APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000182-45.2024.4.03.6108
RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA
APELANTE: BRUNO MARQUES DA CONCEICAO, FRANCINE DE FATIMA FEITOZA MARQUES
Advogado do(a) APELANTE: DEBORAH DA SILVA MOREIRA - SP405282-A
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Advogado do(a) APELADO: JACQUELINE ALLANA MONTANARI - SP385196-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000182-45.2024.4.03.6108 RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA APELANTE: BRUNO MARQUES DA CONCEICAO, FRANCINE DE FATIMA FEITOZA MARQUES Advogado do(a) APELANTE: DEBORAH DA SILVA MOREIRA - SP405282-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, GERENTE CAIXA ECONOMICA FEDERAL BAURU Advogado do(a) APELADO: JACQUELINE ALLANA MONTANARI - SP385196-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALESSANDRO DIAFERIA (Relator): Trata-se de recurso de agravo interno interposto pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL — CEF (ID 304686753) em face da r. decisão monocrática proferida pelo então Relator, que deu provimento à apelação dos impetrantes, concedendo a segurança e determinando a liberação do saldo de conta vinculada ao FGTS para fins de custeio do tratamento médico de R.F.M, diagnosticado com transtorno do espectro autista (ID 303601132). Irresignada, a CEF, ora agravante aduziu, em suma, que: (i) o saque de saldo da conta vinculada do FGTS da parte contrária não pode ser realizado, tendo em vista que não encontra amparo legal; (ii) a sistemática do Saque Aniversário, pela qual a parte recorrida optou, impede a liberação do saldo atualmente (ID 304686753). Sem apresentação de contrarrazões ao recurso interposto, vieram os autos conclusos. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000182-45.2024.4.03.6108 RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA APELANTE: BRUNO MARQUES DA CONCEICAO, FRANCINE DE FATIMA FEITOZA MARQUES Advogado do(a) APELANTE: DEBORAH DA SILVA MOREIRA - SP405282-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, GERENTE CAIXA ECONOMICA FEDERAL BAURU Advogado do(a) APELADO: JACQUELINE ALLANA MONTANARI - SP385196-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL ALESSANDRO DIAFERIA (Relator): De início, destaco que a decisão monocrática se sujeita a agravo legal, previsto no artigo 1.021 do CPC, recurso que devolve a matéria decidida a órgão fracionário do tribunal, garantindo às partes julgamento por colegiado, não havendo que se falar em cerceamento de defesa (Precedentes: AgRg no AREsp 381.524/CE, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 17/04/2018, DJe 25/04/2018 - AgInt no AREsp 936.062/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2018, DJe 27/03/2018 - AgRg no AREsp 109.790/PI, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/09/2016, DJe 16/09/2016). Vale ressaltar que o próprio Superior Tribunal de Justiça admite o julgamento monocrático do relator, mesmo que não haja súmula, recurso repetitivo, incidente de resolução de demanda repetitiva ou assunção de competência, desde que haja entendimento dominante sobre o tema. A Súmula 568 daquela Corte prevê que “o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema”, continua a ser aplicada regularmente, mesmo após a vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Precedentes: AgInt no REsp n. 1.852.090/SP, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 14/8/2023, DJe de 16/8/2023; AgInt no REsp n. 1.914.810/SP, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 11/9/2023, DJe de 13/9/2023; AgRg no AREsp n. 2.281.807/PR, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 15/8/2023, DJe de 18/8/2023; AgRg no HC n. 822.886/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 14/8/2023, DJe de 17/8/2023). Por conseguinte, alegações de nulidade da decisão monocrática são superadas com a apreciação do agravo interno pelo órgão colegiado competente, conforme orientação do E. STJ (AgInt no REsp 1.688.594/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 05/12/2017, DJe 15/12/2017). Dessa forma, é assegurado à parte o acesso ao colegiado através do agravo interno no qual deve explicitar as razões pelas quais a decisão agravada não respeitou os requisitos para o julgamento monocrático, proferido nos termos do artigo 932, do CPC. No caso dos autos, a parte agravante insurge-se contra decisão do pretérito Relator que deu provimento à apelação, proferida nos seguintes termos (ID 303601132): “(...) Decido. O Código de Processo Civil possibilita o julgamento unipessoal observando-se o caráter vinculante dos precedentes (artigo 927 do NCPC): “Art. 932. Incumbe ao relator: (...) III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; (...)” A princípio, a interpretação normativa literal do artigo 932, incisos IV e V, induz o julgador à conclusão de que somente em relação aos temas que já são objeto dos precedentes ali enumerados poderiam ser apreciados monocraticamente. A prática dos tribunais superiores, bem como à consideração dos princípios que