, com amparo na lei, a fundamentação jurídica (iuria novit curia e mihi factum, dabo tibi ius). Em tendo havido, no decurso de todo o deslinde jurídico-processual, a nítida oportunização aos acusados do pleno exercício do Contraditório e da Ampla Defesa, aqui tampouco há que se falar em qualquer nulidade processual. Preliminar também afastada.
A condenação dos corréus no pagamento (solidário) das custas de reposição do bem ao status quo ante decorrem logicamente de regra positivada no Código Civil - mais precisamente em seu artigo 942, que expressamente preleciona que: "se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação." Isto posto, por terem concorrido para o ilícito, respondem na qualidade de devedores solidários quanto à obrigação de promover a devida reparação ao status quo ante. Rejeita-se.
Por derradeiro, quanto às preliminares recursais, fica por ora claro e inequívoco que, em nenhum momento processual, aproveitara o Magistrado de origem confissão de terceiro contra os demais corréus para embasar suas respectivas condenações. Afinal, como se verá no capítulo seguinte, provas a fundamentar as condenações aqui não faltam. Apenas foi feita uma estimativa - conservadora, aliás, de novamente se ressaltar - acerca do quantum debeatur. Rejeitada.
Quanto ao mérito das apelações e da remessa necessária, da detida análise de todo o conjunto fático-probatório produzido nestes autos, vislumbra-se, de forma clara e cristalina, se tratar, in casu, de verdadeira cessão de terras por parte do INCRA- destinadas ao assentamento Teijin - à FETAGRI - formalizada (de maneira ilegal, contrária às normas jurídicas em vigor, em especial à Norma de Execução 33, de 14/07/2003) por meio de simples Ofício - no que se baseou o Ministério Público Federal para propor a presente demanda.
Mais além, o referido "acerto" entre as partes ora requeridas - com a nítida inobservância das formalidades legais, quanto à cessão de terras por parte do INCRA - se concretizara por mero "ofício" - o que não deixa dúvidas de que tudo fora engendrado, dolosamente, com o exclusivo fim de possibilitar a construção açodada do "empreendimento", de interesse particular dos empresários corréus. Tudo em desrespeito ao interesse público e ao Erário.
Estas conclusões, ademais, são logicamente obtidas da apreciação do conjunto fático-probatório produzido nestes autos, sempre sob o crivo do Contraditório e da Ampla Defesa. Mais além: a prova oral colhida em juízo, ao contrário do alegado pelos recorrentes, não afastou o corroborado pelas demais, mas sim o contrário.
Também à exaustão comprovado nestes autos que, uma vez não observada a forma procedimental para a concessão de uso das terras públicas - em manifesto desvio de finalidade para a qual se destinavam - que isto se dera em razão de conluio entre todas as partes ora recorrentes, envolvidas a fim de se beneficiarem mutuamente e em conjunto, na promoção de seus interesses econômicos particulares.
Portanto, os empresários - ora também apelantes - foram ao final nítida, injusta e ilegalmente beneficiados com a cessão irregular da área, aproveitando-se economicamente de tal fato, em detrimento do Erário, onde por fim acabaram por edificar empreendimento lucrativo, cuja contraprestação foi inexistente em benefício da União, verdadeira titular dos direitos daquelas terras.
A respeito da data de construção do restaurante, tampouco trouxeram quaisquer dos recorrentes elementos que infirmem a data reportada - e devidamente demonstrada - por um dos corréus, de que a "Churrascaria e Restaurante Gabrielly" começou a ser construída em março de 2007 e concluída em junho de 2008 - tendo sido inaugurada em 05/06/2008 - razão pela qual também deve ser afastada esta alegação recursal.
Portanto, demonstrados os nexos de causalidade entre os atos dos corréus e o dano experimentado pelo Erário - seja em termos econômicos ou no que se refere à lesão ao interesse público - em prol de interesses particulares espúrios. Os corréus servidores públicos, pois, em conluio doloso e voluntário com os demais, particulares, beneficiários - todos estes em concurso voluntário e consciente - procederam à cessão e/ou uso das referidas terras públicas de forma absolutamente ilícita, em detrimento do estabelecido em lei e da finalidade ínsita a este tipo de ato administrativo: cessão de terras públicas, com o objetivo de estabelecimento de assentamento, com o escopo social de colonização e reforma agrária.