informam o sistema processual brasileiro, conduzem, todavia, à conclusão diversa, no sentido de que as hipóteses do artigo 932 abrangem também as matérias que já sejam objeto de jurisprudência dominante nos tribunais superiores ou no próprio tribunal. Com efeito, a Súmula 568 do STJ dispõe que “O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema” (CORTE ESPECIAL, julgado em 16/03/2016, DJe 17/03/2016). A referida Súmula continua sendo aplicada pelo STJ na vigência do NCPC (precedentes: AgInt no AREsp n. 2.006.173/PR, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 22/11/2022, DJe de 24/11/2022; AgInt no REsp n. 1.899.941/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 23/5/2022, DJe de 25/5/2022.). O E. STF também adota este entendimento (precedentes: AR 2882 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 21-02-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-042 DIVULG 04-03-2022 PUBLIC 07-03-2022; ARE 1260087 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 17-02-2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-044 DIVULG 08-03-2021 PUBLIC 09-03-2021) Note-se que o julgamento monocrático não enseja qualquer prejuízo às partes e tampouco ofende o princípio da colegialidade, mormente considerando a possibilidade de interposição de agravo interno contra a referida decisão, cabendo ressaltar, por outro lado, que a utilização deste instituto processual se coaduna com os princípios da eficiência, economia e celeridade processuais, na medida em que filtra os recursos com baixa probabilidade de acolhimento, já que calcado em jurisprudência dominante no tribunal ou nas Cortes Superiores, contribuindo para a redução do tempo de julgamento da demanda e do custo inerente à movimentação da máquina judicial. Nesta senda, entendo pela possibilidade de ampliação interpretativa das hipóteses previstas no artigo 932, incisos IV e V, Código de Processo Civil de 2015, de modo que a autorização para as decisões unipessoais em sede recursal não fique restrita à literalidade da redação constante do dispositivo em comento, que demanda a existência de julgados de aplicação cogente. De fato, a interpretação teleológica da norma permite a compreensão de que está autorizada a prolação de decisão monocrática quando houver jurisprudência dominante sobre o tema. Considerando que, no caso vertente, a matéria recursal se refere à questão amplamente pacificada na jurisprudência pátria, como se verá na fundamentação a seguir, entendo pela possibilidade de julgamento de recursos por decisão monocrática, com fulcro no artigo 932, incisos IV e V, do Código de Processo Civil. Passo ao exame do recurso. Pois bem. No caso concreto, o mandado de segurança encontra-se instruído com prova documental da existência do saldo do FGTS de titularidade dos Impetrantes (IDs 302572302 e 302572303), genitores de R.F.M, portador de Transtorno do Espectro Autista (IDs 302572306, 302572307, 302572308 e 302572309). Assim, entendo que deva ser reformada a r. sentença, pois a via do mandado de segurança é adequada para a busca da satisfação do interesse dos Impetrantes. Pois bem, a enfermidade restou demonstrada, bem como a titularidade da conta do FGTS e a relação de dependência dos Impetrantes e do filho menor, além dos gastos já suportados com tratamento. Isto porque a exigência comumente constante em formulário da Caixa é de que o transtorno do espectro autista seja de grau severo, nível 3 e não de falta de condição econômica dos pais de criança nesta condição. A exigência de que o espectro autista seja de grau severo não deve prevalecer, tendo em vista o princípio social da norma (artigo 20 da Lei n. 8.036/90). A Lei nº 8.036/90, em seu artigo 20, prevê as hipóteses em que o trabalhador poderá movimentar livremente a sua conta vinculada, quais sejam: (...) XXII - quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes for, nos termos do regulamento, pessoa com doença rara, consideradas doenças raras aquelas assim reconhecidas pelo Ministério da Saúde, que apresentará, em seu sítio na internet, a relação atualizada O diploma legal não exige comprovação de necessidade financeira e, ademais, as hipóteses elencadas no artigo 20, da Lei nº 8.036/90 possuem caráter exemplificativo, razão pela qual a liberação do saldo das contas vinculadas ao FGTS deve ser permitida nas situações em que o requerimento decorre da necessidade em virtude de doença grave do próprio titular ou de seus dependentes, mesmo que não se encontre em estado terminal, dado que não se pode negar ao trabalhador o acesso aos recursos que são de sua titularidade, mesmo diante da destinação social de tais recursos. Não se deve olvidar que o saque do FGTS em casos de tratamento de saúde revela plena aplicação do princípio da justiça e da equidade, atendendo ao interesse coletivo, pois não deve ser negligenciado o seu oneroso tratamento médico. Portanto, ainda que a moléstia que acomete o filho da requerente não esteja expressamente prevista nas hipóteses autorizativas de saque do FGTS, cumpre ao Judiciário ampliar a incidência da norma de regência, mercê da necessária relativização dos princípios informadores da ação de julgar, tendo em vista que o processo moderno está imantado não apenas pelo escopo jurídico mas também pelo social e pelo político (princípio da instrumentalidade do processo), devendo o julgador perseguir o justo e o equitativo (princípio da efetividade do processo), não olvidando os demais direitos constitucionais e infraconstitucionais que albergam a proteção do direito à vida e à saúde. A aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana, insculpido no artigo 1º, inciso III da Constituição da República, deve ser efetivo, permitindo o tratamento da pessoa acometida de doenças por meio dos recursos em conta do FGTS. Afinal, o saldo do FGTS é patrimônio do trabalhador, ou seja, pertence à parte requerente, sendo justo e razoável a liberação para custear os gastos com tratamento de moléstia de seu filho, mantendo-se, assim, a integridade do direito à vida e à saúde. Certo é que o Ministério Público Federal ajuizou Ação Civil Pública (autos n. 0028244-17.2016.4.02.5001) em face da Caixa Econômica Federal por conta da recusa na liberação do FGTS nos casos de doenças não elencadas na Lei 8.036/90 e o pedido foi julgado procedente, determinando-se que a Caixa autorize a movimentação das contas do FGTS no caso de trabalhadores ou qualquer de seus dependentes que forem acometidos de tuberculose ativa; hanseníase; alienação mental; neoplasia maligna; cegueira; paralisia irreversível e incapacitante; cardiopatia grave; doença de Parkinson; espondiloartrose anquilosante; nefropatia grave; estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante); contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada; e hepatopatia grave, porquanto reconhecidas, também, para a concessão de outros benefícios, nos termos da fundamentação; além, é claro, daquelas previstas no art. 20, da Lei 8036/90, inclusive quanto aos pacientes em estágio terminal, em razão de doença grave (inciso XIV), independentemente da existência de regulamento. A delimitação dessas doenças para os fins propostos naquela ação não impede a análise de requerimentos relacionados a outras doenças, atreladas ao seu estágio e gravidade, e tampouco prejudica as ações judiciais propostas – ou a serem propostas – individualmente em casos e moléstias diversas das reconhecidas como autorizadoras do saque. A decisão judicial, proferido em Ação Civil Pública, tem efeito erga omnes, oponível a todos, sem qualquer limitação territorial, à exceção dos Estados em que já tenha havido a prolação de sentença judicial em ação com o mesmo objeto daquela, transitada em julgado, o que deverá ser aferido, destarte, nas Seções Judiciárias respectivas, em observância ao instituto da coisa julgada. Concluindo, comprovado nos autos que o filho do Impetrante é portador de patologia grave, a parte requerente faz jus à movimentação, ao saque, do saldo de seu FGTS. Por fim, por se tratar de saque por doença grave, tanto a opção pelo saque aniversário como a alienação ou cessão fiduciária não impedem o levantamento do saldo do FGTS, nos termos do art. 20-A, §2º, II da Lei n. 8.036/90 e art. 7º, caput e §2º da Resolução n. 958, de 24.04.2020 do Conselho Curador do FGTS. É possível, portanto, a liberação do saldo da conta vinculada do FGTS em situações excepcionais, como o caso do Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), eis que tal enfermidade demanda tratamento médico contínuo, medicamentos específicos e acompanhamento constante. A jurisprudência desta E. Corte já se manifestou sobre a matéria aqui tratada. Confira-se: REMESSA NECESSÁRIA. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO - FGTS. LEVANTAMENTO DO SALDO PARA TRATAMENTO DE DOENÇA DE DEPENDENTE. TRANSTORNO DO ESPECTRO DO AUTISMO. DOENÇA GRAVE. POSSIBILIDADE. HIPÓTESE NÃO ELENCADA NO ART. 20 DA LEI N. 8.036/90. ROL NÃO TAXATIVO. FINALIDADE SOCIAL DA NORMA. POSSIBILIDADE. - A jurisprudência tem firmado entendimento no sentido de que, em se tratando de doença grave e havendo necessidade da importância depositada no FGTS, o trabalhador tem direito ao levantamento do saldo, ainda que não se trate de doença expressamente prevista na legislação. Precedentes. - O STJ possui entendimento jurisprudencial consolidado no sentido de que o rol das hipóteses de movimentação da conta de FGTS, estabelecido no art. 20 da Lei nº 8.036/90, é exemplificativo. Precedente: STJ, 3ª Turma, REsp 1.083.061, Rel. Min. MASSAMI UYEDA, DJE 7.4.2010. - Na hipótese dos autos, a filha do casal (titulares da conta fundiária) é portadora do “Transtorno do Espectro do Autismo”, surgindo, assim, o direito ao levantamento do saldo do FGTS, a fim de que seja assegurado acesso ao valor depositado para fazer frente às despesas com o tratamento e à aquisição dos medicamentos. - Tratando-se de mandado de segurança, não cabem honorários advocatícios, ex vi do art. 25 da Lei 12.016/2009 e da Súmula nº 105 do STJ. - Remessa oficial não provida. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, RemNecCiv - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - 5000340-29.2023.4.03.6143, Rel. Desembargador Federal RENATA ANDRADE LOTUFO, julgado em 21/09/2023, Intimação via sistema DATA: 26/09/2023) - grifos acrescidos. APELAÇÃO. LEVANTAMENTO DO SALDO DE CONTA VINCULADA AO FGTS. AUTISMO E TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. DOENÇA GRAVE NÃO PREVISTA EXPRESSAMENTE PELA LEI N. 8.036/1990. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. TUTELA AO DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE DO TITULAR DA CONTA. RECURSO PROVIDO. 1. O FGTS, conforme se infere da jurisprudência deste Tribunal, possui natureza alimentar, tendo como objetivo assegurar ao trabalhador o mínimo de dignidade - princípio maior do ordenamento constitucional pátrio - nos momentos de maiores dificuldades (desemprego, doença grave, etc): 2. O artigo 20 d Lei 8.036/90 elenca quais são as hipóteses autorizadoras da movimentação do saldo do FGTS. Nesse cenário, constata-se que o artigo 20 da Lei 8.036/90 não pode ser interpretado de maneira restritiva, mas sim de forma teleológica, juntamente com o artigo 6º da Constituição Federal, que alça a saúde ao patamar de direito constitucional social e fundamental. 3. Por tais razões, independentemente de se aferir se o fundista ou seu familiar está em estágio terminal, pode o magistrado ordenar o levantamento do saldo da conta do FGTS mesmo fora das hipóteses previstas no art. 20 da Lei n. 8.036/90, desde que tal liberação tenha como finalidade atender à necessidade social premente, sobretudo em hipóteses em que se busca resguardar a saúde de membro da família da parte autora, assegurando-lhe melhor qualidade de vida, logo um bem jurídico constitucionalmente tutelado. 4. A jurisprudência pátria vem decidindo a favor do levantamento do saque do FGTS em diversos casos de pessoas diagnosticadas autismo e Transtorno do Espectro Autista. Precedentes. 5. Apelação provida. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002204-31.2019.4.03.6115, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 25/02/2021, Intimação via sistema DATA: 01/03/2021) - grifos acrescidos. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO. LEVANTAMENTO DE SALDO DE CONTA VINCULADA. DOENÇA GRAVE NÃO ELENCADA EXPRESSAMENTE NO ART. 20 DA LEI Nº 8.036/1990. POSSIBILIDADE. - O FGTS tem múltiplas finalidades sociais, especialmente dar amparo financeiro ao trabalhador (em situações tais como desemprego involuntário) e criar volume de recursos para financiar políticas públicas em diversas áreas (p. ex., financiamentos habitacionais, saneamento e infraestrutura socioeconômica). Em razão disso, o ordenamento jurídico tem delimitado a movimentação do FGTS mediante listas positivadas em atos normativos. - As hipóteses tratadas no art. 20 da Lei nº 8.036/1990 devem ser interpretadas restritivamente (vale dizer, trata-se de lista taxativa), devendo ser cumpridas pela CEF. Porque essas hipóteses de saque foram abstratamente positivadas, pelo titular da competência normativa, dentro de limites da discricionariedade concedidos pela ordem jurídica, o Poder Judiciário também deve respeitá-las, contudo, harmonizando aspectos particulares que os autos revelem, podendo avaliar, no caso concreto, se há justificativas jurídicas igualmente protegidas pelo Estado de Direito que permitam saques pelo trabalhador. - O caso sub judice cuida de situação concreta na qual é juridicamente legítimo o saque do FGTS, porque o motivo do pleito emerge como motivo equivalente àqueles descritos no art. 20 da Lei nº 8.036/1990, conciliando os mesmos propósitos individuais e públicos. Nessas circunstâncias, é presumível que o levantamento pelo trabalhador atenda aos melhores propósitos do FGTS. - Pela documentação acostada aos autos do Mandado de Segurança, conforme revela pesquisa realizada no sistema PJ-e de Primeiro Grau, verifica-se que a autora é titular de conta vinculada ao FGTS em relação a qual pede levantamento, bem como comprova que seu filho é portador de transtorno do espectro autista (CID F 84.0). - Agravo de instrumento provido. Agravo interno prejudicado. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5004052-26.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 24/08/2023, Intimação via sistema DATA: 28/08/2023). - grifos acrescidos. PROCESSUAL CIVIL. LIBERAÇÃO DE SALDO DO FGTS. DEPENDENTE DO TITULAR PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. POSSIBILIDA-DE. SAQUE-ANIVERSÁRIO E ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DOS VALORES DEPOSITADOS NÃO IMPEDEM O LEVANTAMENTO DO SALDO. RESOLUÇÃO Nº 958, DE 24 DE ABRIL DE 2020 DO CONSELHO CURADOR DO FGTS. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência tem firmado entendimento no sentido de que, em se tratando de doença grave e havendo necessidade da importância depositada no FGTS, o trabalhador tem direito ao levantamento do saldo, ainda que não se trate de doença expressamente prevista na legislação. Precedentes. 