Ainda vale a pena por ora ressaltar o caráter público das terras ora em litígio, questão esta decidida há tempos por esta E. Corte Regional, que converteu a ação de reintegração de posse em desapropriação indireta e determinou que a área do Assentamento Teijin é de domínio da União (AC 0004675-81.2004.03.0000/MS - Relator Desembargador Federal HENRIQUE HERKENHOFF, j. 17/06/2010).
Tendo por base o artigo 55, da Lei nº 9.784/99, somente podem ser convalidados os atos que não tenham acarretado lesão ao interesse público e que, portanto, apresentem defeitos sanáveis. Desta forma, não é possível convalidação de ato ilícito praticado dolosamente com manifesta má-fé - em que houve nitidamente um conluio entre todos os corréus, ora apelantes - visando burlar as normas jurídicas pertinentes ao caso em pleno vigor, que impediu o INCRA, de fato, ao final, em promover a reforma agrária, objetivo principal do assentamento rural.
Além disso, conforme já exaustivamente exposto aqui: houve manifesto prejuízo ao Erário, por anos a fio, tendo os corréus empresários logrado vultosos proveitos econômicos em atividade econômica lucrativa, fazendo uso de patrimônio da União, sem qualquer contraprestação.
Neste diapasão, imperioso por ora ressaltar o indeferimento do pedido recursal subsidiário dos corréus, consistente na conversão da pena de demolição em arrendamento, já que tal providência pressupõe a convalidação do ato administrativo, o que, como já verificado, é, in casu, impraticável.
Pelo que se apurou, é bem verdade que a FETAGRI somente atuou como "ponte" a título de beneficiária das terras para, logo após, repassá-las - em manifesto ato jurídico simulado - aos verdadeiros beneficiários de fato do conluio ora descrito.
Quanto à responsabilidade solidária pelo pagamento dos valores a serem despendidos para a efetiva recomposição do status quo ante - embora já tenhamos, no capítulo das preliminares, enfrentado a questão, nunca é demais relembrar que agira com acerto o MM. Juízo de primeiro grau. Com efeito, é expresso no artigo 942 do Código Civil que a responsabilidade civil por ato ilícito é solidária entre seus coautores e partícipes.
Ainda de se consignar, por ora, quanto a todas as sanções impostas aos corréus - ora apelantes - em primeiro grau de jurisdição - inclusive o montante praticado a título de multa civil - que estas foram estabelecidas em conformidade com os parâmetros previstos na LIA - bem como da razoabilidade e proporcionalidade - sendo fixadas no mínimo legal ou muito próximo disso, de forma plenamente fundamentada, não havendo, pois, qualquer razão suficientemente demonstrada para a reforma do já decidido, neste aspecto.
Acerca da obrigação solidária de reparação do dano, de se ressaltar que a estimativa realizada pelo Parquet e pelo MM. Juízo a quo, in casu, é muito razoável, verossímil e fundamentada, tendo por escopo a apuração de um valor mínimo de reparação à União - em importância notoriamente muito abaixo do praticado pelo mercado imobiliário, dada a extensão da área envolvida e às benfeitorias confessadamente ocorridas na região onde se encontra a edificação irregular.
Quanto ao pedido de indenização pelas benfeitorias efetuadas na região do empreendimento pelos ora apelantes, de se salientar que, em se tratando de bem público, não há que se falar, na hipótese, em posse, mas sim de mera detenção - e a título precário, o que definitivamente inviabiliza a pretensão indenizatória dos recorrentes. Precedentes do STJ.
Apelações e remessa oficial desprovidas. Sentença de primeiro grau mantida, em sua integralidade e pelos seus próprios e escorreitos fundamentos.