2. Na hipótese, o filho do titular da conta fundiária é portador de doença denominada "Transtorno do Espectro do Autismo", surgindo, assim, o direito ao levantamento do saldo do FGTS, a fim de que seja assegurado acesso ao valor depositado para fazer frente às despesas com o tratamento e à aquisição dos medicamentos. 3. A opção pela sistemática saque-aniversário não impede o levantamento do saldo do FGTS na hipótese de doença grave do titular da conta ou de seu dependente, nos termos do art. 20-A, §2º, II, da Lei n. 8.036/90. Igualmente, a aventada alienação ou cessão fiduciária do saque-aniversário pelo titular da conta não impede a movimentação do saldo fundiário nos casos previstos nos incisos XI, XIII e XIV do art. 20 da Lei nº 8.036, de 1990, nos termos do art. 7º, caput e §2º, da Resolução nº 958, de 24 de abril de 2020 do Conselho Curador do FGTS. 4. Negado provimento ao agravo de instrumento e julgado prejudicado o agravo interno interposto pela agravante. (TRF-3 – Acórdão 5015059-49.2022.4.03.0000 – AI – Relator Juiz Federal Convocado ALEXANDRE BERZOSA SALIBA – 1ª Turma - DJEN DATA: 07/11/2022) - grifos acrescidos. REMESSA OFICIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. FGTS. LEVANTAMENTO DO SALDO DA CONTA VINCULADA. CABIMENTO. CASO ANÁLOGO À HIPÓTESE DO ARTIGO 20, XIV, DA LEI Nº 8.036/90. SENTENÇA MANTIDA. REMESSA OFICIAL DESPROVIDA. 1. Embora o caso concreto não se amolde a uma das hipóteses de movimentação da conta vinculada do FGTS previstas pelo dispositivo legal, é cabível a concessão da ordem para permitir a liberação do saldo da conta vinculada do FGTS. 2. O filho da autora foi diagnosticado com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), não sendo razoável exigir-se que o filho da impetrante esteja em estado grave de saúde (estágio terminal), para, só então, com base no artigo 20, inciso XIV, da Lei nº 8.036/90, exsurgir o direito ao saque. 3. As hipóteses do artigo 20 da Lei nº 8.036/90 não são taxativas, cabendo a liberação do saldo da conta vinculada do FGTS em situações excepcionais, como o caso do Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), já que tal enfermidade demanda tratamento médico contínuo, medicação específica e acompanhamento constante. 4. Os recursos depositados nas contas vinculadas do FGTS são de titularidade do trabalhador, sendo evidente seu direito ao saque quando contemplado pelas hipóteses legais ou em situações excepcionalíssimas. 5. Portanto, a recorrida faz jus ao levantamento do saldo da conta vinculada no FGTS em seu nome, conforme constou da sentença recorrida. 6. Remessa oficial desprovida. (TRF3 – Acórdão 5000349-60.2022.4.03.6002 – RemNecCiv - Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO – 1ª Turma - Intimação via sistema DATA: 04/11/2022) - grifos acrescidos. MANDADO DE SEGURANÇA. FGTS. LEVANTAMENTO DE SALDO. ROL LEGAL NÃO TAXATIVO. I - Enumeração do artigo 20, da Lei nº 8.036/1990 que não é taxativa, permitindo interpretação extensiva a hipóteses não elencadas diante do alcance social da norma. Possibilidade, em casos excepcionais, de liberação do saldo do FGTS para situações não previstas no mencionado dispositivo legal. II - Remessa oficial desprovida. (TRF3 – Acórdão 5007484-23.2022.4.03.6100 – RemNecCiv - Desembargador Federal OTAVIO PEIXOTO JUNIOR – 2ª Turma - DJEN DATA: 30/11/2022) E, especificamente, sobre o transtorno do espectro autista, este é condição que desde 2012 se tornou objeto de política nacional específica, sendo a pessoa portadora de tal transtorno considerada pessoa com deficiência para todos os efeitos legais, independentemente de alterações em leis específicas. Eis o teor da lei vigente – Lei 12.764/2012: Art. 1º Esta Lei institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista e estabelece diretrizes para sua consecução. § 1º Para os efeitos desta Lei, é considerada pessoa com transtorno do espectro autista aquela portadora de síndrome clínica caracterizada na forma dos seguintes incisos I ou II: I - deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação sociais, manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento; II - padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos. § 2º A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais. § 3º Os estabelecimentos públicos e privados referidos na Lei nº 10.048, de 8 de novembro de 2000, poderão valer-se da fita quebra-cabeça, símbolo mundial da conscientização do transtorno do espectro autista, para identificar a prioridade devida às pessoas com transtorno do espectro autista. A lei não faz distinção entre os níveis de autismo, ou seja, para a lei um grau leve de autismo não é menos grave ou menos significativo do que um grau mais severo. Outrossim, prevê referida lei (art. 2º, III) que “a atenção integral às necessidades de saúde da pessoa com transtorno do espectro autista, objetivando o diagnóstico precoce, o atendimento multiprofissional e o acesso a medicamentos e nutrientes”. Logo é de se concluir, inclusive por ser notório, que pessoas portadoras do transtorno do espectro autista necessitam em maior ou menor grau de tratamento especializado e acompanhamento com profissionais diversos, de modo que a doença deve, a meu ver, ser equiparada a doença grave para fins da Lei n. 8.036/90. Como verificado acima, há diversos julgados a respeito da possibilidade de levantamento de valores de FGTS em decorrência de doenças consideradas graves, não elencadas no rol legal, inclusive o espectro autista. Ante o exposto, dou provimento à apelação dos Impetrantes, para conceder a segurança e determinar a liberação do saldo de conta vinculada ao FGTS a fim de custear o tratamento médico pleiteado” Não procede totalmente a insurgência da agravante. A opção pela sistemática do Saque Aniversário feita pelos impetrantes (IDs 302572328 e 302572329) não configura óbice ao saque nas hipóteses de doença grave, consoante entendimento firmado por esta E. Corte: REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. LEVANTAMENTO DO FGTS. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DOENÇA GRAVE. TITULAR DA CONTA DIAGNOSTICADO COM CÂNCER. PACIENTE SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO. POSSIBILIDADE. - Otitular da conta vinculada aoFGTS foi diagnosticado com neoplastia maligna docólon sigmóide (CID 10 C187), submetido a tratamento médico.Asaúde do titular da conta está comprometida. Ausentes os requisitos para o deferimento da antecipação da tutela recursal. - O direito à saúde, previsto na CF, éconsideradocomo direito fundamental do cidadão, corolário do direito à vida. O titular da conta vinculada ao FGTS(no caso de moléstia grave) tem direito ao saque, o qual não poderá ser suprimido por normas da Centralizadora Nacional Suporte ao Pagamento do FGTS(CEFGP) ou por perícia médica. Precedentes. - OFGTS possui natureza alimentar, com o claro objetivo de assegurar ao trabalhador o mínimo de dignidade, princípio basilar do ordenamento constitucional, nos momentos de maior dificuldade, como desemprego ou doença grave.Precedentes. - A opção pela modalidade saque-aniversário não cria óbice ao levantamento do saldo de FGTS, no caso de grave enfermidade do titular da conta ou dependente. Precedentes. - Remessa necessária e apelação desprovidas. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5004228-04.2024.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal RENATA ANDRADE LOTUFO, julgado em 28/11/2024, Intimação via sistema DATA: 29/11/2024) AGRAVO DE INSTRUMENTO. FGTS. LIBERAÇÃO DE CONTA. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA - TEA. LEVANTAMENTO DE VALORES. GARANTIA DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS. LIBERAÇÃO DE SALDO. POSSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA DO VALOR DADO EM GARANTIA FIDUCIÁRIA. - A agravante Caixa Econômica Federal objetiva a reforma da decisãoque deferiu a liminar para determinar a liberação do saldo da conta vinculada ao FGTS. - OFGTS possui natureza alimentar, com o claro objetivo de assegurar ao trabalhador o mínimo de dignidade, princípio basilar do ordenamento constitucional, nos momentos de maior dificuldade, como desemprego ou doença grave. -In casu,extrai-se da documentação colacionada aos autos que o laudo médico atesta que o filho do agravado preenche os critérios diagnósticos para Transtorno do Espectro Autista (TEA), necessitando ações farmacológicas, acompanhamento multidisciplinar e terapêutico. -Assim sendo, tenho que o fato de o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) não integrar o rol do artigo 20 da Lei nº 8.036/90 não impede o levantamento dos valores depositados em conta fundiária, sendo possível a autorização de saque ou o levantamento dos valores pelo trabalhador, notadamente pois a referida doença assemelha-se em tudo em gravidade às situações descritas nos incisos do retromencionado artigo, justificando tratamento igualitário. Precedentes. -Registre-se que a opção pela modalidade saque-aniversário não cria óbice ao levantamento do saldo de FGTS, no caso de grave enfermidade do titular da conta ou dependente. Precedentes. -Todavia, no caso em tela, verifico que a CEF trouxe informação nos autos de que o agravado ofereceu o saldo para a garantia de empréstimos bancários. Art. 20-D, § 3º, da Lei n. 8.036/90.Pela regra acima transcrita o titular da conta vinculada ao FGTS poderá levantar os valores do saldo remanescente para tratamento de seu dependente (no caso de doença grave)desde que observada a execução antecipada das dívidas.Precedentes. -Comprovado que o agravadoé pai de criança portadora de Transtorno de Espectro Autista, deve ser acolhido o pedido de liberação dos valores depositados em sua conta de FGTS para que sejam utilizados no custeio do tratamento de saúde de seu filho, observado, contudo, o valor dado em garantia fiduciária pela fundista. - Agravo de instrumento parcialmente provido. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5010235-76.2024.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal DIANA BRUNSTEIN, julgado em 08/11/2024, DJEN DATA: 12/11/2024) PROCESSUAL CIVIL. FGTS. LEVANTAMENTO DE SALDO. ROL LEGAL NÃO TAXATIVO. CESSÃO/ALIENAÇÃOFIDUCIÁRIA. I. Entendimento pacificado nestaSegunda Turma, no sentido de ser cabívela apreciação do pedido de liberação do saldo do FGTS quando este se encontraplenamente demonstrado nos autos através da juntada de prova documental inequívoca.Caso em que, ressalvado entendimento pessoal desta Relatora,se reconhece a dispensa no caso deprova pericial. II. Presente no caso concreto o pressuposto de semelhança relevante, é de se admitir o emprego da analogia, vislumbrando-se na hipótese fática o mesmo elemento de gravidade do estado de saúde dedependenteda parte impetrantecontemplado pela norma positivada a determinar a autorização de levantamento do FGTS. Precedentes. III. Hipótesede doença grave de que está acometidodependente da parte impetranteese deparaanalogia com as causas que possibilitam o levantamento do saldo do FGTSpor motivos de tratamento médico enumeradas no artigo 20 da Lei nº 8036/90, ressaltando-se que citado dispositivo legal faz referência ao “trabalhador ou qualquer de seus dependentes”. IV. Caso em que, ainda que o titular da conta tenha optado por saque-aniversário, as hipóteses relativas a enfermidades, aplicáveis por analogia ao caso dos autos, não impedem o levantamento dos valores. V. Artigo 20-D, §§ 3º a 5º, da Lei n. 8.036/90, que dispõe sobre a possibilidade de cessão fiduciária do direito aos saques anuais, hipótese em que poderá haver bloqueio de percentual do saldo total existente nas contas vinculadas, caso em que eventuais movimentações deverão observar o limite decorrente do referido bloqueio. Precedente. VI - Recurso provido em parte. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004816-03.2023.4.03.6114, Rel. Desembargador Federal AUDREY GASPARINI, julgado em 16/10/2024, Intimação via sistema DATA: 17/10/2024) Entretanto, a CEF comprovou que houve o comprometimento parcial de quantias depositadas na conta vinculada ao FGTS do autor BRUNO MARQUES DA CONCEIÇÃO, em virtude da contratação de alienação fiduciária para fins de antecipação dos valores do saque aniversário (ID 302572534). Assim, faz-se necessário o bloqueio do valor garantido e a liberação do excedente. Nesse sentido é o entendimento deste e. Tribunal Regional Federal: APELAÇÃO CÍVEL. FGTS. LEVANTAMENTO DO SALDO DA CONTA VINCULADA. DOENÇA GRAVE DE DEPENDENTE. ARTIGO 20 DA LEI Nº 8.036/1990. ROL NÃO EXAUSTIVO. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. DOENÇA COMPROVADA. SAQUE-ANIVERSÁRIO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. POSSIBILIDADE DE LEVANTAMENTO DO SALDO REMANESCENTE. CEF, ENQUANTO REPRESENTANTE DO FGTS, É ISENTA DE CUSTAS, EMOLUMENTOS E DEMAIS TAXAS JUDICIÁRIAS. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. APELAÇÃO DA CEF PARCIALMENTE PROVIDA. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5024371-48.2023.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO JUNIOR, julgado em 29/01/2025, Intimação via sistema DATA: 30/01/2025) - grifos acrescidos Desse modo, de rigor se faz a reforma da r. decisão monocrática no que se refere ao bloqueio de valores da conta vinculada FGTS do autor, dados em garantia de empréstimo na modalidade saque aniversário, liberando o saldo excedente para fins de custeio do tratamento médico de R.F.M, diagnosticado com transtorno do espectro autista – TEA, após a reserva do montante comprometido como garantia de empréstimos bancários. Desse modo, determino o bloqueio de valores da conta FGTS do autor, dados em garantia de empréstimo na modalidade saque aniversário e libero o saldo remanescente para custear o tratamento médico pleiteado. Diante do exposto, dou parcial provimento ao agravo interno, nos termos da fundamentação. É o voto.
"Art. 20. A conta vinculada do trabalhador no FGTS poderá ser movimentada nas seguintes situações:
dessas doenças."
- Cinge-se a controvérsia à possibilidade de levantamento da integralidade do saldo do FGTS para custeio de tratamento médico das filhas gêmeas do autor, menores de idade e diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista - TEA (CID 10: F84.0).
- Apresenta-se o autor, ora apelado, como genitor de duas crianças gêmeas, nascidas em 22.09.2014, portadoras do TEA e que necessitam de assistência multidisciplinar. Narra que os gastos com a manutenção da família e as terapias das crianças são excessivos, não sendo suficientes os rendimentos mensais da genitora para todo o custeio necessário. Argumenta que não restou alternativa senão utilizar o saldo do FGTS “para dar dignidade às gêmeas”. Com fins comprobatórios das doenças das filhas, foi colacionada documentação aos autos.
- A CEF alega ser isenta do recolhimento de custas e taxas judiciárias quando atua como representante do FGTS, nos termos do art. 24-A, parágrafo único, da Lei nº 9.028/1995. No mérito, sustenta que o grau do TEA previsto para a liberação é o “severo (nível 3)” e que existe garantia de empréstimo na conta FGTS do autor, na modalidade saque aniversário, impossibilitando o levantamento integral dos valores lá depositados.
- De início, a CEF, enquanto representante do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), é isenta de custas, emolumentos e demais taxas judiciárias, nos termos do art. 24-A, parágrafo único, da Lei nº 9.028/1995. Com razão nesse ponto.
- A Lei nº 8.036/90, que dispõe sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e dá outras providências, ao dispor sobre a possibilidade de utilização dos depósitos realizados em conta fundiária para pagamento de despesas médicas do titular da conta ou de seus dependentes, o legislador previu expressamente os casos de neoplasia maligna, HIV, estágio terminal em razão de doença grave e a aquisição de órtese ou prótese.
- Não se pode perder de vista o caráter social da contribuição ao FGTS, que também possui o escopo de amparar o trabalhador em momentos de necessidade determinados, de modo que não se vislumbra óbice à liberação de tais valores, uma vez comprovado o acometimento por doença grave que ainda não esteja em fase terminal.
- A jurisprudência desta E. Corte tem entendido pela possibilidade de levantamento do saque do FGTS em casos de dependentes/filhos diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista (TEA). O rol do artigo 20 da Lei nº 8.036/90 não é exaustivo, e sim exemplificativo. Precedentes.
- Os documentos juntados aos autos foram suficientes para fazer prova das moléstias das filhas.
- A CEF demonstrou o comprometimento parcial de valores depositados na conta FGTS do autor, em razão da contratação de alienação fiduciária para antecipação dos valores do saque aniversário. É devido o bloqueio do valor garantido e a liberação do excedente, nos termos já efetuados. Precedente.
- De rigor a reforma da sentença quanto ao reconhecimento de isenção da CEF no tocante ao pagamento de custas, emolumentos e demais taxas judiciárias, nos termos do art. 24-A, parágrafo único, da Lei nº 9.028/1995, bem como em relação ao bloqueio de valores da conta FGTS do autor, dados em garantia de empréstimo na modalidade saque aniversário.
- É de se reconhecer que os litigantes foram, respectivamente, vencedor e vencido, em parte, o que impõe a aplicação do disposto no artigo 86 do Código de Processo Civil/2015. O percentual dos honorários advocatícios deve ser fixado na fase de cumprimento da sentença, conforme artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do Código de Processo Civil, observada a suspensão prevista no artigo 98, §§2º e 3º, do CPC.
- Apelação provida em parte.
E M E N T A
Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO. FGTS. LIBERAÇÃO DE SALDO. TRATAMENTO DE SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. SAQUE-ANIVERSÁRIO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. POSSIBILIDADE DE LEVANTAMENTO DO SALDO REMANESCENTE.
I. Caso em exame
Trata-se de agravo interno interposto pela Caixa Econômica Federal - CEF contra decisão monocrática que deu provimento à apelação dos impetrantes, concedendo a segurança para liberação do saldo da conta vinculada ao FGTS para custeio do tratamento médico de R.F.M., diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
II. Questão em discussão
A controvérsia reside na possibilidade de levantamento do saldo do FGTS, apesar da adesão ao regime de saque-aniversário, e na necessidade de bloqueio do valor dado em garantia fiduciária para antecipação do saque.
III. Razões de decidir
A jurisprudência desta Corte consolida o entendimento de que o rol de doenças graves do artigo 20 da Lei nº 8.036/90 não é taxativo, permitindo-se a liberação dos valores depositados na conta do FGTS quando comprovada a gravidade da enfermidade.
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é equiparado a doenças graves para fins de liberação do FGTS, se houver comprovação da necessidade de tratamento médico custoso.
A opção pelo saque-aniversário não impede a liberação do saldo na hipótese de doença grave, conforme entendimento pacífico.
A existência de alienação fiduciária impede o levantamento integral dos valores, devendo ser liberado somente o saldo remanescente, após a reserva da quantia comprometida como garantia de empréstimos bancários.
IV. Dispositivo e tese
Determinado o bloqueio dos valores dados em garantia de empréstimos bancários e a liberação do saldo remanescente
Agravo interno parcialmente provido.
Tese de julgamento:
“1. O Transtorno do Espectro Autista (TEA) configura doença grave para fins de liberação de saldo do FGTS.
2. A opção pelo saque-aniversário não impede o levantamento do saldo nos casos de doença grave do titular ou de seus dependentes.
3. Deve ser liberado somente o saldo remanescente da conta do FGTS, resguardada a quantia vinculada a alienação fiduciária para antecipação de saques.”
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Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.036/1990, arts. 20 e 20-D.
Jurisprudência relevante citada: TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5024371-48.2023.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO JUNIOR, julgado em 29/01/2025, Intimação via sistema DATA: 30/01/2025; TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApelRemNec 5004228-04.2024.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal Renata Andrade Lotufo, julgado em 28/11/2024; TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI 5010235-76.2024.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal Diana Brunstein, julgado em 08/11/2024;